sábado, 27 de agosto de 2011

Filosofia Económica: Os Economistas Soviéticos

«A Economia Política é a ciência das leis que regem a produção e a distribuição dos bens materiais indispensáveis à vida na sociedade humana, nos diversos estádios do seu desenvolvimento. O seu objecto é a estrutura social da produção». (Lev Leontiev)

«Die politische Ökonomie ist eine Gesellschafts-wissenschaft. Ihr Geganstand sind die auf den verschiedenen Entwicklingsstufen der Gesellschaft bestehenden Beziehungen der Menschen in der Produktion, die Produktionsverhältnisse, und die in ihnen objektiv wirkenden Gesetze, die ökonomischen Gesetze, sowie die - ebenfalls von objektiven Gesetzen bestimmten - Wechselbeziehungen der Produktionsverhältnisse mit den Produktivkräften und mit dem Überbau der Gesellschaft». (Jürgen Becher et al.)


A melhor análise do marxismo soviético foi realizada por Herbert Marcuse na sua obra O Marxismo Soviético: a Esquerda deve ter muito cuidado quando critica o marxismo soviético. A sua missão não é contribuir para esse empreendimento mentiroso que é O Livro Negro do Comunismo, mas sim elaborar O Livro Negro do Capitalismo. Hoje, quando acordei, lembrei-me que tinha alguns livros de economia política da autoria de economistas da classe operária: os cientistas sociais soviéticos tinham a grande qualidade de ser transparentes nas exposições científicas que faziam dos assuntos que os preocupavam. Eles escreviam numa linguagem acessível ao auditório universal: o marxismo soviético promoveu sempre a cultura, a arte, a ciência, a filosofia e a educação e, neste domínio, a sua obra não tem eco no mundo capitalista que mergulhou a sua população no abismo dos falsos-diplomas. A literatura soviética (em sentido amplo) constitui um tesouro cognitivo da Humanidade que não pode ser esquecido para alimentar as mentiras do capitalismo. Por temperamento, não suporto a MENTIRA IDEOLÓGICA e fico revoltado quando ouço homens medíocres e corruptos a falsificar a História da Humanidade, mentindo descaradamente com todos os seus dentes para salvaguardar os seus privilégios sociais conquistados de modo fraudulento e sem mérito próprio. Estas mentes tortuosas que envergonham a humanidade do Homem são de tal modo doentias que não conseguem pensar para além do seu umbigo gorduroso, fazendo justiça às grandes obras de teoria histórica, económica, social, jurídica, artística, psicológica, científica, política, etc., produzidas pelos marxistas soviéticos. Os filósofos e os cientistas, se quiserem merecer estas designações, devem rasgar este véu ideológico com o qual os ideólogos burgueses tentam encobrir a verdade. A tarefa que estou a propor é a leitura sem preconceitos ideológicos das obras científicas e filosóficas do marxismo soviético (sentido amplo): os leitores que não tenham domínio pleno dos instrumentos conceptuais da ciência e da filosofia podem iniciar os seus estudos de economia política lendo algumas obras de divulgação do marxismo soviético, das quais recomendo três traduzidas em língua portuguesa - Manual de Marxismo-Leninismo de Otto Kuusinen et al., O que é o Materialismo Histórico? de O. Yakhot, e Curso Elementar de Economia Política de Lev Leontiev - e duas em alemão - Politische Ökonomie des Kapitalismus und des Sozialismus de Jürgen Becher et al., e Dialektischer und historischer Materialismus de Frank Fiedler et al.. Existem mais obras traduzidas em língua portuguesa - e eu próprio tenho algumas delas, mas as referidas são suficientes para dar início à redescoberta do marxismo soviético.


