Escassez de Água |
«Que produzir, Como e Para quem não seriam problemas se os recursos fossem ilimitados: se pudesse ser produzido um volume infinito de cada um dos bens, ou se as necessidades humanas fossem completamente satisfeitas, não faria qualquer diferença que um determinado bem fosse produzido em quantidade demasiada. Nem que o trabalho e os materiais fossem combinados de modo menos correcto. Uma vez que cada um pudesse ter tanto quanto lhe agradasse, seria indiferente o saber-se como os bens e rendimentos eram distribuídos entre os diversos indivíduos e famílias. Não haveria então bens económicos, isto é, bens que fossem relativamente escassos; e dificilmente poderia existir qualquer necessidade de um estudo de economia ou de economizar. Todos os bens seriam bens livres, como o ar». (Paul A. Samuelson)
O confronto crítico entre a economia marxista e a economia burguesa trava-se basicamente em torno da noção de escassez, que Jean-Paul Sartre reintroduziu no seio do marxismo. Mas antes de analisar a teoria da escassez de Sartre vamos retomar a perspectiva de Samuelson. Paul Samuelson revelou ser um grande teórico da economia quando, a partir da sua definição formal de economia, desenvolve uma teoria geral da organização económica, aplicável a todos os tipos de economia, onde a noção de escassez desempenha um papel nuclear: «A economia é o estudo da forma como as sociedades utilizam recursos escassos para produzir bens com valor e de como os distribuem entre os vários indivíduos». Samuelson destaca duas ideias que estão na base desta definição formal de economia: a ideia de que os bens são escassos e a ideia de que a sociedade deve usar os seus recursos de forma eficiente. Escassez e eficiência são dois conceitos fundamentais da economia. (:::) (O conceito de economia de Samuelson implica uma sociedade hierárquica e desigual: a escassez como dado ontológico não questiona a sua própria origem social e histórica.) Maurice Godelier critica os economistas burgueses por pretenderem fundar numa "realidade quase metafísica" o seu direito de utilizar a definição formal de economia, citando Henri Guitton para ilustrar esta referência filosófica dos economistas: «O homem traz em si uma necessidade de infinito e esbarra constantemente com o finito da criação. Esta antítese traduz-se antes de mais na ideia de escassez. As necessidades aparecem como inumeráveis e os meios para as satisfazer são limitados. Também pode acontecer que os meios sejam suficientes, às vezes mesmo muito numerosos. Intervém então uma outra noção, a de inadaptação. Os bens não se encontram forçosamente onde são necessários nem quando são necessários. É preciso produzi-los, se são insuficientes, reduzi-los, se são demasiado abundantes». Porém, Godelier não vai...
Infelizmente, ainda não estamos na posse de uma arqueologia completa da escassez, mas, no caso de Sartre, penso que ela remonta até à obra de Thomas Hobbes. Quando formulou pela primeira vez a sua teoria económica, Paul Samuelson destacou a figura de Thomas Malthus, mas o seu entusiasmo pela teoria malthusiana da população esmoreceu com a passagem dos anos, acabando por ocupar um lugar muito discreto na sua obra Economia, escrita em colaboração com William Nordhaus. A dialéctica sartriana não começa com o diálogo - o encontro do eu - a praxis individual - com o outro, mas com o confronto com o outro que ameaça a minha liberdade. A relação humana entre indivíduos implica reciprocidade ou igualdade, mas a reciprocidade não está presente na história real dos homens por causa da escassez que transforma o outro em inimigo. Vítima e prisioneira da escassez que faz de cada um de nós o inimigo do outro, a espécie humana é o seu maior inimigo: a visão de Hobbes do homo homini lupus é aplicada à história que, não sendo necessária, tem a sua origem e o seu fundamento inteligível num facto contingente, mas coextensivo à vida do homem neste planeta: a carência de recursos em relação ao número