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domingo, 30 de maio de 2010
Porto Vampiro
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sexta-feira, 28 de maio de 2010
A Maria dos Caixões: Um caso de necrofilia
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quarta-feira, 26 de maio de 2010
Homossexuais Portugueses e Casamento
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terça-feira, 25 de maio de 2010
Prós e Contras: À Procura do Compromisso
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domingo, 23 de maio de 2010
Homossexualidade em Angola
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Porto |
Portugal iniciou os descobrimentos geográficos e colonizou territórios de todo o mundo - Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola, São Tomé e Príncipe, Brasil, Moçambique, Goa, Timor e Macau, mas infelizmente não produziu uma escola de etnógrafos e de etnólogos de qualidade. A citação em epigrafe - em português corrompido - descobri-a não num estudo antropológico português, mas num estudo brasileiro da autoria de Luiz Mott. O capitão António de Oliveira Cadornega realizou uma descrição detalhada da homossexualidade angolana, pelo menos de um determinado tipo de homossexualidade masculina, que permite reconstituir a sua história pré-colonial: Angola é-nos apresentada como a terra da sodomia. Nesse período remoto, a comunidade gay angolana era uma comunidade de feiticeiros: o grupo de feiticeiros era respeitado pela comunidade e vivia publicamente como travestis. Os feiticeiros travestidos eram conhecidos como sacerdotes chefes do sacrifício e praticavam a sodomia. A descrição do capitão foi posteriormente confirmada por diversos estudos antropológicos que mostraram abundantemente que os povos africanos pré-coloniais reconheceram e institucionalizaram as práticas homossexuais: os homens Lango (Uganda), que eram considerados impotentes, vestiam-se como mulheres, simulavam a menstruação e convertiam-se em esposas de outros homens, sendo aceites e acolhidas pelas outras co-esposas femininas no seio da família. A sua homossexualidade era atribuída a um agente sobrenatural. A actividade homossexual mais praticada pelos povos africanos pré-coloniais era o coito anal: os Siwanos do Norte de África regalavam-se na prática frequente de sexo anal, adoptando o papel feminino em situações estritamente sexuais, e os homens que não se recriavam nestas actividades homossexuais eram vistos como "estranhos" ou "peculiares". Os guerreiros Zande (Sudão, República Centro-Africana e Congo) tinham relações intercrurais com os seus jovens escudeiros e os Nkundo (Congo) praticavam o sexo anal, com os mais jovens a desempenhar o papel activo. Os Haúças e os Ganeses aceitavam e praticavam os actos sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Os Hereros (Namíbia e Botswana) reconheciam amizades especiais - amizades coloridas - entre homens (oupanga) que incluíam o sexo anal. O mesmo pode ser dito em relação a tantos outros povos africanos, de Norte a Sul, tais como os Harair muçulmanos (Etiópia), os Galas ou Oromos (Etiópia), os Somalis, os Akan da Costa do Ouro, os Amara, os Daometanos, os Namas (África do Sul), os Nyakyusa (Tanzânia), os Rundi, os Hutu, os Tutsi (Ruanda), os Tanala (Madagáscar) e os Zulus.