Concordo com o sentido geral da crítica dirigida por Marcuse ao marxismo soviético, mas - relendo as secções de economia política das obras referidas - fiquei com a impressão que os marxistas soviéticos conservaram o espírito crítico de Marx em relação à crítica da economia política do capitalismo. De certo modo, eles realizaram uma exposição abstracta e exacta dos princípios da economia política marxista, travando um confronto com todas as escolas da economia política burguesa. A crise financeira e económica de 2008 gerou uma conjuntura mundial favorável à mudança de paradigmas económicos, impondo por si só a redescoberta do marxismo soviético: a economia política do capitalismo tal como foi exposta pelos marxistas soviéticos sai reforçada e revitalizada na sua missão de dizer a verdade sobre o capitalismo com a crise de 2008. A Queda do Muro de Berlim deixou o capitalismo entregue a si próprio e às leis do seu movimento imanente e, quando isso acontece, ele dispensa o papel regulador do Estado e segue as regras do seu próprio jogo, o que o conduz inexoravelmente à crise. O neoliberalismo desalojou o keynesianismo e, com isso, preparou o terreno para o eclodir de crises sucessivas: o que significa que não há uma solução neoliberal para a crise, excepto a de empobrecer ainda mais os contribuintes desprotegidos ou mesmo os mais pobres para cobrir os prejuízos privados. (O programa neoliberal do Governo Português liderado por Passos Coelho vai matar Portugal que nunca foi um país capitalista desenvolvido: à acumulação de atrasos estruturais e históricos acrescenta-lhe a morte que representa a perda de soberania e do controle nacional sobre empresas-chave. A política do PSD é o suicídio nacional.) Basta ler a Terceira Secção do manual de Otto Kuusinen dedicada à exposição da Economia Política do Capitalismo para descobrir aí o discurso que diz a verdade sobre a actual conjuntura do mundo: «A doutrina de Marx é omnipotente porque é verdadeira» (Lenine). Os marxistas soviéticos permaneceram fiéis a Marx quando, a partir da unificação da microeconomia e da macroeconomia, tendo como fio condutor a teoria do valor, conseguiram apresentar uma teoria económica coerente do capitalismo, cuja verdade não pode ser facilmente questionada. Devo confessar que eu próprio fui intoxicado com a propaganda capitalista: a hegemonia cultural da burguesia revela-se tanto nas instituições educativas como nos mass media, cuja acção diária deforma a nossa mente, levando-nos a interiorizar o opressor capitalista, isto é, tudo aquilo que nos torna escravos de um sistema social que nos nega a dignidade. Muitas das minhas obras marxistas estavam encaixotadas ou perdidas algures dentro dos armários de parede, nas secções escondidas das estantes ou mesmo no sotão. A propaganda capitalista afasta-nos da verdade, mergulhando-nos no reino das mentiras e da degradação mental e cognitiva. Não vale a pena viver as mentiras do capitalismo para dilatar o self-bolsa do capitalista e atrofiar o nosso self verdadeiro. O capitalismo usou a ciência para derrubar o feudalismo, mas, quando Marx começou a usar a ciência para criticar o capitalismo, este reagiu substituindo a ciência pela apologia e pela pragmática. A superioridade do marxismo em relação à economia burguesa reside tanto na síntese dinâmica que opera entre história e teoria económica, como também no facto da análise económica produzir a sua própria filosofia. É nesta dupla-síntese dinâmica que reside o núcleo essencial da imensa revolução teórica de Karl Marx: Marx faz Filosofia fazendo a Crítica da Economia Política burguesa. O Capital - a obra de Marx - é, ao mesmo tempo, uma teoria económica do modo de produção capitalista e uma teoria crítica do seu processo de produção de conhecimentos. A leitura sintomal que Althusser realizou de O Capital é legítima, mas peca quando abandona os Escritos de Juventude de Marx para se entregar ao fetichismo do jogo das estruturas que priva o marxismo da política. Althusser esqueceu-se do subtítulo de O Capital - Crítica da Economia Política. Habermas - aquele que escreveu Conhecimento e Interesse - protegeu-se da armadilha do positivismo quando definiu a teoria crítica como uma teoria reflexiva que dá aos agentes humanos um tipo de conhecimento inerentemente produtor de esclarecimento e emancipação. Alfred Schmidt e Raymond Geuss explicitaram esta ideia de teoria crítica, mostrando que a ciência da História fundada por Marx não é uma ciência natural no sentido positivista do termo. Geschichte und Struktur de Schmidt constitui uma crítica do estruturalismo marxista que merece ser lida. O contributo de Jacques Rancière para a obra Ler O Capital mostra até que ponto os althusserianos não compreenderam a teoria de Marx quando opõem o discurso crítico do jovem Marx ao discurso científico do Marx da maturidade: eles objectivam a ciência da história de Marx. Martin Heidegger e Hannah Arendt acusaram o marxismo de ter quebrado a unidade da Filosofia, fragmentando-a e dispersando-a numa multiplicidade de ciências sociais e humanas, mas esta acusação é falsa, porque, para o marxismo, «não há, pois, em última análise, ciência jurídica, economia política, história, etc., autónomas; há somente uma ciência, histórica e dialéctica, única e unitária, do desenvolvimento da sociedade como totalidade» (Georg Lukács). Deste modo, Lukács dissolve a distinção clássica entre materialismo histórico e materialismo dialéctico: a teoria marxista é a auto-crítica da sociedade burguesa que possibilita a auto-crítica da história da humanidade. Graças a Marx a Filosofia não perde terreno; pelo contrário, a Filosofia "apropria-se" de todo o território que, por direito, lhe pertence. A obra de Marx é de tal modo densa, complexa, rica e incompleta que resiste a qualquer leitura linear e redutora: o que aqui posso dizer é que a filosofia de Marx trabalha simultaneamente em dois campos teóricos: como crítica materialista do idealismo e do seu princípio de identidade, a Filosofia de Marx consuma a Tradição Ocidental, apropriando-se de todo o seu legado através de um novo conceito de História, e, como crítica do positivismo, a Filosofia de Marx faz da Crítica uma forma de conhecimento, dotada de conteúdos próprios e de uma epistemologia própria, e capaz de funcionar como guia da acção humana. A minha leitura da Filosofia de Marx não é inocente: a partir do momento em que a auto-crítica da sociedade burguesa se converte em auto-crítica da história da humanidade, a "ciência da História" fundada por Marx adopta o ponto de vista do observador imparcial, isto é, do observador universal. Marx não opõe à economia política burguesa uma economia política da classe operária, como pensavam os economistas soviéticos. Leo Huberman, que não era um marxista soviético, chamou Economia do Trabalhador à Economia de Marx, porque «nela o trabalhador verificava o seu importante lugar na ordem das coisas e encontrava também esperanças no futuro». Abraham Lincoln não era marxista mas partilhava alguns aspectos do pensamento de Marx: «Nada de bom tem sido ou pode ser desfrutado sem ter primeiro custado trabalho. E como a maioria das coisas boas são produzidas pelo trabalho, segue-se que todas essas coisas pertencem, por direito, àqueles que trabalharam para as produzir. Mas tem ocorrido, em todas as eras do mundo, que muitos trabalharam e outros, sem trabalhar, desfrutaram uma grande proporção dos frutos (do trabalho alheio). Isso está errado e não deve continuar. Assegurar a todo o trabalhador o produto do seu trabalho, ou o máximo possível desse produto, é o objectivo digno de qualquer bom governo». Marx e Lincoln partilham duas ideias fundamentais: o trabalho produz mercadorias ou produtos, e o trabalhador, ao ser obrigado a dividi-las com o capital, está a ser roubado. E, tal como Marx, Lincoln desejava abolir esta situação de exploração. O interesse que move a teoria crítica é a emancipação: a crítica da economia política burguesa visa precisamente iluminar a luta da classe trabalhadora contra o sistema de exploração. Mas, quando afirmo que a teoria marxista adopta o ponto de vista do observador universal, recorro a outra tese de Marx: «A história de toda a sociedade até aos nossos dias mais não é do que a história da luta de classes». A síntese entre teoria económica e história faz com que a auto-crítica da sociedade capitalista se converta na auto-crítica da história da humanidade, isto é, na auto-crítica da história da luta de classes. Ora, esta síntese implica necessariamente o ponto de vista do observador universal, não só porque se trata de toda a história da humanidade, da humanidade em sofrimento, mas também porque, ao contrário dos economistas vulgares que tendem a transformar as leis históricas em leis naturais, como se a ordem social burguesa fosse uma ordem natural a-histórica, Marx não abdica da busca cooperativa da verdade: a crítica da ideologia funciona basicamente na obra de Marx como crítica do positivismo. As "leis históricas" descobertas por Marx não são "leis naturais", mas tendências que só por si não são suficientes para garantir a passagem automática do modo de produção capitalista para o modo de produção socialista: os marxistas soviéticos naturalizaram as "leis históricas", e é neste acto ideológico que reside o seu erro colossal. Aplicar a crítica da ideologia ao próprio marxismo não exige o abandono da tese do colapso do capitalismo; exige uma outra coisa: cultivar o pessimismo metódico. Para todos os efeitos, o comunismo é uma peça exterior à teoria marxista: Marx já era "comunista" antes de ser marxista. Assumo a culpa da minha leitura que visa libertar o marxismo desse mito que é o comunismo, graças à qual posso actualizar a Filosofia de Marx.


