Nos anos 60 do século XX, durante a revolta estudantil de 68, Herbert Marcuse afirmou que «o que está em causa é a ideia de uma nova antropologia, não apenas como teoria, mas também como modo de existência, a criação e desenvolvimento de uma necessidade vital de liberdade que é fundamentada e limitada, já não pela miséria e pela necessidade do trabalho alienado, mas por uma nova espécie de liberdade». Esta nova antropologia filosófica e, portanto, política, fortemente inspirada nos escritos de juventude de Marx, foi desenvolvida na sua obra "Eros e Civilização", onde afirma que «o biologismo de Freud é, na sua essência, teoria social» e, como tal, teoria histórica. A liberdade surge nesta nova antropologia como uma necessidade biológica, numa acepção verdadeiramente biológica. A classe trabalhadora a quem pertencia objectiva e subjectivamente a tarefa de libertar a humanidade da miséria foi inteligentemente integrada social e culturalmente na sociedade estabelecida e, encantada como a melhoria geral do seu nível de vida, deixou de sentir essa necessidade biológica de libertação. O capitalismo é um sistema altamente integrador e sabe neutralizar todas as forças de oposição, de modo a neutralizar essa necessidade de liberdade. Ora, esta capacidade de neutralizar a oposição fez com que a teoria crítica perdesse o seu agente de mudança social, obrigando-a a tornar-se extremamente abstracta e teórica. Porém, Marcuse procurou novos caminhos e um deles exige «a transformação das necessidades» como um primeiro passo para levar as pessoas conformadas a redespertar novamente para a urgência de levar a cabo a mudança social qualitativa. Isto significa que a nova antropologia, além de pensar a transformação das necessidades, deve criar uma nova ética ou moral capaz de negar a moral judaico-cristã, que tem caracterizado até agora a história da civilização ocidental, porque, segundo Marcuse, «a continuidade das necessidades desenvolvidas e satisfeitas numa sociedade repressiva (...) faz com que esta sociedade repressiva se reproduza a si própria constantemente nos próprios indivíduos. Os indivíduos reproduzem nas suas próprias necessidades a sociedade repressiva». E, não é possível escapar deste círculo vicioso, a menos que se transformem as necessidades. Esta ideia de transformação das necessidades rompe cabalmente com uma visão estática e funcionalista das necessidades, supondo que «as necessidades humanas possuem um carácter histórico» e, por isso, possam ser modificadas. Segundo Marcuse, «todas as necessidades humanas, incluindo a sexualidade, são historicamente determinadas e historicamente susceptíveis de transformação». A ruptura com a continuidade das necessidades repressivas, portanto, o salto para a diferença qualitativa, encontra-se contido no desenvolvimento das forças de produção, o qual exige efectivamente novas necessidades vitais a fim de poder ser coerente com as suas próprias possibilidades históricas. Deste modo, Marcuse é levado a defender a base biológica do socialismo, defendendo, na peugada de Ernst Bloch, a possibilidade de um caminho do socialismo da ciência para a utopia e não, como fez Engels, da utopia para a ciência. Neste momento, precisamos de criar uma certa distância teórica em relação à nova proposta antropológica de Marcuse e encarar a "antropologia negativa" em novos moldes, sempre no âmbito da história da Filosofia Ocidental. A noção de uma antropologia negativa foi vista como uma tarefa urgente por Adorno e Horkheimer. Com efeito, a Dialéctica do Esclarecimento termina com uma secção intitulada "Notas e Esboços", referentes a «uma antropologia dialéctica», que deveria ser tratada «num trabalho futuro». Mas este trabalho nunca chegou a ver a luz do dia e, no âmbito da teoria crítica da Escola de Frankfurt, temos apenas a obra antropológica de Marcuse e a «metodologia» exposta por Adorno na sua Dialéctica Negativa. Pensando livremente, podemos afirmar que os mestres da Escola de Frankfurt estavam insatisfeitos com o próprio homem e esta insatisfação revela-se no pensamento de muitos outros filósofos contemporâneos, em especial no de Nietzsche. Daí que todos eles, cada qual à sua maneira, num diálogo com toda a nossa tradição Ocidental, tenham vislumbrado a necessidade urgente de "transformar o próprio Homem". Quando Marcuse afirma que a nova antropologia, além de ser uma nova teoria do homem, é também um novo «modo de existência», mais não faz do que manifestar a insatisfação filosófica com o homem tal como o conhecemos, como se este mísero animal mortal não estivesse à altura da missão que lhe é atribuída pela Filosofia: ser livre e responsável. Usei intencionalmente a expressão "mísero animal mortal", para me distanciar teoricamente de certos "ideais" ou "princípios" defendidos por todos os pensamentos de Esquerda, de modo a destacar a tarefa urgente de pensar a "animalidade do homem", numa perspectiva realmente biológica. Pensar a animalidade do homem como "ser sofredor" (Marx) possibilita-nos romper com o "humanismo" como perspectiva teórica e, simultaneamente, destraumatizar e desmistificar certas noções, tais como a da igualdade e da liberdade, severamente desmontadas por Marx na Questão Judaica, quando denuncia a formalidade dos chamados "Direitos Humanos", que bloqueiam a filosofia na tarefa de repensar a missão prática: mudar o homem para que este novo homem possa depois mudar o mundo. Ou dito de outra forma, talvez mais provocadora: Da obra "Humanismo e Terror" de Merleau-Ponty, abandonamos o humanismo (como perspectiva teórica) e retemos apenas a violência criadora, mais precisamente a tarefa de transformar radicalmente o homem, a qual exige uma nova teoria que pode inspirar-se na poesia de Georg Trakl. (Termino deste modo provocantemente incompleto, sem mostrar o caminho que já percorri nesse sentido.) J Francisco Saraiva de Sousa
41 comentários:
Continuo a ler com gosto os seus textos no âmbito da "teoria crítica" e seus horizontes alargados. Mas reconheço que não tenho estaleca para um pequeno comentário que seja, porque o nível teórico é muito elevado. Em metáfora militar isto para mim é artilharia pesada. Felicito-o.
Obrigado, F. Dias.
De facto, ando a tentar renovar a teoria crítica ou, pelo menos, procuro uma nova saída... A filosofia é mesmo "artilharia pesada"... :)
Gostei !
Lá no meio encalhei numa coisa com a qual engalinho solenemente: " a nova ética"...:)
Eu que gosto de conceitos fortes para ideias claras, retenho para a ética a noção de culto do respeito.
Tudo o resto remeto para o ãmbito dos valores morais, sociais, códigos de conduta, ....portanto sempre que ouço falar de uma "nova ética" pergunto-me o que haverá de mal com a velha ?!...:)
E no que se refere ao tratamento do sentido cultural de necessidade, sinto que o autor que refere fica "curto"...há nesta matéria facetas estranhissimas ( fruta da "época"), coisas deste género: "eu fumo, quero ter a liberdade de fumar onde e quando quiser, sinto essa necessidade de me sentir livre e não admito que interfiram nessa minha liberdade, mas acho que o cultivo do tabaco deve ser proibido, que o Estado deveria tratar disso... " Ou seja: um conflito nunca visto entre consciência social e hedonismo individual. Em certas "esquerdas" então, é dramático !
Deve ter reparado que não dei saída à "nova ética". Influência de Nietzsche sobre Marcuse, mediada por Heidegger... :)))
E acrescentei uma parte final, ainda incompleta, que não conclui de madrugada! :)))
Agrada-me essa linha de ruptura...vem de encontro ao que lhe comentava há dias quanto à minha relutância em aceitar para determinada visão do ambiente o paradigma do paraíso e o seu corolário de derivas conservacionistas...
