terça-feira, 23 de novembro de 2010

Prós e Contras: Greve Geral - Os ganhos e as perdas

«Nada me importas, País! seja meu Amo
O Carlos ou o Zé da T'resa... Amigos,
Que desgraça nascer em Portugal!». (António Nobre)

«Porque não nos suicidamos?
Jesus! Jesus! Resignação...» (António Nobre)

O debate Prós e Contras de hoje (22 de Novembro) debruçou-se sobre a greve geral: as duas grandes centrais sindicais portuguesas uniram-se para realizar brevemente uma greve geral. Carvalho da Silva e João Proença debateram os ganhos e as perdas desta greve com Helena André (Ministra da Segurança Social), Cavaleiro Brandão, Silva Peneda e José Reis. Durante o debate ocorreu-me a ideia de recorrer a esta imagem de Erwin Olaf - Marie Antoinette, 1793 -, para mostrar o resultado final de uma greve geral bem-sucedida: a decapitação dos responsáveis pela actual crise económica e financeira: o Banco Central Europeu, os eurocratas, os banqueiros, os especuladores, os empresários parasitários do Estado, os economistas, os gestores, os dirigentes políticos, a banca alemã, a banca francesa, enfim a actual União Europeia. O uso da guilhotina para decapitar as elites do poder da Europa e do Ocidente é o único meio saudável que temos ao nosso dispor para continuar a sonhar um mundo melhor: os carrascos instalados que falam a mesma língua(gem) não podem ser os nossos redentores. A tarefa de libertar o futuro do Ocidente exige, em primeiro lugar, a decapitação de todas as esferas do poder europeu. Com esta exigência ético-política, evito comentar as perspectivas ventiladas neste debate e condenar a sua falta de imaginação política: o jogo está de tal modo viciado que não permite pensar para além do paradigma dominante, e, quando isso acontece, só nos resta a via revolucionária para sair da crise.
J Francisco Saraiva de Sousa

19 comentários:

Manuel Rocha disse...

Pois ! Mas como está visto essa via ninguém a quer assumir. Em vez disso prefere-se descartar argumentos avulsos que tanto criticam os maleficios do capitalismo como lhes reinvindicam as vantagens que proporciona. Quando se trata de ser consequente, é um total vazio. Não fosse isso e, em coerência, quem amanhã apoia a greve, já teria apresentado e aprovado na AR a moção de censura que promove na rua. E depois propunha a saida do Euro e a nacionalização da banca.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel Rocha

Medidas radicais as suas! Mas precisamos alterar profundamente a sociedade portuguesa e as mentalidades: eles pensam no regresso no mesmo estilo de vida, tendo como pano de fundo melhorias quantitativas permanentes. Ora, o que precisamos é de um salto qualitativo e, de certo modo, o José Reis está mais próximo desta posição.

Apesar de ainda terem a cabeça presa ao tronco, estas figuras comportam-se como decapitados mentais e cognitivos... :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, eles não apresentam a moção de censura porque são prisioneiros do modelo dominante: não conseguem transcendê-lo!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ontem, numa entrevista da SicNotícias, José Sócrates afirmou que nunca foi marxista! Enfim, a sua ideologia política é o pragmatismo deslumbrado com a falsa riqueza nacional.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Agora uma resposta pública aos emails que me enviam:

Tenho recebido muitos textos para editar neste blog. Muitos são estudos universitários. Porém, a configuração desses textos não facilita a sua transferência para o blog. Agradecia que me enviassem os textos libertos dessas configurações. Mas vou ver se edito um ou outro...

Manuel Rocha disse...

:)

Falta um ponto de interrogação no fim do meu comentário.

Não são medidas que eu defenda. O que questiono é se em coerência seriam defendidas por quem insiste na teoria da solução interna de problemas sobre os quais não existe possibilidade de acção isolada e directa. Mas o registo que permanece é identico ao do PSD quando declarou que era possivel cortar mais na despesa. Onde ? O governo que resolva. Pois !

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Os sindicalistas e outros são contra a redução salarial: criticam o irrealismo de Sócrates mas partilham a mesma imagem do país. Aumentar os salários, aumentar o consumo: eis a receita económica dos sindicalistas. Ao mesmo tempo reconhecem a necessidade de redução do défice através das medidas de austeridade criticadas! Ou então querem redistribuir a riqueza - mas que riqueza, a do endividamento externo? No fundo, querem a elevação quantitativa do nível de vida e é isto que bloqueia a imaginação política...

antónio m p disse...

