sábado, 20 de julho de 2013

Fragmentos facebookianos

Experiência do Túnel
Hoje resolvi explorar o tema da morte e das experiências de quase morte no Facebook para afastar algumas criaturas indesejáveis. Eis alguns fragmentos de lucidez:

Nada é mais eficaz para afastar pessoas indesejáveis do que os momentos de lucidez: a maioria tende a ser zombie e foge do pensamento como o diabo da cruz. Querem rir mas rir de quê? Da sua vida vazia e idiota?

O Facebook não é saudável para pessoas que sofram determinadas perturbações mentais, como por exemplo a depressão: a identidade virtual adoptada pode assumir uma dimensão egocêntrica exagerada que não corresponde ao perfil da pessoa na vida real. O resultado desta clivagem é um perfil absolutamente tirânico e intolerante. A vida online é alienação.

Há uma hipótese metafísica que merece ser pensada para clarificar a questão da morte: Conceber Deus como memória infinita que alienou a sua majestade quando criou o mundo. Nesta perspectiva, a nossa identidade individual não morre, dado participar da memória infinita de Deus. Porém, coloca-se outro problema: conservamos a nossa individualidade ou submergimos na memória divina? Esta hipótese é sedutora porque livra Deus da responsabilidade pelo mal do mundo: Deus-memória infinita é "impotente"; ele aguarda que o homem o resgate.

Por que sou tão irónico? Herdei a ironia de Sócrates, provavelmente. Porém, tenho outra justificação: a ironia é o meu modo de ser entre os mortais. E por vezes a minha ironia tem uma tonalidade agressiva: ao partilhar a hipótese metafísica - Deus-memória-infinita - com os moçambicanos, fui lúcido confrontando-os com a inutilidade de uma memória colonial destruída. A ironia dissolve mundos e cria outros mundos mais saudáveis. Gosto de rir dos homens e da sua caducidade!

Amo almas metafísicas e, se todas as almas que conheço estivessem a salvo da morte, não desejaria coabitar com elas noutra dimensão: Que inferno de eternidade seria "viver" com essas almas fragmentadas e idiotas!

Vou usar outra imagem para retratar a nossa existência virtual: o nosso perfil é por vezes possuído por estranhas criaturas que na vida real exorcizaríamos. Este fenómeno de possessão virtual deve-se talvez à fome do nosso ego e corremos o risco de explodir de tanto inchar.

Igor Sousa

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Penrose: Mecânica Quântica e Consciência

Roger Penrose
Roger Penrose é um físico matemático que escreveu duas obras filosóficas, onde expõe a sua teoria da mente. Mas a sua teoria da mente não está completa: o seu alvo principal é a teoria da inteligência artificial que Penrose deseja destronar. Para compreender a sua teoria da mente, convém definir a posição teórica de Penrose no quadro da física: Penrose acredita que há uma teoria física fundamental capaz de unificar a mecânica quântica e a teoria da relatividade geral. Penrose e os seus alunos tentam produzir essa teoria fundamental a partir da teoria do twistor, segundo a qual os processos são fundamentais e as coisas que existem são secundárias: as entidades fundamentais do mundo não são os acontecimentos do espaço e do tempo mas os processos em virtude dos quais existem as coisas. Ora, nesta perspectiva, a mecânica quântica tem de ser modificada para se acomodar aos efeitos da gravidade, e não o inverso, como defende a maioria dos físicos que acreditam que a mecânica quântica tal como existe é essencialmente correcta, modificando a relatividade geral para algo como a gravidade supersimétrica ou a teoria das cordas. O cepticismo de Penrose em relação à mecânica quântica leva-o a navegar contra a corrente predominante na física.

