quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Meditação e Actividade Cerebral (III)

Apesar da Ilustração ter sido interpretada por Lessing, Kant, Fichte e Hegel, seguindo as teorias de Joaquim de Fiore, como a "terceira idade" e como a "época do Espírito", a filosofia contemporânea condenou paulatinamente o Espírito ao exílio. A pneumatologia foi denegrida a favor da ciência moderna e do materialismo que lhe é subjacente e, neste momento de obscuridade total, estamos completamente desarmados diante dos poderes terríveis do obscurantismo materialista em curso. O esquecimento do Espírito promoveu o advento de uma sociedade metabolicamente reduzida e degenerescente, diante da qual nos sentimos deprimidos, apáticos e impotentes. Sem o cultivo da vida do espírito, ficamos completamente integrados numa sociedade que nos nega a felicidade ou mesmo o futuro: a integração social total é o preço fatal que pagamos diariamente pelo esquecimento do espírito. O Espírito conduz os homens a iniciar uma "vida nova", fazendo deles os sujeitos da sua vida em comunhão com os outros e a natureza. O esquecimento do Espírito e a formalização da razão constituem aspectos de um mesmo processo: a destruição da individualidade. O homem moderno "decide" cuidar de si mesmo e, a partir do momento em que se retira da participação responsável nos assuntos da esfera pública, a sociedade esmaga todos os vestígios da individualidade, levando os seus indivíduos a sentir que só existe um meio de progredir neste miserável mundo: desistir da esperança de autorealização plena e ajustar-se ao processo social em curso. O sistema da indústria cultural suga, neutralizando-os, os valores culturais, e glorifica o mundo tal como ele é e como deve ser e será. O resultado é a resignação: a mente fecha-se ao sonho de um mundo melhor e os conceitos tornam-se meras classificações de factos, em vez de serem orientados para a realização dos sonhos de um mundo diferente.
O conceito de meditação pode ser clarificado nas suas relações com a acção instrumental, a contemplação e a mística. A meditação é um modo de percepção e de pensamento que exercitamos continuamente na nossa vida quotidiana, embora a maior parte das pessoas não lhe preste muita atenção ou lhe dedique muito do seu tempo, como se não tivessem tempo para interiorizar as coisas e, sobretudo, para interiorizar o seu próprio eu. Ao contrário do que se diz, o pensar não é uma "prerrogativa da minoria", mas uma faculdade sempre presente em todos os seres humanos. E, como mostrou Hannah Arendt, a incapacidade de pensar não é um "defeito da maioria" que tem falta de capacidade cerebral, mas uma possibilidade sempre presente para todos, cientistas, eruditos e outros especialistas em empreendimentos mentais. A incapacidade de pensar, a burocracia e a banalização do mal são facetas de uma única realidade: a estagnação espiritual.
Meditação e Acção Instrumental. A meditação foi desencorajada, reprimida e eclipsada pelo pragmatismo moderno, cujo "ataque à meditação quanto o louvor da perícia técnica expressam o triunfo dos meios sobre os fins" (Horkheimer). A sociedade moderna proclama a eficácia, a produtividade e a planificação como os deuses do homem moderno, ao mesmo tempo que estigmatiza os chamados "improdutivos" e "inactivos" como os inimigos da sociedade. A meditação é considerada como uma espécie de vício, não só porque parece ser algo especulativo e distante da realidade, mas também porque parece não assegurar um desempenho adequado numa actividade lucrativa. No entanto, os burocratas de colarinho-branco começam a encarar a meditação como um desporto útil e necessário para encontrar um equilíbrio anímico, mostrando-se receptivos à venda de técnicas de Yoga para aumentar a eficiência e os resultados. A comercialização destas técnicas adulteradas de Yoga aniquila a essência da meditação, sem permitir alcançar a tranquilidade e encontrar-se a si mesmo. A mente de engenheiro predominante sempre-já transformou os homens num conjunto opaco de instrumentos sem objectivos próprios. O decréscimo contínuo do pensamento e da resistência individual torna a evolução para o humano cada vez mais difícil: quer sejam empresários, gestores, eruditos ou subordinados, todos os indivíduos estão submetidos pelo próprio poder que controlam e, apesar de estarem em movimento, nada se transforma. A cultura superior foi completamente colonizada pelo sistema económico capitalista: a clivagem que existia entre cultura e produção/consumo foi anulada. A cultura perdeu a sua autonomia.
