George Steiner |
«Sabemos hoje, enquanto Adam Smith e Macaulay o não sabiam, que o progresso material participa numa dialéctica de destruição concomitante e que devasta irreparavelmente os equilíbrios entre a sociedade e a natureza. Os progressos técnicos, soberbos em si próprios, têm contribuído activamente para a ruína dos sistemas vivos elementares e das condições ecológicas do mundo. O nosso sentido do movimento da história já não é linear, mas o de uma espiral. Somos hoje capazes de conceber uma utopia tecnocrática e higiénica funcionando num vazio de possibilidades futuras.» (George Steiner)
Já dediquei três seminários a Steiner, um centrado sobre as presenças reais, outro sobre a crise da palavra e ainda outro sobre filosofia da linguagem e comunicação. O seu interesse cabalístico pela linguagem fascina-me, mas o que me preocupa neste momento é a sua filosofia da cultura lida como filosofia da história. A primeira obra de Steiner que li atentamente foi No Castelo do Barba Azul: Algumas notas para a redefinição da cultura. Embora me tenha cativado, a obra não me trouxe mais-valia cognitiva: reencontrei nela os temas abordados pelos meus mestres da Escola de Frankfurt, sobrecarregados pelas cores cinzentas da experiência do holocausto. A encenação da história da civilização ocidental como uma criação de judeus cansou-me e continua a cansar-me. Steiner justifica-se citando Kafka: «Man schlägt den Juden und erschlägt den Menschen», ou, em tradução portuguesa livre, «aquele que fere um judeu mata o homem». Não admira que Steiner, orgulhoso de fazer parte do "povo eleito", o único povo de homens (sic), veja o Holocausto como uma Segunda Queda: o genocídio «não foi um mero fenómeno económico-social e secular. Actualizou um impulso tendendo para o suicídio da civilização ocidental. Foi uma tentativa de nivelar o futuro - ou, mais precisamente, de tornar a história comensurável com a crueldade natural, o torpor intelectual e os apetites materiais de uma humanidade que não se transcende a si própria. Se nos servirmos de uma metáfora teológica, e não temos por que nos desculpar por isso num ensaio sobre a cultura, poderemos dizer que o holocausto assinala uma Segunda Queda. Podemos interpretá-lo como um abandono voluntário do jardim e uma tentativa pragmática de queimar o jardim atrás de nós. Sem o que a sua memória continuaria a infectar a saúde da barbárie com os seus sonhos debilitantes ou os seus remorsos /Com a tentativa falhada de matar Deus e a tentativa quase conseguida de matar aqueles que O tinham "inventado", a civilização entrou, justamente conforme a previsão de Nietzsche, "na noite cada vez mais noite"». Steiner resume aqui o núcleo duro da sua filosofia da história: toda a história do Ocidente anterior ao holocausto é, praticamente, encarada como a sua preparação proto-fascista. A sua consumação no holocausto implica o colapso ou o suicídio da civilização ocidental, como se os alemães e os judeus fossem os únicos "ocidentais". Ora, esta filosofia da história de Steiner é, na sua essência, uma teologia (judaica) da história, que ousa usar o holocausto como o acontecimento que marca o advento da pós-cultura, como se depois de Auschwitz já não fosse possível escrever poesia (Adorno): Steiner apropria-se da civilização ocidental, reduzindo-a a uma antiquíssima conspiração contra os judeus e o "seu" Deus, e fazendo dela - no seu melhor momento - uma construção ou produção de e para judeus. Adorno escreveu que, na psicanálise de Freud, só os exageros são verdadeiros, mas, nesta concepção teológica da história que concentra toda a humanidade possível nos judeus, os exageros de Steiner são falsos. Todo o pensamento de Steiner é envenenado por um judaísmo racista que, para se apropriar da herança ocidental, responsabiliza os filósofos não-judeus e os cristãos pelo holocausto. (Apesar da sua erudição, Steiner esquece que o Inferno não é uma ideia cristã!) O judaísmo doentio de Steiner - bem como a sua insensibilidade pelo sofrimento das vítimas não-judias do nazismo! - faz o meu sistema imunitário produzir anti-corpos a um ritmo acelerado, para eliminar todas as "vacas sagradas" deste mundo. A minha primeira impressão continua a ser a minha impressão de hoje: o pensamento de Steiner é pensamento envenenado, no sentido que Nietzsche deu a este termo. Enquanto não depurarmos o seu pensamento, libertando-o das molduras judaicas que anseiam pela quimera de uma unidade perdida, com a ajuda de outros judeus esclarecidos, o melhor será esquecê-lo, até porque tudo aquilo que de importante disse já tinha sido formulado pelos grandes filósofos dos séculos XIX e XX, uns judeus, outros não-judeus. O que nos une, a nós que somos ocidentais de gema, não é o judaísmo, mas a filosofia e a política que emergiram nas Cidades-Estados da Grécia Antiga. Depois de nos termos libertado do jugo da religião, já adquirimos uma imunidade suficientemente poderosa para liquidar qualquer tentativa regressiva de colonização judaica. Estamos cansados do muro das lamentações dos judeus, do seu bezerro de ouro e da sua usura (Marx)! Há mundo para além dos judeus e, para haver mundo, os judeus não são necessários: a Steiner falta-lhe humildade e, por consequência, humanidade. Ninguém é mais humano do que outro homem. Ninguém conquista mais humanidade negando-a ao outro homem. Não é com a sua concepção do judeu sobre-humanizado - ou divinizado? - que Steiner cativa um público não-judeu de homens inteligentes e humanos, libertos das teias de aranha religiosas.
J Francisco Saraiva de Sousa
1 comentário:
Esclareci algumas ideias! Mas não vou desenvolver. :)
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