A teoria da mente de Penrose - tal como é exposta no seu livro Shadows of the Mind, de resto uma continuação do livro anterior The Emperor's New Mind - compreende duas partes: a primeira tenta mostrar que o pensamento consciente é algo diferente da computação; a segunda tenta investigar o que se passa. Ou melhor, na primeira parte, Penrose utiliza uma variação da famosa prova de Gödel sobre a incompletude dos sistemas matemáticos para tentar provar que nós não somos computadores e que não podemos ser simulados em computadores. Ora, com o uso desta prova, Penrose tenta mostrar que a teoria da inteligência artificial - tanto a sua versão forte como a sua versão fraca - é falsa. Afinal, foi a visualização do programa televisivo Horizon, em especial a participação de Martin Minsky, que levou Penrose a escrever os seus livros, para mostrar que há um ponto de vista científico alternativo ao paradigma da computação. Na segunda parte, Penrose expõe extensamente o teorema da incompletude de Gödel e a mecânica quântica, destacando as variáveis ocultas, o teorema de Bell e o paradoxo de Einstein-Podolsky-Rosen, para demonstrar como uma teoria quântica do cérebro poderia explicar a consciência de uma forma que a física clássica não seria - nem é - capaz. Para Penrose, não somos capazes de explicar a consciência - nas suas relações com o cérebro e o computador - sem termos previamente compreendido as implicações do teorema de Gödel e da mecânica quântica para o estudo científico da mente. A sua noção de que a consciência está de algum modo ligada à gravidade quântica, o que equivale à incorporação da gravitação da relatividade geral de Einstein na teoria de campo quântico, escandalizou os seus colegas da física das partículas. Sem uma nova física - entenda-se: uma mecânica quântica não-computacional - não podemos compreender a consciência humana, cuja característica fundamental é a sua não-computabilidade. A tese fundamental de Penrose afirma que o cérebro consciente não é computacional: o cérebro não é exactamente um computador quântico. Para explicar esta ideia seminal, vou enunciar teses filosóficas.

Tese 1: A mecânica quântica tal como existe não é exacta. (:::)

Tese 2: O cérebro consciente não é um computador, nem sequer um computador quântico, tal como esta ideia foi definida por David Deutsch ou Richard Feynman. (:::)

Tese 3: O nível mais profundo onde devemos descobrir os efeitos quânticos é muito provavelmente o sistema de microtúbulos situado no interior dos neurónios. (A doença de Alzheimer pode ajudar a compreender esta estranha tese avançada por Stuart Hameroff.) (:::)

Em construção. J Francisco Saraiva de Sousa 

terça-feira, 9 de julho de 2013

Mia Couto é reaccionário!


Recebe o Prémio Camões, alegando que se trata de uma "coisa-negócio luso-brasileira": Que falta de respeito para com a língua portuguesa! Tanto "miou" na infância - daí o nome "Mia" - que acabou por desaprender a língua(gem) dos seres humanos. Quando se deseja modificar a natureza de um povo, neste caso do povo moçambicano, não podemos usar a sua linguagem: o conhecimento popular é, por natureza, retrógrado. Um povo que queira conquistar o futuro sem deixar a história passar ao lado deve produzir uma nova linguagem: a escrita de Mia Couto degrada a língua portuguesa, bloqueando o futuro aos seus utentes. Sendo biólogo, Mia Couto tem uma concepção retrógrada da biologia, ao reduzi-la à história-narrativa da vida. Mia Couto que é tão avesso ao colonialismo acaba por render-se à sua mais poderosa arma, o racismo: o discurso dos atractores - a perspectiva do desenvolvimento - é-lhe estranho.

