terça-feira, 19 de maio de 2009

Prós e Contras: Pensar Portugal (2)

"Prós e Contras" (18 de Maio de 2009) voltou a debater mais uma vez, em regime especial, o futuro de Portugal com novos convidados: Adriano Moreira (AM), Fátima Bonifácio (FB), Garcia Leandro (GL) e Viriato Soromanho Marques (VSM). O debate foi deveras interessante e rico em ideias orientadoras, muitas das quais expostas e defendidas por Adriano Moreira. No entanto, houve uma certa dispersão, talvez provocada pela própria complexidade do tema, mas, se pudesse escolher os meus próprios interlocutores, excluía desse diálogo Soromanho Marques, cujo optimismo exagerado não ajuda a iluminar a tarefa de pensar Portugal a longo prazo e de orientar uma praxis de mudança social qualitativa. A tripla-crise de que falou - crise ambiental, crise da arquitectura da globalização e crise da pobreza - e a sua solução não podem ser reduzidas a uma mera "questão de atitude e de método": a regularização dos fluxos financeiros e a adopção de políticas públicas são insuficientes para resolver a crise estrutural. Portugal não vive apenas uma crise externa, mas uma crise estrutural profunda que o "coloca à beira do abismo", como disse Garcia Leandro. Pensar Portugal não é pensar o seu futuro a curto prazo, puramente imediato, mas a sua sustentabilidade a longo prazo no quadro da Europa e da ligação atlântica da UE com os USA (AM). (E a Rússia não faz parte do Ocidente? Faz! E a UE deve estar preparada para a integrar no seu seio, de modo a alargar as suas fronteiras até o Pacífico, porque o nosso destino ocidental pode depender mais dessa integração do que da aliança com os USA ameaçados internamente por forças obscuras.) A perspectiva a longo prazo, historicamente fundada e protegida contra os optimismos precipitados dos satisfeitos com o sistema, foi exposta por Adriano Moreira, com a preciosa colaboração de Fátima Bonifácio e de Garcia Leandro. O pessimismo metódico é a única atitude teórica saudável que permite pensar o futuro sem perder a esperança, por uma razão muito simples: não esconde que atravessamos a longa noite de um tempo de declínio que pode amanhecer num mundo completamente diferente daquele que conhecemos, não num mundo melhor, mas num mundo de "sangue, suor e lágrimas" (Garcia Leandro). Ao não esconder essa possibilidade real, o lado mau da história que não exclui a guerra (GL), o pessimismo metódico convida todos a participar na construção do futuro que não está garantido, e muito menos nos moldes sociais, culturais e civilizacionais a que estamos habituados.
A nossa matriz civilizacional e identitária, o Ocidente, está a ser seriamente ameaçada, interna e externamente: o futuro é sombrio e só há uma maneira de combater, de modo vertical e mental e cognitivamente armado, essas sombras negras que ameaçam afundar-nos no caos total, aquilo a que Adriano Moreira chamou a mobilização do espírito ou da massa cinzenta. A mobilização do espírito não é a mobilização de qualquer espírito, nomeadamente do espírito do capitalismo que nos arrasta para o abismo ou do espírito da tecnologia que pode ser usada para nos destruir: é a mobilização do espírito azul que nos anima na tarefa de recriação, relançamento e afirmação do Ocidente no mundo globalizado, cujos centros de decisão fogem cada vez mais da Europa ou mesmo dos USA para o Oriente, em especial para as economias emergentes da China e da Índia. A perda da posição de dominação do Ocidente no teatro do mundo não é somente uma catástrofe para nós ocidentais e europeus, mas também a entrega da Terra e dos seus habitantes às forças naturais da sua destruição acelerada. As multidões de criaturas humanas que habitam a Terra inviabilizam o futuro da vida neste planeta azul, não só porque estão a devorá-lo, mas também porque a sua existência metabolicamente reduzida desperdiça inutilmente energias sem trazer uma mais-valia ontológica ao mundo. O Ocidente deve unir-se internamente e alargar as suas fronteiras, sob a liderança de grandes políticos, capazes de promover grandes políticas, de modo a mostrar aos outros povos que o modelo de crescimento económico que seguiu foi e é um suicídio. A sua suposta força de atracção que exerce sobre as periferias pobres é uma força destrutiva: a Terra não possui recursos e capacidades regenerativas capazes de manter a irracionalidade deste modelo devorador de sociedade e de economia, e muito menos a sua universalização a todos os cantos do mundo.
