terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Prós e Contras: Cigarros Apagados

O programa "Prós e Contras" de hoje (21 de Janeiro de 2008), dedicado à nova "lei anti-tabaco", foi hilariante: de um lado, Fátima Bonifácio e Sá Fernandes, dois iluminados, do outro, dois "talibans (talibãs) sanitaristas", ambos da Escola de Saúde Pública Nacional. Este debate mostra até que ponto a democracia portuguesa está a ser subvertida internamente por um grupo de talibãs profundamente sedentos de poder e que usam a "ciência" como "fonte de uma autoridade inexistente", protagonizada neste programa pelos dois talibãs sanitaristas.
Devo dizer que estou de acordo com a posição corajosamente defendida por Fátima Bonifácio e secundada pela experiência jurídica e polémica de Sá Fernandes e do Presidente do Casino Estoril. Apenas lamento que Fátima Bonifácio tenha cedido o argumento dos estudos científicos que demonstram ou não os supostos malefícios do tabaco. É esse argumento que quero recuperar: a "autoridade científica" exibida pelos talibãs sanitaristas foi nula e, pelos vistos, eles divulgam essa "charlatanice" nas suas aulas.
A ciência não é em si mesma uma autoridade ou fonte de autoridade e, se o fosse, seria uma autoridade não-política falível. Contudo, Francisco George menciona um estudo realizado em casais em que um dos membros fuma e o outro, não, cujos resultados mostraram que o membro que não fuma tem grandes probabilidades de vir a ter um cancro pulmonar. Deste estudo foi concluído que o fumo passivo é tão perigoso (ou mais) quanto o fumo activo.
Ora, um "cientista honesto" sabe que se trata de um estudo estatístico e que, por isso, os seus resultados devem ser interpretados com muito cuidado, levando em conta questões relativas à sua validade interna e externa. À partida são possíveis outros estudos que, controlando as mesmas variáveis, podem descobrir uma terceira variável que explane melhor a correlação ou associação estabelecida pelo estudo anterior. Muitos outros factores podem intervir e facilitar a ocorrência de qualquer doença. Com isto não pretendo justificar o uso do tabaco, embora o ache menos nefasto que o uso de muitas outras substâncias, aliás bem mais perigosas para a saúde pública. (O monóxido de carbono expelido pelos carros é um desses perigos e talvez o mais fatal, ao qual podemos acrescentar o abuso do álcool e de drogas pesadas.)
Mais há outro tipo de estudos, especialmente antropológicos, que podem mostrar os benefícios (sociais, psicológicos e de saúde) do tabaco: estes estudos também existem e são fáceis de fazer. (Infelizmente, devido às limitações do "blogger", não posso simular os resultados de um estudo prévio e mostrar que uma associação estabelecida nesse estudo pode encobrir uma terceira variável explicitada num estudo mais cuidadoso e com outro delineamento experimental, usando outras técnicas estatísticas. Mas devo dizer que uma correlação não deve ser vista como uma relação de causa/efeito, até que se façam novos estudos, de preferência laboratoriais.)
Mas independentemente dos estudos, uns científicos, outros claramente ideológicos, a política não pode estar subordinada a "estudos higienistas", marcadamente talibãs e fundamentalistas, muitos dos quais financiados por grupos que têm interesses obscuros noutras áreas da economia, mesmo na economia clandestina e ilegal. Como socialista, espero que os socialistas tenham escutado e visto este programa e que pressionem o governo para demitir estes talibãs fundamentalistas, tal como foi exigido por alguns dos presentes. Com efeito, proferiram um discurso claramente antidemocrático e ideologicamente totalitário: tentaram e tentam criminalizar o uso do tabaco e, pelos vistos, sem suporte legal e técnico legítimo. Até falaram da "morte precoce", como se uma sociedade idosa constituisse alguma estratégia evolutivamente estável ou simplesmente desejável! Os seres vivos nascem, vivem e morrem e é assim que deve ser: o mito do prolongamento da vida é absolutamente irracional, além de ser hipócrita quando usado para defender interesses pouco transparentes!
Em democracia, as liberdades individuais devem ser, como disse repetidamente Fátima Bonifácio, defendidas e o Estado não deve imiscuir-se na esfera privada, até porque já detém muitos instrumentos electrónicos panópticos de controle. Um dos talibãs, o Constantino, mencionou a democracia grega e o contrato social, a favor da proibição absoluta do uso de tabaco nos espaços públicos (concepção totalitária) e ninguém o confrontou com a sua ignorância e a sua malvadez. Democracia grega? Mas ele sabe o que era a esfera pública da polis grega? Contrato social? Mas ele sabe que o contrato garantia a propriedade privada que quer controlar? Um "mísero médico", que envergonhou publicamente a medicina, pretende dar lições de filosofia, integrando o divino Platão entre os liberais? Mas ele sabe o que é o liberalismo político?
A melhor medida é realizar campanhas de sensibilização e deixar que os proprietários dos estabelecimentos comerciais em causa optem ou pelo fumo devidamente ventilado e purificado ou pelo não-fumo. Com as etiquetas visíveis, cabe a cada cidadão optar: entro ou não entro, independentemente de ser ou não fumador. Esta medida protege os direitos de todos: fumadores e não-fumadores. Mas querer proibir o uso do tabaco constitui um atentado contra as liberdades individuais e, se assim é, temos o direito de exigir maior competência àqueles que lideram o país. E, como o lideram muito mal, devemos lutar activamente pela sua retirada forçada dos órgãos de decisão nacional: a incompetência, aliada à maldade, é o maior inimigo da saúde pública!
Isto é uma vergonha nacional: A ignorância activa está instalada no poder e, sem argumentos racionalmente motivadores, usam e abusam da propaganda para intimidar os portugueses! E, infelizmente, com algum sucesso, dado o estado depauperado dos habitantes deste país e a sua muito fraca auto-estima. (Sobre a degradação da democracia ocidental reconduzo para outros posts onde abordo esse tema.)
PORTUGUESES: O medo destrói a mente. Por favor, libertem-se do medo e digam: Basta, NÃO queremos mais estes burrecos!
J Francisco Saraiva de Sousa