(Reparem: não usei o termo síntese no sentido dialéctico de negação da negação, ela própria uma positividade pardacenta. Usei-o no sentido de teoria unificada. Para mim, a totalidade social é sempre negativa e é por ser negativa que ela é dialéctica. Não concebo o fim da dialéctica e não acredito em conciliações dos contrários. A história é luta e assim será até à catástrofe final. Meti-me num Grande SARILHO TEÓRICO: Penso que estou no caminho certo para resolver os problemas económicos que atormentam a humanidade, mas não tenho todos os documentos-livros necessários para tomar conhecimento em primeira mão das teorias que me interessam. Ao introduzir a perspectiva do observador imparcial, uma figura que fui buscar a Adam Smith, estou a tentar impor uma teoria unificada da economia. Porém, cada país tem a sua própria história da economia e da análise económica. Por exemplo, a história das doutrinas socialistas na Rússia e na Grã-Bretanha é espectacular e há obras que a relatam mas de um ponto de vista parcial. Pela literatura escassa que consultei até aqui, verifico que o marxismo reagiu muito bem aos novos desenvolvimentos teóricos da economia burguesa. No entanto, o campo marxista nunca procurou realizar uma síntese teórica do seu contributo. Elevar o nível de abstracção e de formalização do discurso ajuda a clarificar as ideias: a teoria pura é um instrumento analítico fundamental, sem o qual corremos o risco de perder o rumo. Em relação a Portugal, um país que nunca teve uma tradição de pensamento económico ou mesmo filosófico, chego à conclusão de que um dos factores de crescimento económico é o investimento cultural. Assim, por exemplo, o facto de não termos as obras fundamentais traduzidas atempadamente para a língua portuguesa ajuda a compreender o nosso atraso estrutural. Portugal está, em termos de desenvolvimento cultural, perigosamente próximo dos países africanos e árabes. Quando teve acesso ao crédito, com a entrada na zona Euro, usou-o tal como faz um país subdesenvolvido: corrompeu-se e, em vez de criar as condições necessárias ao desenvolvimento económico, investiu em obras sumptuosas que não geram riqueza. Portugal parece ser um país moderno, mas não é: o comportamento saloio consiste em fingir ser aquilo que não é, e este negócio do fingimento nacional enriquece sempre os mesmos. Desenvolvimento económico também é desenvolvimento cultural: o atraso económico de Portugal explica-se estruturalmente pelo seu atraso cultural. O que é deveras preocupante para o futuro de Portugal é constatar que as políticas pós-25 de Abril e pós-adesão à União Europeia terem agravado esse atraso, dando diplomas aos analfabetos e enchendo a sua cabeça de ilusões de animal anti-cultural. Acreditem em mim quando vos digo que as novas gerações são mais burras do que as gerações anteriores. Neste momento, o problema de Portugal é uma crise antropológica, uma crise de inteligência cultivada. Desgraçados dos países que importam estes cérebros-zombies! As Universidades Portuguesas não desempenham a sua missão de fomentar o desenvolvimento cultural, porque foram sempre-já capturadas pelo sistema da cunha e pela rede de corrupção nacional, para já não referir os aspectos badalhocos. A maior parte dos professores portugueses são mediocridades pardacentas que pensam que, ao ocupar o cargo que lhes garante o vencimento, incorporam magicamente a sabedoria subjacente à posição: o ensino em Portugal é um jogo de mentiras público-privadas. A crise deve ser aproveitada para executar o saneamento desejável: o despedimento por incompetência é legítimo. Os burros-corruptos instalados vedam o acesso aos competentes e, deste modo, bloqueiam o desenvolvimento. Libertar as instituições desta manada de burros é libertar o futuro de Portugal. Um dos objectivos da política nacional devia ser a entrega das suas instituições aos competentes. Com os burros Portugal afunda-se cada vez mais. O 25 de Abril possibilitou a ascensão social dos burros e dos diplomas administrativos e estamos a pagar o preço. Não concebo uma reforma da administração pública sem uma política racional de despedimentos. Não podemos sacrificar o futuro por causa dos burros que nos afundaram e nos afundam enquanto permanecerem nos lugares que não lhes pertencem por mérito e por direito. Afinal, a teoria de que a crise é uma oportunidade para mudar já tinha sido enunciada por Marx.)

