domingo, 23 de maio de 2010

Homossexualidade em Angola

Porto
«Há entre os gentios de Angola muita sodo-mia, tendo uns com os outros as suas imundícies e sujidades, vestindo como mulheres. Eles chamam pelo nome da terra: quimbandas, os quais, no distrito ou terras onde os há, têm comunicação uns com os outros. E alguns deles são finos feiticeiros para terem tudo mau e todo o gentio os respeita e não os ofendem em coisa alguma. E se sucede morrer algum daquela quadrilha, congregam-se os mais a lhe vir dar sepultura, e outro nenhum lhe bole, nem chega a ele, salvo os daquela negra e suja profissão. E quando o tiram de casa, para o enterrarem, não é pela porta principal, senão abrem porta por detrás da casa, por onde saem com ele fora, que como se serviu pela do quintal, querem que morto saia também por ela. Esta casta de gente é quem os amortalha e lhe dá sepultura. E não chega outro nenhum a ele como dissemos, que não seja da sua ralé. Andam sempre de barba raspada, que parecem capões, vestindo como mulheres». (António de Oliveira Cadornega, História Geral das Guerras Angolanas (1681).)
Portugal iniciou os descobrimentos geográficos e colonizou territórios de todo o mundo - Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola, São Tomé e Príncipe, Brasil, Moçambique, Goa, Timor e Macau, mas infelizmente não produziu uma escola de etnógrafos e de etnólogos de qualidade. A citação em epigrafe - em português corrompido - descobri-a não num estudo antropológico português, mas num estudo brasileiro da autoria de Luiz Mott. O capitão António de Oliveira Cadornega realizou uma descrição detalhada da homossexualidade angolana, pelo menos de um determinado tipo de homossexualidade masculina, que permite reconstituir a sua história pré-colonial: Angola é-nos apresentada como a terra da sodomia. Nesse período remoto, a comunidade gay angolana era uma comunidade de feiticeiros: o grupo de feiticeiros era respeitado pela comunidade e vivia publicamente como travestis. Os feiticeiros travestidos eram conhecidos como sacerdotes chefes do sacrifício e praticavam a sodomia. A descrição do capitão foi posteriormente confirmada por diversos estudos antropológicos que mostraram abundantemente que os povos africanos pré-coloniais reconheceram e institucionalizaram as práticas homossexuais: os homens Lango (Uganda), que eram considerados impotentes, vestiam-se como mulheres, simulavam a menstruação e convertiam-se em esposas de outros homens, sendo aceites e acolhidas pelas outras co-esposas femininas no seio da família. A sua homossexualidade era atribuída a um agente sobrenatural. A actividade homossexual mais praticada pelos povos africanos pré-coloniais era o coito anal: os Siwanos do Norte de África regalavam-se na prática frequente de sexo anal, adoptando o papel feminino em situações estritamente sexuais, e os homens que não se recriavam nestas actividades homossexuais eram vistos como "estranhos" ou "peculiares". Os guerreiros Zande (Sudão, República Centro-Africana e Congo) tinham relações intercrurais com os seus jovens escudeiros e os Nkundo (Congo) praticavam o sexo anal, com os mais jovens a desempenhar o papel activo. Os Haúças e os Ganeses aceitavam e praticavam os actos sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Os Hereros (Namíbia e Botswana) reconheciam amizades especiais - amizades coloridas - entre homens (oupanga) que incluíam o sexo anal. O mesmo pode ser dito em relação a tantos outros povos africanos, de Norte a Sul, tais como os Harair muçulmanos (Etiópia), os Galas ou Oromos (Etiópia), os Somalis, os Akan da Costa do Ouro, os Amara, os Daometanos, os Namas (África do Sul), os Nyakyusa (Tanzânia), os Rundi, os Hutu, os Tutsi (Ruanda), os Tanala (Madagáscar) e os Zulus.
Os homossexuais angolanos integrados na minha amostra virtual de homossexuais africanos de todo o mundo são, em termos gerais, excessivamente efeminados. Ao contrário dos chamados garanhões negros - os homossexuais africanos activos, eles não exibem o seu pénis flácido ou erecto e, quando lhes pedem para o mostrar, ficam profundamente irritados e, por vezes, banem os visitantes mais curiosos e atrevidos. Porém, quando estão serenos, eles fazem aquilo que geralmente os garanhões negros, sobretudo os afro-americanos, não fazem: mostrar a face sorridente. O pedido para mostrar a face embaraça-os, porque sabem que os traços faciais africanos não são eroticamente apreciados: os visitantes dos sites Web-cam querem ver exibições fálicas, mas, quando há a possibilidade de estabelecer um encontro privado ou mesmo um encontro off-line, eles desejam ver a face dos exibicionistas. Embora esta vontade de ver a face do exibicionista possa ser interpretada como indicação de possível quebra da comunicação, ela revela uma característica típica dos seres humanos: o fascínio pelas faces. Os seres humanos registam as suas emoções na face e, para o fazer, recorrem a diversas linguagens faciais, entre as quais se destacam as linguagens faciais para namoriscar. Num encontro real, a face é normalmente a primeira coisa que reparamos na pessoa com quem interagimos, porque ela nos diz o que essa pessoa sente e o seu estado de saúde, conferindo-lhe uma identidade. A simetria facial funciona como um indicador de bons genes (Thornhill & Gangestad, 1999), cujos transportadores tendem a ter grande