23 comentários:

Fernando Dias disse...

Francisco,
Lamento estar em profundo desacordo consigo.
Para defender a sua dama, a inteligência das pessoas ludibria-se a si própria.
Essa sua posição em relação aos estudos científicos e em relação até à intuição acerca do Bem e do Mal (acabando por o cigarro ser para si um Bem e para mim um Mal), parece-me que o leva a defender o absurdo.

Vou reler Hannah Arendt – Responsabilidade e Juízo

David Fernandes disse...

Nem mais.

A questão é de liberdade, como (embora de forma ridiculamente menos elaborada) procuro dizer aqui: http://tasnatanga.blogspot.com

Fernando Dias disse...

Partido do princípio de que nada é definitivo -(por ironia já fumei defintivos e também provisórios nos idos anos 1960)- já coloquei no meu blogue uns apontamentos baseados na leitura do pensamento de Hananh Arendt

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Essa obra de Hannah Arendt fornece mais argumentos políticos para combater o talibanismo sanitário! Aliás, H. Arendt era uma fumadora de classe e naquele tempo fumar dava status e tinha uma simbologia de autonomia. O fumo sempre foi aliado da paz humana e da sociabilidade. Veja as sociedades arcaicas e sua simbologia do fumo. Todos os nossos antepassados nos doaram um mundo (Arendt) mas os sanitaristas estão alienados do mundo (Arendt).
A ciência não é uma autoridade: a autoridade é conceito político e a política diz respeito à esfera pública e a acção que se inicia aí... sem garantias.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Quanto ao tabaco, pode ser "reduzido", mas não sei se na lista dos malefícios ele está assim tão no topo... Os carros são mais perigosos e dispendiosos em termos de energia. O que defendo é a democracia de qualidade e não a intimidação! Isso condeno, sobretudo quando feita com o recurso aos "estudos técnicos"! :)

Jeronimo disse...

Maio de 68 Forever,
o desespero da busca de novas causas onde projectar a rebeldia e o inconformismo leva a estes disparates. Tenta-se transformar uma questão do mais puro bom senso, e que resulta da própria evolução e amadurecimento da Humanidade, num ataque soez a uma minoria de vitimas inofensivas (os fumadores). Despertem e tenham juizo, que há muitas ouras causas a sério onde podem canalizar as vossas revoltas.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Defesa da democracia não é uma causa vã! E tenho defendido essa causa! Maio de 68 não é da minha geração: um resultado é que eles constituem a geração grisalha que mais benefícios teve na história do ocidente. Aqueles que não teremos! :)))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas eu não estou a defender que o "cigarro faz bem à saúde"! Mas é uma opção (sic) no âmbito da dependência! Mas existem outros comportamentos e substâncias mais nefastos para a saúde e ninguém faz nada para nos proteger desses perigos, talvez os responsáveis directos por muitas doenças!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

O Presidente da Associação de Casinos (ou coisa do género) é muito culto e lembrou a literatura que retratavam uma sociedade concentracionária, cientificamente conduzida.
Ora, a minha dama neste debate é a ciência que não revejo nesses retratos: apenas o seu uso ideológico e apologético da dominação. Uma tal sociedade seria a não-liberdade! :(((

Manuel Rocha disse...