A actual crise financeira e económica revela a fragilidade estrutural de Portugal e atiça-nos a pensar, com um olhar muito crítico e desapaixonado, o que aconteceu depois do 25 de Abril: Adriano Moreira lançou o ideia de que o Estado entrou em "férias sabáticas" depois do 25 de Abril, donde resultou a actual crise de falta de confiança dos portugueses na justiça e nos políticos e o seu desconhecimento das questões europeias, da situação da verdadeira UE e da sua importância para o futuro de Portugal. A confiança entre governantes e governados foi quebrada devido às "incongruências do Estado" e à viciação do tecido político: o facto de um órgão de soberania - o Ministério Público - falar através da sua voz sindical revela o erro enorme que é o funcionamento do Estado, para o qual contribuíram o presidencialismo do Primeiro-Ministro subjacente às maiorias absolutas e o facto dos melhores não ocuparem os cargos públicos. (Os melhores são expulsos pelos instalados!) A crise do sistema judicial foi reforçada por Fátima Bonifácio que vê nele um poder do Estado organizado contra o Estado: um poder corporativo que fala pela voz sindical. Os magistrados portugueses querem gozar de benefícios e de estatutos especiais, mas na verdade comportam-se como funcionários públicos e, como tais, não deviam desfrutar desses benefícios. A autonomia do poder judicial não só dificulta toda a tentativa de reformar o sistema judicial, como também tende a converter-se em "autonomismo" (VSM), de resto um poder dividido pelas "guerras de clãs" que o habitam (GL). A quebra de confiança no funcionamento judicial é uma das forças responsáveis pelo alheamento dos portugueses, mais preocupados em assegurar o seu bem-estar e as suas regalias do que em participar na implementação de novas políticas públicas de interesse nacional. A revolução do 25 de Abril criou "expectativas tremendas" numa população demasiado pobre que, no momento presente, o que lhe interessa da UE é "sacar dinheiro" para satisfazer as suas necessidades e o seu bem-estar. Convertidos em meros consumidores, os portugueses não estão interessados em escutar "verdades", preferindo acreditar nos partidos e nos candidatos que lhes prometam maior bem-estar e outras "mentiras". Os consumidores não são bons cidadãos e a sua ligação com os partidos políticos é perversa, forçando os políticos a evitar "pregar no deserto", isto é, a fazer propostas realistas de futuro, se quiserem vencer as eleições europeias e nacionais. Para os consumidores vorazes, a Europa é um mana ou um Euro-Milhões: o povo quer consumir, fingir que comunica via telemóvel e exibir o seu esqueleto ao volante de um automóvel.
É certo que Portugal precisa da Europa, como frisou Adriano Moreira, mas os portugueses desconhecem e ignoram a Europa e a sua situação no mundo, não só por causa da política europeia ter sido furtiva, mas sobretudo porque a chamada teologia de mercado, expressão cunhada por Marx, promove a regressão mental e cognitiva das pessoas, reduzindo-as à sua condição de animais de consumo voraz. Ao contrário do que pensa Adriano Moreira, a ideologia fundamentalista de mercado destruiu completamente o sistema de ensino e de educação: a tarefa de mobilizar o espírito enfrenta a escassez de inteligência cultivada. O 25 de Abril destruiu as universidades portuguesas e a crise generalizada da educação, agora agravada pelo tratado de Bolonha, começou no ensino universitário, invadido e dominado