de bocas a alimentar. Malthus já tinha postulado uma tendência universal da população - excepto quando confrontada com a oferta limitada de alimentos - para crescer exponencialmente. Ora, uma população que duplica em cada geração acaba por ser tão grande que deixa de haver no mundo espaço suficiente para todos. Malthus recorre aos rendimentos decrescentes para demonstrar que, dado que a terra é fixa, enquanto os recursos de trabalho aumentam, os alimentos tendem a crescer numa progressão aritmética e não geométrica, como sucede com a população. Assim, «à medida que a população duplica e volta a duplicar é como se o globo estivesse a reduzir-se para metade e novamente para metade - até finalmente se ter reduzido tanto que a oferta de alimentos se situa abaixo do nível de vida necessário» (Malthus). Esta escassez - ou negação em exterioridade do homem pela natureza - é retomada e interiorizada pelas consciências, gerando um clima de violência, no qual decorre toda a história do homem. A inumanidade do homem para o homem é ontologicamente acidental, mas tem uma causa historicamente permanente que é a escassez. A escassez marca com a inumanidade todas as relações entre os homens e coloca em movimento a dialéctica da história: a praxis individual está imediatamente ameaçada na sua liberdade e no seu projecto pela praxis dos outros. No mundo da escassez, as liberdades não podem coexistir sem se submeterem reciprocamente. As praxis individuais objectivam-se nas suas obras e esta objectivação torna-se alienação, já que os outros a roubam ou falseiam a sua significação. Todos os conjuntos são tragados pelo prático-inerte, isto é, pela organização social transformada em coisa, à qual os indivíduos se submetem como a uma necessidade material. Apesar de ter como origem a praxis livre, o que lhe garante a inteligibilidade, o conjunto prático-inerte constitui a antipraxis ou a antidialéctica. O homem nasceu livre, como disse Rousseau, mas em todas as partes é o instrumento do homem, é solitário entre as multidões e só pode realizar a sua liberdade roubando-a aos outros. A série caracteriza as relações intersubjectivas na servidão do prático-inerte. Sartre exemplificou a série com a fila de transeuntes que aguarda o autocarro diante da Praça de Saint-Germain-des-Près: «Essas pessoas - de diferentes faixas etárias, de ambos os sexos, e fazendo parte de classes e meios muito diferentes - realizam na banalidade quotidiana a relação de solidão, de reciprocidade e de unificação pelo exterior (e de massificação pelo exterior) que caracteriza, por exemplo, os citadinos de uma grande cidade, na medida em que se encontram reunidos, sem serem integrados pelo trabalho, pela luta ou por qualquer outra actividade, num grupo organizado que lhes seja comum. Com efeito, importa observar, antes de tudo, que se trata de uma pluralidade de solidões: essas pessoas não se preocupam, nem falam umas com as outras e, em geral, nem olham umas para as outras; existem, lado a lado, em redor de um ponto de sinalização» (Sartre). As pessoas que formam fila numa paragem de autocarro não têm nada em comum, excepto a mesma necessidade de um meio de transporte. Porém, a escassez - «não há lugares suficientes para todos» - torna-as inimigas: o outro não é um parceiro de diálogo, mas um rival que disputa comigo o mesmo lugar. Sartre analisa os colectivos, um após outro, para mostrar que todos eles, em especial o Mercado, a Classe Social e as Finanças, são colectivos de tipo serial: unidades exteriores de actividade de todos enquanto Outros ou, simplesmente, unidades prático-inertes do múltiplo que cada praxis individual produz, mantém e sofre impotentemente como uma sentença selada na matéria pelas praxis seriais. Como é que se pode superar o isolamento das praxis individuais, as suas rivalidades, as suas sujeições e o conjunto do prático-inerte? O empreendimento comum é o projecto colectivo, o único objectivo para o qual tendem as consciências unidas