sábado, 6 de julho de 2013

A Vertigem da Relatividade

Jardins do Palácio de Cristal, Porto
Anuncio um texto que pretendo escrever se o calor o permitir. Já critiquei diversas vezes o relativismo, mas desta vez pretendo fazê-lo numa perspectiva mais ampla que envolva uma crítica severa da filosofia anglo-saxónica, esse vazio terrível de pensamento, que ganha terreno nas universidades portuguesas, assumido por figuras cognitivamente reduzidas que, simulando o uso de argumentos lógicos, improvisam disparates de conhecimento vulgar da vida quotidiana. Aliás, a crítica do relativismo deve abranger a demolição do conhecimento à mão da vida quotidiana: a retomada do mundo da vida tem sido fatal para a Filosofia. A Gradiva é a editora portuguesa que mais tem contribuído para a difusão de livros medíocres de filosofia anglo-saxónica: as traduções são medíocres porque escritas num português feio, próprio de uma determinada escola profundamente provinciana e saloia, a herdeira de um Portugal Velho que urge superar. Vou tentar criar um vocabulário próprio para demolir o relativismo: a crítica radical do império relativista contemporâneo, repleto de ilusões, uma das quais afirma que o homem está cada vez mais inteligente, exige uma nova linguagem - e talvez uma linguagem mais técnica. Não convém escrever livros de divulgação filosófica: eles degradam a filosofia no seu momento mais sério, o de dizer a verdade. O relativismo predominante anda de mãos dadas com a globalização: o fim das grandes narrativas lançou o mundo num estado de paralisia mental e cognitiva. A cultura superior que é ocidental está em estado vegetativo: o meu desejo é fazê-la regressar à vida. Como é evidente, a crítica do relativismo implica a demolição de muitos mitos aparentemente simpáticos, um dos quais é o estado de paz mundial: um homem mais inteligente e mais pacífico - é algo que soa mal quando olhamos para a sociedade americana. A filosofia anglo-saxónica é altamente partidária: ela justifica o status quo americano, a globalização do capitalismo e a perpetuação da miséria e do sofrimento, ao mesmo tempo que abre as portas às tradições dogmáticas mundiais.

Os alunos que estudam Filosofia devem protestar contra o ensino de filosofia anglo-saxónica nas universidades: a chamada filosofia analítica - de resto, não dominada por esses professores vigaristas - tem fortes afinidades com a escolástica medieval e com a vulgata soviética; todas estas tendências de pensamento destacam a importância da lógica no seio da filosofia, uns para demonstrar a existência de Deus, outros para eliminar as questões metafísicas e gerar posições filosóficas que negam o sentido dessas questões: Qual é a finalidade da minha vida?, Por que tenho de morrer?, Donde venho e para onde vou?, enfim, Quem sou eu? Nós não devemos receber lições de homens - refiro-me a alguns filósofos analíticos estrangeiros - que colocam a sua inteligência ao serviço da lógica imanente do capitalismo. A Filosofia tem uma missão: projectar a vida justa. É fundamental salvaguardar o pensamento da colonização por parte do sistema vigente. Explicar "logicamente" a subjugação do homem concreto ao sistema vigente, como se não houvesse outras alternativas, é algo que não faz parte do ADN da Filosofia: a libertação da lógica da metafísica - lógica sem metafísica - e a sua conversão em instrumento formal fazem parte integrante do processo de formalização da razão que acompanha a lógica de desenvolvimento capitalista. A lógica usada pela filosofia analítica já não é uma disciplina filosófica: ela é uma técnica de adaptação ideológica e social que se aprende nas universidades. A expressão "filosofia anglo-saxónica" é uma contradição nos termos: não há verdadeiramente filosofia anglo-saxónica; a Filosofia é europeia. Ao editar livros de filósofos anglo-saxónicos, aliás os piores, a Editora Gradiva está a prestar um mau serviço à cultura filosófica portuguesa, ao mesmo tempo que funciona como aparelho ideológico de Estado colocado atempadamente ao serviço do projecto neoliberal do governo de Passos Coelho. Ora, os portugueses já sabem o que isso significa: empobrecimento, liquidação da democracia e destruição do Estado Social.

J Francisco Saraiva de Sousa

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Welcome to PORTO: Terrace Lounge



Anotações sobre Humor

Os filósofos têm elaborado diversas teorias sobre o fenómeno do humor, das quais se destacam as teorias de Freud, Bergson e Plessner. Como já analisei a teoria de Plessner, vou concentrar-me nas interpretações de Freud e de Bergson. Freud e Bergson interpretam o humor como a apreensão de uma discrepância fundamental entre as exigências do superego e da libido, no caso de Freud, e entre o organismo vivo e o mundo mecânico, no caso de Bergson. Aquilo que me interessa nestas duas teorias do humor é o seu aspecto comum: ambas encaram o cómico como uma discrepância ou incongruência: «Uma situação é invariavelmente cómica quando pertence ao mesmo tempo a duas séries de acontecimentos inteiramente independentes e é capaz de ser interpretada em dois sentidos completamente diferentes ao mesmo tempo» (Bergson). Dado ser um conceito nuclear da antropologia filosófica, interpreto o humor como fenómeno especificamente humano, o que me permite enunciar diversas novas teses filosóficas que restringem a qualidade cómica às situações humanas. Eis as teses que proponho:

Tese 1: O Homem é o único ser capaz de se rir - e chorar! - de si mesmo, dos outros e de certas situações. (Daqui decorre que a qualidade cómica se refere sempre a situações humanas: os animais só são cómicos quando lhes atribuímos características humanas.)