por pessoas destituídas de conhecimentos que não deixam ninguém trabalhar: Universidades medíocres e viciadas na e pela cunha não requalificam as populações! A paz tão elogiada por Soromanho Marques é, pois, uma paz podre: a domesticação do gado humano através da elevação do nível de vida promovido pelo desenvolvimento tecnológico suavizou os efeitos da luta de classes, mas cria muita frustração que, em situação de desemprego e de pobreza extrema, pode emergir na forma de violência gratuita, já testemunhada em França, na Grécia e agora em Portugal. A regressão cognitiva estimula formas de agressão e de violência que minam o civismo: a cidadania evapora-se no horizonte da fantasia e os chamados "idiotas felizes" sacrificam o futuro no altar de uma vida imediata satisfeita consigo mesma e eternizada nessa forma de consciência endurecida. A crise antropológica é universal: reduzidos à condição de animais consumidores, os homens perderam a experiência e o contacto com a tradição, deixando de pensar. Esta crise do elemento humano revela a fragilidade da proposta de Adriano Moreira: "não mudar o todo, isto é, o povo, mas sim o governo". Estado e sociedade civil co-pertencem-se: o sono do consumismo é adversário da mudança social qualitativa. A humanização dos animais metabolicamente reduzidos é a nossa tarefa mais urgente e a sua realização exige um poder político forte e coeso, capaz de usar todos os seus aparelhos de Estado, ideológicos e repressivos, que, nesta hora sombria, falam a diversas vozes sindicalizadas. O Estado perdeu poder e, por isso, pode colapsar a qualquer momento.
Adriano Moreira desenvolveu a ideia de que depois da queda do Muro de Berlim o poder financeiro se autonomizou e adquiriu soberania durante estas últimas três décadas caracterizadas pelo fim das ideologias: a actual crise financeira e económica deriva basicamente dessa soberania do poder financeiro que corrompeu a política, subjugando-a aos interesses económicos privados, e os políticos ocidentais, ao mesmo tempo que constitui o fracasso total da ideologia do fundamentalismo de mercado. O mercado é incapaz de auto-regular-se e, por isso, estamos a assistir ao regresso do Estado. Mas está o Estado dilacerado e corrupto preparado para esta missão? Portugal precisa da Europa, mas a Europa não é um projecto garantido, até porque o G20 é fundamentalmente um "G2 (USA e China) + 18", onde a UE não está representada (AM). Além disso, como mostrou Fátima Bonifácio contra o optimismo doentio de Soromanho Marques, a Europa não é politicamente forte, porque não é militarmente forte, enfrentando o terrível dilema: ou o modelo social europeu ou o armamento. Portugal precisa de inteligência informada, preparada e cívica (AM), mas o que temos é uma multidão de consumidores irracionais que reivindica mais do mesmo. Portugal precisa do Estado, mas este está absolutamente corrompido e dilacerado. Portugal precisa de novas políticas públicas para garantir o seu futuro, mas o que predomina é o "parlamento dos murmúrios" (AM), isto é, a politiquice barata difundida e prostituída pelos meios de comunicação social. A questão é esta: Como restaurar a confiança e a esperança com estas pessoas - governantes e governados - adormecidas, anestesiadas e medíocres? O salto qualitativo exige uma ruptura radical com a ordem estabelecida e o futuro só pode ser garantido por aqueles que tiverem coragem para iniciar essa ruptura. A ruptura é sempre um acto de violência cometido contra aqueles que nos conduziram ao longo de anos à situação presente de desespero: a mudança de paradigmas exige mudança prévia de pessoas e reformulação das elites, porque as que estão instaladas lutam contra a mudança social qualitativa, comprometendo o futuro de Portugal. Nada está garantido e, nesta hora de crise de civilização, joga-se o futuro da aventura humana. O debate em torno do futuro de Portugal, da Europa e do Ocidente começa agora...
J Francisco Saraiva de Sousa

