Terreiro da Sé do Porto ao pôr-do-sol |
Fui tentado a colocar uma imagem de pobreza, mas depois pensei que não valia a pena dar visibilidade a uma realidade cruel vivida diariamente pelos portugueses, preferindo a beleza do pôr-do-sol contemplado a partir do Terreiro da Sé-Catedral do Porto. No contexto deste debate Prós e Contras (17 de Outubro) sobre o Orçamento terrorista de Estado apresentado por este governo neoliberal de extrema-direita, ele representa o fim de um mundo, um mundo de ilusões que alucinou de tal modo os portugueses que toldou a sua mente consciente e crítica, impedindo-os de ver que o futuro de Portugal estava a ser sistematicamente sacrificado para engordar as elites do poder. Os convidados de Fátima Campos Ferreira começaram por apresentar perspectivas diferentes: João Cantiga Esteves (economista neoliberal), Carlos Moreno (juiz jubilado) e o Padre António Vaz Pinto foram, pelo menos inicialmente, simpáticos em relação ao orçamento de Estado, mas depois de terem escutado as dificuldades e as aflições reais dos convidados da plateia, mudaram de perspectiva, acabando por alinhar - de certo modo - ao lado de Carlos Carvalhas (economista do PCP) e condenando a incapacidade deste governo para apresentar sinais concretos de esperança, ou seja, um programa de crescimento e de desenvolvimento económicos. O governo liderado por Passos Coelho governa há pouco mais de 100 dias e, no entanto, já ninguém acredita nele. D. Januário Torgal Ferreira classificou este orçamento de Estado como terrorismo: o governo está a empobrecer os portugueses e a lançar a economia em recessão, assaltando os seus bolsos sem se preocupar se eles têm dinheiro para se alimentar. O PSD deve ser responsável pelas medidas mais neoliberais que foram recolhidas pela troika: a sua sede pelo poder levou-o a denegrir Portugal perante os mercados financeiros numa espécie de campanha terrorista contra o anterior governo e, o que é pior, contra o próprio povo português. O memorando da troika radicalizado foi sempre o programa de governo do PSD. O alheamento e a fantasia letal dos cidadãos portugueses não lhes permitiu ver que estavam a ser novamente enganados: eles votaram em massa no partido que hoje os lança sem dó nem piedade na pobreza, na miséria, na doença e na ignorância. O terror está instalado em Portugal e, se não houver uma mudança radical na Europa, os portugueses vão regressar aos tempos mais miseráveis da sua história, mas desta vez sem dignidade e sem desculpas. Os portugueses em geral - e os professores em particular - são culpados pela situação de miséria material e mental em que vivem: eles permitiram a troco de umas migalhas que as elites do poder - sediado em Lisboa - desgovernassem Portugal, sacando-lhe toda a riqueza em benefício próprio. Alguém na manifestação dos indignados que ocorreu no Porto usou a expressão certa para caracterizar as elites do poder: Ali Babá e os quarenta ladrões. A corrupção é a doença das elites do poder portuguesas.