Ao fim deste tempo todo continuamos à procura do nosso lugar no Mundo...
Daí que Max Scheler tenha escrito uma obra "O Lugar do Homem no Mundo", seguido pelas obras de Plessner e Gehlen... :)
Manuel Rocha
Gostei da "ética do respeito" de que falou. Tugendhat fala do respeito por si próprio e pelos outros na sua ética, retomando teses de Adam Smith e de outros. Quando tiver tempo falo disso. :)
A teoria de Marcuse é mais complexa, mas precisa ser lida de forma hermeneuticamente mais violenta, sobretudo a sua "dimensão estética" e educação estética... :)
Bom dia.
Uma nota prévia dirigida ao Sr. F. Dias: a filosofia não é artilharia pesada.
Não nos devemos encantar com a eloquência e retirarmo-nos depois disso. Qualquer texto filosófico pode ser passível de simplificação porque é assente numa estrutura, e é este exercício que se pode aprender a fazer para que nos possamos armar (na senda da metáfora militar…) para uma leitura plena e consequente possibilidade de questionar, concordar ou discordar fundamentadamente. Pensar é realmente difícil, e a Filosofia é particularmente sofisticada, mas é, sobretudo, uma actividade humana e humanista e, como tal, não deve nunca ser alheia a ninguém; pelo menos é esta a minha crença.
Caro Francisco:
O diagnóstico do homem como “ser sofredor” (desconhecia em Marx, mas pelo menos exaltado por Nietzsche e Freud) foi muito importante, aliás, essencial para o pensamento decorrente. Questiono é a “necessidade biológica da libertação”: porque me parece que significa mais do que conhecer biologicamente o homem ou a sua animalidade. A "necessidade de liberdade" parece-me um conceito contraditório em si mesmo e a sua "neutralização", retórica.
Francisco,
quer-se rir um bocadinho para descomprimir? Então leia este post de um advogado da nossa praça: http://josemariamartins.blogspot.com/2007/12/paneleiros-demografia-e-oramernto-da.html
Continuo a não entender a sua postura diante da vida! O post é de mau-gosto... tipicamente homofóbico e a homofobia é sintoma de doença grave. Mande o seu amigo tratar-se...
E continuo a não perceber o seu comentário: conceito contraditório! Porquê? Tem medo da libertação? Marx lutou pela libertação e, graças a ele, vivemos num mundo melhor do que era no seu tempo, como se verifica olhando para os operários... Boa luta!
Contudo, convido-a a fazer uma visita ao Zoo de Lisboa e veja o que é ser um animal em cativeiro... :)))
Além disso, gostava que explicitasse essa noção de homem como ser sofredor em Nietzsche e Freud. Pode ser possível mas não constitui leitura oficial do pensamento desses autores, até porque o conceito traz a marca do cristianismo.
Quando tinha 17 ou 18 anos, fiz um estudo sobre os textos do jovem Marx, lidos à luz da cibernética. Identifiquei o ser sofredor com a noção de sistema aberto e nessa linha interpretei a sua noção de corpo como feixe de necessidades. Actualmente, prefiro retomar a posição excêntrica de Plessner e de abertura ao mundo de Gehlen, mas ambas as leituras são viáveis e compatíveis no âmbito da filosofia política...
Nos seus posts, seixa transparecer uma certa ligação ao marxismo e a uma certa ideia de utopia (que pretensamente justificada pela ciência adquiria a qualidade de profecia).
O marxismo, porém, baseia-se numa crítica da economia política totalmente errada nos seus fundamentos e num esboço de teoria da evolução social contraditório, que acaba sendo descabido. Constitui um dos maiores fiascos ao nível das teorizações da evolução social; e a sua vertente de projecto político, o comunismo, ficou também constituindo o maior malogro político do século passado.