Aprende-se mais lendo os manuais soviéticos sobre economia política do que lendo o famoso livro de Paul Samuelson, cuja definição de economia faz lembrar uma assembleia urbana onde os homens deliberam sobre a maneira como utilizar as suas capacidades limitadas: «A economia é o estudo da maneira como os homens e a sociedade decidem, com ou sem utilização de dinheiro, utilizar recursos produtivos escassos, que poderiam ter usos alternados, para produzir várias mercadorias com o tempo e distribuí-las para consumo, agora e no futuro, entre as várias pessoas e grupos na sociedade» (Samuelson). Mas, como estou aqui mais preocupado com a filosofia económica, vou retomar a economia política tal como foi analisada pelos economistas soviéticos: a economia política é o estudo científico das relações de produção entre os homens e das leis de desenvolvimento da produção social e da distribuição dos bens materiais nas diversas fases que a sociedade humana atravessou. Convém lembrar que, em termos históricos, a economia dizia respeito à administração do orçamento doméstico. Ora, quando a residência passou a ser a do monarca, as preocupações económicas tornaram-se preocupações políticas: a "economia política" surgiu assim como o estudo dos problemas relativos às rendas - oriundas dos impostos e dos empréstimos - e às despesas do monarca - com a corte, a administração civil, o exército e a marinha. Mas, como demonstrou Marx, a economia política começa a desenvolver-se como ciência ao mesmo tempo que se gera o modo de produção capitalista: o mercantilismo (século XVII), o fisiocratismo (século XVIII) e, sobretudo, a economia clássica inglesa (século XIX) são algumas das doutrinas económicas que a burguesia ascendente usou como armas ideológicas contra o feudalismo. Quando se lança nos palcos da história como classe revolucionária, a burguesia estava interessada no conhecimento científico das leis que regem o desenvolvimento da produção capitalista e na eliminação das relações feudais que se opunham ao estabelecimento do poder do capital. No século XIX, já durante o período da Revolução Industrial, surge a economia política burguesa, mais conhecida pelo nome de economia política clássica, cujos fundadores mais célebres foram Adam Smith e David Ricardo: Marx criou a sua economia política a partir de um diálogo produtivo e crítico com a economia clássica burguesa, originária da Inglaterra. Marx estabeleceu uma distinção importante entre a economia política clássica, que «investigava a estrutura interna real das relações burguesas de produção», e a economia vulgar, que se confunde «com a estrutura aparente dessas relações, sistematizando de forma pedante e proclamando como verdades eternas as ideias banais e complacentes que os agentes de produção burgueses têm sobre o seu próprio mundo, que para eles é o melhor mundo possível». Marx reconhece o carácter científico da economia clássica burguesa que procura a fonte da riqueza na produção: a economia clássica - bem como a de Marx - estava preocupada em saber como um excedente económico é produzido e distribuído, em elucidar o impacto da relação entre produção e distribuição sobre o crescimento económico e o conflito de classes, e em analisar as suas implicações em matérias tão sensíveis como os preços, os lucros, os salários e o emprego. Porém, a conquista do poder político pela burguesia, na França e em Inglaterra, e o seu conflito de classe com o proletariado em rápido crescimento marcaram o fim do desenvolvimento científico da economia clássica burguesa. No Posfácio da 2ª. Edição de O Capital Marx situa essa ruptura em 1830: «A partir deste momento, a luta de classes, tanto prática como teórica, adquire formas cada vez mais claramente definidas e ameaçadoras. Ao mesmo tempo, soa o dobre de finados da economia científica burguesa. Daqui para diante, não se trata já de saber se é correcto ou não este ou aquele teorema, mas sim de determinar se é útil ou nocivo para o capital, se é vantajoso ou desvantajoso, se concorda ou não com as considerações policiais. A investigação desinteressada dá lugar aos combates entre os espadachins mercenários, a busca científica imparcial cedeu o seu lugar à consciência deformada e às intenções perversas da apologética». Quando a economia clássica burguesa abandona o espírito científico, aqui definido pelo seu carácter imparcial e desinteressado, para se converter em mera apologética do mundo capitalista, Marx reclama-o para definir o status epistemológico do seu próprio empreendimento económico, ao mesmo tempo que denuncia o logro que a economia burguesa semeia e as ilusões que desperta. Como já vimos, na formulação da sua teoria económica e histórica, Marx vacila muito entre a perspectiva positivista e a crítica do positivismo, o que justifica, em grande medida, a atracção dos economistas soviéticos pelo positivismo: o combate teórico e político entre economistas soviéticos e burgueses travou-se no mesmo terreno, o do positivismo. Se confrontarmos o Curso Elementar de Economia Política de Lev Leontiev e o Curso de Economia Política de François