Os filósofos gregos, os Padres da Igreja e os monges compreendiam as coisas com os olhos, ou seja, teorizavam (theorein), no sentido literal do termo. Porém, hoje em dia, as pessoas conhecem com as mãos. O primeiro modo de conhecer é uma espécie de acto de amor que cria comunhão, enquanto o segundo modo de conhecer resulta do poder e cria dominação. Para a ciência moderna, conhecer algo é dominá-lo. Francis Bacon foi o primeiro filósofo a afirmar que "saber é dominar". Isto significa que nos apoderamos dos objectos para nos convertermos nos "senhores e possuidores da natureza" (Descartes). Segundo Kant, a razão só conhece a natureza "de acordo com o que nela pôs". Ao contrário da meditação que é uma forma de percepção sensível, um modo de receber, de acolher e de participar, a razão é um órgão produtivo. A ciência moderna, fundada por Galileu, Descartes e Newton, move-se num horizonte instrumental, graças ao qual pode ser perspectivada como «uma tecnologia a priori e o a priori de uma tecnologia específica – uma tecnologia como forma de controle social e de dominação» (Marcuse). Nas sociedades modernas, a dominação converteu-se no interesse que guia o conhecimento das ciências da natureza, bem como das ciências sociais e humanas. O interesse do domínio molda o conhecimento científico, não só na sua aplicação técnica, mas até mesmo nos seus princípios metodológicos fundamentais. O método de análise e de objectivação dos sistemas naturais e sociais é usado para os submeter aos imperativos do crescimento económico e do controle social da sociedade burocrática. O homem divide para imperar e, através deste método, contrapõe-se à natureza como o seu sujeito, isto é, como o seu senhor e proprietário. Converte-se em sujeito exclusivo do conhecimento e da vontade. A subjectivação da racionalidade implica necessariamente a coisificação e a instrumentalização do meio natural: a devastação da Terra.
A dominação da natureza persegue o homem desde, provavelmente, as suas origens filogenéticas mais remotas, mas, como demonstrou Heidegger, coube a Descartes tematizar este horizonte instrumental. Com efeito, na metafísica de Descartes, o ente é determinado, pela primeira vez, como objectividade da representação e a verdade como certeza da representação. Segundo Descartes, o ente é o que é certo: aquilo de que temos uma ideia clara e distinta. A realidade da coisa é a certeza indubitável que o sujeito dela tem. Descartes usa a palavra sujeito para designar, não a substância de um ente qualquer, mas o eu do homem, o qual se converte-se no fundamento absoluto e indubitável da realidade. O ser das coisas, que só é reconhecido como ser na medida em que é certo, deve ser legitimado perante o eu. A noção de objectividade é sempre correlativa ao sujeito. A realidade objectiva é aquela que se mostra e se demonstra como tal ao sujeito: o que a constitui é precisamente a certeza que o sujeito dela tem. Esta identificação do ser das coisas com a certeza de que o eu dele tem é realizada efectivamente, nos Tempos Modernos, pela tecnificação do mundo. Dado ser cada vez um produto técnico, o mundo é, no seu próprio ser, produto do homem. A ciência moderna implica a redução do ser verdadeiro à objectividade. Como resultado que se obtém no laboratório do cientista, a objectividade é um produto da actividade do sujeito. A redução cartesiana do ser verdadeiro à certeza é, no fundo, a redução do ser à vontade do sujeito, a qual culmina com a vontade de poder de Nietzsche. Concebido como vontade, o eu reduz a totalidade do ente a si mesmo, ou, como diz Heidegger, o eu toma posse da totalidade do ente. Mas, como afirma Heidegger, «o próprio facto de que o homem se torne sujeito e o mundo objecto mais não é que uma consequência da essência da técnica em vias de se instalar, e não inversamente». Ao concretizar-se efectivamente como ordem do mundo, a técnica abole toda a diferença ontológica. Do ser já nada resta: apenas ficaram os entes, cujo ser é total e exclusivamente o ser imposto pela vontade do homem produtor e organizador. A técnica e a instrumentalização total do mundo é, para Heidegger, a metafísica cumprida: o esquecimento total do ser. A redução do ser verdadeiro à vontade do sujeito tem o carácter de uma tomada de posse. A conquista do mundo enquanto imagem concebida coincide inteiramente com a sua exploração técnica. Ao reduzir o ser à certeza, Descartes converteu a natureza num ser objectivo, susceptível de ser instrumentalizado. Nesta perspectiva, a filosofia da natureza de Descartes mais não é do que uma lógica da dominação, fundada numa concepção instrumental da natureza e da racionalidade científica.
