terça-feira, 14 de julho de 2009

A Produção da Notícia

«A notícia é uma janela para o mundo. Através da sua moldura, os americanos aprendem sobre si mesmos e sobre os outros, sobre as suas instituições, lideres e estilos de vida, e sobre os das outras nações e das suas gentes. Substituta urbanizada e urbanizadora do pregoeiro do povo, a notícia tende a dizer-nos o que queremos saber, o que necessitamos saber e o que deveríamos saber.» (Gaye Tuchman)
Newsmaking: o termo foi usado nos anos 70 do século XX para designar uma nova abordagem teórica da comunicação social que deslocou a atenção dos investigadores dos mass media do estudo da mensagem e dos efeitos para o estudo dos comunicadores. O estudo dos emissores passou por duas fases de desenvolvimento teórico: a primeira fase dedicou-se ao estudo de certos factores exteriores - sociológicos e culturais - à organização do trabalho que influenciam os processos produtivos dos emissores, e, como estava ligada à sociologia das profissões, ficou conhecida como sociologia dos emissores, entre os quais se destaca a figura do gatekeeper (seleccionador) introduzida por Kurt Lewin (1947). (:::)
A segunda fase amadurece o estudo dos emissores, dando origem a uma multiplicidade de estudos empíricos que analisam a lógica dos processos pelos quais a comunicação social é produzida e o tipo de organização do trabalho dentro da qual se efectua a produção de notícias. A noção de notícia é ambígua. No seu sentido geral e ordinário, a notícia significa "nova informação" e, neste sentido, encontra-se presente nas conversações da vida quotidiana. Porém, a teoria da produção da notícia destaca uma segunda classe de significados ligada aos meios de comunicação e à comunicação de massas. O conceito de notícia tal como é usado nos meios de comunicação implica três ideias fundamentais: a nova informação sobre acontecimentos, objectos ou pessoas (1), um programa-tipo de televisão ou de rádio, no qual são apresentados itens jornalísticos (2), e um item ou informe jornalístico (3), no qual se fornece nova informação sobre acontecimentos recentes (van Dijk, 1980). A maior parte dos estudos utiliza a terceira acepção do conceito de notícia, sem no entanto evitar a sua ambiguidade. A ideia básica desta nova perspectiva teórica da comunicação reside no conceito de produção: o processo de trabalho é um processo de transformação de um determinado objecto num produto determinado, transformação realizada por uma actividade humana específica, utilizando instrumentos de trabalho adequados (Althusser). O acto de produzir a notícia é um acto de construir a própria realidade e não como se pensa habitualmente um acto de elaborar uma imagem da realidade. O processo de trabalho informativo transforma os acontecimentos ou determinados fragmentos da realidade em acontecimentos informativos: os agentes informativos narram relatos sobre aspectos seleccionados da vida quotidiana que nos apresentam a nós próprios, de modo a constituir a base da (nossa) acção social. Porém, o processo de produzir notícias não ocorre no vazio: o processo de trabalho informativo é um processo de produção que tem lugar sob determinadas relações sociais e técnicas de produção. O profissionalismo dos agentes informativos serve os interesses das organizações informativas e das redes de informação: o trabalho informativo insere-se no seio de processos institucionais complexos.
O elemento determinante do processo de produção da notícia reside na organização do trabalho informativo: as organizações informativas colocam os seus repórteres no terreno, dispersando-os no espaço e no tempo, com o objectivo de cobrir o maior território possível e de descobrir acontecimentos que possam ser transformados em relatos ou discursos informativos. A lógica da escolha de acontecimentos, da negociação das responsabilidades que se sobrepõem e da selecção negociada das notícias do dia obedece aos imperativos impostos pelas cadeias burocráticas de autoridade: as negociações colectivas atribuem o estatuto de noticiabilidade aos acontecimentos quotidianos. A dispersão dos repórteres e das fontes cria uma superabundância de informação que precisa ser peneirada, filtrada e escardeada. Para levar a cabo esta filtragem, as organizações informativas estabeleceram as classificações dos acontecimentos noticiáveis e criaram ritmos de trabalho: são estas classificações prévias que atribuem a qualidade de noticiabilidade aos acontecimentos, reduzindo a sua idiossincrasia como matéria-prima das notícias. No entanto, estas classificações não privam os repórteres de algum espaço de manobra. Embora os relatos informativos sejam editados e supervisionados (função editorial), os repórteres podem negociar com colegas nas suas próprias organizações informativas e com outros pares pertencentes a outras organizações sobre a cobertura de relatos específicos e as práticas informativas adequadas. As fontes de notícias e os factos constituem-se reciprocamente: a rede informativa identifica algumas fontes e instituições como a localização apropriada dos acontecimentos e, deste modo, descarta outras fontes e instituições. Além disso, as práticas informativas geram líderes quase-legitimados que funcionam como fontes quando os agentes não legitimados não estão disponíveis para criar acontecimentos: os métodos de reportagem e a prática do comentário nos canais de televisão exemplificam este dispositivo que gera uma trama de facticidade com a finalidade de conservar e manter a credibilidade das notícias e de legitimar o status quo.
A notícia legitima a ordem estabelecida e, neste sentido, a notícia como forma de conhecimento é ideologia. Historicamente, a emergência da notícia, das organizações informativas e do profissionalismo está ligada aos desafios colocados pelo capitalismo do século XIX ao mercantilismo colonial e, já no decurso do século XX, ao capitalismo das grandes empresas: a liberdade de imprensa mais não é do que a legitimação das exigências de liberdade de expressão feitas pelos proprietários e pelos profissionais da informação. Estas exigências e as práticas informativas de rotina constituem a notícia como ideologia, como um meio de não conhecer, um meio de ofuscar e, deste modo, legitimar o miolo da actividade política e empresarial. (:::)
A problemática teórica da produção da notícia oscila entre uma perspectiva microsociológica e uma perspectiva macrosociológica, as quais tendem na maioria dos estudos empíricos que recorrem à etnografia dos emissores e dos seus contextos de produção a combinar-se e a articular-se na clarificação dos processos de interpretação e de representação envolvidos na fabricação das notícias. Grosso modo, a pesquisa americana (Gans, 1979; Tuchman, 1978; Fishman, 1980) privilegia a perspectiva microsociológica, enquanto a pesquisa europeia, mais especificamente inglesa (Halloran, Elliott & Murdock, 1970; Cohen & Young, 1981; Chibnall, 1977; Hall et al., 1980; Downing, 1980; Hartmann & Husband, 1974), alemã (Strassner, 1975, 1982; Kniffka, 1980; Lüger, 1983) e holandesa (van Dijk, 1980), adopta uma perspectiva macrosociológica que lhe possibilita explicitar com maior detalhe e acuidade o papel das ideologias na produção das notícias. (:::)
Os estudos da produção da notícia têm o mérito de libertar o estudo dos emissores da abordagem anedótica dos jornalistas que, tratando geralmente de um caso ou de temas nacionais, descreve a vida quotidiana e as rotinas dos indivíduos que elaboram notícias e, nalguns casos pontuais, demonstra como se manipulam as notícias e como se deformam os factos. Estes relatos impressionistas e superficiais produzidos por jornalistas para jornalistas não constituem análises rigorosas do resultado jornalístico, deixando na penumbra ideológica os problemas de organização, as rotinas jornalísticas, os valores e o controle corporativo ou político: as histórias que relatam sem as analisar constituem dados de primeira ordem que podem ser utilizados para a elaboração teórica de uma sociologia quotidiana da produção jornalística.
(Em construção) J Francisco Saraiva de Sousa

140 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Espero que desfrutem o tema deste post, porque tenho de tentar sintetizar estudos muito complexos, de modo a torná-los rapidamente acessíveis, pelo menos nas suas linhas teóricas gerais. Além disso, como não sou inocente, preparo-me para iniciar a crítica do jornalismo luso. :)

Bem, nos últimos meses, não tenho escrito sobre sexo ou depilação, embora haja aqui - neste post - sexo. Mas para o explicitar teria de aprofundar mais o tema e virar as armas produzidas pelo newsmaking contra o feminismo. Bah... mas deixo aqui uma questão: a invasão feminina de tantos sectores de actividade não estará a contribuir para a nossa decadência civilizacional e para a falta de qualidade que observamos na educação, na cultura, na política e noutras actividades públicas? Por exemplo, a blogosfera mostra que os blogues produzidos por mulheres giram em torno de temas da corte!