Perroux, verificamos que ambos partilham a ideologia positivista que faz deles apologistas da ordem social existente, o socialismo no caso de Leontiev e o capitalismo no caso de Perroux. Quanto afirma o seu carácter "científico", o discurso económico mais não faz do que denunciar o seu próprio carácter ideológico: a "ciência" e todos os seus instrumentos matemáticos são usados pela economia vulgar para naturalizar e imortalizar aquilo que é histórico: «O papel apologético desempenhado por tal tipo de teorização (macroeconómica) não é, em absoluto, diminuído pela precisão aparente obtida pela utilização da Matemática. Na verdade, ocorre justamente o oposto. A linguagem e o raciocínio matemáticos podem ser especialmente traiçoeiros, porquanto permitem a inferência de conclusões logicamente impecáveis de premissas inadequadas e criam a aparência de haver um sistema coordenado e coesivo quando, na verdade, nada existe. Da mesma forma que, no caso microeconómico, a eficiência brilhante da moderna sociedade anónima disfarça a falta de sentido do objectivo a que serve, assim, no caso macroeconómico, o modelo matemático complexo serve para ocultar a irracionalidade da organização económica que supostamente ilumina» (Paul A. Baran & Paul M. Sweezy). O positivismo é a mais miserável de todas as filosofias até agora produzidas: a actualização da teoria de Marx exige a demolição do positivismo que lhe é inerente: «O marxismo-leninismo parte do facto de a sociedade, tal como a natureza, se desenvolver segundo leis determinadas. Essas leis têm um carácter objectivo, o que quer dizer que não dependem da vontade e da consciência dos homens. Mais ainda, são elas que, em última instância, determinam a consciência, a vontade e, por conseguinte, as acções dos indivíduos». O mesmo Leontiev que aqui faz da sociedade uma espécie de ordem natural sujeita a leis, logo a seguir, quando chega a hora de reclamar o fim inevitável do capitalismo e a vitória do comunismo, retoma a crítica do positivismo, mostrando que o capitalismo não é uma forma natural de organização da produção social, mas uma forma historicamente transitória. Ora, é neste terreno da síntese dinâmica entre teoria económica e história que se revela a superioridade da perspectiva de Leontiev em relação à de Perroux: «O valor é uma relação entre os homens que produzem mercadorias. Mas essa relação entre os homens reveste a forma de relação entre coisas-mercadorias. O valor de uma mercadoria parece ser uma propriedade tão natural como a cor ou o peso: diz-se, por exemplo, que um pão pesa tantas gramas e custa tantos euros. As propriedades que as mercadorias somente possuem em virtude de um certo sistema de relações sociais são no entanto consideradas como propriedades naturais. Nisto consiste o feiticismo da mercadoria, próprio da produção capitalista. Esta feiticismo oculta a essência das relações capitalistas, o seu carácter real, e dá-lhes uma aparência enganadora» (Leontiev). O primeiro capítulo de O Capital - A Mercadoria - não só é, do ponto de vista literário, «uma das coisas mais importantes de Marx» (Franz Mehring), como também constitui o eixo teórico a partir do qual a ciência económica assume a forma de crítica da economia política: o ponto de vista do observador universal que possibilita a elaboração de uma teoria económica unificada encontra-se aqui claramente definido. Quando tenta explicar porque razão os escravos e os servos da gleba nunca conseguiram derrubar o sistema que os explorava, confrontando a visibilidade da sua exploração com a invisibilidade da exploração capitalista da classe trabalhadora revelada pela teoria da mais-valia, Leontiev coloca inadvertidamente o dedo na ferida: a economia política marxista assume o ponto de vista do observador universal e os princípios do seu "método" foram esboçados por Marx na Introdução à Crítica da Economia Política (1857) e, sobretudo, na secção "O Fetichismo da Mercadoria: o seu segredo" do primeiro capítulo de O Capital. Cabe à Filosofia Económica definir esta nova figura epistemológica para a economia política, de modo a preparar o terreno para a elaboração dessa teoria unificada. Se a economia política é, por excelência, a ciência do capitalismo, como pensavam alguns marxistas, então a crítica da economia política é necessariamente a crítica da irracionalidade da organização capitalista da produção. O colapso do mundo comunista obriga a economia marxista a descobrir um novo rumo económico para responder ao desafio que lhe foi colocado por Engels: «A tarefa (da Ciência Económica) consiste em mostrar que os abusos sociais que se notam são as consequências necessárias da forma de produção existente, ao mesmo tempo que os sinais da sua iminente dissolução, e descobrir, no meio do movimento económico que se desagrega, os elementos de uma nova organização futura da produção e troca, que porá fim a esses abusos». (Inicialmente, pretendia exemplificar o argumento-chave deste texto com a crítica da teoria marginalista do valor, o ridículo da economia burguesa, mas resolvi adiar essa crítica para outra oportunidade.)