Tese 2: A discrepância constitui o ingrediente fundamental de todas as piadas. Existem diversos tipos de discrepância - as incongruências propostas por Freud e Bergson - mas todos eles nos reconduzem à discrepância fundamental entre o homem e o cosmos. É esta discrepância antropocosmológica fundamental que faz do cómico um fenómeno especificamente humano. Daqui se segue nova tese.

Tese 3: O cómico reflecte o aprisionamento do espírito humano no mundo, sobretudo no mundo abandonado pelos deuses: «A alma é um estranho na terra» (Georg Trakl). Esta tese já é conhecida desde a Antiguidade Clássica. A concepção de ironia como a mais alta liberdade possível do homem num mundo sem Deus - exposta pelo Jovem-Lukács - relaciona-se com esta tese.

Tese 4: A distinção entre tragédia e comédia esquece que ambas são comentários sobre a finitude radical do homem: a noção existencial de homem como náufrago ou ser-sem-abrigo coaduna-se com esta tese filosófica.

Tese 5: Ao aceitarmos a última tese, somos forçados a encarar o cómico como uma dimensão objectiva da realidade humana: o humor mais não é do que o reconhecimento da cómica discrepância da condição humana.

Estas teses são suficientes para elaborar uma nova teoria filosófica do humor. Poderia acrescentar outras teses, talvez para mostrar que é muito difícil relativizar o humor, mas prefiro concluir enunciando uma tese que clarifica a teoria que tenho em mente.

Tese 6: A negação da metafísica conduziu ao triunfo da trivialidade: o humor que se faz actualmente perdeu a graça. Fechado em si mesmo e neste mundo intra-empírico, o homem tornou-se incapaz de encontrar o seu próprio caminho de fuga. O mundo trivial em que vivemos deixou de ser engraçado. A perda de graça é proporcional à invasão do mundo pelo homem: o cansaço da humanidade de Nietzsche pode ser compreendido à luz desta nova perspectiva. 

Anexo. Um colega brasileiro criticou o meu recurso a uma teoria da natureza humana, acusando-me de ser liberal em vez de marxista. Os rótulos não me incomodam: aqui direi apenas que o conceito de natureza humana me permite compreender o homem do passado mais distante ou do presente mais próximo. Afinal, o homem de todos os tempos ri e chora. Ora, este facto fundamental mostra que há uma natureza humana fundamental que nos une a todos e que nos une aos nossos antepassados. Além disso, uma tal teoria veda-me o caminho dos disparates políticos. A Filosofia é um empreendimento teórico sério.

J Francisco Saraiva de Sousa 

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Notas sobre a História de Moçambique

Estátua do Porto
Não encaro o colonialismo como um fenómeno civilizacional nefasto: se não fosse o colonialismo português lá onde construímos cidades lindas - como Lourenço Marques e Luanda - haveria hoje palhotas. As pessoas africanas não saberiam ler e escrever, nem sequer teriam história. Sim, convém lembrar que nem os índios brasileiros nem os africanos tinham inventado a escrita: eram - e, segundo Ryszard Kapuscinski, ainda são - povos tribais e selvagens. Um exemplo de tribalismo persistente: Mandela já está morto: O que é desagradável é a luta dentro da família. Um dos netos é chefe tribal e sacou os três cadáveres dos filhos de Mandela para os enterrar no território da sua tribo. Depois chega a polícia a mando de outro familiar, invade a propriedade, desenterra os cadáveres e leva-os... Enfim, a África do Sul ainda é território civilizado?