Portugal é um país profundamente desigual e assimétrico em termos sociais e de acesso ao poder. A ilusão de riqueza foi gerada pelo próprio poder político e económico em conluio com a comunicação social lisboeta. Os canais privados de televisão alimentaram a alucinação colectiva através das suas telenovelas, da sua publicidade e de toda a sua agenda: o novo-riquismo é uma invenção fantasiosa lisboeta difundida para todo o país sem levar em conta as assimetrias regionais. A III República está a ser um fracasso total e a única coisa boa que ela produziu - o sistema nacional de saúde - vai ser destruída pela agenda neoliberal deste governo. Carlos Moreno - o juiz jubilado - fez questão em afirmar que a sua intervenção neste debate seria uma intervenção "sem ideologias". Ora, esta é a mais terrível das ideologias: a ideologia que tenta olhar para a realidade social a partir de uma espécie de observatório extraterrestre. Claro que Carlos Moreno foi ágil a criticar tudo e todos sem ter colocado no banco dos réus a corporação a que pertence: a maior vergonha da democracia portuguesa é o sistema judicial, em especial o Ministério Público que age de um modo absolutamente terrorista. O Ministério Público é a Al-Qaeda de Portugal. Se fosse um observador universal, Carlos Moreno devia ter denunciado as práticas terroristas deste sector da sua própria "família profissional", uma das principais responsáveis pelo atraso económico de Portugal. A intervenção de Carlos Moreno traz a mancha negra da sua corporação: os portugueses não acreditam nos seus magistrados públicos, cuja acção terrorista consiste em fabricar bruxas para depois as tentar caçar. A ideologia que se apressa demasiado rapidamente a negar o seu carácter ideológico é a mais mentirosa de todas as ideologias. Daí a ambiguidade estrutural do discurso de Carlos Moreno: «Um orçamento violento e inesperado que provocou angústia e medo do futuro». No entanto, Carlos Moreno admira este orçamento violento, alegando ser um orçamento de verdade e de coragem. Coragem no sentido do governo ter perdido o seu estado de graça, e verdade no sentido de assumir o descalabro e a irresponsabilidade das finanças públicas portuguesas. Com este orçamento violento, termina a era das ilusões portuguesas. O governo fez a sua própria opção: cortar as despesas públicas, liquidar a economia e empobrecer Portugal. Mas Carlos Moreno vai mais longe quando une a sua voz à voz da sua corporação terrorista: é preciso responsabilizar e talvez enviar para a prisão os responsáveis pelo descalabro das finanças públicas. A caça às bruxas foi o único sinal de esperança dado por Carlos Moreno que, tal como os seus colegas do Ministério Público, sonha com uma "democracia judicial", ou melhor, com uma ditadura judicial. Uma coisa é certa: Carlos Moreno não é democrata e a sua cultura jurídica é claramente inquisitorial! Outra voz que se uniu à voz do governo foi a de João Cantiga Esteves, que interpretou o orçamento como a chegada da factura do despesismo descontrolado e o desmentido da negação socrática da estagnação da economia portuguesa. Como não há financiamento da economia, Portugal está dependente do apoio da troika. Este é o orçamento da verdade e do rigor para os portugueses: o sadismo de Cantiga Esteves leva-o a congratular-se com o fracasso do modelo económico e do modelo social portugueses. É com prazer sádico que ele afirma que o Estado Social é insustentável: Cantiga Esteves quer punir os portugueses e privá-los dos benefícios sociais. O que ele lamenta na acção deste governo é o facto de estar a desmantelar e a desmontar o Estado Social "pela calada": Cantiga Esteves quer que o governo privatize abertamente a educação, a saúde e a segurança social, dizendo aos portugueses o que vem a seguir. O que vem a seguir? A pobreza e a miséria, a dor e o sofrimento, a angústia e o desespero, a doença e a morte, claro! Quando afirma que "tudo vai acabar", Cantiga Esteves quer dizer que vem aí a pobreza como sistema social e como forma de vida. Reinventar uma nova forma de estar é, nesta perspectiva sádica, adaptar os portugueses à pobreza e à miséria. Que sinais de esperança concreta nos deixaram Carlos Moreno e Cantiga Esteves? A situação de crise exige mudança de paradigmas, como é evidente, mas a ditadura judicial e a pobreza propostas por estes dois profetas da desgraça não são solução para o futuro: os portugueses deviam privar os profetas da desgraça dos privilégios que lhes foram conferidos pelo Estado Social. O ambiente em Portugal seria muito mais leve se nos libertássemos destas vozes da desgraça. De certo modo, Carlos Carvalhas - e, em menor grau, António Vaz Pinto - contribuíram para esta tarefa nacional ao defenderem que é preciso mais tempo para reduzir o défice e renegociar a dívida. Carlos Carvalhas é contra a austeridade, alegando que este orçamento vai produzir falências em série, especialmente no domínio da restauração bem representado por Celeste Jorge, desemprego galopante e catástrofe. Deste modo, Carlos Carvalhas desmistificou os discursos ideológicos de Cantiga Esteves e de Carlos Moreno, apresentando dados que refutavam as teses empíricas destes profetas sádicos da desgraça. Como já tinha dito, ninguém duvida da necessidade de reinventar a sociedade portuguesa: o desacordo começa quando se discute a nova sociedade que os portugueses querem construir. Ora, no que se refere à construção de uma nova sociedade, o debate foi muito pobre: a Europa está a sacrificar as novas gerações para conservar os benefícios das gerações mais velhas. Esta é uma política de suicídio ocidental: o futuro não pertence aos velhos mas sim aos mais novos. Hoje a luta contra o sistema deve ser protagonizada pelos jovens, de preferência por jovens inteligentes, cultos e politizados.