Anexo 1: Na sua obra A Acumulação do Capital, Rosa Luxemburgo analisa as crises económicas do capitalismo a partir do modelo de reprodução simples de Marx. Ela comete um erro ao não fazê-lo a partir do modelo da reprodução ampliada ou alargada de Marx, mas este erro ajuda-nos a compreender a globalização do capitalismo. (Este anexo será um novo texto.)
Anexo 2: O nosso mundo foi moldado pela filosofia da história de Hegel e de Marx e, de certo modo, a nossa tradição culmina neles. Depois deles não ocorreu absolutamente nada que mereça a nossa atenção: o fracasso da experiência comunista veio mostrar como o marxismo, em vez de enfraquecer o capitalismo, ajuda-o a resistir ao seu colapso mecânico: todas as políticas económicas introduzem alguma racionalidade lá onde ela não existe e, deste modo, remendam o capitalismo. Introduzi o ponto de vista do observador universal para definir uma figura de fuga, susceptível de descobrir o Marx oculto, aquele que não foi levado a sério, quer pelos seus adversários, quer pelos seus seguidores. O Marx oculto pode abrir novos horizontes, mas, em última análise, continua a ser uma figura hegeliana, isto é, uma figura da liberdade. Em termos simples, o Marx oculto aponta no sentido da crítica da irracionalidade do sistema capitalista. Porém, no cenário mundial, surgem potências autónomas que não são medularmente ocidentais, o que introduz muita incerteza no mundo. Será que as energias criadoras ocidentais se esgotaram de vez? Só uma análise levada a cabo do ponto de vista do observador universal pode lançar alguma luz sobre o mundo e o seu futuro. No essencial, o capitalismo não mudou e isso não augura um final risonho: o seu colapso pode ser o colapso do ocidente ou mesmo o ocaso do mundo. Infelizmente, uma catástrofe natural ou uma guerra de grandes dimensões ajudavam a clarificar a situação, impondo uma renovação populacional e social: todas as grandes transformações sociais foram desencadeadas ou aceleradas por estes factores; a morte quebra o feitiço dos delírios humanos. Se não houvesse morte, o mundo seria impossível. O mundo que foi construído depois da II Guerra Mundial não faz sentido à luz da mortalidade da condição humana. É, por isso, que não vale a pena pensar na realização de uma sociedade perfeita, porque quanto mais perfeita for a sociedade maior será a degradação mental do homem.