Já escrevi muito sobre Moçambique e não tenho vontade de regressar a esse tema. Porém, dado o predomínio de ideologias anti-ocidentais nefastas, sou forçado a tecer algumas considerações sobre o assunto. Apesar da existência de abundantes arquivos, os historiadores portugueses ainda não escreveram uma História (honesta) do Colonialismo Português ou uma História de Moçambique ou de Angola. Geralmente, no caso de Moçambique referem-se estas obras, nenhuma das quais escrita por um português:

1. FRENTE DE LIBERTAÇÃO DE MOÇAMBIQUE. História de Moçambique. Porto, Afrontamento, 1971.
2. HEDGES, David (coord.). História de Moçambique: Moçambique no auge do colonialismo 1930-1961. Vol.2, 2.ª edição, Maputo, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, 1999.
3. NEWITT, Malyn. História de Moçambique. Mem-Martins, Publicações Europa-América, 1997.
4. PÉLISSIER, René. História de Moçambique: formação e oposição: 1854-1918. 2 vols., Lisboa, Editorial Estampa, 1987-1988
5. SERRA, Carlos (coord.). História de Moçambique: Parte I - Primeiras Sociedades sedentárias e impacto dos mercadores, 200/300- 1885; Parte II - Agressão imperialista, 1886-1930. Vol. 1, 2.ª edição, Maputo, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, 2000.
6. SOUTHERN, Paul. Portugal: The Scramble for Africa. Bromley, Galago Books, 2010.

A primeira e a quinta obras (Carlos Serra e Companhia) são extremamente sectárias: o marxismo usado pelos autores como grelha de análise histórica viola frontalmente a letra e o espírito dos escritos de Marx. Os autores deviam meditar os textos onde Marx trata da questão colonial: Marx nunca isolou o colonialismo da teoria do desenvolvimento capitalista para aplaudir uma teoria da luta entre raças. Há racismo nas obras referidas e, de facto, nós portugueses devemos aceitar o desafio lançado por estes pseudo-historiadores e confrontá-los com os seus próprios fantasmas raciais e, no caso dos outros autores, com as formas de colonização dos seus países. A eleição de Obama despertou nalguns desses autores o desejo de liquidar o "branco" e o Ocidente. Outros ficam desiludidos com os brasileiros pelo facto de não rejeitarem a herança ocidental. E, geralmente, são benevolentes perante as investidas do Islão. Descrevem - exagerando - os supostos crimes de ódio cometidos pelos portugueses, mas omitem a violência exercida pelos negros sobre os brancos. Estes dados são suficientes para denunciar a ideologia de rancor racial que está por detrás destas histórias, para já não falar do incitamento à violência racial. Angola e Moçambique, bem como outras ex-colónias portuguesas, caminharam para a democracia; no entanto, os partidos políticos ainda são designados como movimentos de libertação dos respectivos povos. É como se ainda vivessem sob o colonialismo português: a verdade é que eles expropriaram os portugueses julgando que a riqueza se reproduz por geração espontânea e pagaram o preço por esta infantilidade mágica: o recuo civilizacional e a destruição das cidades e do tecido produtivo. Hoje são os negros que exploram e oprimem a população negra. (Já era assim antes da chegada dos portugueses ou mesmo durante o período colonial.) Marx dizia que o capital não tinha pátria e a globalização confirma isso. Hoje podemos acrescentar que o capital não tem raça: os historiadores moçambicanos tratam os árabes com benevolência, ao mesmo tempo que tecem mentiras grosseiras sobre a "agressão imperialista", esquecendo que o capital não tem pátria e raça. (O imperialismo é um fenómeno de territorialização do capital.) Os historiadores ligados ao mundo anglo-saxónico não deviam confundir o imperialismo inglês com o colonialismo português: afinal, o apartheid é uma invenção anglo-saxónica. Meus amigos: Não há raças inocentes na história; há apenas raças, umas mais primitivas, outras mais desenvolvidas, que ocupam áreas culturais diferentes. E o cristianismo - apesar dos seus erros - ajudou a suavizar e a controlar muitos impulsos criminosos. Nós intelectuais devemos fazer todos os esforços para dizer a verdade: um intelectual mentiroso é um oxímoro e um intelectual terrorista é um cérebro patológico que deseja incendiar o mundo. O seu relativismo histórico anda de mãos dadas com o terrorismo. Os africanos já deviam saber que "intelectuais" deste calibre ajudaram a afundar e a empobrecer os seus países. Sem cérebros sadios não há desenvolvimento e paz! E sobretudo isto: os vossos inimigos - como os de todos os povos do mundo - são internos. Sejam objectivos: não culpem os outros pelos vossos pecados. (A Rússia optou pela colonização continental, tal como outros países da Europa Central, e como URSS teve a oportunidade de conquistar territórios distantes. Hoje é a China que sonha com o imperalismo colonizador. Quando referem o papel do cristianismo na colonização, os autores anglófonos aproveitam a ocasião para fazer a sua propaganda protestante, enquanto os moçambicanos falam de colonização mental sem usar o mesmo conceito para designar a acção do Islão. Mas há uma diferença entre Ocidente e Islão: o Ocidente despertou em vós um sonho social de emancipação, noção estranha ao Islão. Sim, até o marxismo é um fenómeno especificamente ocidental: ele está inscrito no genoma grego.)