Portugal é um país profundamente desigual e assimétrico em termos sociais e de acesso ao poder. A ilusão de riqueza foi gerada pelo próprio poder político e económico em conluio com a comunicação social lisboeta. Os canais privados de televisão alimentaram a alucinação colectiva através das suas telenovelas, da sua publicidade e de toda a sua agenda: o novo-riquismo é uma invenção fantasiosa lisboeta difundida para todo o país sem levar em conta as assimetrias regionais. A III República está a ser um fracasso total e a única coisa boa que ela produziu - o sistema nacional de saúde - vai ser destruída pela agenda neoliberal deste governo. Carlos Moreno - o juiz jubilado - fez questão em afirmar que a sua intervenção neste debate seria uma intervenção "sem ideologias". Ora, esta é a mais terrível das ideologias: a ideologia que tenta olhar para a realidade social a partir de uma espécie de observatório extraterrestre. Claro que Carlos Moreno foi ágil a criticar tudo e todos sem ter colocado no banco dos réus a corporação a que pertence: a maior vergonha da democracia portuguesa é o sistema judicial, em especial o Ministério Público que age de um modo absolutamente terrorista. O Ministério Público é a Al-Qaeda de Portugal. Se fosse um observador universal, Carlos Moreno devia ter denunciado as práticas terroristas deste sector da sua própria "família profissional", uma das principais responsáveis pelo atraso económico de Portugal. A intervenção de Carlos Moreno traz a mancha negra da sua corporação: os portugueses não acreditam nos seus magistrados públicos, cuja acção terrorista consiste em fabricar bruxas para depois as tentar caçar. A ideologia que se apressa demasiado rapidamente a negar o seu carácter ideológico é a mais mentirosa de todas as ideologias. Daí a ambiguidade estrutural do discurso de Carlos Moreno: «Um orçamento violento e inesperado que provocou angústia e medo do futuro». No entanto, Carlos Moreno admira este orçamento violento, alegando ser um orçamento de verdade e de coragem. Coragem no sentido do governo ter perdido o seu estado de graça, e verdade no sentido de assumir o descalabro e a irresponsabilidade das finanças públicas portuguesas. Com este orçamento violento, termina a era das ilusões portuguesas. O governo fez a sua própria opção: cortar as despesas públicas, liquidar a economia e empobrecer Portugal. Mas Carlos Moreno vai mais longe quando une a sua voz à voz da sua corporação terrorista: é preciso responsabilizar e talvez enviar para a prisão os responsáveis pelo descalabro das finanças públicas. A caça às bruxas foi o único sinal de esperança dado por Carlos Moreno que, tal como os seus colegas do Ministério Público, sonha com uma "democracia judicial", ou melhor, com uma ditadura judicial. Uma coisa é certa: Carlos Moreno não é democrata e a sua cultura jurídica é claramente inquisitorial! Outra voz que se uniu à voz do governo foi a de João Cantiga Esteves, que interpretou o orçamento como a chegada da factura do despesismo descontrolado e o desmentido da negação socrática da estagnação da economia portuguesa. Como não há financiamento da economia, Portugal está dependente do apoio da troika. Este é o orçamento da verdade e do rigor para os portugueses: o sadismo de Cantiga Esteves leva-o a congratular-se com o fracasso do modelo económico e do modelo social portugueses. É com prazer sádico que ele afirma que o Estado Social é insustentável: Cantiga Esteves quer punir os portugueses e privá-los dos benefícios sociais. O que ele lamenta