J Francisco Saraiva de Sousa

30 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hi Dinamarca! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hi Alasca! Ai Itália! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hummm... estive a fazer uma incursão pela ciência/teoria económica. Ai, ai, o Keynes quis ser maior do que foi: a minha preocupação incidiu sobre a teoria marginalista do valor que rompe com Ricardo e Marx. Porém, ela foi brutalmente atacada por Robinson e Sraffa.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Andam a dizer por aí que, de repente, fiquei insatisfeito com a economia marxista. Talvez seja verdade, mas já introduzi critérios gerais para alargar o seu âmbito e, se for necessário, introduzo princípios de complementaridade. Bahhh... que chatos - o mundo é complexo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Aliás, amigos, não estou preocupado com a economia planificada: os instrumentos de planificação já foram introduzidos e funcionam. Mas que vou fazer uma crítica, sim é verdade - uma crítica da economia de bem-estar de Pigou e da economia social de Wieser. Mas antes tenho a Rosa Luxemburgo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E estou fonex com o modelo estático da teoria do equilíbrio - odeio estes reaccionários do equilíbrio.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Eu bem sabia que tinha mais tratados de economia burguesa encaixotados - agora estou no caos livresco - tudo misturado.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A economia marxista pode utilizar a econometria, mas pode usar cálculos mais sofisticados: a utilização do computer é fundamental e é preciso a ajuda de um bom departamento de matemática. Mega-computadores e bons cérebros: eis a fórmula do sucesso.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Marx é um génio, mas Engels não lhe fica atrás: o Aditamento ao Livro Terceiro de O Capital de Engels comprova-o.

Vendo o estrutura do 2º volume de O Capital fui surpreendido novamente pela categoria do TEMPO: Tempo, Rotação, Ciclos - Marx é o génio do tempo do Capital. Mas há também o ESPAÇO do Capital. Ainda não compreendemos O Capital - a obra-prima de todos os tempos. É difícil, muito difícil, mas Marx merece o esforço. Tempo de produção, Tempo de circulação, Tempo de consumo - é toda uma teoria das temporalidades que é aqui exposta. Uma obra genial do pensamento ocidental!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E onde é que a economia burguesa tropeça? No TEMPO e também no ESPAÇO: ela desconhece o tempo e sabemos porquê!

Mas há outro segredo em Marx: ela formula a teoria das temporalidades do modo de produção capitalista, mas, se não estou enganado, há uma temporalidade pré-histórica ou original que evita o círculo vicioso da acumulação do capital - a acumulação primitiva cujo tempo é original. Simplesmente genial! Teoria filosófica pura e da melhor qualidade!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hmmmm... Eu até já sou superior a Marx - vejo nele aquilo que ele não viu bem. Vou inferir toda a globalização de O Capital. Tempo Global, Espaço Global - estão lá a aguardar por mim, pelo sopro do meu intelecto puro.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ai, agora meio-a-brincar, meio-a-sério - o problema dos capitalistas reside na sua incapacidade para passar do modelo simples ao modelo ampliado da acumulação! Porra, nem empresários de jeito temos: são mesquinhos e corruptos. Maldito país!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Era - capitalista PORTUGUESES!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E ainda por cima - os capitalistas portugueses são incultos - odeiam a cultura. Daí o atraso do país! Não adianta produzir cultura porque eles não dão saída à cultura. Em Portugal é tudo trolha! :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estou muito desanimado com as teorias do preço! Penso ser necessário introduzir um princípio que suavize o seu impacto sobre a teoria económica. Um terreno muito movediço para alimentar qualquer teoria forte.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ai, ou a minha mente foi caçada pela economia burguesa, ou então, o russo que estava a ler não compreendeu cabalmente a teoria da reprodução de Marx: o certo é que não me identifico com a exposição dele.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Afinal, sou eu que tenho razão: a reprodução implica um processo temporal, não é estática. Aliás, o ciclo de Schumpeter integra os 2 modelos de Marx com outras designações. O que quer dizer que o russo deve ter alguma teoria do equilíbrio na secção de economia socialista, mas n vou ler isso.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estou divertido a relembrar aquilo que li quando andava no liceu. Agora descobri uma obra de História da Economia que comprei quando andava na escola; no entanto, tenho emblemas da Faculdade de Medicina, o que quer dizer que voltei a fazer uso da obra mas não me lembro.

Bem, a questão dos preços é complexa: a teoria de Marx é exposta por fases, partindo de suposições prévias que, à medida em que a teoria se aproxima da realidade, não funcionam como se a teoria do valor fosse incapaz de resolver o problema. É preciso abandonar a teoria do valor? Marx segue outra via de aproximação. O meu primeiro impulso - um tanto ou quanto burguês - seria abandonar a teoria. Mas... essa foi a via seguida pela economia neoclássica que detesto.

Porém, vislumbro outra via unificadora: desdobrar a teoria em dois registos, de modo a conservar o carácter crítico e reflexivo da teoria económica. Preciso pensar...