61 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Reconduzo para outro post com o mesmo título: "Prós e Contras: Pensar Portugal", onde desenvolvo ideias complementares. Outras ideias ventiladas não podem ser aqui desenvolvidas, para não tornar o texto demasiado compacto e longo. Pensar Portugal é sempre uma tarefa em andamento e já fiz aqui muitas reflexões a esse respeito: não quero repetir o que já foi dito tantas vezes... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Infelizmente, ainda não conheço os estudos sobre o liberalismo português de Fátima Bonifácio, mas ando curioso! Também nunca li Adriano Moreira! Não há tempo e dinheiro para ler e comprar tudo! :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Precisamos de uma nova filosofia da história de Portugal. Precisamos muito de Filosofia...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Os professores andam loucos: 12º anos de estudo, incluindo mestrado da treta, e diz tanta barbaridade na aula... Que vergonha de professores! Mete nojo a existência destas criaturas analfabetas e grossas diplomadas!
:(

Fräulein Else disse...

Francisco, ouviu as barbaridades da professora da história gravadas por uma aluna??? Meu Deus... Diga-me se n é falta de pila-->falta de sanidade mental.

E ainda por cima fala mal: "(tu) metestes" e "amíguíssimos"

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Também ouvi e fiquei com a pulga atrás da orelha, mas não posso falar em público. Declarações vergonhosas: uma aula sobre cuecas húmidas? Porém, existem assim muitas professoras taradas e insaciáveis: só querem pila dentro..., comem tudo, até nos centros comerciais, como sucedeu recentemente... O nosso país anda sob o signo da loucura!

Fräulein Else disse...

Ai Francisco, sempre cheio de mistérios... lol

Fräulein Else disse...

N me diga q foi comido por uma professora no Norte Shopping. ahah
Espero que fale melhor q esta...
Viu a parte das orgias dos romanos: comem e vomitam, comem e vomitam, comem e vomitam... mas n é comida, são as raparigas!!!
ahah

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E quando andam à caça de jogadores de futebol? Ou na Internet, em chat? Mostram tudo, fazem tudo, dizem que comem os alunos, os colegas, os empregados, os guarda-nocturnos, etc... E enviam por e-mail a vulva rapadinha! Mas são pessoas destas que dizem ser professoras! Há casos conhecidos mas abafados, como uma que se meteu na casa dos pais para comer o filho/aluno! Obrigava o miúdo a mamá-la!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Esse caso do shopping saiu no jornal: uma entregou-se no armazém a um polícia e toque-toque...

Fräulein Else disse...

Sim, há vários professores assim, e machos tb. Tb tenho peripécias dessas no percurso da minha escola obrigatória... aliás, tb fizémos queixa na altura e ele foi despromivido de dar matemática, passou a dar uma treta qq de electrotecnia. Atirava o apagador à cabçea dos alunos, aos alunos q tinham nega (n era o meu caso q eu era aluna de 5) atirava com os testes para o chão a dizer q estavam uma merda, etc...
Além de pintar mulheres nuas durante as aulas e cenas assim. E disse-me uma vez: Fraulein Else (leia-se o meu nome) tu até és bonita, mas tens a boca grande. Imagine.
Mas escreveu um livro e depois foi oferecer-mo com dedicatória.

Fräulein Else disse...

Ya, eu acho q as professoras devem ter vida sexual, mas devem ter decoro tb. Enfim, uma vergonha mesmo... envergonhei-me e choquei-me a ouvi-la.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Enfim, o ensino des-ensina...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Vida sexual fora da escola ou do local de emprego..., mas as casadas/os não respeitam os companheiros/as. É um excesso de sexo frustrado. Vidas vazias e fracassadas compensadas com sexo sem sentido!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Usam os pseudotítulos académicos, do tipo mestrado em cuecas húmidas! Sim, muito vergonhoso e reles, falta de carácter, de brio, de inteligência, enfim de postura: uma destravada...

Fräulein Else disse...

Ya, muito sexo frustrado mesmo. E acho q as mulheres ficam mais chonés com isso.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estou lixado com a crítica de que faço interpretações alegóricas da poesia, embora Benjamin gostasse da alegoria. Detesto a crítica literária! Ainda por cima constipei-me! E ainda não é hoje que concluo o post do F. Pessoa... :(

Fräulein Else disse...

Quem o acusou de ser alegórico? A alegoria que é no fundo o método analógico, tem as suas limitações explicativas, sim, mas n vejo de todo mal, se o seu uso n for excessivo.
E o Francisco n pode ser excelente a tudo.

Bom trabalho!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Umas "literatas" da casa! A malta está habituada a não dizer nada de substancial, como referências às correntes literárias classificadas por tópicos, mas não gosto dessas prisões áridas...

O Caeiro é todinho ambíguo, mas penso que a chave que queria experimentar é talvez muito sofisticada para o F. Pessoa: os escritos dele ficam aquém das expectativas, mas ainda não sei... A concepção da metafísica como poesia permite ir lá, mas os textos não se conformam.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas o meu problema é outro: não desejar ver a metafísica superada, o que colide com qualquer um dos mestres, além da historicidade dever ser reformulada.