sucesso no acasalamento: a estética darwinista da face está intimamente ligada ao estado de saúde de um indivíduo e à sua aptidão directa, bem como à longevidade e à fertilidade. Durante o seu período fértil, as mulheres casadas com homens com faces assimétricas sentem-se atraídas por homens com faces simétricas (Gangestad et al., 2005): elas escolhem preferencialmente homens simétricos como parceiros de casos extraconjugais, donde resulta o facto de 10% das crianças de hoje terem pais genéticos diferentes dos seus pais putativos, provavelmente homens assimétricos que sofrem uma inclinação especial para serem enganados pelos seus rivais mais simétricos. No entanto, as faces africanas não são consideradas atractivas, não tanto por causa dos seus desvios da simetria, mas sobretudo pelo facto de exibirem alguns traços faciais considerados pelos potenciais parceiros sexuais como "feios" e "grosseiros": a cabeça alongada, a pele muito preta e a fronte fugidia do subgrupo nilótico, e o nariz largo e achatado com narinas alongadas em fendas transversais, os lábios espessos com bordo vermelho e o prognatismo evidente do subgrupo congolês, são alguns desses aspectos faciais que não atraem fisicamente os ocidentais. Um corpo musculoso e atlético e/ou um pénis avantajado podem ser rejeitados por causa de uma face não-atractiva. As sequências fotográficas de contactos sexuais interaciais mostram claramente os efeitos negativos dessa não-atractividade facial dos africanos sobre o tipo de actividade sexual realizada com parceiros caucasianos: o sexo com africanos tende a ocorrer sem envolvimento afectivo, isto é, sem troca de beijos íntimos, como se fosse a realização de uma mera curiosidade sexual ou a satisfação de uma busca compulsiva de novidade. No entanto, os angolanos, os moçambicanos e os afro-brasileiros sofreram a mestiçagem, o que lhes permitiu adquirir "faces mais giras", e, como os utentes dos sites Web-cam julgam a atractividade dos residentes africanos pela sua aparência, filtrada por preconceitos étnico-culturais, as faces mestiças são consideradas mais atraentes que as faces especificamente africanas: ser mestiço tornou-se assim sinónimo de "sexo quente" e intenso, tal como pode ser observado nas praias, nos oásis eróticos gay que incentivam as práticas sexuais entre os seus clientes e nas festas da espuma realizadas nas discotecas gay.
Os sites Web-cam são mais frequentados por homossexuais angolanos efeminados que por homossexuais angolanos simplesmente masculinos ou hiper-masculinos: os homossexuais efeminados e hiperefeminados raramente exibem o seu pénis. Os quatro tipos de homossexuais efeminados da minha tipologia das homossexualidades masculinas partilham algumas características em comum: desvalorizam a masculinidade em si mesmos e sobrevalorizam a masculinidade nos outros, os seus parceiros sexuais ideais. Eles interiorizaram a definição social do maricas imposta pela ideologia heterosexista, incorporando o padrão cultural de feminilidade e desvalorizando a masculinidade em si mesmos. Apesar da desvalorização da sua própria masculinidade relaxar à medida que se transita do "maricas" para o "agrupado", passando pelo "agitado" e pelo "enfastiado" respectivamente, os homossexuais efeminados são indivíduos do sexo masculino que valorizam e cultivam a feminilidade em si mesmos e que sobrevalorizam a masculinidade nos outros com quem desejam estabelecer contactos sexuais. Por outras palavras, os homossexuais efeminados tendem a ver-se a si próprios como uma espécie de «mulheres»: a sua preferência sexual pelo papel de receptor anal e oral e a desvalorização da sua própria masculinidade são sinais evidentes da sua feminização e da sua desmasculinização precoces. De modo inverso, os quatro tipos de homossexuais simplesmente masculinos e hipermasculinizados partilham alguns traços em comum: valorizam a masculinidade em si próprios e nos outros. Embora todos adiram de algum modo ao padrão de masculinidade instituído pela sociedade heterosexista, verifica-se que essa adesão se fortalece e se reforça à medida que se passa do "emergente" ao "hipermasculino", passando pelo "normalizado" e pelo "encoberto". Os homossexuais não-efeminados são indivíduos que valorizam a masculinidade em si próprios e nos outros, ou seja, que desvalorizam a feminilidade em si mesmos e nos outros. A valorização da masculinidade em si próprios e nos outros implica a independência em relação à ideologia heterosexista: a rejeição natural do estereótipo social do maricas é realizada mediante a reafirmação da sua condição masculina, donde resulta a invenção de novas masculinidades, algumas das quais são mais masculinas que as exibidas pelos homens heterossexuais. Ora, os homens gay em geral têm perfeita consciência da associação negativa entre atipicidade sexual e atractividade sexual. Com efeito, quanto maior for o grau de efeminamento ou de atipicidade sexual exibido pelos homossexuais maior será a probabilidade de serem marginalizados pela comunidade gay e, por conseguinte, de serem menos bem sucedidos romanticamente, o que tem consequências negativas para a sua saúde mental. Nos sites Web-cam, bem como na comunidade gay real, os homossexuais atípicos não conquistam grandes audiências, pelo menos uma grande audiência homossexual, a menos que estejam a interagir sexualmente com um parceiro activo: os meus amigos efeminados de Angola - incluídos na minha amostra virtual - nunca atingiram as primeiras páginas dos sites Web-cam.