numa mesma vontade. Se a fila de transeuntes numa paragem de autocarro simboliza os colectivos seriais, a multidão que toma a Bastilha simboliza os grupos. Sartre inverte as significações: o número que, nos colectivos, provocava dispersão, solidão e servidão, torna-se, nos grupos, factor de confiança e de dinamismo de acção. O grupo de acção restitui às praxis individuais, num nível superior, a liberdade perdida: a fusão dos indivíduos num grupo revolucionário torna-se o símbolo da libertação colectiva. Mas, para se constituir como tal, o grupo exige a promessa de fidelidade e recorre ao terror: o grupo constitui-se pelo compromisso mediante o qual cada um concede aos outros o direito de o punir no caso dele trair a sua promessa. Acossado pelos seus inimigos externos e pela decomposição interna, o grupo dura como vontade e como acção graças à submissão de todos - livremente consentida - à lei do empreendimento comum. O proletariado-grupo nasce da classe-colectivo através da e na acção revolucionária que visa a supressão do reino da necessidade: o que quer dizer que Sartre descreve a passagem da série ao grupo como a possibilidade da passagem do reino da necessidade para o reino da liberdade. Porém, uma vez nascido, o grupo é confrontado com as servidões da existência social e, para durar, deve criar instituições. (:::)
O que Marx pensava da lei da escassez? Conheço o desprezo de Marx pela teoria malthusiana da população, mas não sei definir claramente a sua posição em relação à escassez. Sartre estava ciente disso, tendo escrito uma secção dedicada à Escassez e Marxismo: «Marx fala muito pouco de escassez e, pelo que creio, é porque se trata de um lugar-comum da economia clássica, colocado na moda por Adam Smith, desenvolvido por Malthus e seus sucessores. Ele considera a coisa como adquirida e prefere - com razão, uma vez que é isso o marxismo - considerar o trabalho como produtor de ferramentas e bens de consumo e, ao mesmo tempo, um tipo definido de relação entre os homens» (Sartre). Raymond Aron criticou a dialéctica histórica de Sartre, alegando que a noção de escassez, tão grata aos economistas clássicos, não desempenhava nenhum papel de relevo no pensamento de Marx e de Engels: o que os preocupava era o excedente económico ou a parte maldita e não a escassez. Mas a teoria marxista do excedente não é incompatível com a noção de escassez, como procurou demonstrar André Gorz contra Pietro Chioli. O capítulo XIV de O Capital - Mais-Valia Absoluta e Mais-Valia Relativa - é fundamental para elucidar historicamente a distinção entre trabalho necessário - a parte do trabalho que é efectuada para o sustento próprio dos produtores - e trabalho excedente - a parte do trabalho que é efectuada para sustentar a classe dominante, a qual se apropria do sobreproduto social - resultante desse trabalho não-pago - sob a sua forma monetária, a mais-valia: «So kann von einer Naturbasis des Mehrwerts gesprochen werden, aber nur in dem ganz allgemeinen Sinn, dass kein absolutes Naturhindernis den einen abhält, die zu seiner eignen Existenz nötige Arbeit von sich selbst abund einem andern aufzuwälzen, z.B. ebensowening wie absolute Naturhindernisse die einen abhalten, das Fleisch der andern als Nahrung zu verwenden. Es sind durchaus nicht, wie es hier und da gescheln, mystische Vorstellungen mit dieser naturwüchsigen Produktivität der Arbeit zu verhinden. Nur sobald die Menschen sich aus ihren ersten Tierzuständen herausgearbeitet, ihre Arbeit selbst also schon in gewissem Grad vergesellschaftet ist, treten Verhältnisse ein, worin die Mehrarbeit des einen zur Existenzbedingung des andern wird. In den Kulturanfängen sind die erworbnen Produktivkräfte der Arbeit gering, aber so sind die Bedürfnisse, die sich mit und an den Mitteln ihrer Befriedigung entwickeln. Ferner ist in jenen Anfängen die Proportion der Gesellschaftsteile, die von fremder Arbeit leben, verschwindend klein gegen die Masse der unmittelbaren Produzenten. Mit dem Fortschritt der gesellschaftlichen Produktivkraft der Arbeit wächst diese Proportion absolut und relativ. Das Kapitalverhältnis entspringt übrigens auf einem ökonomischen Boden, der das Produkt eines langen Entwicklungsprozesses ist. Die vorhandne Produktivität der Arbeit, wovon es als Grundlage ausgeht, ist nicht Gabe der Natur, sondern einer Geschichte, die Tausende von Jahrhunderten umfasst». Neste texto, Marx rejeita todos os conceitos de excedente derivados do postulado das necessidades humanas irredutíveis. (:::)