Fräulein Else disse...

ahahah!

A última parte é verdade. Eu sou mulher, feminina, e defendo as mulheres, gosto (mto) de sexo, mas n percebo e repudio essa tendência exibicionista que as mulheres têm e que demonstram nos blogues. Parecem cadelas com o cio. Muito feio. Deviam mostrar que têm mais neurónios e menos hormonas.

Fräulein Else disse...

Mas o resto do comment é absurdo e erróneo. Repare que mulheres há filósofas (com obra original e não meras comentadoras)? Muito poucas, logo, a crise do pensamento tem assinatura masculina. Que mulheres há nas finanças? E na política? Muito poucas - a corrupção, crise financeira e económica tem assinatura masculina... etc, etc, etc. Seria muito fácil pensar como o Francisco e o problema resolver-se-ia, mas n é a verdade. :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, neurónios mais hormonas dá neuronas! Sim, são muitas as neuronas.
Mas também existe a sua contrapartida masculina e na educação predomina o elemento masculino. Ora, essa degradação pode ter algum tipo de associação com essa expansão do elemento feminino, de resto cronologicamente evidente, o que não significa que não hajam mulheres competentes e homens frouxos e moles. Porém, a integração da mulher na vida pública teve efeitos negativos na sua qualidade e isto afectou a masculinidade, tendo em conta os desequilíbrios sociais evidentes. Parece-me evidente e o assunto pode ser estudado objectivamente.

Soluções existem mas as pessoas vivem deslumbradas com o seu vazio existencial e, por isso, são inaptas para o estabelecimento de um diálogo racional. O cenário é muito negro! E agora com a gripe a conquistar terreno! Bem, as epidemias e pandemias sempre tiveram um efeito benéfico na renovação da geração humana, mas com as desigualdades imperantes não nos libertamos por este meio dos corruptos e dos turistas levianos! Egoísmo atroz: falta de responsabilidade total.

E. A. disse...

Ya, e há homens que não sabem as regras da gramática: quando o verbo haver se conjuga como existir, SÓ se escreve no singular. :P

E. A. disse...

Bom, não concordo consigo, digo-lhe até que, profissionalmente, noto as mulheres muito mais competentes e trabalhadoras, até pq precisam de se esforçar o dobro para provar a sua credibilidade. Não concordo, de todo, consigo.

Quanto ao facto do Ocidente se estar a efeminar, no sentido de enfranquecer, isso é notório, até nos "nossos homens" que andam muito "gays", no mau sentido. Muito coninhas. Desculpe o termo, mas é este o termo. Falta coragem, audácia! :D

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Lapso - em vez de masculino era feminino:

... "na educação predomina o elemento feminino".

Sim,a Else é muito inteligente, porque sabe conjugar alguns verbos; outros desconhece. :P

E. A. disse...

Ui! Não disse que era inteligente, sabe que qd o "corrijo" até sou discreta e faço-o por outras vias. Mas esse "hajam" é de me fazer bolsar, é um erro demasiado crasso. :P

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Se andam coninhas, algo se passa? Algumas mulheres competentes, mas a maioria é galinha oca!

E. A. disse...

O problema das mulheres é que são muito "bitches"; deviam ser mais seguras e racionais. :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah... a língua é feita pelos utentes e pode ser modificada. :)

E. A. disse...

Bah! Que fuga tão infantil. :P

Tenho de trabalhar, a noite será longa! Boa noite

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hummm... o problema é outro: falta de cabeça e de substancia cinzenta organizada. :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Infantil não, mas adulta, porque só os adultos estão libertos de tutela para criar.

Fräulein Else disse...

O quê? Deve estar a brincar. As crianças n fazem outra coisa senão criar! A partir do momento em que entram na escola é q começam a "atrofiar"... a "deformação" mental bem conhecida.
Fique lá com a tutela! E dê erros grosseiros à vontade! Ça m'est égal!!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Erro craso? Deve soar bem, mas não há erro, porque tenho conjugado o verbo das duas maneiras e só nalguns casos uso a forma "hajam"... Não há regra que o proiba: é tudo convencional! Sobretudo, com a expansão da língua e a sua diversidade mundial. Ou também vai "corrigir" os brasileiros, angolanos ou moçambicanos? Ok see you...

Fräulein Else disse...

"não hajam mulheres competentes e homens frouxos e moles" . É "haja", no singular, e por mim chega, se soubesse q ia ficar tão melindrado, n diria nada. Bye! :P

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

As crianças não criam: este é o seu erro crasso. Sem os adultos e a cultura herdada, as crianças morrem atrofiadas, como o mostra o caso das crianças selvagens. Está baralhar noções diferentes: capacidade de aprendizagem é grande ou, pelo menos, o impulso para aprender é grande, mas sem os elementos culturais atrofia-se.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, a Else parece ser um cinto-de-castidade gramatical! E eu lembrei-lhe que a linguagem pode ser modificada e já existe em diversas formas modificadas.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O que uma criança sozinha pode criar? Nada, porque simplesmente morria e, mesmo que vivesse, seria burrinha! :P

E. A. disse...

Sim, isso é verdade, sou muito perfeccionista com a gramática em português e nas línguas q estudei. Faz-me confusão ver erros. :(

Pronto, ganhou! :D
Agora é q vou!

E. A. disse...

Hmmmm... não!

Conhece a tese do Rancière sobre o "mestre ignorante"? É muito pertinente, exponho noutra oportunidade. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, mas pode corrigir, porque não fico melindrado.

Como educadores somos diferentes: eu prefiro desafiar as crianças, a Else prefere deslumbrar-se com as suas coisinhas infantis. Enfim, ensinar em vez de aprender ou infantilizar. Ok bye

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Um mestre ignorante não é mestre! E, se for mestre, não é ignorante! O resto é história! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Claroqque conheço o pupilo de Althusser, mas ele não é grande coisa em termos de pensamento. :D

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Só mais uma coisinha: acreditar que se pode aprender alguma coisa com as crianças ou dar aulas deixando-as opinar como se fossem sábias - deu origem a mediocridade que vivemos. Outro erro crasso e grosseiro: agora vivemos na ausência de conhecimento transversal. Que horror o "mestre" - ou o diplomado - ignorante! :(((

E. A. disse...

Hmmm... não, "horror" é o mestre ou diplomado que pensa que sabe muito. O Francisco, de vez em quando, esquece-se das lições do único e verdadeiro mestre: Sócrates. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E Sócrates era realmente ignorante? Acho que não..., além de ter outra teoria do conhecimento que não podemos aceitar sem crítica. Mas tem razão: não acredito no diálogo como meio de aprendizagem ou como base para a construção positiva de algo substancial e, neste aspecto, sou paradoxalmente socrático: a filosofia está marcada pelo monólogo criativo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Como conceptual designer, detecto essas falhas de pensamento nos estudos e, de certo modo, elas devem-se a essa necessidade de diálogo, isto é, de integrar tudo o que é dito pelos outros. O pensamento não deve satisfazer essa paixão pela ignorância. É preciso coragem e romper com o espírito de rebanho que invadiu a nossa sociedade. Não quero ser um mero "carneiro", como diz a figura popular.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não vejo o problema em termos de saber tudo ou de não saber nada ou fingir que não se sabe, mas em termos de bom senso: a criação é individual e nem todos podem ser criativos, porque somos todos diferentes: a liderança é saudável.