Os homossexuais angolanos integrados na minha amostra virtual de homossexuais africanos de todo o mundo são, em termos gerais, excessivamente efeminados. Ao contrário dos chamados garanhões negros - os homossexuais africanos activos, eles não exibem o seu pénis flácido ou erecto e, quando lhes pedem para o mostrar, ficam profundamente irritados e, por vezes, banem os visitantes mais curiosos e atrevidos. Porém, quando estão serenos, eles fazem aquilo que geralmente os garanhões negros, sobretudo os afro-americanos, não fazem: mostrar a face sorridente. O pedido para mostrar a face embaraça-os, porque sabem que os traços faciais africanos não são eroticamente apreciados: os visitantes dos sites Web-cam querem ver exibições fálicas, mas, quando há a possibilidade de estabelecer um encontro privado ou mesmo um encontro off-line, eles desejam ver a face dos exibicionistas. Embora esta vontade de ver a face do exibicionista possa ser interpretada como indicação de possível quebra da comunicação, ela revela uma característica típica dos seres humanos: o fascínio pelas faces. Os seres humanos registam as suas emoções na face e, para o fazer, recorrem a diversas linguagens faciais, entre as quais se destacam as linguagens faciais para namoriscar. Num encontro real, a face é normalmente a primeira coisa que reparamos na pessoa com quem interagimos, porque ela nos diz o que essa pessoa sente e o seu estado de saúde, conferindo-lhe uma identidade. A simetria facial funciona como um indicador de bons genes (Thornhill & Gangestad, 1999), cujos transportadores tendem a ter grande sucesso no acasalamento: a estética darwinista da face está intimamente ligada ao estado de saúde de um indivíduo e à sua aptidão directa, bem como à longevidade e à fertilidade. Durante o seu período fértil, as mulheres casadas com homens com faces assimétricas sentem-se atraídas por homens com faces simétricas (Gangestad et al., 2005): elas escolhem preferencialmente homens simétricos como parceiros de casos extraconjugais, donde resulta o facto de 10% das crianças de hoje terem pais genéticos diferentes dos seus pais putativos, provavelmente homens assimétricos que sofrem uma inclinação especial para serem enganados pelos seus rivais mais simétricos. No entanto, as faces africanas não são consideradas atractivas, não tanto por causa dos seus desvios da simetria, mas sobretudo pelo facto de exibirem alguns traços faciais considerados pelos potenciais parceiros sexuais como "feios" e "grosseiros": a cabeça alongada, a pele muito preta e a fronte fugidia do subgrupo nilótico, e o nariz largo e achatado com narinas alongadas em fendas transversais, os lábios espessos com bordo vermelho e o prognatismo evidente do subgrupo congolês, são alguns desses aspectos faciais que não atraem fisicamente os ocidentais. Um corpo musculoso e atlético e/ou um pénis avantajado podem ser rejeitados por causa de uma face não-atractiva. As sequências fotográficas de contactos sexuais interaciais mostram claramente os efeitos negativos dessa não-atractividade facial dos africanos sobre o tipo de actividade sexual realizada com parceiros caucasianos: o sexo com africanos tende a ocorrer sem envolvimento afectivo, isto é, sem troca de beijos íntimos, como se fosse a realização de uma mera curiosidade sexual ou a satisfação de uma busca compulsiva de novidade. No entanto, os angolanos, os moçambicanos e os afro-brasileiros sofreram a mestiçagem, o que lhes permitiu adquirir "faces mais giras", e, como os utentes dos sites Web-cam julgam a atractividade dos residentes africanos pela sua aparência, filtrada por preconceitos étnico-culturais, as faces mestiças são consideradas mais atraentes que as faces especificamente africanas: ser mestiço tornou-se assim sinónimo de "sexo quente" e intenso, tal como pode ser observado nas praias, nos oásis eróticos gay que incentivam as práticas sexuais entre os seus clientes e nas festas da espuma realizadas nas discotecas gay.