Inteiramente de acordo, uma vez mais, com o texto do seu artigo, Francisco, tenho dificuldade em aderir a alguns comentários seus, posteriores. Talvez venha a explicar-me melhor, com tempo.

Já sobre a atitude de Manuel Rocha não tenho grandes dúvidas: quer a "revolução já" e desvaloriza o alcance das iniciativas sindicais.

Se há condições para essa "revolução já", porque não a faz? E se não há, que se deve fazer senão iniciativas que contestem a política, ao mesmo tempo que mobilizam e organizem a gente na perspectiva daquilo a que eu tenho aqui chamado de "revolução"?!

Com toda a consideração pois é claro que o M. Rocha a merece pelas intenções que manifesta.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Eu defendo uma ideia simples: Portugal não pode continuar a viver acima das suas possibilidades. O enriquecimento aparente - com excepção do dos corruptos - foi realizado através do endividamento: Portugal liquidou o seu tecido produtivo pensando que podia viver dos maus serviços.

Para evitar a regressão, defendo recuos estratégicos: a ideia de aumentos quantitativos contínuos é um suicídio. As pessoas podem ter vidas saudáveis sem consumir irracionalmente e devorar o mundo. É preciso valorizar o trabalho, o conhecimento, e cultivar mais a mente. O neoliberalismo deve ser liquidado e a iniciativa privada deve ser forçada a correr riscos! O Estado deve ser repensado!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O PS deve abrir os olhos e ser verdadeiramente de Esquerda, propondo um novo governo, um novo Primeiro-Ministro! Esta fórmula está gasta: conduziu à bancarrota! Esta greve geral de 24 de Novembro implica essa mudança de governo!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A Europa está mergulhada na corrupção e na incompetências: os seus dirigentes são medíocres. A Angela é uma barbie, o Sarkosy não funciona bem da cabeça - até chama pedófilos aos jornalistas -, Berlusconi é um tarado..., enfim gente decadente e sem cultura. Enfim, somos governados por ladrões sem qualificações... :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A União Europeia vai desagregar-se...

antónio m p disse...

«...tanto criticam os maleficios do capitalismo como lhes reinvindicam as vantagens que proporciona».

Poderá o Manuel Rocha explicitar melhor - se não aqui, para não abusar deste espaço, no seu próprio blogue - a quem se refere e que vantagens são essas? Isso poderia levar a um debate interessante sobre se as leis económicas são ou não dependentes dos regimes políticos.

Para esta fogueira deitei a minha acha em
http://antonio-mp.blogspot.com/2010/10/as-novas-viagens-de-circum-navegacao.html

lp disse...