Caeiro nega simplesmente a metafísica sem a conseguir superar ou anular, dado parasitar as suas questões.

Pessoa encara-a como poesia, mas a noção de poesia avançada é deveras pobre.

Campos encara-a como uma ciência virtual, dissolvendo-a nas ciências. É um positivista...

E todos eles não chegam a vislumbrar a antropologia fenomenológica como acesso à questão... O nada visto a partir do homem...

Fräulein Else disse...

Oh que pena que essas literatas não comentem em linha, assim n podemos ter acesso ao q dizem.

Interessante a sua visão sobre a poesia de Pessoa, é exactamente contrária à de Badiou. O Francisco diz q a poesia dele fica aquém, ele diz que fica além, e que a filosofia que se fez até hoje é incapaz de captar o pensamento de Pessoa. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não conheço o Badiou: o que diz ele? Apresenta uma chave?

Uma chama-se Rosa, outra Teresa, outra...

Fräulein Else disse...

Rosinha, Teresinha, venham dialogar em linha. lol

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Detestam computadores, porque, na sua perspectiva, "estes animais" competem com as mulheres, ou seja, o brinquedo dos homens afasta-os das mulheres. Uma concepção arcaica, enfim...

Fräulein Else disse...

Ya... inseguras, o futuro é como no Matrix, estarmos sempre ligados a máquinas.

A teoria do Badiou é que Pessoa abre um intervalo ainda n tematizado pela Filosofia: um "entre" platonismo e anti-platonismo... vale a pena ler o seu ensaio, é muito diferente da tarefa q tem tentado fazer. Ele, por exemplo n vê a heteronomia como drama subjectivo.

Fräulein Else disse...

N se pode dizer q apresente uma chave, mas abre caminho para se perceber o porquê da insuficientes (em termos de qualidade) leituras filosóficas de Pessoa. Eu gosto de Badiou.

Fräulein Else disse...

http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1381155&idCanal=58

Eu tb sou contra esta tendência de ultra-especialização e profissionalização! Se nós falarmos com pessoas mais velhas (60, 70, 80 anos), elas têm (mesmo q n sejam licenciadas) muito mais cultura geral do que nós hj em dia. Agora querem-se pessoas muito boas a pregar um prego e analfabetas no resto, para n terem um panorama da realidade...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A mim o que me deixa perplexo é o desfasamento entre a poesia (conjunto de poemas), as poéticas (teorias da poesia) e as ideias filosóficas e estéticas de F. Pessoa. Os poemas podem ser lidos, mas, quando recorremos aos outros textos escritos, ficamos perplexos. F. Pessoa psicologiza muito, a ponto de ter explicado a poesia de Sá-Carneiro pelo facto da mãe ter morrido cedo e ele não ter tido afecto, e, no mesmo texto, com recurso a Freud, fala do falo... As definições que dá de poesia são pobres... Este é o meu dilema; não os poemas, a sua obra poética, mas os textos...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, também eu gostava de ter um poeta em língua portuguesa genial para avançar novas ideias, mas os que tenho não o permitem como quero...

Não sei se o Badiou terá razão, porque se confrontar os poemas e os textos confronta a diversidade e esse desfasamento casado com proximidade...

Fräulein Else disse...

Ahahah...

Lamento, mas Pessoa é genial. A sua inteligência é q é limitada e n vê. Por que n o admite??

Fräulein Else disse...

É como diz Badiou: lê-se o poema e está lá tudo.

Fräulein Else disse...

O Francisco tem ideias pré-concebidas e quer moldar a arte às suas ideias. Mas elas, por mais nobre intenção que tenha, são pequeninas e ainda medícores para a grandeza de Pessoa. Talvez daqui a algum tempo se consiga ou nunca. É assim.

Fräulein Else disse...

Ou então, uma vez que quer ser "laureado" à força... escreva o Francisco poesia e uma poética da sua própria poesia. Assim fica genial aos seus olhos. Masturbação intelectiva.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A Else já leu a obra escrita de Pessoa? Veja a classificação dos sistemas filosóficos! A concepção de tempo e espaço! A crítica literária! A sociologia, a política, a antropologia, a cosmologia! Isso é genial? Olhe que de genial não tem nada!

