quarta-feira, 12 de maio de 2010

Política: Sofrimento e Sentido

«O destino transformou esse casaco numa pesada estrutura de aço. Ao mesmo tempo que se assistia à transformação e influência exercidas pelo ascetismo sobre o mundo, estes bens superficiais adquiriram um poder crescente e depois irresistível, sobre os homens, como nunca antes aconteceu na história. Hoje, o seu espírito escapou-se dessa estrutura, quem sabe se para sempre. O capitalismo triunfante, após ter adquirido bases mecânicas, já não precisa desse apoio. E a boa disposição do iluminismo, o seu sorridente herdeiro, também esmoreceu. A ideia do "dever profissional" ronda pela nossa vida como um fantasma dos conteúdos religiosos do passado. Nos casos em que a "realização do dever profissional" não pode ser directamente ligada aos valores espirituais e culturais mais elevados - ou, ao contrário, quando tem de ser compreendida subjectivamente como uma coacção económica -, o indivíduo de hoje acaba por renunciar a qualquer tentativa de justificá-la. A procura de riqueza, no lugar de maior desenvolvimento, os Estados Unidos, tende, despida do seu sentido ético-religioso, a associar-se a paixões competitivas, que lhe conferem não raro o carácter de desporto. Ainda ninguém sabe quem habitará essa estrutura vazia no futuro e se, ao cabo desse desenvolvimento brutal, haverá novas profecias ou um renascimento vigoroso de antigos pensamentos e ideais. Ou se, não se verificando nenhum desses dois casos, tudo desembocará numa petrificação mecânica, corada por uma espécie de auto-afirmação convulsiva. Nesse caso, para os "últimos homens" dessa fase da civilização, tornar-se-ão verdade as seguintes palavras: "especialistas sem espírito, folgazões sem coração: estes nadas pensam ter chegado a um estádio da humanidade nunca antes atingido». (Max Weber)
A existência de Portugal é um crime, no sentido que Guerra Junqueiro lhe atribuiu. O povo português é um bando de criminosos e as suas classes dirigentes constituem redes de crime organizado, pelo menos desde o 25 de Abril. A História de Portugal demonstra facilmente o carácter criminoso dos portugueses, ao mesmo tempo que o associa a um défice cognitivo estrutural e genético: Portugal não realizou atempadamente a sua modernização por causa do retardamento mental das suas classes dirigentes de todos os tempos. O atraso estrutural e histórico de Portugal deve-se à corrupção, à insensibilidade social e cultural, à perda de experiência, à atrofia dos órgãos mentais e cognitivos e à incompetência das suas classes dirigentes. Considero Portugal uma experiência abortada ou, se preferirem, um caso irremediavelmente perdido, e, por isso, prefiro pensar o destino do Ocidente. Não dá gozo pensar para um público de atrasados mentais: pensar Portugal é perder tempo, porque Portugal está condenado a ser um país atrasado, a menos que se elimine um sector significativo da população portuguesa: as elites do poder. Todos os grandes pensadores nacionais sabiam que os portugueses são visceralmente avessos à racionalidade: a actual escola portuguesa é uma imensa fábrica de produção de atrasados mentais diplomados, arrogantes e perversos.
Ora, a modernização é precisamente racionalização, como demonstrou Max Weber, e é o modelo de racionalização que conduziu à globalização e à actual crise económica que pretendo questionar e avaliar em função de dois cálculos: o cálculo do sofrimento e o cálculo do sentido, que devem ser tidos em conta nas análises económicas de custos e benefícios. Freud mostrou que o processo civilizacional implica repressão e, muito antes dele, Jean-Jacques Rousseau já tinha censurado a civilização, fazendo a defesa do bom-selvagem: a civilização e a humanização têm efectivamente elevados custos humanos, não só em termos de privação, de sofrimento físico e de trabalho forçado, mas também em termos de saúde mental. A vida dos povos selvagens é mais agradável e saudável do que a vida dos povos civilizados: a modernização como ocidentalização espalhou a desgraça entre os povos selvagens, roubando-lhes a sua felicidade e a sua identidade cultural. A política humanista deve obedecer a dois imperativos morais: reduzir os custos humanos das decisões políticas (cálculo do sofrimento) e garantir o direito dos seres humanos de viver num mundo dotado de sentido (cálculo do sentido). As decisões políticas a ser tomadas para fazer face à actual crise económica devem ser enquadradas e avaliadas no âmbito desta ética política: os decisores políticos não podem nem devem sacrificar os seres humanos mais humildes e desfavorecidos para corrigir os erros políticos cometidos por gestores económicos e financeiros corruptos.
A nossa grande narrativa da modernidade precisa ser substancialmente revista e corrigida à luz da experiência abortada da globalização. O drama da Filosofia pode ser resumido em duas expressões que reflectem o processo de regressão mental e cognitiva em curso: escassez de filósofos de qualidade, capazes de fazer a síntese de conhecimentos à luz da experiência actual, e ausência de um público inteligente e culto. No nosso tempo indigente, a reformulação da teoria da modernização exige a ruptura total como o mito do crescimento, tanto na versão neoliberal como na versão comunista: a nossa tarefa é descobrir um novo paradigma de desenvolvimento que saiba combater a fome e o terror, sem prometer a abundância ou o paraíso no futuro. A teoria da modernidade é a teoria do desenvolvimento capitalista. Embora tenha alcançado uma produtividade sem precedentes e gerado instituições que favorecem a liberdade individual, o desenvolvimento capitalista impõe elevados custos humanos. (Aplico aqui uma eco-redução: não levo em conta o impacto nefasto do desenvolvimento capitalista sobre o ambiente e a saúde da Terra.) (:::)
(Em construção) J Francisco Saraiva de Sousa

6 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Meu Deus, meu Deus... Estou assustado com os meus pensamentos. Do marxismo conservo a dialéctica e nutro um ódio pelo neoliberalismo. A construção de uma nova filosofia debate-se com um pensamento terrível: o homem que recusa ser humano. Como oferecer uma filosofia a este monstro? Este pensamento medonho gera angústia e mergulha-me na depressão cognitiva. :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

De modo paradoxal, somos confrontados com uma falsa consciência feliz: o capitalismo colonizou completamente a consciência humana. A verdadeira resistência situa-se na Esquerda, mesmo que ande desorientada.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A grande verdade é que os portugueses não têm vida psicológica. Infelizmente, nasceram zombies.:(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

De facto, meditando na frase anterior, sou forçado a reforçar a sua verdade - em termos gerais. Eu sou português mas não sou zombie: há excepções à luso-norma fatal. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem, se vivesse num país de cultura, já tinha recebido ajuda externa, porque estou a tentar melhorar o modelo de desenvolvimento sem o abandonar devido ao seu elevado custo humano, cultural e ambiental.

Ya, os portugueses devem seguir o Papa na busca da verdade e a verdade é que eles são a mentira personificada.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Enfim, parece haver aporia mas não há: o progresso levou à regressão total, convertendo os humanos em zombies. O pensamento tornou-se um privilégio de muitos poucos: uma alienação abstracta, no sentido de já não terem agentes humanos capazes de decifrar as mensagens na garrafa.