Os sites Web-cam são mais frequentados por homossexuais angolanos efeminados que por homossexuais angolanos simplesmente masculinos ou hiper-masculinos: os homossexuais efeminados e hiperefeminados raramente exibem o seu pénis. Os quatro tipos de homossexuais efeminados da minha tipologia das homossexualidades masculinas partilham algumas características em comum: desvalorizam a masculinidade em si mesmos e sobrevalorizam a masculinidade nos outros, os seus parceiros sexuais ideais. Eles interiorizaram a definição social do maricas imposta pela ideologia heterosexista, incorporando o padrão cultural de feminilidade e desvalorizando a masculinidade em si mesmos. Apesar da desvalorização da sua própria masculinidade relaxar à medida que se transita do "maricas" para o "agrupado", passando pelo "agitado" e pelo "enfastiado" respectivamente, os homossexuais efeminados são indivíduos do sexo masculino que valorizam e cultivam a feminilidade em si mesmos e que sobrevalorizam a masculinidade nos outros com quem desejam estabelecer contactos sexuais. Por outras palavras, os homossexuais efeminados tendem a ver-se a si próprios como uma espécie de «mulheres»: a sua preferência sexual pelo papel de receptor anal e oral e a desvalorização da sua própria masculinidade são sinais evidentes da sua feminização e da sua desmasculinização precoces. De modo inverso, os quatro tipos de homossexuais simplesmente masculinos e hipermasculinizados partilham alguns traços em comum: valorizam a masculinidade em si próprios e nos outros. Embora todos adiram de algum modo ao padrão de masculinidade instituído pela sociedade heterosexista, verifica-se que essa adesão se fortalece e se reforça à medida que se passa do "emergente" ao "hipermasculino", passando pelo "normalizado" e pelo "encoberto". Os homossexuais não-efeminados são indivíduos que valorizam a masculinidade em si próprios e nos outros, ou seja, que desvalorizam a feminilidade em si mesmos e nos outros. A valorização da masculinidade em si próprios e nos outros implica a independência em relação à ideologia heterosexista: a rejeição natural do estereótipo social do maricas é realizada mediante a reafirmação da sua condição masculina, donde resulta a invenção de novas masculinidades, algumas das quais são mais masculinas que as exibidas pelos homens heterossexuais. Ora, os homens gay em geral têm perfeita consciência da associação negativa entre atipicidade sexual e atractividade sexual. Com efeito, quanto maior for o grau de efeminamento ou de atipicidade sexual exibido pelos homossexuais maior será a probabilidade de serem marginalizados pela comunidade gay e, por conseguinte, de serem menos bem sucedidos romanticamente, o que tem consequências negativas para a sua saúde mental. Nos sites Web-cam, bem como na comunidade gay real, os homossexuais atípicos não conquistam grandes audiências, pelo menos uma grande audiência homossexual, a menos que estejam a interagir sexualmente com um parceiro activo: os meus amigos efeminados de Angola - incluídos na minha amostra virtual - nunca atingiram as primeiras páginas dos sites Web-cam.
Para explicar o insucesso sexual virtual dos homossexuais angolanos efeminados, vou recorrer a duas figuras de travestis negros da era colonial portuguesa, que foram recuperadas por Luiz Mott (2005): o travesti Vitória - o António - do Reino de Benin, escravo em Lisboa, e Francisco Manicongo, escravo de António Pires na Bahia, ambos os quais já tinham vivenciado a sua orientação homossexual no continente africano. Detida em 1556 pela Inquisição Portuguesa, pelo facto de ter sido denunciada pelas prostitutas da Ribeira de Lisboa, revoltadas com a sua concorrência desleal, a Vitória era uma figura imponente e encorpada que não queria que a chamassem pelo seu nome masculino (António): a prostituta "negra", que residiu inicialmente em Ponta Delgada - na ilha de São Miguel, vestia roupas de mulher e seduzia os moços, os mancebos e os ratinhos (trabalhadores da Beira) que passavam na rua, levando-os para um lugar escuso atrás das casas, onde pecavam, algumas vezes em grupos de 7 ou 8 homens, e riam. Quando foi