«O melhor processo de aumentar a inteligência dos sábios seria a diminuição do seu número. Bastaria um pequeno grupo de homens para desenvolver os conhecimentos de que temos necessidade, caso esses homens fossem dotados de imaginação e dispusessem de poderosos meios de trabalho. Desperdiçamos todos os anos grandes somas de dinheiro em investigações científicas, porque aqueles a quem elas são confiadas não possuem, em grau suficiente, as qualidades que fazem os conquistadores de mundos novos, e também porque os poucos homens que possuem essas qualidades estão colocados em condições de vida em que a criação intelectual é impossível. Nem os laboratórios, nem os aparelhos, nem a excelência da organização do trabalho científico, fornecem, por si sós, o meio que é indispensável ao sábio. A vida moderna opõe-se à vida do espírito. Os homens de ciência acham-se rodeados por uma multidão cujos apetites são puramente materiais, e cujos hábitos são inteiramente diferentes dos seus. Esgotam inutilmente as suas forças, e perdem grande parte do seu tempo na conquista das condições indispensáveis ao trabalho do pensamento. Nenhum deles é suficientemente rico para conseguir o isolamento e o silêncio que outrora cada um podia obter gratuitamente, mesmo nas grandes cidades. Não se tentou até hoje a criação, no meio da agitação da cidade moderna, de ilhas de solidão em que a meditação fosse possível. Uma tal inovação impõe-se contudo. As altas construções sintéticas estão fora do alcance daqueles cujo espírito se dispersa todos os dias na confusão dos nossos actuais modos de viver. O desenvolvimento da ciência do homem, mais ainda do que o das outras ciências, depende dum imenso esforço intelectual. Reclama uma revisão, não só da nossa concepção do sábio, mas também das condições em que se faz a investigação científica». (Alexis Carrel)
A obra de Alexis Carrel tem estado presente na minha mente - de modo distante, é certo!-, mas só hoje resolvi relê-la: o texto em epígrafe revela algumas afinidades estruturais entre a minha perspectiva da indigência mental e cognitiva do homem de hoje e a atrofia da inteligência preconizada por Carrel. O debate Prós e Contras de hoje (14 de Março) confirma o sentido da nossa preocupação comum: o futuro da civilização ocidental e a possibilidade de renovação do homem ocidental. Os participantes neste debate foram cinco figuras do Parlamento Português - a instituição democrática mais desacreditada em Portugal, cada uma das quais em representação de um partido político: Francisco Assis (PS), Miguel Macedo (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP) e José Manuel Pureza (BE). As novas medidas de austeridade - tomadas pelo governo - estão a ser usadas pela Direita para alimentar a sua sede de poder: a moção de censura está outra vez na ordem do dia. A Direita quer derrubar o governo e devolver a palavra ao povo e, depositando demasiada confiança no sentido das sondagens, já sonha com os benefícios materiais de deter o poder, não para resolver a crise nacional, mediante a apresentação de um projecto alternativo credível, mas para ter acesso - em última análise - ao dinheiro público. Como disse Carrel: «o homem moderno caiu numa completa indiferença por tudo, excepto pelo dinheiro». Muita sede de poder e de riqueza fácil e poucas ideias redentoras: eis o retrato do triste e feio debate de hoje. A presença de deputados degrada a qualidade dos debates moderados por Fátima Campos Ferreira, o que confirma a incompetência dos políticos portugueses e a corrupção que se instalou no seio dos partidos do arco do poder - a eterna tempestade amorosa da promiscuidade, o coito e a orgia da corrupção (Ver o quadro de Oskar Kokoschka, A Tempestade, 1913) - e no próprio sistema político. São políticos deste tipo zombie - analfabetos funcionais - que degradam constantemente a vida regular de todos os subsistemas que compõem a sociedade portuguesa, a começar pelo sistema educativo. O que Carrel disse em relação à imaginação científica aplica-se igualmente à imaginação política: Portugal não precisa do número excessivo de deputados incompetentes que tem no seu feio Parlamento. A Assembleia da República é o rosto visível da degradação da vida política portuguesa: a sua lógica de funcionamento - o debate parlamentar como troca de insultos e de ordinarices, por exemplo - mostra como o regime democrático pode ser usado para destruir a própria democracia. Os homens sem qualidades - hoje o político é, por excelência, o homem sem qualidades de Robert Musil! - assaltaram a Assembleia da República e estão a minar todo o sistema político: o poder político é usado em benefício próprio e a noção de serviço público esfuma-se no ar. O maior problema estrutural e histórico de Portugal é a corrupção - em sentido lato - que se instalou depois do 25 de Abril nas altas esferas do poder. Os vagabundos saloios conquistaram o poder e Portugal é refém deste bando de vagabundos que abusam do regime democrático para garantir as regalias e os privilégios sociais do seu estilo de vida artificial: emprego pornograficamente remunerado sem exigência de qualificações e sem trabalho. Portugal navega sem rumo em águas perigosas, repletas de políticos, empresários e banqueiros corruptos. A decadência estrutural de Portugal deve ser vista no âmbito da decadência geral da civilização ocidental: «Os nossos antepassados realizaram uma obra sem igual na história da humanidade. Os homens que, na Europa e na América, deles descendem, parecem ter esquecido a história» (Alexis Carrel). A existência de políticos que esqueceram a história é um crime: o discurso hipócrita da ideologia dos direitos humanos e o predomínio da temática ética articulam-se com o imoralismo e o individualismo míope da nossa época indigente.
J Francisco Saraiva de Sousa
7 comentários:
Enfim, já não tenho paciência para comentar os ditos dos políticos portugueses - provocam náusea. :(
Os burocratas europeus burros impuseram o tratado de Bolonha e eis o resultado: um bando de burros que se dedica à investigação científica sem fazer a ciência avançar. Os políticos metabolicamente reduzidos estão a afundar o ocidente no ocaso.
Em nome dos direitos humanos, exigem escolaridade obrigatória e não deixam os jovens antes dos 18 anos aprender informalmente um ofício: estes políticos da basura criaram uma juventude cheia de vícios.
Como é que o ocidente pode competir com as economias emergentes com estes idiotas no poder???
O mais engraçado - sem piada - é o facto dos políticos portugueses venderem a imagem de cultos - um atentado contra a cultura. :(
Alinho em muito do que diz, mas não qd refere que Pt está refém dos vagabundos no poder. Continuo a pensar que a única coisa que nos aprisiona é a demissão pública da politica a todos os niveis da governança. Nessa medida é um auto-aprisionamento. Em caso de dúvidas veja-se as taxas de abstenção em tudo qt respeita a vida pública, seja no condominio, na junta de frequesia ou nas presidenciais. A ideia de que é obrigação da politica ( i. é, de quem governa ) resolver tudo qt ao individuo compete, é um optimo refugio para a inacção e para fazer a catarze de todos os inevitáveis insucessos. Ainda há pouco lia na edição on line do DN a história dopercurso de vida de uma jovem licenciada que não encontrado emprego na sua área de ( pseudo ) especialiadade " TEVE" de se tornar empresária. Adorei o "TEVE"! Qual o sub-texto ? Não devia ter tido ? Pq ?
Saudações !
Sim, as pessoas retiram-se da vida pública, sobretudo as que têm qualidade, e esse espaço deixado vazio é ocupado pelos "vagabundos" que, uma vez instalados, afugentam os mais qualificados: era esta a ideia.
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