Veja o que se passa com as reformas em Portugal: ninguém quer mudar ou reformar; as pessoas querem é facilidade imediata e dose brutal de ilusão.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Aliás, as pessoas já não sabem dialogar, porque o diálogo implica o escutar o outro e, nesta hora obscura, ninguém escuta ninguém: todos gritam e reivindicam sem dar nada em troca, mesmo um mero sorriso.

Como é que uma criança pode criar filosofia ou ciência se não as conhecer previamente? Precisa aprender para entrar no mundo dos adultos; ficar pela aprendizagem da língua e abusar dela não é criativo. Dá vontde de "espancar" - ignorar - esses atrasados mentais!

Fräulein Else disse...

AAAaah! :'( snif snif
Gosto de si, mas acabou de me desiludir! Nesse aspecto estou resolutamente em desacordo, aliás, é mesmo uma questão de fé. Como dizia uma professora que eu admirava muito: "se a filosofia existe, existe na sala de aula", ou seja, existe somente em diálogo. Não em teses de prateleira. Isso é uma maneira de fazer filosofia mas menor, não é a maneira dos que criaram e tinham fé na filosofia: Sócrates e Platão. Tudo o resto é que são histórias! Como diz Whitehead: notas de rodapé a Platão.

Mas, pronto, admito q somos incompatíveis! Os gregos são e serão os meus únicos mestres. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas já reparou que essa metodologia de ensino produziu diplomados filosóficos analfabetos? Se ela tivesse sido bem sucedida, não viviamos em regressão cognitiva. A Else diz que a ausência de pensamento edificante com assinatura masculina é um horror e, no entanto, teima em voltar a insistir no mesmo erro: o diálogo que na realidade é grito na sala de aula como método de aprendizagem. Como é que um ser cognitivamente virgem pode interpretar um texto filosófico? Opina e finge saber o que deveras ignora. :)

E. A. disse...

Mas isso é um partis pris seu: n há diálogo na sala de aula! O problema é esse. O diálogo é difícil, n é gritaria e opinite.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Hummmm... Platão dialógico? Logo o divino e autocrata filósofo da ordem estatal chamado Platão? :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Eu não sou contra o diálogo e quem ensina fá-lo dialogando com os alunos. Coisa diferente é assentar a aprendizagem num suposto diálogo-parteiro sem parteiro.

E. A. disse...

Opina e finge saber o que deveras ignora

Precisamente!É esse o dever da filosofia, demascarar a ignorância, o preconceito, o confortável. A filosofia intriga, perturba, choca, porque n é natural. Temos sempre de ter isso em mente, Francisco: a filosofia é contrária à vida, é contra-natura.

E. A. disse...

Oh, claro q sim Francisco, n me vai "obrigar" a fazer referências sobre o pensamento do autocrata Platão... ;)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Prefiro o Sócrates moscardo e enguia eléctrica: pedagogia de choque. :)

E. A. disse...

Sócrates era insinuoso, n era "chocante"... a filosofia é insinuosa sim, uma boa imagem. Sensual pq dá prazer e perigosa pq pode por em causa o equilíbiro da comunidade - manifesto na condenação de Sócrates.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não conheço nenhum interprete de Platão que o tenha visto como um filósofo do diálogo, tanto na direita como na esquerda.

Hummmm... a Else está a ser mais humeana do que socrática com essa sua noção de contra-natura. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, chocante... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E põe em causa a sobrevivência dos que a praticam..., mas eles são vítimas - se forem genuínos - da sua genética e da configuração cerebral.

E. A. disse...

"Não conheço nenhum interprete de Platão que o tenha visto como um filósofo do diálogo, tanto na direita como na esquerda."

Ai, por favor. Platão por inúmeras vezes fala da forma escrita como a morte da sabedoria, por atrofiar a memória e a imaginação. Mas precisa de se socorrer em filósofos que leram Platão? basta ir aos textos. São sempre uma refrescante leitura.

E. A. disse...

Não, não era "chocante". Aliás, chocante é um termo já cristianizado, decadente, os arrebatamentos que os "doentes" precisam de ter, para obter algum prazer. "Chocante" são as notícias. :P

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, não a li bem, talvez porque estava a pensar em Hannah Arendt, uma boa pista para Sócrates e superior à patetice popperiana. O choque é o trauma da aprendizagem: para ser filósofo o aprendiz deve estudar muito, escutar e ler muito. A iniciação isola da vida, mas isso faz parte de qualquer aprendizagem cognitiva, filosófica ou científica. Como escolhem o vinho e a rua, os estudantes universitários abdicam do conhecimento: procuram um diploma que lhes garanta corruptamente um lugar ao sol, mesmo que tenham umas orelhas de burrinho grande.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O choque é uma imagem grega e é usada por Sócrates. Também não tenho um preconceito negativo contra o cristianismo que reteve de Platão o inferno como castigo eterno. O mestre não era democrata: não há leitura que desminta o seu desprezo pela democracia. A utopia platónica é uma utopia da ordem e inspira-se retrogradamente em Esparta.

E. A. disse...

"A iniciação isola da vida" - sim de acordo :)

Mas o conhecimento vai da vida para a reflexão, da vida para os livros, n o oposto. É preciso viver escutar observar experimentar.

E. A. disse...

Ninguém disse que Platão era democrata. E onde é que Sócrates fala de "choque"? :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Quando define a sua arte de "parteiro do espírito", onde revela o pensamento e o define como diálogo "interior"...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ontem estava com sono, mas vou tentar conceptualizar sem opinar.

1). Não concordo com a tese de que o conhecimento parta da vida vivida. Todos já fomos crianças e eu lembro-me de ter sido raptado da vida para ser alojado num outro universo - o do conhecimento e do pensamento conceptual, ao qual não resisti. O conhecimento rapta a nossa vida e os seus seres que tomam conta da nossa mente anseiam pela sua própria vida. Somos desde logo colonizados pelos seres desse universo cultural, linguístico e cognitivo, a partir do qual podemos tentar elaborar a nossa própria identidade que, afinal, é também um microcosmos conceptual. Enfim, precisamos lutar e lutar para encontrar um sentido, mas se esse sentido for cognitivo estamos desde logo afastados da vida: a filosofia exige entrega total.

2). Sobre Sócrates, recordo três imagens: a do moscardo que acorda as pessoas do seu sono profundo, levando-as, incitando-as a pensar e a problematizar, a da parteira que traz a luz o conhecimento, e a da arraia que as paralisa com as suas perplexidades. As 3 imagens arrancam a pessoa do mundo para que possa pensar. A partir desta iniciação o mundo nunca mais volta a ser seguro: o conhecimento inquieta e atormenta o espírito.

3). A própria experiência que fazemos do/no mundo é moldada e mediatizada por este pool de conhecimentos prévios. Sem esse pool somos "seres patetas" entregues a sensações e a imediatismos carentes de significação profunda.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, o choque implica a mudança de mundos: o pensamento convida-nos a passar do mundo seguro para um outro mundo, portanto uma mudança de perspectivas. É o que significa "choque" na expressão choque cultural usada na antropologia cultural. As 3 imagens de Sócrates podem ser lidas a esta luz: implicam uma conversão.

Unknown disse...

a discussao n está algo desviada do tema? :)
Ao menos falem tb do socrates beberrao e mulherengo, oh.



Mas, voltando ao tema:

http://www.youtube.com/watch?v=pcvdSBSNF1Y

http://silviokoerich.blogspot.com/



>:>

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, completamente desviada do tema da notícia, embora o rasgar do véu ideológico da notícia possa ligar essa disparidade. :)

E. A. disse...

Então sobre o ponto 2, está correcto, mas n sei o que é que essa "imagem" que tem de Sócrates contraria aquilo que estávamos a disctutir acerca do método dialógico ou dialéctico, o único método para a verdade.