A poesia fala a diversas vozes e a questão é localizá-la, identificar o lugar donde fala... O próprio F. Pessoa coloca a heteronomia em termos de drama psicológico! Muitos textos sobre isso ele escreveu...

Eu só tento compreender, mais nada...

Fräulein Else disse...

Conhece o livro de Judith Balso?

Fräulein Else disse...

Mas n me interessa isso, interessa-me a poesia... se ele fosse bom filósofo, seria filósofo e não poeta... desde o pai Platão q se deu a clivagem, irresoluta.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Nesses textos não vislumbro um entre platonismo e anti-platonismo, até porque os textos revelam que Pessoa não compreendeu verdadeiramente os filósofos que refere... Não adianta escamotear essa lacuna, porque os textos estão-aí para o comprovar...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não...

Sim, e como localiza o lugar donde a poesia fala? Ou prefere um dos heterónimos? Há aqui um problema hermenêutico de fundo...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas para pensar a poesia precisamos de alguns indicadores extra-poéticos; caso contrário, podemos ficar perdidos...

Fräulein Else disse...

Ya, eu tb não, mas ela escreveu um livro importante sobre Pessoa.

A tese de Badiou sustenta-se exclusivamente na sua obra poética e n nos seus escritos.

Fräulein Else disse...

Por acaso n concordo consigo, gosto do princípio da "morte do autor".

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Gadamer deu-lhe a resposta: sem essas ideias pré-concebidas não sabemos colocar perguntas aos textos...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas o que disse não é incompatível com a morte do autor...

Fräulein Else disse...

Mas preconceitos há sempre, certo, mas os seus fulminam a poesia de Pessoa com tanta cegueira.

N acho q os seus escritos sejam relevantes no entendimento da sua obra poética. No fundo, o poeta pode interpretar a sua obra, de forma errada, ou insuficiente, é apenas uma perspectiva como outra qq. (problema de estética classico)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Por exemplo:

"Um poema é uma impressão intelectualizada, ou uma ideia convertida em emoção, comunicada a outros por meio de um ritmo".

Definição de Pessoa!

Sim, mas existe um trabalho de elaboração, cujo acesso permite ver como a poesia foi construída em ligação com esse trabalho mais estético e filosófico. Sim, a própria perspectiva de Pessoa é fraca... Autohomicídio!

Fräulein Else disse...

Sim, é uma definição banal, não ajuda na interpretação da sua poesia.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Pois..., nem ajuda a compreender o resto, e no entanto no meio tem boas ideias que lança ao lixo. Pena! O melhor é mesmo meditar a poesia, embora os puristas estejam atentos a esses aspectos que neste caso não ajudam o próprio poeta...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Só gostava de saber que livros de filosofia seguia, porque os seus "esquemas" são escolásticos. Dos autores que conheço nenhum descobriu essa fonte de inspiração filosófica... (Vou tomar banho! Cortei o cabelo e estou cheio de pelos ou assim penso...) :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Enfim, a leitura "metafísica" do Pessoa que estava a fazer é desmentida pela sua prosa! :(((

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A Sophia Andresen tem poemas giros, mas já muito marcados pela poesia de Rilke e outros grandes poetas. Eis um poema profundo:

"Exilámos os deuses e fomos
"Exilados da nossa inteireza".

Ou este:

"Aqui - como convém aos mortais -
Tudo é divino
E a pintura embriaga mais
Que o próprio Vinho".

Caro Augusto Cardeal

Sim, Fernando Pessoa foi um grande poeta, mas não o maior do século XX: Rilke, Trakl, Eliot, e tantos outros.

Fräulein Else disse...

Acho q foi dos maiores, sem dúvida, n o igualo a Trakl, nem a Eliot!

carolus augustus lusitanus disse...