Anexo: Carlos Serra diz este disparate sobre o "belo": «O belo é um fenómeno misterioso. Todavia, há sempre quem defenda a sua universalidade no sentido de que em qualquer parte do mundo sempre houve e haverá quem goste do belo, sendo o belo havido como uma substância que nasce conosco e que atinge especial profundidade em certos de nós. Porém, a concepção do belo requer condições sociais propícias ao seu nascimento, à sua reprodução e, particularmente, ao seu aprofundamento. Por outro lado, a unidade do belo está em sua diversidade social e nacional. A concepção do belo é social, não natural.» O que podemos dizer sobre isto? Merda que suja a estética e viola a biologia! Vejam como entra em acção o relativismo (sob a forma de construtivismo social delirante), o nacionalismo e a luta racial. O tema de fundo só pode ser os rostos africanos. Além disso, há aqui um paradoxo: a condenação da universalidade - atribuída ao Ocidente - e a afirmação da "unidade do belo na sua diversidade social e nacional" (étnica). E facto curioso: o autor esquece que foi o discurso universal que abriu as portas à emancipação. Mais: o que é o nascimento do belo?, a reprodução do belo?, enfim o aprofundamento do belo? Noções estranhas - cosméticas? - a qualquer estética! Afinal, o belo nunca foi tratado como uma "substância": não sei donde surgiu esta ideia peregrina. Belo e gosto... aqui há gato! Carlos Serra, comunista confesso, converteu o seu relativismo sociológico em irracionalismo.

E o que diz Carlos Serra sobre a biografia? Isto: «A biografia é um dos mais fascinantes e respeitados momentos da vida social. Dá às pessoas a crença de que o biografado contém nele a capacidade fantástica de mudar a vida e as relações de outrém. Na biografia o biografado é substancializado, magicamente tornado imune às relações sociais sem as quais, porém, não pode ser ele; é feito totalidade, unificação única, centro absoluto de um determinado mundo, o "ele era assim" do senso comum.» Até compreendo o que ele pretende dizer (a relevância das relações sociais), mas não posso estar de acordo com a condenação da biografia e do papel do indivíduo na história. Com efeito, o indivíduo não é apenas sociologia incorporada; é também biologia. Começo a crer que Carlos Serra usa e abusa da noção de substância... Será que pretende esburacar a materialidade compacta da sociedade? Ou melhor: a camada electrónica da matéria social? Mas se esburacar muito vai descobrir o vazio da matéria social. As massas populares - os colectivos - inclinam-se à passagem dos vencedores!

J Francisco Saraiva de Sousa

terça-feira, 2 de julho de 2013

Manifestação contra o Acordo Ortográfico

Splash no Rio Douro, Porto
A língua portuguesa também merece os nossos cuidados colectivos: os portugueses devem organizar manifestações em todas as cidades para abolir o Acordo Ortográfico.