Sobre o ponto 2, é claro que temos sempre conhecimentos prévios na experiência do mundo, faz parte da nossa natureza, uma condição pré-predicativa. Mas esse conhecimento prévio é distinto do conhecimento de facto, este último que eu oponho à vida.

No ponto 1 é q discordo completamente, o conhecimento vai da vida para a reflexão, só pode ter este caminho e senão tiver, o conhecimento que daí deriva é uma abstracção sem fundo. A vida autêntica n é a ascética, essa é pobre e decadente, como tão bem Nietzsche soube descrever. O desafio da vida é "beber mais que todos, sem contudo nos embebedarmos", ou seja, sem contudo perder aquela distância que uma iniciação na filosofia nos deixa, como fazia Sócrates no célebre "Symposium". :)

E. A. disse...

Ah e o Sr Paulo estava-se a referir ao tema das "mulheres" e não da notícia... ;)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, a notícia também transformou o mundo das mulheres e, se inicialmente lhe era avesso, depois ajudou a legitimá-lo. Mas porque diz que o Paulo se referia ao tema das mulheres?

E. A. disse...

porque sei ler:

"a discussao n está algo desviada do tema? :)
Ao menos falem tb do socrates beberrao e mulherengo, oh."

Unknown disse...

Das "mulheres" mas sem tb perder de vista Socrates, o qual, segundo parece, era bastante parcimonioso na materia :)
Vejam o q encontrei ao proc por Zópiro http://www.geocities.com/Athens/4539/socrat/o_senhor_de_si_mesmo.htm

No excerto nao diz, mas, segundo o mesmo Cicero, a fisionomia indicaria q os vicios seriam o de ser: "idiota" "estúpido" "mulherengo"

:P


A pp de nieztsche, desde q o li, nunca mais vi a sociologia com os mesmos olhos... LOL

coolness
http://www.youtube.com/watch?v=4F-CpE73o2M

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O Sócrates é tudo isso? Lorenz diz que ele tinha aspecto de "animal" domesticado. :)

Sim, Nietzsche nunca estudou verdadeiramente sociologia, mas isso também não interessa. »_»

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Depois de concluir este post, vou fechar para obras! A blogosfera tuga é muito chata. Porquê? Porque sim... £_£ \_/ %_% §_§ ----»

E. A. disse...

Ahahah! faz bem! Eu em setembro vou-me embora e este blog sem mim é chato.

Bisou*

-->estou brincando, veja lá senao fica chateado!

Iacobus disse...

Ainda bem mesmo!, para ver se não me fico para retardatário... É q já estou dois posts atrasado! :D (sem tempo...)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estive a ver o meu FCPorto a vencer os amiguinhos "agressivos" do Leixões e fiquei lixado com o pseudo-penalty. Bem, estamos em Portugal..., onde acontecem essas coisas de jogo pouco transparente e bloqueado pelos adversários.

Eu raramente fico chateado... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah... vencemos por 3 e temos uma excelente equipa para vencer e triunfar no campo, como é prática habitual do FCPorto: jogar e vencer no campo sem a palhaçada televisiva ou da imprensa fascista. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Oh Else: o meu blogue e eu não somos chatos; apenas ocupamos o lugar que é o nosso, cumprindo a missão prevista, sem desvios populistas ou sexistas.

De resto, aprecio muito a vossa intervenção neste espaço de reflexão livre. Obrigado amiga e amigos! _-_-_-_-_-_-_----»

Fräulein Else disse...

De nada, querido amigo F. Tb gosto de si. E terei saudades de o ler qd abandonar a blogosfera... que lerei? Pouco restará! :(

Mas é assim a vida, nasce-se e morre-se. E os blogs, criações humanas, obedecem ao mesmo movimento.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estava a pensar que podia desmistificar a produção tuga das notícias e, se gostasse de fulanizar, seria fácil colocar nomes e destruí-los, porque escutando os comentários da tv ou os editoriais ficamos esclarecidos. E muitos estudos interessantes mostram que a tv, além de fomentar o conservadorismo, é responsável por este triste estado de coisas. Mas precisava de aliados na blogosfera..., eles não são melhores do que o jornalismo medíocre. Não vejo saída para um futuro melhor! ?_?

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sr

Não lhe disse que a teoria da produção da notícia põe em causa a sociologia de um modo mais radical do que Nietzsche: a sociologia é definida, tal como a notícia, como um "não saber", isto é, como ideologia. Os pressupostos filosóficos desta crítica da sociologia são complexos e assentam em filosofias edificantes aparentemente diferentes, tais como a fenomenologia e o marxismo. No entanto, esta é uma questão da filosofia das ciências sociais que já aflorei noutros posts. Julgo que essa nova matriz filosófica deve ser repensada, porque introduz uma ruptura importante no saber ocidental, cujas consequências ainda não foram seriamente pensadas. Devo confessar que eu próprio vacilo quando me confronto com certos efeitos dessa ruptura. Porém, se levarmos em conta as suas raizes filosóficas, o empreendimento é digno de ser pensado, até porque implica uma reavaliação da actividade filosófica e a sua afirmação contra o não saber das ciências sociais.

Além disso, a nova matriz é capaz de dar conta do fenómeno da globalização de um modo interessante, porque descobre atrás da diversidade um conjunto de atitudes comuns a todos os povos no espaço e no tempo. Ora, essa atitude comum revela-se claramente no ciberespaço, apesar da sua aparente diversidade. Pena é que o nosso tempo seja o tempo do declínio que aguarda a catástrofe e a morte. Isto é: já não vale a pena pensar um projecto novo para um mundo moribundo: o mundo está condenado à morte e as pessoas que o habitam já não são humanos mas zombies.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Else

Ah... E esta nova matriz ajuda a compreender o fenómeno da criatividade que tanto a fascina, coisa que não acontece recorrendo aos modelos sociológicos tradicionais que tratam o indivíduo como um mero portador ou suporte de determinações estruturais sociais. A sociologia clássica e o pensamento social dominante bloqueiam a criatividade e legitimam a perpetuação da ordem estabelecida. A mudança não faz parte do seu vocabulário conservador e reaccionário. Mas a afirmação da criatividade nasce da não aceitação da notícia como relato verídico. Aceitar a notícia é contribuir para a propaganda das instituições informativas no seu investimento como instituições legítimas.

O problema é que já não vivemos numa sociedade de humanos: os projectos são projectos de homens para homens e não para zombies.

Unknown disse...

"Os pressupostos filosóficos desta crítica da sociologia são complexos e assentam em filosofias edificantes aparentemente diferentes, tais como a fenomenologia e o marxismo. No entanto, esta é uma questão da filosofia das ciências sociais que já aflorei noutros posts."

Não me parece q tenha lido esses posts... Posso saber quais são? :)
Ontem li e diverti-me bastante foi com aqueles seus posts do ciber-sex ehehe
Tem lá dados especificamente sociologicos que desconhecia, mas a melhor parte é mesmo a descrição voyeuristica que faz dos seus chats e demais inter-actividade com aquele ppl huehuehue Se quer saber, a parte q mais me surpreendeu, foi mesmo a do alto indice de heteros-homens, que, pelos vistos, pelo menos virtualmente, dá pros "dois lados" :))) Mew, q vergonha, sendo assim bem q prefiro a progressiva femininização do ensino, sempre existirão menos problemas de identidade por parte dos alunos :P
Axei interessante o pouco q li sobre a corrente macro-sociologica, howeva, não tou pp/ ali a ver grande novidade... :O Mas, se o diz, deve ser mesmo pq nao conheço na especificidade...