Conheço e li-os todos e gosto bastante, sobretudo de Trakl -- que nasceu no mesmo dia que eu, e até já «romei» à sua casa em Salzburgo, tendo mesmo começado a traduzir a sua poesia quando frequentei o Goethe Institut, por pensar que Paulo Quintela não tinha «chegado lá» :) --, sem falar em Goethe e Novalis (e também os seus aforismos), e outros mais, mas não chegam lá, ao quid do dilaceramento do «fingidor» e à sua alma de sentir um povo que tem uma Mensagem (ainda) a «comunicar» ao mundo capitalo-materialista e belicoso (que ainda está para durar...).

Esta é a minha (mera) opinião, claro; eu não leio a sua obra na grelha da mainstream (nem tão-pouco estou lá a colocar o Franscisco nem ninguém, que não os autores/compiladores que editam por «ser bem» e/ou ser moda), mas antes tentando perceber essa mensagem velada que «passa» às gerações futuras desta terra incognita que um dia ainda «vai cumprir seu ideal»...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Obrigado amigos.

Estive a reler alguns poemas e desconfio onde posso ir buscar a unidade da poesia de Fernando Pessoa, talvez no próprio Pessoa e não tanto nas máscaras. Só que as ideias que aí surgem são meio-estranhas e talvez ainda não tenham sido pensadas em termos filosóficos. Elas aparecem muito dispersas e os Poemas Ingleses revelam aspectos muito interessantes. Penso ser necessário de momento esquecer os textos do poeta e agarrar a sua poesia. Será necessário elaborar novos conceitos e depois articulá-los: o resultado pode ser um tipo de pensamento não-metafísico. Vai dar trabalho... A carne pode ter um papel nesse enredo... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, mas não vou desistir de procurar pensar a poesia de Pessoa; posso demorar algum tempo, quanto não sei, mas não vou desistir: acredito nos meus palpites e lá chegarei à Mensagem. Sou teimoso! Essa é uma tarefa que cabe a nós portugueses e não a estrangeiros. Orgulho nacional! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Pessoa diz ser um labirinto, mas os labirinto têm uma saída, pelo menos; não é necessário ficarmos perdidos nas sua encruzilhadas... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

As peças básicas da metafísica encontram-se nos Poemas Dramáticos, em especial no Fausto: apreendidas ajudam a iluminar o resto, com as devidas modificações.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Recebi hoje uma prenda: a 1ª edição portuguesa de "A Confissão de Lúcio" (1914) de M. de Sá-Carneiro. Já tinha a segunda edição. E com a encomenda: dedica-lhe outro post. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O "materialismo espontâneo" e ateísta de Caeiro implica uma outra metafísica, ou melhor, a sua negação: a de T de Pascoaes e de G Junqueiro. Não há nada "oculto", porque a coisa oculta é a coisa sem ser oculta. A alma é a própria coisa. A ciência do ver não é ciência. Uma fenomenologia? Parece mas não é uma fenomenologia, talvez mais uma fenomenologia do corpo. Caeiro coloca muitas questões à Filosofia... e, neste momento, começo a compreendê-lo... Afinal, Pessoa não é inacessível... Estranho é nunca ter sido compreendido!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

No entanto, Caeiro usa de modo peculiar certos termos, palavras ou conceitos, que não correspondem ao seu sentido filosófico "normal"...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Na tentativa desesperada de ridicularizar os poetas místicos (Pascoaes, Junqueiro), Caeiro dá tiros nos seus próprios pés. Eis um exemplo:

"Mas as flores, se sentissem, não eram flores,
Eram gente;
E se as pedras tivessem alma, eram cousas vivas, não eram pedras..."

Do último verso deduz-se que a vida é um corpo animado pela alma. Ora, esta noção de vida choca com a sua concepção mais geral da natureza: a negação da metafísica não é conseguida porque retém a noção de que a realidade é apresentada ao (seu) "eu sou" nos sentidos. Há aqui um solipsismo dos sentidos que choca com o resto, embora recorra aos outros para mostrar que a natureza existe. Estas contradições podem talvez ser superadas numa leitura mais atenta, mas elas existem e mostram que a metafísica das sensações é mais uma versão da metafísica que Caeiro pretende negar.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ele está consciente de tudo isso, porque tenta desaprender tudo o que aprendeu, de modo a ficar limpo para nomear as coisas sem recorrer ao pensamento: sentir sem pensar, mas este sentir nunca se espanta nem com a morte e, por isso, não capta o mistério: ser em vez do nada...