Surpreende-me que diga que os trabalhadores beneficiaram do marxismo e não das suas lutas sindicais reformistas (coisa que o marxismo menosprezava, a favor da acção revolucionária). Bastaria comparar em que países os trabalhadores alcançaram melhores níveis de vida (económico, social e político) e comparar com a influência do marxismo nessas sociedades.
JMC.
Nunca poderia ser homofóbica...
Obviamente q estava a ser irónica... e obviamente q ele não é meu amigo. N percebo a sua exaltação. :(((
JMC
A minha leitura de Marx está para além da sua interpretação "comunista". Os partidos políticos e movimentos sindicais reformistas foram marcados por Marx. Isso é inegável. Não sei que leitura faz desse sucesso de Marx ou a quem o atribui... :)
Papillon
Não estou exaltado! :)))
Ok já vi que a ironia é uma figura de estilo mal-vinda aqui, por isso vou até ao Zoo. Confio no sentido de humor da hiena.
Papillon
Antes de ir ao Zoo, Leia o meu post sobre as hienas malhadas. :)))
JMC
Não sei qual a teoria marxista da evolução a que se refere. Existem várias atribuídas erroneamente a Marx.
JMC
A revolução de Outubro de 1917 e, posteriormente, a guerra fria e a política de blocos, facilitaram o sucesso de algumas lutas operárias e sindicais, contribuindo para a elevação do nível de vida. Não pode apagar estes acontecimentos marcantes da nossa história. E não deve ser por mero acaso que actualmente a Europa, após a queda do muro de Berlim, está a retroceder em termos sociais.
Por outro lado, Lenine era voluntarista e um lider inteligente e determinado: soube marcar e conduzir o rumo da Rússia. Mas essa revolução ocorreu no país mais atrasado da Europa. Daí a morte dos czares, hoje (repare) convertidos em santos pela Igreja Ortodoxa. Santos! Até os assassinos são santos!!! (Contudo, pense que nem tudo na URSS foi mau: a sua educação era superior à nossa, a dos europeus. Não falo de Portugal, porque este é um pais pouco culto. Repare: nunca fui "comunista".)
A critica economica levada a cabo por Marx é teoricamente rigorosa e verdadeira. A economia actual está do lado das classes dominantes. Daí a promiscuidade entre Bancos, poder político e especuladores. Os cálculos podem ser feitos de outra maneira, levando em conta outras variáveis.
Marx nunca usou o termo profecia! O comunismo não é um conceito marxista, mas greco-cristão! Marx retomou-o para exigir o alargamento da cidadania à classe dos trabalhadores e foi esse impulso teórico que alimentou as lutas sindicais que referiu....
O sucesso de algumas (muitas) lutas sindicais deveu-se (e deve-se) a uma outra concepção de sindicalismo que não o sindicalismo revolucionário. Esse sindicalismo reformista não deve puto a Marx nem ao marxismo, antes pelo contrário.
Os trinta gloriosos anos atribuídos ao fordismo devem-se ao desenvolvimento capitalista por todo o lado após a segunda guerra mundial (de que o Plano Marshall foi apenas o financiador e de que a indexação dos ganhos de produtividade aos salários foi um dos fundamentos). Na Europa, as conquistas operárias (que começaram com a vitória da frente popular, em França) deveram-se fundamentalmente a movimentos sindicais reformistas, não influenciados pelo marxismo (Suécia, Grã-Bretanha, etc., e, mais tarde, na Alemanha devastada pela guerra). Nos países comunistas, em todos eles, os trabalhadores não chegaram a usufruir nada semelhante ao que os seus companheiros de classe passaram a ter no mundo capitalista desenvolvido (no início dos anos setenta, na URSS e nos restantes países comunistas, a maioria das convenções da OIT não estavam ratificadas e os trabalhadores não tinham os mais elementares direitos de defesa, a começar por não terem sindicatos verdadeiramente autónomos do poder político). Por favor, não confunda propaganda com realidade.