Quanto ao nietzsche, nuff respect, man! o homem exagerou uma beca com o socrates e exaltava máximamente qualidades burguesas como a prudencia e o egoismo, mas, é inegavel, desmontou tudo q lhe apareceu à frt, lol Nao so a sociologia, como a pp filosofia, psic, religiao, ideologia, moral, cultura............ até o principio de realidade(efectividade)!!
E aquela lucidez extrema, mesmo até na doença, fack, de se dirigir ao futuro............... hihihi melhor nem me prolongar mais :P

Pras suas ferias, se quiser sacar alguma musica http://ipsons.forumeiros.com/forum.htm Veja o topico "Gravaçoes Historicas", deve ter coisas q goste. (podem é ja tar alguns links off :)


0/

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Veja o post O Problema da Realidade, onde trato de uma vertente: o resto está espalhado por diversos posts.

Oh, mas essa ambiguidade de comportamento hetero-homo também se deve à ominpresença feminina, embora possa reflectir uma variável oculta que nunca foi identificada por causa de preconceitos sexuais e religiosos que podem ser revelados pela crítica de Nietzsche. Porém, o facto da história do homem ter sido patriarcal deve levar a pensar porque foi assim e não de outro modo mais libertário. A tarefa da filosofia é derrubar mentiras e preconceitos seculares e pôr a realidade à luz do conhecimento crítico.

Pena que Nietzsche não tenha apreendido que a ordem moral era efectivamente uma nova ordem económica: neste aspecto ficou àquem do espírito dos tempos modernos, contribuindo para o seu ocultamento.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

A crítica que faz a Marx também pode ser feita a Nietzsche: inverter Hegel é permanecer prisioneiro de Hegel; inverter Platão é permanecer prisioneiro de Platão. Hoje a crítica do sistema precisa ter em conta os resultados dessas operações de inversão: podem não ajudar a mudar o estado de coisas existente. E veja que Marx contribuiu para o triunfo do economicismo, mesmo do neoliberal, e Nietzsche para a legitimação de certos movimentos totalitários, desviando o foco da atenção para temas inofensivos para o status quo. A única diferença é que o pensamento de Marx é inconformista e, neste sentido, pode continuar a inspirar a tarefa de transformar o mundo. Há em Niezsche uma matriz conservadora que entrou na esquerda com resultados catastróficos e Heidegger viu isso... na sua perspectiva, claro. Os conceitos nucleares de Nietzsche são ultraconservadores e é preciso ter isso em conta quando se lê a sua obra ou se dialoga com o seu pensamento. Isto não significa que não tenha dado contributos profundos para o desocultamento radical. Como ele diz noutro contexto: precisamos usar luvas para manusear a sua obra. Sejamos responsavelmente críticos e construtivos!

Obrigado pelas sugestões musicais! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, a matriz de que falei é uma crítica radical da ciência e da sua pretensão à verdade exclusiva. Claro, encontra alguns elementos em Nietzsche, de resto incorporados, mas esses elementos são elaborados a partir de Husserl: é precisamente aqui que essa matriz implica uma mutação radical no saber ocidental, porque permite pensar o erro milenar. Mas esta é uma visão radical: reformular toda a tradição ocidental, um empreendimento levado a cabo por Adorno e Horkheimer. É uma revolução simultaneamente conceptual e social --- política! Fascinante se vivessemos num tempo de homens e não de zombies!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Um desafio tecnológico: Como se sabe, Marx era um optimista tecnológico: o desenvolvimento tecnológico entraria em contradição com as relações de produção capitalistas, produzindo com a ajuda dos agentes humanos o salto qualitativo.

Esta é uma das ideias mais claras de Marx, mas também a que produziu mais polémica. Por exemplo, as novas tecnologias da comunicação permitem operar uma mudança e, no entanto, apesar das pessoas terem acesso a Internet, o que vemos no ciberespaço é tudo menos um esforço de mudança qualitativa. Esta inércia pegajosa humana coloca a questão de saber se a tecnologia é neutra, como parece supor Marx, ou "perigosa": o que vemos é a história a seguir o seu lado mau, como diz Marx na Miséria da Filosofia, uma obra muito actual.

Pra todos os efeitos, as grandes teorias não souberam identificar e tematizar o elemento que produz essa inércia, fazendo da utopia mera quimera! E, como digo, mesmo sabendo onde reside esse elemento, já é tarde: o mundo está em estado de morte adiada.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Aliás, quem estiver atento ao que aqui escrevo não precisa recuar e ler outros posts, porque nesta caixa de comentários coloquei em movimento essa matriz teórica, apesar de dizer -- já é tarde para salvar o mundo. O facto de permanecer talvez incompreendido já é sintomático: o homem de hoje é um morto adiado. Como posso ser mais explícito sem chocar a lacuna humana? E como me podem compreender sem ter compreendido o momento de verdade de Nietzsche? Mas, para compreender estas conexões, seria necessário já ter compreendido previamente os seus elementos isolados! Eu sou um construtor de pontes: a minha prática filosófica é edificar pontes e conectar os nós uns aos outros, de modo a mover uma constelação em perpétua mudança de configuração.

Bem, poderão retorquir: precisa elaborar tudo isso de forma mais sistemática. Talvez sim, talvez não...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Para os mortos adiados -- claro, no sentido não hegeliano do termo, em cuja filosofia significa o oposto do uso que faço aqui da expressão --, a verdade é traumatologia: a verdade aniquila-os enquanto projectos ilusórios.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Santo António pregava para os peixes; eu dialogo comigo mesmo no deserto dos mortos adiados! Como filósofo, procuro salvar a minha própria alma-memória, como se estivesse a salvar um mundo já perdido.

Quantos deslocamentos teóricos operei nestes breves comentários? Quantos objectos intra-teóricos construi? Quantas pontes edifiquei? Quem souber responder está salvo! ::::)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Um enigma-pista:

O vector da redução fenomenológica de Husserl foi completamente invertido, mas como sou consciente de habitar um deserto de mortos adiados, portanto o abismo, procurei recuperar -- ao mesmo tempo -- uma dialéctica peculiar, quasi-platónica, distanciando-me infinitamente...

Ora, os conceitos que uso estão sobrecarregados de teorias, aliás são nós teóricos complexos que vão tecendo uma teia que se move em constelação... A sua compreensão exige um salto mortal sem salva-vidas... ººººººººººªªªªªªªªªªªªª**********^^^^^^^^^^^^^`````````?????????"""""""""""""""""""""""""""""""222222

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ou talvez calvinista, quem sabe?

Unknown disse...

calvinista? coessa trunfa toda?? :))
E, construtor de pontes? n acha q ja sao demais no Porto? hihi
Sobre essa alma-memoria, tb n haverá por aí uma especie de sindrome de estocolmo? é q me ta a parecer estar a sentir-se refém dessa ideia... Kiddin'. :)
Lembrei-me do Kundera: " A luta do Homem contra o poder, é a luta da memória contra o esquecimento".
Sobre o nietzsche, discordo quase em absoluto sobre a interp q faz.
Nietzsche espalhou merda no ventilador em tdas as direcçoes, o conservadorismo é so aparente e má criação da irmã e marido. Mesmo o heidegger, na 2ª fase foi corrigindo a interpretação q fez e demarcou-o, claramente, do reich e junger(as ideologias;)
Adorno e Hork? herdam a noia anti-tecnicista do heidegger, jawohl. Perderam-se mt por aí, eu acho, mas, tb o q seria termos q suportar um adorno a explicar mecanica quantica ou t da relatividade lolz
Ainda bem q so nos ficou o adorno assim como o conhecemos, portanto :)

A ver se ate amanha ainda leio o post q indicou, thx.

Ah, passei o seu blog a um amg pra ele linkar ao dele(tecnologa LOL), n se admire se começar a ser citado nos media da cidade...

rotfl


asta la vista 0/

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sindrome de Estocolmo? Bah..., não fui raptado e, como tal, não me identifico com os raptores. Estou é com "depressão cognitiva"! E, nessa situação, tenho a mente raptada pelo pensamento, mas isso não me preocupa, porque ter a mente colonizada desse modo é bom.