Para explicar o insucesso sexual virtual dos homossexuais angolanos efeminados, vou recorrer a duas figuras de travestis negros da era colonial portuguesa, que foram recuperadas por Luiz Mott (2005): o travesti Vitória - o António - do Reino de Benin, escravo em Lisboa, e Francisco Manicongo, escravo de António Pires na Bahia, ambos os quais já tinham vivenciado a sua orientação homossexual no continente africano. Detida em 1556 pela Inquisição Portuguesa, pelo facto de ter sido denunciada pelas prostitutas da Ribeira de Lisboa, revoltadas com a sua concorrência desleal, a Vitória era uma figura imponente e encorpada que não queria que a chamassem pelo seu nome masculino (António): a prostituta "negra", que residiu inicialmente em Ponta Delgada - na ilha de São Miguel, vestia roupas de mulher e seduzia os moços, os mancebos e os ratinhos (trabalhadores da Beira) que passavam na rua, levando-os para um lugar escuso atrás das casas, onde pecavam, algumas vezes em grupos de 7 ou 8 homens, e riam. Quando foi interrogada pelos padres do Santo Ofício, a Vitória disse que era mulher e tinha «um buraco na ilha», isto é, uma vagina, mas os examinadores concluiram que ele/ela tinha «natura de homem. sem ter buraco algum». A Vitória que gostava de provocar os homens, dizendo-lhes ter um «marido branco», foi condenada a degredo perpétuo nas galés del-rei, servindo como remeiro no Algarve. Em 1591, quando o Santo Ofício se instalou na Bahia, Matias Moreira denunciou Francisco Manicongo por ter «fama entre os negros desta cidade» de ser somítigo: os negros somítigos de Angola e do Congo usavam um pano cingido com as pontas para diante que lhes fazia uma abertura à frente e, quando pecavam, serviam de «mulheres pacientes». A Vitória procurava um marido entre os trabalhadores brancos pobres, enquanto o Francisco quimbanda praticava a homossexualidade com outros negros da Bahia, o que o livrou da fogueira. Hoje classificaríamos a Vitória e o Francisco quimbanda no grupo dos transexuais homossexuais. Nos países latinos, o transexualismo é associado à homossexualidade, no sentido dos transexuais macho-para-fêmea ou fêmea-para-macho serem atraídos por parceiros do seu próprio sexo genético. Mas nem todos os indivíduos transexuais são homossexuais. Blanchard (1985, 1988, 1989) preconizou a existência de dois tipos diferentes de transexualismo: o homossexual e o não-homossexual. Em contraste com os transexuais homossexuais que são andrófilos, os transexuais não-homossexuais tendem a ficar sexualmente excitados com o pensamento ou a imagem de si próprios como mulheres. Blanchard (1989) chamou a esta característica disforia de género autoginefílica. A categoria de transexuais homossexuais inclui indivíduos que foram abertamente efeminados durante a infância (infância sexualmente atípica), que permanecem femininos na vida adulta e que são exclusivamente atraídos por homens, enquanto a categoria de transexuais não-homossexuais integra indivíduos que não foram abertamente femininos durante a infância, que não são marcadamente femininos na vida adulta e que não são exclusivamente atraídos por homens (Cohen-Kettenis & Gooren, 1999). Além das variações das suas atracções sexuais, os indivíduos desta segunda categoria relatam uma história de fetichismo trasvestido ou excitação sexual com cross-dressing (Blanchard, 1985; Blanchard, Clemmensen & Steiner, 1987). Os travestis Vitória e Francisco Manicongo - ou melhor, estes dois transexuais homossexuais negros - recusavam ser tratados como homens: eles viam-se a si próprios como mulheres negras e, por isso, travestiam-se - não para se excitarem sexualmente mas para seduzir os homens - e serviam de mulheres pacientes, isto é, sofriam a cópula anal. Ora, esta feminilidade exagerada - quase caricatural - e assumida pelos travestis e transexuais não atrai os homens gay. Os transexuais andrófilos e os homens gay hostilizam-se e estigmatizam-se reciprocamente: os transexuais negam a masculinidade aos homens gay, rejeitando-os como potenciais parceiros sexuais, e os homens gay reagem chamando-lhes "coisas" que envergonham a condição masculina. Mas o que os separa verdadeiramente é a assumpção da identidade de género: os homens gay orgulham-se de ser homens, enquanto os transexuais homossexuais desejam ser mulheres. Os primeiros apreciam os seus órgãos genitais, enquanto os segundos desejam descartar-se deles e substituí-los por uma vagina. O desconforto dos transexuais com a sua identidade de género é também um desconforto com a sua identidade corporal. Os homens homossexuais nasceram para curtir a sua própria masculinidade intumescida, enquanto os transexuais nasceram para amputar a sua masculinidade: o desejo de ser mulher leva-os a desprezar o seu próprio pénis e a não exibi-lo aos outros, como sucede actuamente entre os homossexuais efeminados angolanos que frequentam os sites Web-cam. Eles não mostram o pénis, comportam-se como "mulheres" à procura de marido estrangeiro, e, quando se exibem privadamente, revelam o furor insaciável do seu único "buraco", tal como o fez Vitória em lugares escusos da Ribeira de Lisboa no século XVI. (Veja mais aqui e aqui.)
J Francisco Saraiva de Sousa