interrogada pelos padres do Santo Ofício, a Vitória disse que era mulher e tinha «um buraco na ilha», isto é, uma vagina, mas os examinadores concluiram que ele/ela tinha «natura de homem. sem ter buraco algum». A Vitória que gostava de provocar os homens, dizendo-lhes ter um «marido branco», foi condenada a degredo perpétuo nas galés del-rei, servindo como remeiro no Algarve. Em 1591, quando o Santo Ofício se instalou na Bahia, Matias Moreira denunciou Francisco Manicongo por ter «fama entre os negros desta cidade» de ser somítigo: os negros somítigos de Angola e do Congo usavam um pano cingido com as pontas para diante que lhes fazia uma abertura à frente e, quando pecavam, serviam de «mulheres pacientes». A Vitória procurava um marido entre os trabalhadores brancos pobres, enquanto o Francisco quimbanda praticava a homossexualidade com outros negros da Bahia, o que o livrou da fogueira. Hoje classificaríamos a Vitória e o Francisco quimbanda no grupo dos transexuais homossexuais. Nos países latinos, o transexualismo é associado à homossexualidade, no sentido dos transexuais macho-para-fêmea ou fêmea-para-macho serem atraídos por parceiros do seu próprio sexo genético. Mas nem todos os indivíduos transexuais são homossexuais. Blanchard (1985, 1988, 1989) preconizou a existência de dois tipos diferentes de transexualismo: o homossexual e o não-homossexual. Em contraste com os transexuais homossexuais que são andrófilos, os transexuais não-homossexuais tendem a ficar sexualmente excitados com o pensamento ou a imagem de si próprios como mulheres. Blanchard (1989) chamou a esta característica disforia de género autoginefílica. A categoria de transexuais homossexuais inclui indivíduos que foram abertamente efeminados durante a infância (infância sexualmente atípica), que permanecem femininos na vida adulta e que são exclusivamente atraídos por homens, enquanto a categoria de transexuais não-homossexuais integra indivíduos que não foram abertamente femininos durante a infância, que não são marcadamente femininos na vida adulta e que não são exclusivamente atraídos por homens (Cohen-Kettenis & Gooren, 1999). Além das variações das suas atracções sexuais, os indivíduos desta segunda categoria relatam uma história de fetichismo trasvestido ou excitação sexual com cross-dressing (Blanchard, 1985; Blanchard, Clemmensen & Steiner, 1987). Os travestis Vitória e Francisco Manicongo - ou melhor, estes dois transexuais homossexuais negros - recusavam ser tratados como homens: eles viam-se a si próprios como mulheres negras e, por isso, travestiam-se - não para se excitarem sexualmente mas para seduzir os homens - e serviam de mulheres pacientes, isto é, sofriam a cópula anal. Ora, esta feminilidade exagerada - quase caricatural - e assumida pelos travestis e transexuais não atrai os homens gay. Os transexuais andrófilos e os homens gay hostilizam-se e estigmatizam-se reciprocamente: os transexuais negam a masculinidade aos homens gay, rejeitando-os como potenciais parceiros sexuais, e os homens gay reagem chamando-lhes "coisas" que envergonham a condição masculina. Mas o que os separa verdadeiramente é a assumpção da identidade de género: os homens gay orgulham-se de ser homens, enquanto os transexuais homossexuais desejam ser mulheres. Os primeiros apreciam os seus órgãos genitais, enquanto os segundos desejam descartar-se deles e substituí-los por uma vagina. O desconforto dos transexuais com a sua identidade de género é também um desconforto com a sua identidade corporal. Os homens homossexuais nasceram para curtir a sua própria masculinidade intumescida, enquanto os transexuais nasceram para amputar a sua masculinidade: o desejo de ser mulher leva-os a desprezar o seu próprio pénis e a não exibi-lo aos outros, como sucede actuamente entre os homossexuais efeminados angolanos que frequentam os sites Web-cam. Eles não mostram o pénis, comportam-se como "mulheres" à procura de marido estrangeiro, e, quando se exibem privadamente, revelam o furor insaciável do seu único "buraco", tal como o fez Vitória em lugares escusos da Ribeira de Lisboa no século XVI. (Veja mais aqui e aqui.)