na acção deste governo é o facto de estar a desmantelar e a desmontar o Estado Social "pela calada": Cantiga Esteves quer que o governo privatize abertamente a educação, a saúde e a segurança social, dizendo aos portugueses o que vem a seguir. O que vem a seguir? A pobreza e a miséria, a dor e o sofrimento, a angústia e o desespero, a doença e a morte, claro! Quando afirma que "tudo vai acabar", Cantiga Esteves quer dizer que vem aí a pobreza como sistema social e como forma de vida. Reinventar uma nova forma de estar é, nesta perspectiva sádica, adaptar os portugueses à pobreza e à miséria. Que sinais de esperança concreta nos deixaram Carlos Moreno e Cantiga Esteves? A situação de crise exige mudança de paradigmas, como é evidente, mas a ditadura judicial e a pobreza propostas por estes dois profetas da desgraça não são solução para o futuro: os portugueses deviam privar os profetas da desgraça dos privilégios que lhes foram conferidos pelo Estado Social. O ambiente em Portugal seria muito mais leve se nos libertássemos destas vozes da desgraça. De certo modo, Carlos Carvalhas - e, em menor grau, António Vaz Pinto - contribuíram para esta tarefa nacional ao defenderem que é preciso mais tempo para reduzir o défice e renegociar a dívida. Carlos Carvalhas é contra a austeridade, alegando que este orçamento vai produzir falências em série, especialmente no domínio da restauração bem representado por Celeste Jorge, desemprego galopante e catástrofe. Deste modo, Carlos Carvalhas desmistificou os discursos ideológicos de Cantiga Esteves e de Carlos Moreno, apresentando dados que refutavam as teses empíricas destes profetas sádicos da desgraça. Como já tinha dito, ninguém duvida da necessidade de reinventar a sociedade portuguesa: o desacordo começa quando se discute a nova sociedade que os portugueses querem construir. Ora, no que se refere à construção de uma nova sociedade, o debate foi muito pobre: a Europa está a sacrificar as novas gerações para conservar os benefícios das gerações mais velhas. Esta é uma política de suicídio ocidental: o futuro não pertence aos velhos mas sim aos mais novos. Hoje a luta contra o sistema deve ser protagonizada pelos jovens, de preferência por jovens inteligentes, cultos e politizados.
J Francisco Saraiva de Sousa
6 comentários:
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Já tenho a Visão do Paraíso de Sérgio Buarque de Holanda e já comecei a ler - estou a gostar. Gosto de leituras ousadas. Fica aqui o meu obrigado a um amigo do Brasil. :)
O imaginário - a utopia, como diz Bloch - desempenhou um papel fundamental nos descobrimentos portugueses. De certo modo, a construção colonial e a imaginação geográfica andam juntas... É complicado elaborar esta teoria dos descobrimentos mas o resultado seria deveras giro.
Em Portugal, a historiografia foi vítima de um certo racionalismo castrador: os historiadores depuraram os feitos dos portugueses de todo o imaginário, talvez temendo a persistência do sebastianismo. Compreendo historicamente esta depuração mas a longo prazo ela empobrece a nossa história. Buarque de Holanda ao destacar as ideias não está a negar o primado da infra-estrutura: Marx nunca negou o papel das ideias na história.
Buarque de Holanda estabelece uma categoria inaudita para pensar o Éden Luso-Brasileiro. É uma atitude correcta: nos livros de viagens dos portugueses funciona uma imaginário muito próprio que ainda não tematizámos.
É a categoria de atenuação plausível...
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