Não fumo, não bebo nem uso drogas ( nem sequer aspirinas...::). No entanto e por principio nunca me senti tentado pelos proibicionismos. Não me parece que históricamente tenham conduzido as sociedades a melhores soluções. Pelo contrário. Fomentam sub mundos e geram marginalidades que arrastam consigo as consequências conhecidas. Tenho por hábito inscrever o fumo nas questões mais vastas da cidadania, em que idealmente a auto-limitação à Soljenitzin faria toda a diferença entre um mundo realmente livre e este de supotas liberdades assentes em inenarráveis regulamentos que mais não são que o fruto óbvio da falta de bom senso de todos. Nunca me inibi de chamar a atenção de um fumador quando me senti incomodado e sem opção. Nem deixarei de o fazer. Mas as derivas regulamentares assustam-me, porque tendem a não acabar...
Mas é evidente que os fumadores terão que tb eles colaborar na procura de equilibrios neste processo. O caso é que pago com todo o gosto um jantar ao Francisco, mas não me apetece contribuir para o tratamento de um problema pulmonar associado ao fumo. Por isso discordo qd leio alguns depoimentos em que se acusa o Estado de Hipocrisia por cobrar impostos no tabaco e proibir o fumo nos locais publicos.

Santiago disse...

Parece-me que vou começar pelo fim, de qualquer forma, cumprimentos.

O cenário com que me deparo é hóstil à posição que defendo, não tenho quaisquer dúvidas disso. Sim, isso mesmo... venho aqui tentar racionalizar a posição dos "talibans (talibãs) sanitaristas", vulgo "burrecos".

Caro amigo, espero que não leve este nota introdutória, algo sarcástica admito, a mal. fi-lo para desanuviar o ambiente algo tenso em que este género de debates costuma decorrer.

vamos lá então começar com o que realmente interessa.
É completamente válido da sua parte tentar defender-se daquilo que acredita ser um atentado contra as liberdades individuais, não teria sequer a ousadia de vir ao seu espaço pedir-lhe que procedesse de outra forma. Devo dizer-lhe até que ganhou o meu respeito, porque tem uma posição - que é preciso que se diga, já vai sendo minoritária - defende essa mesma posição de forma bem articulada e eloquente (embora por vezes excessivamente exacerbada e apaixonada, o que o levou a alguns excessos que não beneficiam a clareza do seu ponto de vista), mas ainda assim reconheço que o fez estruturando relativamente bem o seu discurso, e ninguém aqui o pode acusar de seguir uma "moda", porque aquilo que tenta defender (que os fumadores possam fumar em qualquer local) não está na moda e não tem defesa fácil.

Dito isto e apesar do respeito que me ganhou o seu acto corajoso, parece-me que por detrás de um discurso bem articulado, que o é , se escondem argumentos falaciosos que vou tentar "desmontar".

Antes de qualquer coisa, não penso que caracterizar aqueles que têm a mesma opinião que o senhor defende de iluminados e os que possuem uma outra opinião diversa de "talibans (talibãs) sanitaristas (...) burrecos" seja o caminho mais indicado. Não penso que seja democrático, fere a capacidade de existência de um discurso racional e bem fundamentado, indispensável ao pensamento democrático e ao exercício da Democracia e tão pouco o ajuda a defender a sua visão, porque o deixa, à partida, numa situação de falta de credibilidade e de falta de argumentos aceitáveis para expor o cerne da sua ideia... e mais grave que isso, incute em quem tem opinião diversa da sua o medo... o tal medo que destrói a mente.

"A ciência não é em si mesma uma autoridade ou fonte de autoridade e, se o fosse, seria uma autoridade não-política falível." Concordo completamente. Não me parece sequer que tal autoridade não falível exista ou venha a existir. Contudo, a cada um aquilo que é seu. Não sendo a Ciência essa fonte de autoridade divina, imagem da qual aliás sempre se tentou afastar, merece algum respeito qualquer estudo que respeite os padrões que o tornam científico, porque o método científico em si é racional e merece consideração. Repare-se que o método científico dá primazia à argumentação válida, racional e não falaciosa, não se serve conscientemente de subterfúgios falaciosos para validar posições subjectivas deste ou daquele. Agora ,é falível, claro que sim...Mas nem isso a torna uma "charlatanice".