(Em construção) J Francisco Saraiva de Sousa
Infelizmente, ainda não estamos na posse de uma arqueologia completa da escassez, mas, no caso de Sartre, penso que ela remonta até à obra de Thomas Hobbes. Quando formulou pela primeira vez a sua teoria económica, Paul Samuelson destacou a figura de Thomas Malthus, mas o seu entusiasmo pela teoria malthusiana da população esmoreceu com a passagem dos anos, acabando por ocupar um lugar muito discreto na sua obra Economia, escrita em colaboração com William Nordhaus. A dialéctica sartriana não começa com o diálogo - o encontro do eu - a praxis individual - com o outro, mas com o confronto com o outro que ameaça a minha liberdade. A relação humana entre indivíduos implica reciprocidade ou igualdade, mas a reciprocidade não está presente na história real dos homens por causa da escassez que transforma o outro em inimigo. Vítima e prisioneira da escassez que faz de cada um de nós o inimigo do outro, a espécie humana é o seu maior inimigo: a visão de Hobbes do homo homini lupus é aplicada à história que, não sendo necessária, tem a sua origem e o seu fundamento inteligível num facto contingente, mas coextensivo à vida do homem neste planeta: a carência de recursos em relação ao número de bocas a alimentar. Malthus já tinha postulado uma tendência universal da população - excepto quando confrontada com a oferta limitada de alimentos - para crescer exponencialmente. Ora, uma população que duplica em cada geração acaba por ser tão grande que deixa de haver no mundo espaço suficiente para todos. Malthus recorre aos rendimentos decrescentes para demonstrar que, dado que a terra é fixa, enquanto os recursos de trabalho aumentam, os alimentos tendem a crescer numa progressão aritmética e não geométrica, como sucede com a população. Assim, «à medida que a população duplica e volta a duplicar é como se o globo estivesse a reduzir-se para metade e novamente para metade - até finalmente se ter reduzido tanto que a oferta de alimentos se situa abaixo do nível de vida necessário» (Malthus). Esta escassez - ou negação em exterioridade do homem pela natureza - é retomada e interiorizada pelas consciências, gerando um clima de violência, no qual decorre toda a história do homem. A inumanidade do homem para o homem é ontologicamente acidental, mas tem uma causa historicamente permanente que é a escassez. A escassez marca com a inumanidade todas as relações entre os homens e coloca em movimento a dialéctica da história: a praxis individual está imediatamente ameaçada na sua liberdade e no seu projecto pela praxis dos outros. No mundo da escassez, as liberdades não podem coexistir sem se submeterem reciprocamente. As praxis individuais objectivam-se nas suas obras e esta objectivação torna-se alienação, já que os outros a roubam ou falseiam a sua significação. Todos os conjuntos são tragados pelo prático-inerte, isto é, pela organização social transformada em coisa, à qual os indivíduos se submetem como a uma necessidade material. Apesar de ter como origem a praxis livre, o que lhe garante a inteligibilidade, o conjunto prático-inerte constitui a antipraxis ou a antidialéctica. O homem nasceu livre, como disse Rousseau, mas em todas as partes é o instrumento do homem, é solitário entre as multidões e só pode realizar a sua liberdade roubando-a aos outros. A série caracteriza as relações intersubjectivas na servidão do prático-inerte. Sartre exemplificou a