Ah, já deu para perceber que gosto do colapso mecânico da Rosa Luxemburgo, mas a sua teoria implica o subconsumo e tem o tal erro. Mas é sedutora.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hoje, à noite durante o café, perguntaram-me se tinha esquecido Max Weber. Não esqueci e num comentário anterior quando refiro Engels estava a pensar em Sombart.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas não vale a pena perguntar-me como funciona a minha cabeça, pk não sei explicar ou mesmo descrever: são arquivo neurais que se abrem e que estabelecem contacto entre si sem eu ter consciência. A minha mente apodera-se de conceitos ou de nomes e o resto vem atrás repentinamente. Não acreditam mas não me torturo a pensar: a solução surge de repente já dada, a mim cabe-me traduzi-la por palavras organizadas em discurso.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas eu sou muito preguiçoso e acredito em mim totalmente: o meu domínio é conceptual e é todo-poderoso qdo escrevo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Com 2 ou 3 conceitos elaboro na hora diversas articulações teóricas.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Está a ser muito difícil tematizar numa nova linguagem o que quero dizer: as tomadas de partido toldam a mente e a sua expressão nas obras económicas.

antónio m p disse...

Tomando embora por ironia essa afirmação do estimado J. Francisco de que está «no caminho certo para resolver os problemas que atormentam a humanidade», faltando-lhe porém alguns « documentos-livros necessários», aproveito para invocar um pensamento e uma obra literária.

Pensamento:
“Adiro muito aqueles que procuram a verdade mas temos muito aqueles que a encontram”.

Obra:
“As Palavras” de Jean Paul Sartre em que este critica a sobrevalorização das palavras no contexto da vida.

Dada a sua capacidade intelectual, fico descansado em que não levará a minha crítica a mal.

Por estranho que lhe possa parecer, também discordo da sua reacção contra a «ascensão social dos burros». Eu sou pela ascensão social de toda a gente - se é que estamos a falar da mesma coisa. Já a atribuição de diplomas a quem não tem as competências inerentes, concordo com a sua reprovação.

Sobre o texto em geral acho que revela coragem e lucidez na valorização da teoria marxista tão diabolizada por razões obviamente ideológicas, mas fico insatisfeito com as referências a “economistas soviéticos” que não se identificam e com a atitude acrítica relativamente aos caminhos do movimento comunista e à falta deles. Afinal a própria História se tem encarregado de evidenciar a falência das teorias burguesas tal como Marx preconizou. O que “faz falta” é uma saída compatível com as necessidades e a dignidade das pessoas – com o desenvolvimento e a democracia económica e política.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

António M. P.

Só identifiquei aqui um economista soviético e, como deixei de lado a economia planificada, não entrei em detalhes. Mas mesmo neste plano da planificação os soviéticos não conseguiram introduzir os instrumentos matemáticos para melhorar a planificação. De certo modo, eles foram definidos pelos economistas burgueses.

Os economistas soviéticos elaboraram a teoria do imperialismo e este é o seu maior contributo.

Sim, a maior parte das obras deixaram de ser acessíveis: a onda neoliberal esqueceu sistematicamente o passado e é desse passado esquecido que devemos partir.

Para mim, o comunismo é algo que não faz sentido e, se há tendências que apontam para algo de novo, este algo não é o comunismo. Ora, ao abandonar o comunismo, a economia marxista deve mudar de rumo e deixar de ser dogmática. Acho que a obra de Marx permite essa mudança de rumo.

Sim, as teorias burguesas tornaram-se demasiado apologéticas e pragmáticas. O ponto de vista do observador universal permite superar esse empenhamento ideológico e elaborar uma teoria unificada da economia. Os problemas que pretendo iluminar são os da pobreza, do emprego, do crescimento económico, que não tenho perdido de vista.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bem, quanto ao problema da ascensão, há uma divergência ideológica entre nós.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Quanto a Sartre e a outros homens de esquerda: o problema deles foi nunca se terem interessado pela Economia. Marx não concluiu a sua obra e eles - salvo as brilhantes excepções - não tentaram aprofundá-la. Limitaram a fazer reivindicações sem pensar na economia: o capitalismo satisfez muitas dessas reivindicações e eles começaram a acreditar numa economia mágica. Ora, a crise quebrou esta magia alucinada. O saldo da esquerda também não é positivo. O alargamento da democracia acaba por abolir a própria democracia política.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hoje, a esquerda está sem projecto: a verdade é esta.

antónio m p disse...

Esquerda sem projecto? É o que parece. Mas eu diria antes que a esquerda acredita hoje num projecto em construção, num caminho que por ser novo se irá revelar à medida que se avança - que reconheço ser uma medida curta no presente histórico.

Por outro lado, creio que existe uma base sólida de ideias em que Marx tem forte participação, as quais carecem de aprofundamento, crítica, experiência. Digamos que há uma forte intuição e uma falta de sistematização e demonstração. Não é todos os dias que surge um homem e um momento histórico capazes de impulsionar o "salto qualitativo".

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, é preciso ler Marx à luz das preocupações do presente: tarefa complicada pk não há boas traduções da sua obra.