Da comparação destes dois modos de conhecer resulta a ideia de que os homens modernos precisam descobrir um equilíbrio entre a vita activa e a vita contemplativa, de modo a evitar a atrofia da sua alma. O modo pragmático de conhecer revela os seus limites no trato com os outros homens, na relação do homem com o meio ambiente natural e, sobretudo, na relação do homem consigo mesmo. O homem moderno está descontente consigo mesmo e, como não se suporta, não consegue viver sozinho. A solidão é uma tortura, o silêncio é insuportável, a vida isolada é uma espécie de "morte social", e a desilusão constitui uma tortura que deve ser evitada. O refúgio na manada reflecte a debilidade do eu: o indivíduo que foge de si mesmo não pode ajudar os outros e, na sua inércia, contagia-os com a sua doença, o seu desespero, a sua angústia agressiva e as suas ideias povoadas de preconceitos. O vazio amplia-se. Um tal eu débil representa o oposto da alma mística. As virtudes do místico são torturas para a mente débil: o alheamento, a solidão, o silêncio, o afastamento, o vazio interior, o despojamento, a pobreza, o repouso mental, a pureza, o ascetismo, a mortificação, a caridade ou mesmo a douta ignorância. O eu débil e a alma mística representam duas atitudes diametralmente opostas diante da pobreza: o místico procura uma vida baseada no ser, enquanto o indivíduo débil procura compensar a sua doença com uma vida baseada no facto de possuir. A vida fundada no ter é menos livre do que a vida baseada no ser ou mesmo no fazer. Os homens que são renunciam aos bens e às propriedades e, no seu desejo de não ter, revela-se o mistério fundamental da experiência religiosa: a satisfação encontrada no abandono absoluto a um poder superior. Os homens que têm identificam a sua essência com as suas propriedades e a sua cobardia revela-se em cada euro que guardam sofregamente.
Meditação, Contemplação e Mística. De acordo com a teologia da experiência mística, não há meditação sem contemplação nem contemplação sem meditação. A iluminação mística como forma mais excelsa de um estado de ânimo só pode ser alcançada mediante uma actividade sistemática de natureza especial: a contemplação que requer sempre a eliminação dos interesses quotidianos. O misticismo pode ser definido, em termos muito genéricos, como a atitude religiosa em que o homem visa a união com as forças ou os seres sagrados. Em termos exclusivamente ocidentais, a mística tem sido entendida como unio mystica, isto é, o momento da plenitude, o êxtase da unificação, a "imersão da alma no mar infinito da divindade", o "nascimento de Deus na alma", a "metódica elevação da alma a Deus", como a descrevem os próprios místicos. A oração permite atingir os níveis mais elevados da experiência mística. A sua prática permite desde logo o desprendimento da mente de sensações externas que possam interferir na sua concentração em coisas ideais: Santo Inácio recomenda aos discípulos que expulsem todo o tipo de sensações através de uma série gradativa de esforços e exercícios espirituais para imaginar cenas sagradas. Este tipo de disciplina culmina numa espécie de monoideísmo semi-alucinatório: a figura imaginária de Cristo ocupa inteiramente a mente. Porém, nos casos mais elevados de rapto, as imagens podem desaparecer completamente. O estado de consciência deixa de poder ser descrito verbalmente. A união do amor é alcançada pelo "contemplação escura" (São João da Cruz) e, nesta união, Deus penetra a alma de um modo tão oculto que ela "não encontra termos" para traduzir "a sublimidade da sabedoria e a delicadeza do sentimento espiritual de que está cheia". Santa Teresa afirma que, na oração de união, "a alma está plenamente desperta no que diz respeito a Deus, mas inteiramente adormecida no que se refere a este mundo e a si mesma". Durante este estado de consciência, o místico experiencia uma "felicidade indizível": o deleite é de tal modo subtil e penetrante que não pode ser descrito pelas palavras da linguagem ordinária. As barreiras entre o indivíduo e Deus são superadas: o indivíduo é absorvido em Deus, tornando-se apenas um com Ele. Os estados místicos são janelas através das quais a mente olha para um mundo mais extenso e abrangente. A sua existência derruba a pretensão de que os estados de consciência não-místicos sejam os únicos a ditar o que podemos acreditar. Embora não tenham autoridade intrínseca, eles falam da supremacia do ideal, da vastidão, da união, da segurança e do repouso. A sabedoria mística não é sabedoria doutrinária, mas sabedoria experiencial, sapientia experimentalis. (CONTINUA)
J Francisco Saraiva de Sousa