Gostei da imagem: Nietzsche = merda ventilada. Não sou avesso a Nietzsche, até porque o seu inacabamento total dá pistas e orientações para o pensamento. Não disse que ele era responsável pelo nazismo, tal como Marx não é responsável pelo economicismo, mas a vontade de poder de um e o primado da economia do outro foram usados para justificar práticas dessa natureza terrível. Devemos ser críticos na recepção das obras!

Nietzsche é tratado por Heidegger na 2ª fase e a dialéctica do esclarecimento de Adorno e Horkheimer não recolhe o seu tema de Heidegger: a crítica da razão instrumental é um legado marxista. A presença de Lukács é pioneira e foi na sua obra que Heidegger encontra inspiração. Mas tem razão: é preciso estudar melhor essas conexões... Mas há mais: os utensílios e os instrumentos já se encontram em Hegel e derivam da economia clássica inglesa. O mérito pertence a Marx e Heidegger conhecia-o bem, até porque leu os Mnuscritos de 1844 antes de serem editados pela primeira vez. Aliás deu a sua força para a sua publicação rápida... O Capital antecipa essa crítica sem o preconceito antitécnica.

Sim, Kundera deve inspirar-se em Adorno e Benjamin: a reificação é esquecimento. Já fiz um post a recordar isso à esquerda instalada no poder, mas sem efeito... Agora pode ser tarde... Nietzsche tb tratou -- e bem -- da memória e Hegel, mas Bloch liberta a dialéctica da arqueologia das figuras do espírito e imprime-lhe o toque da esperança. Muitas pontes para construir! :)

Ah, a trufa vem e vai, neste momento está a meio do caminho. :)

Unknown disse...

so pra desfazer alguns mal entendidos:

tb n disse q associou nietzsche ao fascismo. O q eu disse foi q n é correcto associar-se o seu pensamento ao conservadorismo, e por isso falei no Reich(nação alemã imperial e burguesa) e JunKer(conservadorismo rural, mas escrevi junGer :)).
Tb sobre a cena frankfurt, eu sei qual a matriz marxista(1º marx) da teoria critica, qd aludi a infl de heidegger, foi especificamente ao "tabu" tecnica-ciencia.
Já o nietzsche, tb nisso, era td menos conservador, pois criticou os excessos da epistemolog cientifica e de todo o conhecimento sim, mas via-se q leu darwin e chegou até a escrever algo como o homem de ciencia dever vir a ser o filosofo e artista do futuro.
Na questao economica, ele chegou mesmo a vaticinar com extrema clarividencia e perspicacia psic a dominação empresarial como substituinte do Estado etc => A - s-s-o-m-b-r-o-s-o



Well, vou jantar. Acabei de postar aqui a Colleen. Pode ser q nao conheçam http://ipsons.forumeiros.com/geral-open-f1/electronica-idm-neuro-synth-industrial-breakcore-experimental-etc-t40.htm#447

:)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Está esclarecido, porque tinha pensado que se referia a E. Junger, que, diga-se de passagem, tem uma obra interessante. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Olhando a situação de perto, a filosofia afunda-se em discursos obscuros e vazios, quando há tanto trabalho a fazer, nomeadamente reler esses pensadores referidos e estabelecer novas pontes. Não devemos ficar prisioneiros de leituras anteriores e dos seus traumas epocais. Hoje temos um outro espaço de liberdade e a distância certa para os compreender em outra chave. Porém, os tempos são avessos ao esforço e ao pensamento: o tempo dos mortos adiados! :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estou a pensar em Weber e Park, o que complica a teoria da notícia, mas termino amanhã e deixo outras questões para outros posts. Interessante o comportamento intelectual: construímos, construímos e, por vezes, não clarificamos os alicerces das construções. O Blogger dá poucos recursos para editar outro material que ajuda a simplificar. :)

E. A. disse...

Bom dia!

Sim, isso q o Sr. diz é verdade, contrariamente ao q o F disse: Nietzsche critica a sociedade economicista e tecnocrática emergente, em vários aforismos, sobretudo nos livros mais críticos: Humano Demasiado Humano, Aurora, Gaia Ciência!

Nietzsche era um profeta, ou o profeta. :)

E. A. disse...

Sr.,

Por que é que n cria um blogue? Ou um nick mais "real"? Irrita-me um bocado ser "tão" anónimo.

Unknown disse...

É mesmo o profeta!
De longe, o escritor/pensador com quem sempre mais me identifiquei - um verdadeiro conterrâneo nesse sentimento de se sentir "estrangeiro". :)


LOL, mas essa cena do "Sr" nunca teve qq intuito de anonimidade ou coisa q o valha. Surgiu apenas pelo facto de uma amga, a dar aulas na Nigeria, ter criado recentemente um blog http://www.sunanasara.blogspot.com , e eu, que não frequento nem gosto de blogs, por n ter qq perfil criado, criei qq coisa à pressa so com esse preciso intuito de me manifestar presente por ali e tal.. :))
Como surgi aqui? Nao lembro bem, mas foi, com tda a certeza, ao googlar qq assunto/autor q me interessava. Como gostei bastante da inter-disciplinaridade q o F aqui demonstra, e visto ter constatado q todos os posts tem bastante qualidade e abordam materias q me eram relativamente desconhecidas, passei a consultar...
Eu gosto mesmo é de musica, é aí q perco mais tempo e crio perfis como este sem qq anonimato
http://www.myspace.com/killallbdsmers ;)

E. A. disse...

Ok, estou mais ou menos satisfeita com a resposta.

E se elege Nietzsche só demonstra que é inteligente. É também um dos meus mestres. :)

E faz bem em aconselhar o F sobre música, q como dá para ver no seu perfil pessoal, tem um gosto musical que deixa muito a desejar. Tb n se pode saber tudo. Ele para "engolir" tanto livro, tem de deixar de lado a música. É um crime preterir a música em função da filosofia, mas ele um dia há-de descobri-lo por si próprio, porque é uma pessoa sensível e inteligente, tb. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, o mestre Adorno também era músico e sabia do assunto: eu não estou muito familiarizado com a música.

Quanto a Nietzsche: O seu valor reside essencialmente na crítica da cultura e, como tal, foi integrado por outras orientações filosóficas. A crítica do poder deve ser lida com atenção, mas a crítica da economia política não existe em Nietzsche: o filósofo não tinha uma teoria económica e, sem isso, não podia elaborar a sua crítica. Politicamente, era conservador.

Vejamos: Benjamin fala da História dos Vencedores e sabemos o que ele quer dizer com tal expressão. O que Nietzsche diz sobre as classes trabalhadoras? Ele fala da vitória dos escravos e da sua manha: um conjunto de dispositivos usados para amolecer os homens superiores. Os vencidos benjaminianos aparecem aqui como vencedores, mas os escravos nunca foram vencedores e até mesmo o cristianismo posicionou-se historicamente mais ao lado dos poderes estabelecidos. Podemos contornar este erro histórico e antecipar uma crítica da cultura de massas, mas o conceito de massas implica o de élites. Predomina a visão da aristocracia. E, neste aspecto, Heidegger tem razão ao ver na vontade de poder o culminar/consumar da metafísica da presença.

Além disso, a leitura do pensamento de Nietzsche confronta-se com o problema da inteligibilidade: existem muitas inflexões, fases de desenvolvimento e predomínio dos fragmentos/aforismos. Cada um pode escolher os seus aforismos preferidos, mas não pode facilmente a partir dessa escolha unilateral tentar coagir a entrada do todo nessa perspectiva unilateral. Porque há uma linha condutora geral e esta pode ser conservadora no sentido de não ser sensível aos verdadeiramente vencidos na história.

