Votar em Passos Coelho é como escolher aleatoriamente na rua de uma cidade portuguesa um transeunte desconhecido: o risco é total, porque podemos tanto ter sorte como também ser brindados com o azar. Ora, Passos Coelho tem revelado no decurso desta triste campanha eleitoral falta de preparação para desempenhar o papel de Primeiro-Ministro: Passos Coelho quer governar, não porque tenha um projecto nacional, mas porque acha "giro" ser Primeiro-Ministro. Mas isto já todos sabem, sobretudo aqueles que lhe chamam "betinho": o que me assusta mais é a irresponsabilidade que tem revelado em matérias tão sensíveis como são a avaliação dos professores ou a questão do aborto. Embora não tenha um projecto nacional, a não ser a radicalização das medidas neoliberais do memorando da troika, Passos Coelho promete tudo - incluindo o que não pode cumprir - para caçar os votos dos portugueses: homem formado no e pelo aparelho partidário, Passos Coelho joga em todas as frentes sem conhecer as regras elementares dos respectivos jogos. Infelizmente, os políticos portugueses mais jovens não são mais competentes do que os políticos das gerações anteriores: o actual debate político faz lembrar o fatídico debate político da I República, com os partidos políticos em guerra permanente uns com os outros, sem levar em conta o interesse nacional. Em Portugal, a democracia tem gerado uma luta pelo poder que reveste a forma de uma luta pelo emprego público. Em vez de fazerem política, os políticos portugueses andam à caça de oportunidades e de empregos bem-remunerados. A política-caça não só gera a corrupção generalizada, como também quebra a continuidade das políticas e das reformas estruturais tão necessárias ao desenvolvimento nacional. Quando pretende realizar um novo referendo sobre o aborto, pelo menos durante um período do dia de ontem, Passos Coelho está a sacrificar o interesse nacional - a continuidade de políticas já implementadas e susceptíveis de melhoramentos qualitativos - no altar da caça ao voto de determinados sectores sociais do eleitorado: o oportunismo político bloqueia o futuro de Portugal. O PSD finge não ter nada a ver com a corrupção, mas esta é uma feia herança do cavaquismo, bastando pensar no buraco do BPN: os fundos comunitários evaporaram-se algures, talvez nos bolsos de particulares. A verdade é que Passos Coelho não é uma alternativa credível a José Sócrates e não digo isto por me sentir particularmente contente: trata-se de uma mera constatação política. A sociedade portuguesa é uma sociedade bloqueada: aqueles que alcançam as esferas do poder imobilizam tudo à sua volta e queimam a terra para não terem adversários com mérito. Portugal é vítima desta política de terra queimada. Será necessário um dia pensar objectivamente as forças que bloqueiam a sociedade portuguesa e que lhe negam a via do desenvolvimento. De momento, bastará dizer que o grande bloqueio reside nos próprios portugueses: a implementação indiscriminada das medidas propostas pela troika irá evidenciar a violência inerente à sociedade portuguesa. O discurso alucinado de um país moderno e desenvolvido - o discurso de José Sócrates que afinal também é o de Passos Coelho numa versão menos coerente e mais trapalhona! - gerou frustração e esta frustração começa a manifestar-se em actos violentos: os portugueses devem preparar-se para o pior. A violência confinada até aqui na esfera doméstica - o número de homicídios bárbaros está a crescer! - ameaça invadir toda a vida quotidiana dos portugueses. A sociedade portuguesa é demasiado débil, pobre e desigual para sofrer medidas neoliberais: o neoliberalismo caseiro do PSD - aliás um partido mais feudal do que liberal ou social-democrata! - ameaça mergulhar o país na pobreza mais abjecta e na violência.
Os portugueses não podem cair no erro fatal de permitir a formação de uma maioria absoluta de Direita no próximo Parlamento: as sondagens mostram claramente que os portugueses querem forçar os partidos a procurar entendimentos inter-partidários. Penso que o eleitorado português tem alimentado a degradação da vida pública, dando o seu voto aos partidos que alimentam o estado de alucinação colectiva, mas neste caso particular concordo com a intenção de voto: não dar a maioria absoluta a nenhum partido do arco do poder e negá-la à Direita que sonha com a concentração do poder político - um Presidente, um Parlamento e um Governo de Direita. Num cenário em que os lideres políticos não merecem confiança, até porque não são competentes, o melhor é obrigá-los a um entendimento inter-partidário e, se possível, forçar os próprios partidos políticos a substitui-los na chefia do próximo governo. Os portugueses são, pelo menos teoricamente, soberanos no uso que pretendem fazer dos seus votos: o meu voto não pertence a José Sócrates - cujo discurso optimista me arrepia profundamente! - mas ao Partido Socialista. É certo que me movo no terreno do chamado "centrão", mas não me identifico política e ideologicamente com ele. Aliás, penso que o "centrão" é a maior força de bloqueio nacional: o eleitorado do centro é responsável pela decadência nacional, porque vota alternadamente no PS ou no PSD em função de interesses corporativistas completamente estranhos e adversos ao interesse nacional. Quando digo que o meu voto pertence ao PS, faço-o na esperança remota de que o PS resolva assumir uma nova atitude política de esquerda perante o país. (A formação e a composição das listas partidárias do PS e do PSD não permitem depositar a nossa confiança no próximo Parlamento que será o agravamento e a ruína da alucinação nacional!) Tal como o voto de tantos outros portugueses, o meu voto pretende impedir a formação de uma maioria absoluta da Direita feudal portuguesa. Apesar de tudo, votar no PS é garantir alguma prudência na implementação das terríveis medidas propostas pela troika e fechar a porta ao aventureirismo da Direita sedenta de poder. Neste cenário politicamente indigente, é o melhor que posso ou que podemos fazer nestas eleições legislativas: não dar a palavra à Direita reaccionária, aventureira e oportunista! Faz um uso racional do teu voto se quiseres ter futuro...
J Francisco Saraiva de Sousa
1 comentário:
A fórmula de governação do PSD está esgotada e é responsável pela miséria nacional: as privatizações significam desvio directo do dinheiro do Estado para os privados! O que gera corrupção... :(
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