J Francisco Saraiva de Sousa
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quinta-feira, 20 de maio de 2010
Homossexualidade em Moçambique
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Já escrevi um texto sobre as homossexualidades africanas que pode ser lido aqui, onde reponho a verdade no seu devido lugar: as práticas homossexuais não foram introduzidas pelos europeus no continente africano; elas sempre já existiram entre os povos africanos, que lhes deram uma moldura institucional; o que os europeus fizeram foi colonizar as mentes africanas e envenená-las com a homofobia. O antropólogo Ralph Linton realizou um trabalho de campo em Moçambique, mas prefiro retomar a sua conceptualização da homossexualidade entre os Tanalas de Madagáscar para desmistificar outro mito: o mito de que todos os homens homossexuais são sexualmente passivos ou receptivos, como se eles dependessem dos favores sexuais dos machos heterossexuais para satisfazer os seus desejos sexuais. A institucionalização da figura do travesti nalgumas sociedades africanas pode dar essa ilusão. Em Madagáscar, os homens travestidos são geralmente homossexuais e, em muitos casos, podem desempenhar a função de esposa secundária. Os Tanalas aceitam esta instituição do casamento de pessoas do mesmo sexo: as práticas homossexuais entre o marido e a sua esposa secundária não são reprovadas. A actividade homossexual é representada com o marido a penetrar a esposa secundária, que, ao contrário do berdache da tribo Iatmul, não usa um clitóris simbólico sobre o ânus. Os bailarinos profissionais são homossexuais, mas a sua actividade sexual oscila entre práticas homossexuais e heterossexuais. Porém, nem todos os travestidos são homossexuais que se casam e têm relações sexuais com outros homens. Segundo Linton, o travestismo constitui um refúgio socialmente aprovado para o homem impotente: o estatuto de travesti garante-lhe uma condição pessoal socialmente definida no seio da sociedade, e permite-lhe fazer tudo aquilo que uma mulher faz e fazê-lo melhor. Linton está consciente de que o status de travesti pode ser adquirido tanto por indivíduos homossexuais como por indivíduos idosos que perderam a potência sexual ou pelo grupo dos filhos mais novos: as mulheres Tanalas são proibidas de assumir o papel masculino, estando destinadas à missão de ter filhos e cuidar deles. A tribo Thonga de Moçambique também institucionalizou a figura do travesti em conformidade com o modelo da pederastia. No século XIX, os homens desta tribo foram levados para a África do Sul, para trabalhar nas minas, deixando as mulheres em território moçambicano. Nos acampamentos de Joanesburgo, os rapazes que usavam sutiãs esculpidos em madeira sobre o peito entretinham os homens com as suas danças. A animação e a alegria destas danças não deviam ser muito diferentes das de um show moderno de drag queens numa discoteca gay. À noite, após as danças, os rapazes - que tinham maridos - pediam 10 shillings para remover os sutiãs - peitos falsos - e satisfazer as necessidades sexuais dos seus homens. As prostitutas que frequentavam os acampamentos foram preteridas em favor dos rapazes: os Thongas preferiam os rapazes que eram seleccionados pelos supervisores para assumir o papel de travestis. A troca de papel entre os géneros era socialmente aceite com tranquilidade em muitas sociedades africanas que foram colonizadas pelos europeus. A mente estreita e homofóbica dos europeus colonizadores ficou chocada não só com a troca de papéis mas também com a actividade homossexual realizada entre os homens - os maridos - e os seus rapazes ou esposas secundárias: a prática da sodomia condenada pelo padre Henri A. Junod. Os estudos antropológicos clássicos tendem a referir unicamente a homossexualidade passiva (Aristóteles): os homossexuais são representados como indivíduos que assumem o papel sexual do sexo oposto, sendo penetrados analmente por homens heterossexuais. Geralmente, além de não questionarem a orientação sexual dos