Outro exemplo é a crítica do cristianismo, onde Nietzsche tem cartas fortes. Mas já repararam na recepção dessa crítica? Muito sectária: a morte de Deus já tinha sido anunciada por Hegel e Feuerbach reformula o tema numa perspectiva mais antropológica. A postura de Marx é diferente: a sua posição não é ateísta, porque não faz sentido criticar Deus, sobretudo quando se diz que ele é uma quimera. A crítica deve incidir sobre os efeitos das práticas religiosas nas outras esferas da sociedade, da cultura e do poder. É preciso fazer uma reavaliação destes temas para fazer face aos actuais problemas que nos afligem. Porém, Nietzsche tb faz parte da minha constelação teórica. Não sou dogmático!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Não troco a filosofia e a ciência por outra coisa, mas isso não significa que não goste de outras coisas, incluindo as artes. Agora não posso ser músico porque não tenho vocação, mas isso não significa que não aprecie música.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Elsinha, se tiver os livros perto diga quais são os aforismos, porque estou a pensar nalguns que são deveras reaccionários. :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sr

Vi o seu espaço e não sei se posso fazer um link a partir daqui. Ya, lá estava o Nietzsche! :)

Ah, o que significa latinohispânico? Somos latinos hispânicos? Na minha cyberpesquisa tenho reparado que os portugueses usam frequentemente essa expressão e sinto-me excluído da comunidade. Falamos uma língua predominantemente latina e estamos incluídos nessa matriz cultural. Porém, hispânico é um termo mais usado pelas pessoas da América Latina e, nesse sentido, não vejo a ligação.

E. A. disse...

ahah...
na minha página de myspace digo que sou descendente de negro e q sou swinger. :D

E. A. disse...

Ya, n'Aurora q foi objecto da minha tese de licenciatura há várias indicações, mas n o tenho aqui. Depois deixo aqui as referências.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Swinger? Hummmm... a Borboleta gosta brincar, brincar e brincar...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas essa é uma obra do período intermédio, onde ele defende a democracia liberal, atacando o socialismo.

E. A. disse...

Sim, Francisco acha q sou swinger? É no gozo, evidentemente.

E. A. disse...

Sim ele ataca o socialismo, pq o entende como fenómeno decadente, obstruindo o indivíduo.

E. A. disse...

Mas tb critica o economicismo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estive a folhear esse livro - Aurora - e a minha vista cansada e com dores de cabeça (deitei-a às 6 da matina!) descobriu uns aforismos giros mas contraditórios. Porém, estava a pensar na possibilidade de fazer uma leitura geológica de Nietzsche: já a iniciei mas depois abandonei-a, embora esteja convencido que ela poderia trazer uma nova luz ao seu pensamento. Não vi a crítica da economia, mas sei que algo é dito no Humano Demasiado Humano.

A crítica que faz da comunicação social é aristocrática, com elementos pertinentes.

E. A. disse...

A postura de Marx é diferente: a sua posição não é ateísta

E acha que Nietzsche é ateísta? Ui! nada disso :D Nietzsche critica a religião, tal como Marx, mas n é ateu, ele até assinava como "Cristo".

Nietzsche é grande, tem é de ser lido com muita cautela, pq como ele era poeta-filósofo há sempre aquela tentação, q o F. diz, de "escolher" este ou aquele aforismo por ser bonito e não atentar à verdadeira mensagem e saber integrá-lo coerentemente no seu pensamento.

E. A. disse...

É claro q n viu a crítica à economia. Ler e compreender profundamento um livro n é "esfolheá-lo".

E. A. disse...

* n assinava como "cristo", mas sim como "crucificado"... enganei-me :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Exacto, é por isso que critico os ateístas da praça global e local: perante a questão da afirmação ou da negação de Deus o melhor é ficar calado! Aliás, esse debate é uma manobra ideológica que desvia a atenção dos problemas reais que nos afligem. É como atribuir a crise financeira aos reguladores! Manobras ideológicas!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah, geralmente deixo notas nos livros e chamadas de atenção ou mesmo observações. Assim, quando preciso localizar-me, sei onde encontrar as referências! :D

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ai, acho que tenho de continuar a postar, porque este blogue está na lista mundial Top 1000. :)

Unknown disse...

francisco

N tenho paciencia pra transcrever, mas, já q tem os livros, eu vou colocando aqui algumas indicaçoes de excertos verdadeiramente PROFÉTICOS ^^
Pra começar, no Humano Demasiado Humano, no 285, leia a partir de:
"Sem vaidade e egoísmo - o que são as virtudes humanas?(...)" até ao final.

Entretanto, encontrei isto sobre a sua fil politica, mas tb ainda nem li pra avaliar. Pelo menos deu pra ver q escolheu fragmentos q eu mesmo escolheria :P
http://www.scribd.com/doc/10148474/a-filosofia-politica-de-nietzsche-por-jose-amorim-de-oliveira-junior


0/

Unknown disse...

Aurora 179*

Unknown disse...

Ja q tb falou em gostar de arte:

HDHumano, 174 " Contra a arte das obras de arte"


Epa, até choro coa intuição gigantesca deste Sr!!!








:))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O parágrafo 285 de HDH não corresponde a essa frase.

O 179 refere-se ao Tão-pouco Estado quanto possível. Ideia que reaparece em HDH.

Unknown disse...

ainda no HDH:

Cap VIII: 454, 463, 472, 473 E 474


e axo q fico por aqui pra n susceptibilizar aqueles q creem q o nieztsche continua omnipresente, mas cuja importancia se equipara à do pai natal :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, no capítulo 8 retoma a crítica do Estado, do socialismo e de Rousseau.

Unknown disse...

O 285, na minha edição ta com o titulo " Se com a justiça a posse pode ser igualada"


O 179, Aurora: "O minimo possivel de Estado"

Unknown disse...

:)
No Crepusculo dos Idolos:

38 - "Meu conceito de liberdade"
este tem uma das frases q mais gosto dele e me da sempre gozo transcrever:

« O homem que se tornou livre, e ainda mais o espírito que se tornou livre, calca sobre os pés a desprezivel espécie de bem-estar com que sonham merceeiros, cristãos, vacas, mulheres, ingleses e outros democratas.(...)»


Lindo!! :P

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Na que estou a usar é "a inquietação moderna" e começa por falar dos americanos.

Passei os olhos pelo tal artigo mas fiquei decepcionado, porque... comete uns erros grosseiros. É chato dizer isto mas está lá escrito. Também usou más edições. E este é um problema nacional: temos más traduções dos mestres --- regra geral. :)

Aliás, a concepção que ele apresenta não parece convocar a bibliografia que supostamente consultou. Articular uma filosofia política para Nietzsche não é fácil: a Grande Política é... 11 de Setembro? Ou coisa do género!

Unknown disse...

Ainda no Crepusculo dos Idolos, Incursoes de Um Extemporaneo,é de toda a importancia reler o "Anti-Darwin" tb*

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, nessa última citação há a convocação de Kant, que uma filosofia política deve referir e, quando se trata Kant, somos conduzidos a Rousseau e convidados a avaliar a crítica que Nietzsche lhe dirige. É complexo...

Unknown disse...

ja q fala em Kant, e sobre o papel do filosofo e da filosofia perante o Estado, é importante ler o 8, do Considerações Extemporaneas " (...) Vista com mais precisão, aquela 2liberade" com que agora o Estado, como eu dizia, contempla alguns homens em nome da filosofia já não é nenhuma liberdade, mas uma função, que alimenta o seu homem.(...)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, o fragmento anti-Darwin ajuda a esclarecer as dificuldades de Nietzsche, mas também ajuda a elaborar uma teoria do poder e não uma mera teoria do Estado: aqui reside o núcleo político nietzschiano. Poder, poder, poder...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, esse é importante e -- coisa curiosa -- existem bons estudos sobre Nietzsche que não estão traduzidos, mas a FLUP tem esses livros na Biblioteca, alguns dos quais fotocopiei, porque não eram acessíveis no mercado.