Concordo também que um estudo científico seja falível e que um "cientista honesto" deva saber interpretar os resultados de um estudo. Ainda assim, não é UM estudo que corrobora a tese de que o fumo passivo pode ser nocivo para a saúde, é um conjunto alargado de estudos interpretados por vários cientistas, até prova em contrário, honestos. Não é um qualquer estudo feito em cima da perna, são vários estudos, que até prova em contrário, seguem métodos científicos e não subjectivos e merecem respeito.

"À partida são possíveis outros estudos que, controlando as mesmas variáveis, podem descobrir uma terceira variável que explane melhor a correlação ou associação estabelecida pelo estudo anterior."
Até pode ser que assim seja, porque quando se faz ciência não existe espaço para fundamentalismos, e assim sendo todas as hipóteses que se não "autoexcluam", isto é, que não fique provado de antemão serem falsas, devem ser testadas. Mas aqui está a trabalhar no campo do hipotético, de um estudo que poderia existir mas que por qualquer razão insondável não existe, e servir-se de um estudo que até talvez, quem sabe, poderia existir ou venha a existir ou o que quer que seja, mas que, verdade seja dita, não existe, não é válido numa argumentação que se quer lógica e racional. E se sabe que num estudo científico "os seus resultados devem ser interpretados com muito cuidado, levando em conta questões relativas à sua validade interna e externa" porquê por em causa os mais variados estudos aceites pela comunidade científica internacional e que por isso mesmo devem ter sido interpretados com todo o cuidado de que, muito bem, fala e privilegiar um estudo hipotético inventado em segundos que, a existir, provaria o seu ponto de vista.

E é claro que um estudo poucas vezes se traduz em relações de causa/efeito, mas as evidências apontam para que a correlação existe, é muito forte e evidencia que a exposição ao fumo provoca as mais variadas doenças.
Que fique claro, a existir tal estudo, se vier a existir, que seja considerado, e que se tirem daí as conclusões que ele mereceria mas, até que tal estudo exista efectivamente, cinjamo-nos aos dados que temos e não àqueles que poderiam eventualmente ser demonstrados, contudo nunca o foram , pois é com aqueles que foram demonstrados que temos mais garantias de não estarmos a ceder a falácias.

Quanto ao uso de outras substâncias que referiu (monóxido de Carbono, álcool e drogas), apesar de não me fundamentar em nenhum estudo, ressalve-se este facto, concordo consigo, que pelo menos em senso comum, estas serão mais nefastas para a saúde.
Ponto um, Monóxido de carbono. Estou completamente de acordo, falta no entanto alguma maturidade às soluções técnicas encontradas até ao momento para substituir o automóvel movido a energias fósseis não renováveis - refiro-me, nomeadamente, às questões que se prendem com a autonomia destes veículos e outras meramente técnicas -, e aqui tal como no caso do tabaco existe a questão económica para que não se abandone este hábito (Desenvolverei este ponto mais tarde), e aqui refiro-me às multinacionais do sector automóvel. Mas resolvidos estes e outros, mais pequenos, entraves o caminho a seguir deve ser o abandono de tais veículos que deverão dar lugar a outros mais económicos, e ecológicos.
Ponto dois, álcool e drogas. Tiro no pé. Aqui muito mais que na questão do tabaco surge a questão usada como estandarte das liberdades individuais, porque aqui sim, se entra pelas liberdade individual de cada um e se invade o espaço privado de cada um, porque se no tabaco os malefícios provocados pelo fumo aos não fumadores são mesuráveis, concretos e podem ser directamente atribuídos ao tabaco em si, no caso destas outras substâncias tais evidências não podem ser concluídas de ânimo leve. Não faz sentido falar em gases libertados pelo álcool alheio, capazes de embriagar o mais sóbrio cidadão que se cruza com alguém que está a consumir álcool, tão pouco em partículas libertadas pelas drogas que possam causar problemas de saúde a alguém que não as consuma por livre vontade. Pode-me citar com certeza um ou outro caso de "flagelo social" causado indirectamente pelas drogas e pelo álcool, mas parece-me que, indiscutivelmente, estas substâncias causam - ao contrário do tabaco - a quase totalidade dos seus malefícios àqueles que por vontade própria as consomem. E como o senhor sabe com a liberdade individual de cada um não se brinca.