27 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Infelizmente, por escassez de tempo ou em virtude da perplexidade, não posso explicitar toda uma filosofia da interioridade que me levaria a questionar os neuroresultados que vou expor noutro post desta série. E tudo isto em virtude do esquecimento do espírito que nos deixou quase sem resposta. Precisamos pensar o espírito humano não só nos seus resultados, o complexo cultural, no sentido hegeliano, mas também na sua experiência maos íntima, aquela que nos interessa em termos neurocientíficos, como mostrarei nesse outro post. Filosofar é um risco que assumo com alegria!

Fräulein Else disse...

Há uma coisa que eu não entendo na intenção do seu texto e, provavelmente, dever-se-á a um preconceito terminológico meu. Mas o Francisco utiliza o termo meditação em senso lato e ocidental, como contemplação, (o fito da contemplação é o Ser), o exercício da meditação, em sânscrito, dhyána, tem como fito não-pensar, abstracção total, infinito, o Nada. Eu não vejo nada de semelhante no Ocidente, nem a ataraxia dos estóicos.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, são dois tipos de meditação diferentes e o pior é que não temos um quadro conceptual adequado, o que se reflecte na interpretação dos correlatos neurais. Porém, existem aspectos comuns de acordo com a perspectiva da experiência.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, a meditação ocidental é oração e tratei disso no post sobre cérebro e experiência mística. Vou tentar no próximo post fazer outra aproximação teórica.

Fräulein Else disse...

Hmmmm... Ok, não me pareceu clara a distinção, pelo menos neste texto. Conceptualmente, são actividades muito diferentes, se o correlato neural revela semelhanças, isso é interessante de se averiguar. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, porque a varredura depende da participação e de actos volitivos. Caso contrário, à letra deveria ser um apagão total. Precisamos de uma teoria! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Porém, estava a tentar ver a meditação como processo cognitivo e não apenas como processo emocional, mas as experiências religiosas, místicas e espirituais têm correlatos neurais idênticos.

Se tiver outra sugestão, diga, porque procuro uma teoria mais abrangente.

Fräulein Else disse...

"a sua cobardia revela-se em cada euro que guardam sofregamente"... guardam? ninguém guarda nada, deveria ser antes: esbanjam profusamente...