Mas seria melhor encarar o pensamento dele como uma "teoria" do poder e não desse macro-poder que é o Estado. Para todos os efeitos, das obras de juventude e do período intermédio as obras da "maturidade", ocorrem mudanças de perspectiva. Nietzsche é sempre uma fonte de inspiração, até porque não foi sistemático...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Estava a ser estúpido: tenho as obras em alemão. Vou conferir!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O parágrafo 285 de HDH é "Die moderne Unruhe" (a inquietação moderna): a tradução portuguesa das obras escolhidas está certa.

Unknown disse...

Nao. O Nietzsche n ficou fixado nessa teoria do poder. Pelo contrario, ele salienta é a importancia e necessidade de emergencia duma CULTURA forte como a força bloqueadora por excelencia desse mesmo poder. Ha um fragmento q fala nisso, se encontrar indico aqui tb.

Ainda no HDH, no 472 "Religião e Governo" é q está aquela brilhante intuição do privado e da empresa a absorver e abolir o Estado como CONSEQUENCIA da DEMOCRACIA.
Isto ainda hoje é inedito, eu axo, lol ;)

Unknown disse...

Ok, entao pra acabar, q ja tem aí mt material:), o tal excerto sobre a sua visão "desempoeirada" da relação poder estatal-cultura(a q interessa ta do lado do individuo):

HDH, 474, "O desenvolvimento do espirito temido pelo Estado"


C ya 0/

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Então, em termos simples:

Nietzsche elaborou duas políticas:

1. A política da sobrevivência, que, sem legislar nvos valores, ironiza os ideais da humanidade, incluindo todas as ideologias modernas (democracia liberal e socialismo), e

2. A política da crueldade que, associada ao seu radicalismo aristocrático, visa controlar as forças da história e, produzir, através da grande política (filosofia + poder político), uma nova humanidade.

E legitima esse governo aristocrático com a tal noção de cultura: os novos artistas-tiranos encontram legitimidade não na moral, mas na übermoralisch. Moldar a humanidade! A vida como único princípio da crítica! As grandes guerras! Uma nova direcção para a história! A vontade de poder! E, neste momento, o círculo fecha-se: podemos regressar às obras de juventude que exaltam a tragédia! Educação filosófica! Legislação filosófica! O Passado nobre da humanidade! Eis as linhas da "filosofia política" de Nietzsche!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sr

Percebi a sua leitura de Nietzsche: a luta do indivíduo contra o Estado! Os aforismos que refere dão corpo a essa leitura. Porém, Nietzsche passa a criticar a democracia liberal que vê como uma secularização da moral cristã que nivela a sociedade. Ele termina com a Grande Política: legislação filosófica + poder político. Há um impulso irracional a mover o pensamento de Nietzsche: está bem explicíto na obra!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Última observação, porque já estou atrasado: A leitura que faz implica a rejeição desse elemento aristocrático e violento. Ora, na GM, encontra um fio condutor suceptível de ser salvo via Kant: o homem como ser que faz promessas e as cumpre! Aqui podemos salvaguardar a liberdade do indivíduo contra esses poderes fortes, mantendo a crítica do igualitarismo. Em muitos aspectos, Nietzsche fez observações profundas que só podem ser salvas fora da moldura que traçou. Ciao :)

E. A. disse...

"sobretudo sobre os jovens"

Exacto: sobre os fortes, inteligentes e belos, eram esses que ele queria proteger contra a massa informe estúpida e asquerosa. :)

Salvé Nietzsche, sempre! :)

E. A. disse...

Faz-lhe bem ler Nietzsche, continue e bom fds!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, Sr

Este debate está a ser um desafio frutífero: começo a compreender o fascínio que Nietzsche exerce sobre a malta, sobretudo sobre os jovens. O super-homem até pode ser identificado com a figura da banda-desenhada! É melhor chamar-lhe "sobre-humano": ele seria o resultado da Grande Política -- a construção de uma nova humanidade.

Eu faço uma leitura mais "cínica" de Nietzsche, de modo a evitar ser confrontado com a política da crueldade. Faço três observações adicionais:

1. O parágrafo 473 de HDH, onde critica o socialismo, ele opõe duas visões do Estado: o mais Estado possível (noção que atribui ao socialismo) e o menos Estado possível (noção que antecipa o neoliberalismo de hoje). Bem, os dois tipos de Estado são terroristas, para usar o termo que ele imputa ao socialismo. Nietzsche trata Platão como o primeiro socialista: o seu Estado Ideal é uma acumulação de poder estatal. De acordo, ninguém deseja um tal Estado Gordo, mas também não desejamos um Estado Exíguo. E por uma razão referida por Nietzsche noutra ocasião: ambos produzem corrupção. São versões de um mesmo Estado Burocrático que ameaça a liberdade e a democracia, tal como viu Weber e Marx com a sua noção original de modo de produção asiático.

2. Sem levar em conta a defesa que faz do "federalismo europeu", uma mesma cidadania europeia (até dá um lugar aos judeus no período intermédio!), que implica necessariamente um poder superior forte, Nietzsche não se preocupa com o problema da legitimidade: o seu governo deve transformar a humanidade mediante a grande política: legislação filosófica + poder político. Ora, um tal poder precisa mesmo de muito poder e muita força para levar a cabo tal tarefa de educar esteticamente a humanidade. Nietzsche critica Platão mas não abdica da sua "ditadura pedagógica". Em termos de filosofia política, não introduz nenhuma novidade: o poder implica uma assimetria -- governantes e governados. Paradoxalmente, uma tal unificação de nações foi tentada pelo "império soviético" e Mao introduziu a revolução cultural: nos dois casos a liberdade foi severamente restringida ou suspensa.

3. O parágrafo 474 fala do desencontro entre cultura e Estado e noutro sítio ele diz mesmo que a cultura só floresce lá onde o poder estatal está enfraquecido. A observação é certeira e concordo substancialmente com ela, mas a cultura superior que defende visa moldar a humanidade: o seu programa de educação filosófica. Nietzsche raramente é consequente com as suas ideias brilhantes por causa da sua visão aristocrática da história que é "fisiológica". Ora, é neste fisiologismo que reside o momento irracional do pensamento de Nietzsche que fez dele o ideólogo do totalitarismo fascista, mesmo que a sua filosofia não seja gritantemente fascista. Lukács demonstrou-o e bem.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Bfs toooooooo... :)

Fräulein Else disse...

a luciana abreu anda com o djaló............ ahhhhhhhhhhh

eu gostava dele, deixei de gostar. deve ter dois neurónios para gostar de uma gaja como ela.

é só um desabafo. :)

fui!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Quem é a luciana abreu? Eu não leio essa malta atrasada e burreca! snif snif snif

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, em linguagem mais sofisticada, dizemos que ele não tem interneurónios entre os neurónios de entrada e os de saída: é um entra e sai consecutivo; mero reflexo não-mediado superiormente!

E. A. disse...

ahah a luciana abreu é a floribella :D

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ah... aquela daquela telenovela ridícula da SIC! Então, são duas cabeças despovoadas de interneurónios! :)))

Unknown disse...

Hey!
Ja q a Papillon n se chega à frt, deixa q me diga q o nietzsche q pinta ag ta demasiado parecido com o... duraõ barroso :))
Ainda vou jantar e n venho mais à net, mas sugiro q interiorize q a tradução correcta é ALÉM-DO-HOMEM e não super-homem, e q este, segundo o pp, simbolizaria como q o conjunto de etapas maieuticas necessarias para o surgimento de um homem renovado.
So isto ja faz tda a diferença, eu axo.



Há q afastar qq ameaça de duvida e negrume sobre tudo isto!
http://luciana-abreu.org/pt/wp-content/uploads/2009/07/tvguia.jpg





:P

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sr

Respondi-lhe no post que se segue por uma razão de facilitar... :)