13 comentários:

Fräulein Else disse...

LOL!!!!!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

LOl! Eles não são "bichas"; são "trichas"! :-(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, prós e contras está a ser mais uma seca! As mesmas pessoas, as mesmas ideias, o mesmo blá-blá da ministra do trabalho! :(

saltodadepressao.blogspot.com disse...

Surpreendes informações. Sem esteriotipos ou preconceitos, apenas informações!

angieshark disse...

la fotografia utlilizada en el reportage homosexcuales en Angola , es de un amigo , que no ha dado su consentimiento , para que su imagen sea publicada, ruego elimines dicha fotografia
Atentamente Angels

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem, a fotografia é apenas um chamariz sem relevância! Elimino-a com prazer porque a acho horrível!

Perfil disse...

Senhor J. Francisco Saraiva de Sousa(Igor Santos). Depois do Senhor ter ultilizado, minha imagem por 3 anos em seu blog, agora tenho que suportar seus insúltos? A Denúncia já foi feita, agora tudo está nas mãos da Policia Internacional e meu Advogados.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem não faz sentido manter uma conversa com uma pessoa que não conheço. A Internet disponibiliza imensas fotografias, como devia saber. Todas as fotografias publicadas pertencem à rede, como devia saber.

Em suma, em vez de cultivar a fotografia, deve cultivar a mente e discutir conteúdos de conhecimento. O seu comportamento não é digno de um ser humano esclarecido e responsável. Busque os seus pares!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E já agora leia o comentário de Fontes Inseguras: isso sim é algo construtivo!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Em palavras simples: a imagem é irrelevante para o texto!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Já agora gostava de saber se andar a ameaçar os outros sites que divulgam a fotografia?

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Afinal, tem um blog:

http://koralessandro.blogspot.pt/2009/09/historias-memorias-de-kor-alessandro.html

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Também pretende ameaçar as pessoas que partilham as (suas) fotos no facebook????