O comunismo ficou constituindo um instrumento político para trazer países atrasados no desenvolvimento capitalista para a modernidade. É esse o seu único mérito histórico. Mesmo assim, um mérito obtido à custa de quantos sacrifícios dos trabalhadores assalariados (tornaram possível níveis de acumulação de capital que doutro modo não seriam possíveis). Não julgo que tenha sido uma perversidade, porque certamente os seus actores acreditavam estar construindo um mundo novo. E, de facto, em muitos dos países atrasados onde medrou o comunismo, a nova sociedade constituía um mundo novo, pelo menos um mundo diferente do feudalismo e de outros arcaísmos que o fraco desenvolvimento capitalista não tinha varrido. Por alguma razão, nesses países, o sentimento dominante era o nacionalismo, a transformação de nações e países atrasados em nações e países modernos. Mas o comunismo, por todo o lado, foi um logro político, feito à custa duma profecia pseudo-científica e de métodos políticos bárbaros. A longo prazo, a sua falência era inevitável, como veio a acontecer.
A crítica da economia política feita pelo Marx não só não é rigorosa como constitui um equívoco pegado, uma falsidade duma ponta à outra, que só não assume os contornos de fraude porque o conhecimento se vai construindo através do pensamento crítico, e o Marx não teve como escapar ao contexto científico da sua época. Não se trata de contrapor aos conceitos do Marx outros conceitos; trata-se apenas de verificar que as premissas de que o Marx partiu não são plausíveis e que a sua argumentação é inválida. Começando pela explicação do lucro e acabando na “lei da queda tendencial da taxa de lucro”, passando pela famosa transformação dos valores em preços de produção, nada bate certo nas concepções marxistas. E se formos a falar no esboço de teoria da revolução social, então, é o descalabro teórico total. A melhor das tiradas é a famosa contradição entre o desenvolvimento das forças produtivas (o desenvolvimento de coisas, das técnicas, do trabalho e da capacidade produtiva que a sua conjugação proporciona) e as relações de produção (as relações desenvolvidas pelas pessoas entre si).
Não, de facto, o Marx nunca usou o termo profecia. Eu é que o utilizo para designar o projecto político idealista marxista. O seu “socialismo científico” pretendia demarcar-se de outras correntes socialistas precisamente pelo cunho científico que ele e o Engels lhe atribuíam. O socialismo marxista não se baseava na utopia, no desejo de que a realidade viesse a concretizar a velha aspiração igualitária dos trabalhadores assalariados, mas na certeza de que assim aconteceria, como previsão científica. Esse cunho de certeza é que transforma a simples utopia em profecia; não numa profecia proclamada por inspiração divina, mas proclamada pelo conhecimento da história passada, presente e futura de que o marxismo se arrogava. Ora a ciência marxista produziu apenas conhecimento falso; daí que a profecia marxista não ultrapasse o estádio do logro.
A economia actual, como a de todas as épocas, não poderia deixar de estar do lado das classes dominantes, por uma simples razão: são elas que dirigem as sociedades e as suas economias. A economia actual está mais caótica e desregulada porque, felizmente, milhões de trabalhadores assalariados submetidos ao capitalismo de estado designado por comunismo começam agora a usufruir do desenvolvimento capitalista dos seus países. Como nalguns sítios (de que o caso mais flagrante é a China), as burocracias comunistas mantêm estados totalitários, negando as mais elementares liberdades, a começar pelas liberdades sindicais, assiste-se a uma aliança nunca vista entre as burocracias comunistas e as burguesias nacionais e internacionais. Todos procuram enriquecer rapidamente, à custa dos mesmos desgraçados de sempre. Nunca o capitalismo encontrou melhores condições do que as que encontra desde há vinte anos na China. Esse é o último grande contributo do comunismo internacional; e é também a melhor forma de compreender o logro político que foi o comunismo.
JMC.