série com a fila de transeuntes que aguarda o autocarro diante da Praça de Saint-Germain-des-Près: «Essas pessoas - de diferentes faixas etárias, de ambos os sexos, e fazendo parte de classes e meios muito diferentes - realizam na banalidade quotidiana a relação de solidão, de reciprocidade e de unificação pelo exterior (e de massificação pelo exterior) que caracteriza, por exemplo, os citadinos de uma grande cidade, na medida em que se encontram reunidos, sem serem integrados pelo trabalho, pela luta ou por qualquer outra actividade, num grupo organizado que lhes seja comum. Com efeito, importa observar, antes de tudo, que se trata de uma pluralidade de solidões: essas pessoas não se preocupam, nem falam umas com as outras e, em geral, nem olham umas para as outras; existem, lado a lado, em redor de um ponto de sinalização» (Sartre). As pessoas que formam fila numa paragem de autocarro não têm nada em comum, excepto a mesma necessidade de um meio de transporte. Porém, a escassez - «não há lugares suficientes para todos» - torna-as inimigas: o outro não é um parceiro de diálogo, mas um rival que disputa comigo o mesmo lugar. Sartre analisa os colectivos, um após outro, para mostrar que todos eles, em especial o Mercado, a Classe Social e as Finanças, são colectivos de tipo serial: unidades exteriores de actividade de todos enquanto Outros ou, simplesmente, unidades prático-inertes do múltiplo que cada praxis individual produz, mantém e sofre impotentemente como uma sentença selada na matéria pelas praxis seriais. Como é que se pode superar o isolamento das praxis individuais, as suas rivalidades, as suas sujeições e o conjunto do prático-inerte? O empreendimento comum é o projecto colectivo, o único objectivo para o qual tendem as consciências unidas numa mesma vontade. Se a fila de transeuntes numa paragem de autocarro simboliza os colectivos seriais, a multidão que toma a Bastilha simboliza os grupos. Sartre inverte as significações: o número que, nos colectivos, provocava dispersão, solidão e servidão, torna-se, nos grupos, factor de confiança e de dinamismo de acção. O grupo de acção restitui às praxis individuais, num nível superior, a liberdade perdida: a fusão dos indivíduos num grupo revolucionário torna-se o símbolo da libertação colectiva. Mas, para se constituir como tal, o grupo exige a promessa de fidelidade e recorre ao terror: o grupo constitui-se pelo compromisso mediante o qual cada um concede aos outros o direito de o punir no caso dele trair a sua promessa. Acossado pelos seus inimigos externos e pela decomposição interna, o grupo dura como vontade e como acção graças à submissão de todos - livremente consentida - à lei do empreendimento comum. O proletariado-grupo nasce da classe-colectivo através da e na acção revolucionária que visa a supressão do reino da necessidade: o que quer dizer que Sartre descreve a passagem da série ao grupo como a possibilidade da passagem do reino da necessidade para o reino da liberdade. Porém, uma vez nascido, o grupo é confrontado com as servidões da existência social e, para durar, deve criar instituições. (:::)
O que Marx pensava da lei da escassez? Conheço o desprezo de Marx pela teoria malthusiana da população, mas não sei definir claramente a sua posição em relação à escassez. Sartre estava ciente disso, tendo escrito uma secção dedicada à Escassez e Marxismo: «Marx fala muito pouco de escassez e, pelo que creio, é porque se trata de um lugar-comum da economia clássica, colocado na moda por Adam Smith, desenvolvido por Malthus e seus sucessores. Ele considera a coisa como adquirida e prefere - com razão, uma vez que é isso o marxismo - considerar o trabalho como produtor de ferramentas e bens de consumo e, ao mesmo tempo, um tipo definido de relação entre os homens» (Sartre). Raymond Aron criticou a dialéctica histórica de Sartre, alegando que a noção de escassez, tão grata aos economistas clássicos, não desempenhava nenhum papel de relevo no pensamento