Bem, vou-me deitar, estou doente e tenho de descansar... sofro com um corpo débil :(

Bom trabalho!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, tem razão: uns guardam e investem, outros esbanjam.

Este tema também me põe doente, mas lá vou arranjando vontade para o levar a bom porto. Sei que ele precisava de mais trabalho, mas é apenas uma tentativa de iluminar um oceano de experiêncis tão dispares.

O meu corpo também está um pouco estoirado, mas compenso com força anímica. Espero que acorde fortalecida e iluminada pelo espírito. E lembre-se que o nosso arqui-inimigo perdeu, enquanto os nossos amigos continuam na liga! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

É um universo fascinante o da espiritualidade e estive a estudar diversos desses universos, embora não possa falar deles todos. Vamos ver se no próximo sou mais claro a expor as ideias, porque neste procurei abranger o mundo do pensar.

Fräulein Else disse...

Bom dia F; estou mais ou menos - malefícios deste tempo agreste.

Olhe o que eu soube hoje e vem a propósito da introdução do seu texto: http://3.bp.blogspot.com/_OsxqXvMecDU/SUtkCWuoRpI/AAAAAAAAGVA/W5H4M3nC9-0/s1600-h/luzes.jpg

Só grandes nomes! Quero ir ouvir o Sr. Steiner! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Oi Else

Afinal, estou a resdescobrir Bergson: a teoria do misticismo de Bergson ajuda a clarificar a meditação. Só o misticismo cristão é completo: ultrapassa a contemplação rumo à acção. E teoria da memória cria dificuldades à neurociência: O Espírito é completmente real como testemunha a nossa experiência.

Fräulein Else disse...

Sim, o ponto de vista cristão não é alteração do que existe, mas do como se faz.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Gosto da noção bergsoniana da religião como seguro contra o medo, mas a sua distinção entre religião estática e religião dinâmica deixa algo por resolver. Estive a reler alguns aspectos das religiões nilotas e vejo nelas uma certa filosofia. O espírito significa ar, sopro, e esta significação está ligada ao corpo vivo. O seu lado biológico! O teísmo militante ou a estupidez privou-nos de compreender o fenómeno religioso e isto reflecte-se na situação actual indigente da filosofia e da ciência... Estamos desarmados. Porém, o misticismo pode ser reactualizado de modo a abrir um novo horizonte ao espírito humano: um fuga ao metabolismo reduzido e ao consumo de inutilidades.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Enfim, a experiência mística é puro GOZO e, no fundo, é isso que os neuro-estudos revelam. Curiosamente, Bergson disse que à ciência da matéria (física e química) iria sobrepor-se a "ciência psíquica", fomentada pela fisiologia e medicina: o misticismo pode reorientar a mecânica, isto é, imprimir um novo rumo à sociedade: libertar a espiritualidade do consumo metabólico reduzido. Critica Nietzsche e foi precedido por James: Nietzsche deve ser deitado ao lixo. A medicina mostra que os crentes são mais resistentes à doença e ao sofrimento do que os descrentes. A neurociência espiritual alia-se à medicina em diversos aspectos: a crença fortalece o corpo e o espírito. Coloca-se um problema neuro-epistemológico: Deus que se manifesta na alma, isto é, a sua presença. Estou farto do materialismo hedonista e culinário!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Aliás, não vejo a pertinência do materialismo para a tarefa da libertação e da emancipação. Doravante, vejo o materialismo como pura ideologia do poder corrupto. O materialismo é o alvo a abater!

E. A. disse...

O Francisco é que na sua estratégia compromete-se ideologicamente com a biopolítica capitalista. Se se pretende dignificar a crença religiosa e emancipar o homem, não é, certamente, justificando-a clinicamente.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Eu desejo apenas reavaliar a democracia e, por isso, sou pluralista: pessolmente estou mais próximo do misticismo do que da religião. O misticismo é experiência espiritual em primeira mão; a religião é cristalização.