homens que desempenham o papel de introdutores anais, não fornecem informação sobre outras actividades homossexuais, nomeadamente sobre o sexo oral, a troca de carícias íntimas e os beijos húmidos: o erotismo homossexual africano é reduzido à prática mecânica de coito anal, em que o parceiro activo é considerado heterossexual, e o passivo, homossexual. Esta visão antropológica da homossexualidade africana contrasta fortemente com a imagem que os homossexuais ocidentais construíram do homem africano. Esta discrepância evidenciou-se no decorrer da minha pesquisa de campo nos nichos eróticos gay da Internet: numa conversa em janela privada, um homem gay português de Viseu relatou-me as suas fantasias sexuais, uma das quais era a projecção urinária, e a outra, penetrar analmente um homem negro. Ele já tinha realizado diversas vezes a sua fantasia urinária, mas não acreditava poder concretizar a penetração anal activa com um homem negro, porque, como alegava, todos os africanos eram homens activos bem-dotados. Fiquei muito surpreendido com esta declaração do meu amigo virtual de Viseu: um homossexual masculino português que frequenta regularmente os "ambientes" do Porto e de Lisboa e os sites Web-cam, deve andar muito distraído para não ver as "negras passivas" que se exibem de modo flagrante e provocante nesses ambientes reais e virtuais. A visão do homem negro deste meu amigo virtual que diz ser predominantemente activo - embora eu tenha detectado nele indicadores comportamentais de versatilidade sexual - pode ter sido contagiada pelas sequências fotográficas de pornografia gay que circulam pelo Messenger e pela experiência sexual dos homossexuais passivos. De facto, em Portugal, os homossexuais passivos conseguem seduzir facilmente um indivíduo africano proveniente de Cabo Verde, de Angola, de Moçambique ou de outro país africano. O indivíduo africano não precisa ser homossexual para fazer sexo com os homossexuais ocidentais, desempenhando em todos estes casos o papel activo. Este padrão de comportamento sexual dos homens africanos foi observado no terreno - aqui em Portugal - e reforçado pelos relatos dos próprios homossexuais masculinos portugueses que viveram - retornados - ou trabalham ainda hoje nas ex-colónias portuguesas. Para estudar o comportamento homossexual africano, constitui uma amostra virtual composta por indivíduos negros oriundos de todo o mundo, de África, da Europa, do Brasil, da América do Sul e Central, e dos USA, com especial destaque das ex-colónias portuguesas. Os dados recolhidos sugerem que as sexualidades de género masculino dos indivíduos negros são menos rígidas que as sexualidades de género masculino dos europeus. Nos sites Web-cam, bem como depois via Messenger, eu posso usar abertamente um perfil masculino - gay ou não-gay - para interagir com um indivíduo negro que afirma ser heterossexual, tendo «direito» nalgumas situações a uma sessão de exibição sexual privada e grátis. Acentuo o sexo grátis para descartar a hipótese da prostituição masculina: alguns residentes permanentes dos sites Web-cam - incluindo indivíduos negros - são efectivamente prostitutos, isto é, exibem actividade sexual para todos os utentes masculinos ou femininos - cada um privadamente - que lhes pagam para esse efeito. Quando Moçambique estava incluído no Spartacus: International Gay Guide, os circuitos gay moçambicanos eram de certo modo apresentados como circuitos de prostituição barata: os homens homossexuais que visitassem Maputo podiam encontrar em determinados locais da Polana rapazes ou jovens para satisfazer a baixo custo as suas necessidades sexuais. A imagem ocidental do homem africano é sempre a mesma: o homem africano é apresentado como um parceiro activo, bem-dotado e acessível à abordagem sexual. Quanto ao tamanho do pénis dos indivíduos negros, é preciso dizer que o seu pénis não é, em média, maior do que o dos indivíduos europeus: os únicos pénis que, em média, são menores que os dos indivíduos negros, indianos e