JMC
Quanto ao "comunismo", não tenho nada a acrescentar, até porque se trata de uma interpretação de Marx. Mas não pode negar o seu impacto real na história da humanidade. Se Marx fez uma previsão, essa não foi certamente o "comunismo" e muito menos a sua realização na Rússia.
Esquece que Marx era um filósofo dialéctico e, como tal, nunca poderia optar por um pensamento coisificado, de resto incompatível com a sua filosofia da práxis. Daí que onde vê "leis" deve interpretá-las como "tendências" concretas e não como fatalidades. Estas só existem na economia actual que, de ciência, nada tem, porque é uma técnica de adaptação usada, neste momento, para a acumulação mundial de capital.
Não pode afirmar que a teoria do valor/trabalho de Marx é falsa: precisa de apresentar argumentos e indicadores reais. A falsidade está na exploração e no enriquecimento indevido. Os ladrões são falsos, até porque falsificam resultados, usando muitos cálculos. Mas quem produz com o seu trabalho riqueza não é falso. O capital não vive sem explorar mão-de-obra, destruir a natureza, induzir falsas necessidades, manipular a saúde, corromper a sociedade, o Estado e a cultura, etc. Isto é falsidade no sentido dialéctico do termo.
A visão de Marz não tem nada de profético. Popper inventou o historicismo oracular e atribuiu-o a Marx, depois de ter sido "comunista".
Pensa que haveria Plano Marshall sem a suposta ou real ameaça da URSS? Leia O Capital, sobretudo as primeiras secções e diga sinceramente onde encontra outra obra que iguale a sua cientificidade e beleza conceptual!
Os americanos têm uma longa tradição marxista e as ciências sociais são herdeiras de Marx e a sua influência foi feita por essa via "domesticada". Sem Marx, não teria Max Webwe, Schumpeter..., sabe, não teria NADA! :)))
Papillon
Li o seu e-mail e gostei da sua justificação. Contudo, não creio que Nietzsche defenda o "pensamento do rebanho", mesmo que liderado por um grande homem, uma elite, como disse. Pelo contrário, ele insurge-se contra um tal pensamento, simplesmente porque não é um pensamento. Além disso, essa leitura aproxima Nietzsche do fascismo e sei que esse não é o seu pensamento. Clarifique-me, por favor! :)))
JMC
Não percebo como pode justificar esta frase cruel: "A economia actual, como a de todas as épocas, não poderia deixar de estar do lado das classes dominantes, por uma simples razão: são elas que dirigem as sociedades e as suas economias".
Estas classes são no mínimo competentes!? A avaliar pelos resultados económicos reais, não são competentes; são ladras! :(
A distinção que faz entre sindicalismo reformista e revolucionário não foi feita pelo próprio Marx. Marx defendeu o alargamento da "revolução burguesa" à classe operária. E até mesmo Lenine não defendeu o sindicalismo revolucionário, mas a luta política. E, com razão: os sindicatos corrompem-se, como se vê em Portugal, e são forças conservadoras... Não pode atribuir a Marx aquilo que ele não escreveu e, mesmo no que escreveu, é preciso saber ler em chave correcta, em função dos próprios critérios definidos por Marx. Outra leitura é ideológica...
Quanto ao seu anti-comunismo, respeito, até porque nunca fui "comunista". A China está onde está não por causa do comunismo mas devido a graves erros da política americana e ocidental. Sou um ocidentalista confesso. Marx nunca viu o colonialismo como uma preversão histórica. O "comunismo chinês" é "asiático" e pense aqui no conceito marxista de modo de produção asiático. Marx é a-comunista!!! :))))
Posso afirmar que a teoria do valor-trabalho de Marx é falsa; que a sua explicação para a origem do lucro é falsa; que a chamada "lei" da queda tendencial da taxa de lucro é falsa; que a famosa transformação dos valores em preços de produção é falsa, e por aí adiante. Posso afirmar porque o demonstrei, como poderá verificar pelos textos que mantenho em rede.