Quanto o espírito, ele é irredutível. Não vejo como da matéria "bruta" possa surgir a vida e a consciência. E não vejo nenhuma objecção de peso quanto à "sobrevivência da alma". É evidente que não podemos criar uma ciência do espírito com os métodos da física (matéria). E também não posso negar certas experiências místicas. Em nome de quê? Da matéria bruta!?

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Negar o espírito é negar a nossa experiência constante. Quando reclamo, é o meu espírito encarnado que protesta, e não o meu corpo, muito menos visto como objecto ou instrumento. O espírito é liberdade!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, quanto à saúde existem muitos estudos que comprovam isso, logo a começar pela longevidade e pela mortalidade e pela recuperação. E, repare, que uma vida espiritual pode estar desvinculada de um sistema de crenças e de rituais. Há uma espiritualidade a-religiosa ou mesmo ateia.

E. A. disse...

Hmmm... não sei.
O Cristianismo também é experiência espiritual em "primeira mão". Assim o reclamou Kierkegaard.

E tambem não percebo como se pode ser mistico sem se ser com crenças. Pode não se praticar uma religião - aliás, o que acontece é praticar-se uma série delas indistintamente - , mas há a creça básica: acredito que tenho um espírito como um sopro que anima o meu corpo e perdurará pós-falência deste. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem, a possessão faz parte da religião e constitui uma interpretação do transe. Esse é um problema mais vasto: as técnicas (incluindo a meditação) variam, bem como as interpretações culturais. É um tema fascinante que nos levaria ao xamanismo e à teoria da perda da alma... :)

E. A. disse...

Ai Francisco, confesso que n gosto desse tema do misticismo/xamanismo/espiritismo/ e -ismos que tais. Mas tudo bem, se o entretém. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O xamanismo é uma filosofia do poder e pode ser distinguido da possessão por espírito. O xamanismo seria uma ascensão do homem aos deuses (movimento ascendente, sinal de orgulho do homem por ser igual aos deuses), e a possessão, uma descida dos deuses ao homem (encarnação). Duas atitudes antitéticas.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ui Papillon

Espero que seja mais do que um corpo animado! Brinco, porque o seu espírito não gosta dos temas espirituais: Este é um direito do espírito! :)

E. A. disse...

Ou se calhar, utilizando linguagem espiritual, o meu espírito ainda está num grau iniciado. :)

Bou jantar

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem, Elsinha, vou estudar bem todos os artigos para explicitar melhor a noção de espírito e de experiência espiritual. Contudo, é preciso ter em conta que os mestres gregos trabalharam a partir destas noções, tanto os pré-socráticos como o próprio Platão. Ao contrário do conhecimento que visa o domínio do mundo, a contemplação é saber da comunhão: não é o objecto conhecido que é manipulado ou alterado, mas o sujeito que faz essa experiência. Vejo neste modo de conhecer o caminho que nos permite zelar pela saúde do Planeta e convidar o homem a ter coragem para mudar o seu estilo de vida. O espírito está na terra e a sua missão deve ser cuidar da natureza.

O outro aspecto é aquele que vê no espírito o mundo da cultura: a cultura humana é uma manifestação do espírito humano, é a nossa cultura que devemos rememorar. Há outro caminho, o tecnológico: ligr o cérebro a um computador, o homem conectado à máquina. As experiências começaram a ser realizadas e, em casos graves, essa ligação permite ao ser privado comunicar com a máquina e dar-lhe instruções. Se esta via tiver sucesso completo, o futuro será como no filme Matrix e não me agrada muito. :(

O meu objectivo é compreender a mente humana e a religião ajuda a aprofundar esse conhecimento. Se Bergson tiver razão, a religião é uma reacção defensiva da natureza contra o poder dissolvente da inteligência. Esta substituiu o instinto no homem e segue um rumo que pode por a vida em causa. A religião seria um modo inventado pela natureza para prevenir tal dissolução: é um porto seguro que nos protege do medo e da angústia.