caucasianos são os dos asiáticos (chineses), e, nestes mesmos grupos, os homens homossexuais exibem pénis de maiores dimensões que os homens heterossexuais. O pénis negro de grandes dimensões - o "analgésico de chocolate" - é, portanto, um mito, tal como o é também a ideia gay de que todos os homossexuais negros são activos. A existência de comunidades gay em Moçambique - a comunidade invisível e ubíqua das "manas" - ou em Angola desmente facilmente esta última ideia, bastando pensar no modo como cada um se integra nessas comunidades e interage sócio-sexualmente com os outros membros: os padrões de comportamento e os estilos de vida gay são muito idênticos em todos os países do mundo. As comunidades gay são sexualmente autónomas e auto-suficientes: a diversidade de preferências sexuais de papel - activo, versátil e passivo - garante essa autonomia sem ser necessário recorrer aos serviços sexuais de machos heterossexuais exóticos. O único atributo do homem africano que retenho como realmente confirmado é a sua atitude menos preconceituosa em relação à homossexualidade, e esta atitude de abertura é particularmente evidente no grupo moçambicano da minha amostra virtual. Na comunicação mediada por computador, a maioria dos homens moçambicanos contactados - e as mulheres também - revela interesse em experimentar fazer sexo com outros homens. Não sei como seriam classificados os moçambicanos se lhes aplicássemos o Index da Homofobia, mas nestes contactos virtuais eles revelam um nível muito baixo de homofobia. Durante a pesquisa de terreno, verifiquei a existência de contactos sexuais entre homossexuais portugueses e homens caboverdianos e angolanos, para já não falar daqueles africanos que chegam até Portugal provenientes do Norte de África e que são utilizados para a produção de material pornográfico. Com excepção deste último grupo de africanos, a maior parte dos contactos sexuais realizava-se sem pagamento em dinheiro ou mesmo em género. A atracção física é um processo complexo, como já demonstrei noutros textos: a reacção sexual dos homens africanos é evidentemente idêntica à dos homens europeus. Preferem claramente parceiros mais novos do que eles - um padrão tipicamente masculino - e, o que é muito peculiar neles, reagem com potente erecção a alvos louros e de pele clara. Os homossexuais masculinos caucasianos que não se enquadram neste modelo ou são muito "femininos" - um traço susceptível de atrair os homens africanos - ou terão que negociar a relação sexual e, neste caso, oferecer alguma ajuda adicional, em especial pecuniária. Outra maneira de seduzir os homens africanos é exibir status, mas esta exibição também funciona entre os europeus: a relação que deriva dela tende a ser oportunista. Os homens africanos que fazem sexo com outros homens - aqui em Portugal - não são necessariamente homossexuais, porque muitos deles podem ser casados e ter família constituída: aqueles que são verdadeiramente homossexuais tendem a preferir exclusivamente parceiros sexuais do mesmo sexo, sendo refractários a contactos com membros do sexo oposto, como se verifica facilmente nos sites Web-cam. Porém, os homens moçambicanos surpreenderam-me, não tanto pelo facto de não serem homofóbicos, mas sobretudo pelo facto de declararem querer fazer sexo com outros homens e, nalguns casos, mudar de orientação sexual, como se fossem efectivamente homossexuais. O conhecimento da etnografia dos povos de Moçambique ajuda-me a compreender a sua não-homofobia: a mente masculina moçambicana manifestou sempre uma abertura em relação a algum tipo de prática homossexual. Ter ocasionalmente relações sexuais com jovens do mesmo sexo ou mesmo com homens adultos - turistas ou não - é, para o homem heterossexual moçambicano típico, um comportamento perfeitamente compreensível à luz da sua própria história cultural. Como vimos, os homens da tribo Thonga expulsaram as prostitutas dos seus acampamentos, preferindo fazer sexo com os rapazes. O que desafia o paradigma dominante na pesquisa