Há muito tempo que já não vinha a este blogue. E isto por uma razão muito simples: ainda que o Francisco revele ser alguém bastante culto e escreva posts interessantes sobre matérias teórico-filosóficas, quando aborda os problemas práticos e a governação do dia-a-dia sempre mostrou um facciosismo pró-sócrates pouco ou nada consentâneo com as tais abordagens teóricas. Sempre estranhei que alguém que se farta de citar Marx, Bloch, os teóricos da escola de Frankfurt, etc, etc, fosse ao mesmo tempo um adepto e defensor ferrenho do Sócrates e da sua governação alinhada com neoliberalismo domimante, e que atacasse aqueles que ousaram vir para a rua protestar contra as medidas deste governo. Só o facciosismo ou a burrice (ou ingenuidade) explicariam esta duplicidade nas suas análises. Como o Francisco tem pouco de burro, resta a hipótese do dito facciosismo, próprio dos boys e girls à procura de bons tachos.
Agora, não deixa de ser surpreendente que o Francisco só agora tenha descoberto que a ideologia do Sócrates é o pragmatismo (alinhado com a tecnocracia neoliberal, acrescento eu). Se há algo que desde o início da sua governação saltou à vista, na sua forma de agir e de ser, foi a sua vontade de parecer «moderno» e de agir conforme as conveniências, e isso significava cortar com os princípios de esquerda tradicionais e seguir as práticas «modernas» introduzidas pela terceira-via e pelo Blair. E não é preciso ser muito inteligente nem erudito para ter percebido isso, pois nem o próprio Sócrates o escondeu, mas sempre o publicitou, orgulhando-se da sua demarcação da esquerda «arcaica», como costumam dizer os seus maiores defensores (como é o caso do Vital Moreira). Aliás, é na base dessa demarcação que ele também vai conseguir apoios e elogios em figuras da direita (como são o caso do Proença de Carvalho, do Miguel Júdice e do Dias Loureiro), e que por «coincidência» são também dos (ex)políticos com mais interesses económicos privados.
Mas é realmente surpreendente assistir à «surpresa» do Francisco com a confissão do Sócrates de que nunca foi marxista! Nunca foi marxista, nem nunca foi de esquerda: na sua juventude era da JSD e na idade adulta mudou-se para o PS, provavelmente porque neste partido encontrou melhores condições para «subir na vida» e mais depressa. Ele é apenas um produto de marketing deslumbrado com o poder e que age em função da conquista e manutenção do poder. As doutrinas ideológicas, políticas ou filosóficas pouco ou nada lhe dizem, como a sua governação dirigida segundo a tecnocracia «cientifica» ou dominante mostraram. Daí que seja natural que ele governe conforme o que está determinado pelos poderes económicos, sejam estes os «mercados» financeiros, as agências de rating, ou a banca em geral. Faz o que lhe mandam, como qualquer yuppie desejoso de poder e de reconhecimento social e incapaz de dizer «não» faria.
Enfim, Francisco, depois de tantos posts que escreveu em defesa deste governo deixe-me que lhe diga que fica-lhe mal ser dos primeiros a abandonar o barco. Fica-lhe mal vir agora dizer que o PS precisa de ser um «partido verdadeiramente de esquerda»; fica-lhe mal dizer que Portugal precisa de outro primeiro-ministro; fica-lhe mal dizer que somos «governados por ladrões sem qualificações» (ou com qualificações conseguidas num Domingo, não é verdade?). Numa pessoa inteligente como você (e digo isto sem qualquer ironia) todas estas suas descobertas tardias ficam muito mal... Se é que são descobertas...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

lp

José Sócrates disse diversas vezes que foi marcado pela leitura de um livro de Bernstein: O que é o socialismo! Apesar de ser revisionista da linha reformista, Bernstein não deixou de ser marxista: alinhou a sua visão política pela via reformista e pela luta económica da classe operária. Esta via social-democrata - mais económica do que política - também contribuiu para a degradação da Esquerda. Porém, tanto esta via reformista como a via política de Lenine decorrem do marxismo: a tensão encontra-se na própria obra de Marx. Nos últimos oito anos da sua vida Marx detectou a tensão e as dificuldades da sua teoria mas já não teve tempo para a corrigir substancialmente.
O que mudou na minha perspectiva foi o problema da dívida pública que Marx aborda no âmbito da acumulação primitiva de capital. Isto quer dizer que Marx possibilita resolver as suas dificuldades teóricas: quando critica o princípio de utilidade de Bentham, Marx invoca a natureza humana para além das suas configurações epocais. Ora, é aqui que precisamos de trabalhar: uma antropologia fundamental para a teoria crítica que rompa claramente com o optimismo ingénuo que Marx herdou do século XVIII. O problema da dívida pública - associado ao pauperismo - ajuda a ver a outra luz a corrupção.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Para todos os efeitos, a reavaliação do pensamento marxista implica e exige o abandono da política comunista... A dialéctica não pode pensar o seu fechamento através da realização da reconciliação universal.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Quando fala da dívida pública, Marx avança com o conceito de moderna bancocracia! Mais outro conceito primordial que possibilita compreender o capitalismo de hoje.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ora, Marx pensou que a acumulação prévia do capital estava concluída na Europa, mas não estava: a bancocracia que alavancou a acumulação primitiva floresceu nas últimas décadas, o que significa uma regressão do capitalismo à sua fase originária. A bancocracia é regressiva: ela assume formas arcaicas de desenvolvimento social. O capitalismo selvagem de hoje é o mesmo capitalismo na sua forma originária: a acumulação do capital gera pobreza e indigência e assimetrias abismais entre poucos ricos e muitos pobres.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

LP

Há outro pensamento: Marx pensou o comunismo mais como uma sociedade sem Estado do que como sociedade sem classes. Ora, tanto a linha revolucionária de Lenine como a linha reformista reforçaram o Estado. Nesta perspectiva, José Sócrates segue Estaline. Paradoxalmente, a actual Europa possui Estados estalinistas: Weber antecipou esta ideia.