Louis Althusser será sempre conhecido pela sua tentativa de elaborar uma teoria geral da ideologia. Para combater o poder metabolicamente desejado da ignorância, deixo aqui um texto da sua autoria, onde apresenta a sua concepção inicial de ideologia, posteriormente modificada: «Ao nascer (os homens) encontram-se perante uma representação já feita, existente na sociedade, tal como já encontram estabelecidas as relações políticas e as relações de produção dentro das quais deverão viver. Do mesmo modo que nascem «animais económicos» e «animais políticos», poderíamos dizer que os homens nascem «animais ideológicos». «Tudo se passa como se os homens tivessem necessidade, para poder existir como seres sociais conscientes e activos na sociedade que condiciona e determina toda a sua existência, de dispor de uma certa «representação» do mundo em que vivem, representação essa que pode permanecer em grande parte inconsciente ou ser, pelo contrário, mais ou menos consciente e pensada. «A ideologia surge assim como uma certa «representação do mundo» que une os homens às suas condições de existência e une os homens entre si, na divisão das suas tarefas e na igualdade ou desigualdade do seu destino [...]. «As representações da ideologia acompanham, portanto, consciente ou inconscientemente, todos os actos dos indivíduos, toda a sua actividade e todas as suas relações. Se se representar a sociedade, segundo a metáfora clássica de Marx, por um edifício no qual uma supraestrutura jurídico-política assenta na infraestrutura da base, isto é, nos fundamentos económicos, deve dar-se à ideologia um lugar muito especial. Para compreender o seu tipo de eficácia torna-se necessário situá-la na supraestrutura e atribuir-lhe uma «relativa autonomia» em relação ao direito, ao Estado e à base económica que a determina «em última instância»; mas, ao mesmo tempo, para compreender a sua forma de presença mais geral, é necessário considerar que a ideologia se infiltra em todas as partes do edifício e é como que uma espécie de cimento de natureza especial que assegura a coesão e o ajustamento dos homens aos seus papéis, às suas funções e às suas relações sociais. «De facto, a ideologia impregna todas as actividades do homem, entre elas a prática económica e a prática política; está presente nas atitudes perante o trabalho, perante os agentes da produção, perante as obrigações da produção; encontra-se nas atitudes e juízos políticos: o cinismo, a boa consciência, a resignação ou a rebeldia, etc.; governa a conduta familiar dos indivíduos e o seu comportamento para com os homens, a sua atitude perante a natureza, os seus juízos sobre o «sentido da vida» em geral e os seus diferentes cultos (Deus, o príncipe, o Estado, etc.). «A ideologia está a tal ponto presente nos actos e nos gestos dos indivíduos que é indistinguível da sua «experiência vivida» e por isso toda a descrição imediata do «vivido» se encontra profundamente marcada pelos conteúdos da «evidência» ideológica. Quando um indivíduo (ou o filósofo empirista) julga estar perante uma percepção pura e nua da própria realidade, perante uma prática pura, perante o «vivido», o «concreto», encontra-se, na realidade, frente a uma percepção ou a uma prática impuras, marcadas pelas estruturas invisíveis da ideologia. Mas como não se apercebe da ideologia considera a sua percepção das coisas e do mundo como a percepção das «próprias coisas», sem se dar conta de que esta percepção se lhe apresenta sob o véu de formas insuspeitas de ideologia, se encontra, de facto, marcada pela estrutura invisível das formas ideológicas». (Louis Althusser,1967) J Francisco Saraiva de Sousa
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