Por outro lado, apetece-me perguntar: em que mundo vive? Então não acha que as sociedades são dirigidas pelas classes sociais que conquistaram o domínio económico, político e ideológico?
A realidade não é cruel nem deixa de ser: é o que é. É claro que as classes dominadas sempre clamaram contra o domínio de que são alvo; e as que têm constituído as classes exploradas em cada época, mais do que as outras. É por isso que as lutas das classes pelos seus interesses são uma constante na história.
Já vai sendo tempo de serem abandonados os mitos do comunismo e do marxismo. Principalmente após a auto-derrocada do comunismo por todo o lado.
Em vez de me recomendar a leitura de O Capital, talvez não fosse má ideia seguir o conselho que me dá. Depois, poderemos discutir estas questões um pouco mais aprofundadamente, se tiver interesse.
JMC.
JMC
Já disse que o comunismo foi um conceito retomado por Marx para fazer justiça ao proletariado. E já agora leia também as páginas históricas da redução da jornada de trabalho de Marx e a obra de Engels, A Situação da Classe Trabalhadora em Inglaterra.
Não demonstrou a falsidade dessas teses de Marx, porque Marx não produziu uma economia para justificar a exploração capitalista. A obra de Marx toma sempre a "forma" de uma crítica da economia política" e, se acha que é falsa, faça uma experiência de pensamento: suspenda mentalmente a força de trabalho e os seus agentes humanos e divirta-se a ver os empresários a produzir "mais-valia"! Impossível... Até porque fala de luta de classes (conceito marxista) e de classes dominantes/dominadas (outro conceito marxista), no âmbito de uma concepção dialéctica da História (Hegel/Marx).
Não nego a eficácia da economia, mas daí a defender a sua "Verdade" vai uma distância impossível de transpor. A crítica de Marx não visa a adaptação, mas a mudança qualitativa. A sua linguagem, pelo menos usada aqui, não é científica, mas ideológica. Mas vou ler o seu post logo que tenha tempo e comento. Mas reveja o uso que faz da terminologia e sobretudo não viole o espírito da ciência. :)
Sim, alguma coisa que o Marx produziu não é lixo; o lixo reside no fundamental da sua obra.
Depois é interessante como você fala da ciência e da ideologia, sem saber do que fala ao nível da crítica da economia política.
Constatar a exploração dos trabalhadores assalariados não é qualquer mérito do Marx; não só os próprios o constataram há muito, como os economistas clássicos (o Smith e o Ricardo, para não falar de outros menores) também o constataram. O pretenso mérito do Marx foi ter engendrado para a ocorrência uma explicação científica, explicação que se revela totalmente falsa.
Seria mais profícuo que em vez de andar a falar da obra do Marx e do marxismo (seja adepto ou não, mas se não é imita bem!) fosse ler um pouco o Marx.
Apercebi-me que você fala de muita coisa nos seus posts, e volta e meia traz o Marx e o marxismo à baila. Far-lhe-ia bem estudar um pouco e não falar de ouvido, se é que pretende que lhe atribuam qualquer credibilidade.
JMC.
Concordo com a primeira parte, mas discordo da segunda, até porque sou "catedrático" na matéria.
Seja mais modesto nas opiniões que emite, porque usei "artilharia pesada" e não respondeu ou entendeu. Eu sou cientista de linha dura e percebo de matemática, sobretudo estatística.
Retire Marx das obras de mestres conhecidos e verifique o que fica. Mais: não use o positivismo contra Marx, sobretudo uma versão fraca. Pelo menos, recorra ao neopositivismo lógico.
Já lhe disse que o vou ler com prazer e não me inibo de criticar alguma tese de Marx. :))
Não sei se você é catedrático seja do que for ou se é cientista de linha dura ou de linha mole. Tanto se me dá que seja ou que pretenda sê-lo. O que já me apercebi pelos seus posts é que se pretende dar ares de alguma coisa.