de Marx e de Engels: o que os preocupava era o excedente económico ou a parte maldita e não a escassez. Mas a teoria marxista do excedente não é incompatível com a noção de escassez, como procurou demonstrar André Gorz contra Pietro Chioli. O capítulo XIV de O Capital - Mais-Valia Absoluta e Mais-Valia Relativa - é fundamental para elucidar historicamente a distinção entre trabalho necessário - a parte do trabalho que é efectuada para o sustento próprio dos produtores - e trabalho excedente - a parte do trabalho que é efectuada para sustentar a classe dominante, a qual se apropria do sobreproduto social - resultante desse trabalho não-pago - sob a sua forma monetária, a mais-valia: «So kann von einer Naturbasis des Mehrwerts gesprochen werden, aber nur in dem ganz allgemeinen Sinn, dass kein absolutes Naturhindernis den einen abhält, die zu seiner eignen Existenz nötige Arbeit von sich selbst abund einem andern aufzuwälzen, z.B. ebensowening wie absolute Naturhindernisse die einen abhalten, das Fleisch der andern als Nahrung zu verwenden. Es sind durchaus nicht, wie es hier und da gescheln, mystische Vorstellungen mit dieser naturwüchsigen Produktivität der Arbeit zu verhinden. Nur sobald die Menschen sich aus ihren ersten Tierzuständen herausgearbeitet, ihre Arbeit selbst also schon in gewissem Grad vergesellschaftet ist, treten Verhältnisse ein, worin die Mehrarbeit des einen zur Existenzbedingung des andern wird. In den Kulturanfängen sind die erworbnen Produktivkräfte der Arbeit gering, aber so sind die Bedürfnisse, die sich mit und an den Mitteln ihrer Befriedigung entwickeln. Ferner ist in jenen Anfängen die Proportion der Gesellschaftsteile, die von fremder Arbeit leben, verschwindend klein gegen die Masse der unmittelbaren Produzenten. Mit dem Fortschritt der gesellschaftlichen Produktivkraft der Arbeit wächst diese Proportion absolut und relativ. Das Kapitalverhältnis entspringt übrigens auf einem ökonomischen Boden, der das Produkt eines langen Entwicklungsprozesses ist. Die vorhandne Produktivität der Arbeit, wovon es als Grundlage ausgeht, ist nicht Gabe der Natur, sondern einer Geschichte, die Tausende von Jahrhunderten umfasst». Neste texto, Marx rejeita todos os conceitos de excedente derivados do postulado das necessidades humanas irredutíveis. (:::)
(Em construção) J Francisco Saraiva de Sousa
8 comentários:
Escolhi um tema muito complicado para o qual ainda não tenho solução: a ideia que quero defender é a de que a escassez não é incompatível com o marxismo. O que é questionável é a sua associação aos desejos ilimitados do homem! É aqui que entra em acção a crítica!
Portugal não pode usar o argumento da escassez de recursos para justificar o seu atraso: este deve-se à sua ineficiência produtiva.
Bem, assunto complicado este que escolhi. Vejo a cena toda e sei que tenho simpatia pela teoria da escassez: ela permite criticar a abundância que faz do homem um animal estúpido.
Estou chocado comigo mesmo: concordo em termos gerais com a teoria da mente de Malthus e com a negação da possibilidade de uma sociedade perfeita. Mas ele é muito reaccionário... Em síntese: o mal cria o esforço e o esforço cria a mente. Isto é verdade e tem sido a partir desta ideia simples que critico esta sociedade consumista e facilitista.
Portugal é, estruturalmente, um aborto: a miséria mental e cognitiva dos portugueses é demasiado evidente. O mal radical reside neste país! É um horror - Portugal é um filme de terror.
Nunca pensei que fosse possível haver tanta mediocridade, ignorância e, claro!, maldade no ensino! Não há verdadeiramente ensino em Portugal! Um horror!
Ai, precisava escrever um livro sobre o tema - não estou seguro de aceitar as teorias da economia primitiva tal como foram elaboradas. Marx dá muitas indicações que apontam para outra via. Hoje temos espaço de manobra para o ler de modo diferente. Afinal, ele foi deturpado.
Hi Tailândia! :)
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