sexual não é a exibição deste comportamento homossexual, mas sim a flexibilização de uma das sexualidades de género masculino - precisamente a heterossexual, já que a homossexualidade dos homens de Moçambique, sobretudo a dos mais efeminados, continua a manifestar rigidez. A existência de heterossexuais exóticos que curtem sexo com outros homens começa a fazer estremecer a hipótese neuro-hormonal da diferenciação sexual do cérebro e do comportamento, forçando-nos a olhar de modo problemático para a heterossexualidade. Até agora temos procurado explicar a homossexualidade, sem questionar a suposta normalidade heterossexual, mas, neste momento de multiplicação dos prazeres, começamos a suspeitar que, sem explicar a heterossexualidade, não podemos compreender a homossexualidade e a transexualidade. Os moçambicanos podem ajudar a compreender melhor a heterossexualidade exótica que recusa conscientemente o heterosexismo. África - o suposto berço da Humanidade - pode ajudar a compreender que o programa da orientação sexual só se fecha na homossexualidade masculina ou, numa situação clínica, quando produz transsexuais macho-para-fêmea. Os homens de Madagáscar - os tanalas - atribuiam às mulheres a função de gerar filhos e cuidar deles, reservando para si próprios os prazeres do sexo. O sex drive dos homens é efectivamente superior ao das mulheres. (Veja este site, este post gay alentejo, este texto interessante de Luiz Mott e, por fim, o portal moçambicano da comunidade gay e lésbica.)
J Francisco Saraiva de Sousa
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quarta-feira, 19 de maio de 2010
Denise: a minha amiga da Literatura
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terça-feira, 18 de maio de 2010
Prós e Contras: Medidas Dolorosas
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domingo, 16 de maio de 2010
FCPorto: O Nosso Campeão Azul
Em Portugal, o FCPorto é o único clube com classe, que conquistou hoje (16 de Maio) a sua 15ª Taça de Portugal. Os jogadores da equipa de futebol do FCPorto - bem como os seus técnicos, com especial destaque de Jesualdo Ferreira - destacam-se dos seus pseudo-adversários pela qualidade dos genes que transportam: basta olhar para as simetrias faciais para testar essa qualidade azul que contrasta com as deformações adversárias. O FCPorto é um clube moderno, dinâmico, activo, transparente e inteligente, que atrai os portugueses - sobretudo os jovens com ambição diurna - que desejam um futuro novo para Portugal: os adeptos do FCPorto devem aprender a desprezar o seu adversário e a negar-lhe a existência. Apesar deste campeonato estar ferido de morte pela questão dos túneis e coberto pela vergonha da mentira desportiva - conspirada em quartos escuros e difundida pelos medíocres meios de comunicação social da capital asteca, vou dedicar um poema azul ao FCPorto. O poema intitula-se Grodek e é da autoria de um poeta azul - Georg Trakl - que anseia pelos filhos que ainda hão-de nascer: o azul anímico da noite anuncia a chegada de uma nova geração, cuja missão será destronar a maldita geração e realizar todos os nossos sonhos diurnos azuis. Eis o poema:
«Ao entardecer, as florestas outonais
ecoam de armas mortíferas, e as planícies douradas
e os lagos azuis, por sobre os quais rola
um sol sombrio; a noite abraça
guerreiros moribundos, o lamento selvagem
das suas bocas destroçadas.
Mas, em silêncio, num fundo de salgueiros,
juntam-se nuvens rubras, onde um Deus irado habita;
e o sangue derramado, e frescura lunar;
todos os caminhos desembocam em negra podridão.
Sob dourada ramagem da noite e sob estrelas
a sombra da irmã vacila pelo bosque de silêncio,
para saudar os espíritos dos heróis, as cabeças
ensanguentadas;
e levemente, nos canaviais, soam as flautas sombrias do
outono.
Oh, dor orgulhosa! Vós, brônzeos altares,
Uma dor portentosa alimenta hoje a chama escaldante do
espírito,
Os filhos que ainda hão-de nascer.»
J Francisco Saraiva de Sousa
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