Não é defeito, mas pelo que mostra é apenas pretensão. Terá de estudar e pensar, para dominar os assuntos, e não falar de ouvido ou pela boca de terceiros.
O que referiu em relação à política, à ideologia, etc. foram meras generalidades, sem sentido a maior parte delas. E em relação ao Marx falou do acessório, que é sobre o que ainda hoje ele é citado. Por minha parte não tenho qualquer interesse em discutir generalidades sem sentido.
Mas é claro que sou aqui um intruso que se atreveu a comentar um seu post por se ter apercebido das frequentes referências que faz ao Marx sem saber bem do que fala.
Se lhe interessar discutir este mito científico do marxismo, esteja à vontade. Poderemos fazê-lo aqui ou no meu espaço. Mas terá de estudar um pouco, para que a discussão possa ter algum sentido.
Não se amofine com qualquer tom mais duro das minhas palavras.
JMC.
Não, é-me indiferente o tom!
Também não entendo bem onde quer chegar. Agarra-se ao "científico" mas não respondeu às questões que lhe coloquei. Vive num mundo passado e, pelo que vejo, não se mostra a debater Marx sem preconceito prévio e deslocado. ou rejeita Marx em bloco ou não dá ficar com uns pedaços e misturá-los. Trabalho com conceitos e não com mitos ou quimeras! Talvez fosse melhor deixar Marx em paz, porque não entendeu a essência da dialéctica e não conhece a obra completa de Marx. Esqueça esse conceito fraco de ciência, porque Marx, se o leu, tem uma epistemologia, cujos traços são apresentados no Capital. Não sabe o que significa ideologia e não foi capaz de entender que o derivei do fetichismo da mercadoria. Isto que faço é ciência e filosofia.
Passe bem! :)
As suas "generalidades" fizeram-me rir com vontade... Mas não deve estar à espera que dê pontapés nos concretos!
(risosssssssss)
:))))
As minhas GENERALIDADES são concreto-de-conhecimento, portanto, de conhecimento.
(rissssssssossssssss) :)))
De facto, o seu argumento das generalidades é mesmo de aprendiz e muito infantil. Mas não fique chateado, porque sou um prof com muita paciência. Quais são as teorias da ideologia que conhece???
:(((
Estamos então entendidos. Ecletismo e baralhação não lhe faltam. Cuidado com esses males para a sua ciência.
Presunção e água benta, cada um toma a que quer...
Passe bem, também.
JMC.
Baralhação! Hummm... Depende do diagnóstico. Depois do diagnóstico, podemos pensar no tratamento. Consulte o DSM-IV-R...
Irei ler o seu post com prazer. Estamos entendidos. :)
JMC
Deixei-lhe um brevíssimo comentário. Não vou descer a esse nível de anticomunismo primário!
Pensei que ia apresentar uma teoria dos preços e detecto uma versão muito lamentável de Marx. Leia Samuelson ou outro economista contemporâneo. Sempre é mais saudável! Lamento! :(((
Diacho...que isto esteve grave...:))
Não tinhamos tido por aqui uma conversa sobre o potencial da democracia no espaço net ?!
Onde foi buscar este exemplo prático ?...:)
Também tinhamos conversado se bem recordo sobre a necessária separação de águas entre as ideias e as pessoas que as exprimem, não era ?.. .:)
Enfim, Francisco, invejo-o !..:)
Além disso entendi a questão da Papillon de forma diferente da sua...mas disso falaremos depois...
Oi Mauel Rocha
Estou exausto de tanto polemizar. Sim, pessoas e ideias são coisas diferentes: as ideias são criticadas e derrubadas; as pessoas não. Ninguém morre por causa das suas ideias serem refutadas. Pelo menos, ainda é assim em democracia. :))
Estive a ler este debate e verifiquei novamente como o meu interlocutor não sabe interpretar e dialogar, sem insultar ou dizer disparates. Triste figura a sua... :)
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