Mais um ponto, os interesses económicos que, supostamente, estão a camuflar a verdadeira causa da lei. A economia é interessante de um ponto de vista que passo a explanar, ao contrário das ciências humanas e outras áreas de interesse, não a totalidade, mas pelo menos grande parte daquilo que constitui a economia são números, números que valem o que valem (coitadinhos, desprovidos de qualquer consciência social, de qualquer subjectividade, de valores humanos, até, os pobrezinhos dos números são desprovidos), mas que são claros por si só, porque comportam em si mesmos quase todo o significado que podem ter. Ora aquilo que os números dizem é que (some-se o número que o estado ganha com a venda de equipamentos de extracção de ar e afins que serão vendidos aos estabelecimentos que os pretendam adquirir mais aqueles outros que o estado previsivelmente poupará com o sistema nacional de saúde para tratar os fumadores, subtraia-se o outro que deixará de entrar nos cofres do mesmo relativos a impostos de tabaco e some-se e subtraia-se outros que condimentam esta receita e veremos que o número é negativo, note-se ainda que os impostos relativos ao tabaco acontecem de forma contínua e o mesmo não acontece com alguns dos pesos da balança do lado oposto, visto que um equipamento de extracção de ar, à partido dura vários anos - salvo concertação maquiavélica entre governo e fabricantes, que por razões da ordem da saúde mental aqui me escuso a comentar, de que os aparelhos fossem construidos por forma a terem que ser totalmente renovados todos os anos) assim a lei do tabaco não é vantajosa do ponto de vista económico.
Veja-se ainda o caso americano, em que nem sequer existem um plano nacional de saúde levado a cabo pelo governo que possa realmente ser chamado como tal, se o estado não paga os cuidados de saúde não pode ter em mente poupar neles, mas recebe impostos do tabaco. Porque raio haveria então um estado que vai perder dinheiro querer proibir o fumo em certos locais?

Esta questão conduz-nos ao último ponto. "Até falaram da "morte precoce", como se uma sociedade idosa constituisse alguma estratégia evolutivamente estável ou simplesmente desejável!". Falácia!
A questão não se prende com a concepção de uma sociedade envelhecida como sendo estável ou mesmo desejável, mas antes que, não existindo a fonte da juventude, as pessoas naturalmente envelhecem e morrem. É o ciclo natural das coisas, é assim que tudo acontece. Porém a esperança média de vida aumentou nos últimos séculos (facto) e como tal será mais agradável que os anos de "bónus" que foram ganhos sejam passados com pessoas activas e com qualidade de vida e não com pessoas que podem passar estes últimos anos a definhar com enfermidades, ou pelo menos que apenas aqueles que assim o escolheram passem os seus dias deste modo porque é um direito seu, esta escolha.

Em suma, é para mim perfeitamente aceitável que quem, em consciência, escolhe continuar a fumar porque acha que tira daí um maior prazer do que o risco que corre, ou seja qual for a razão que o leva a esta escolha, o faça. Parece-me até, diria mesmo, louvável. Seria inaceitável a proibição do tabaco (por proibição do tabaco leia-se a proibição quando o malefício afecta apenas e só aquele que conscientemente fez a escolha de fumar), mas é também inaceitável que quem fez a escolha de não fumar tenha que fumar porque outros fizeram essa escolha por ele.

Se encontrar argumentos bem fundamentados, não falaciosos que corroborem a sua convicção faça o favor de os apresentar, e muito provavelmente terá mais um aliado, mas fazer uma distinção não fundamentada entre iluminados e "talibans (talibãs) sanitaristas (...) burrecos" servindo-se de artifícios não é sério.

Por último uma palavra de apreço e desculpa.
Apreço porque, mesmo discordando de grande parte daquilo que constitui a sua opinião, a leitura do seu blog é agradável. Extraia-se-lhe o conteúdo, fique a forma da escrita, e o resultado é do meu ponto de vista satisfatório.
Desculpa por escrever um comentário porventura demasiado longo e com uma escrita algo "proustiana", no sentido da dimensão das frases, que nem sempre facilitam a leitura.

Com os melhores cumprimentos

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Também não sou "viciado" em nenhuma das substâncias referidas. Não sou contra a colaboração na procura de um equilíbrio. Para isso, é necessário o diálogo. Ora, a campanha anti-tabaco disse ontem barbaridades! O problema das sociedades ocidentais não é o tabaco! Muitos ritmos frenéticos levam ao tabaco, álcool e drogas e não vejo os lideres pensar em medidas para os combater. Prevenção é uma coisa! Imposição é outra! Prefiro a liberdade, mil vezes a liberdade, incompatível com o ópio metabolicamente reduzido da "vida eterna". Temer a morte é absolutamente irracional! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Santiago

Obrigado pelo seu excelente comentário. Pessoalmente, não sou adepto do fumo ou do não-fumo. Prefiro defender a democracia e as liberdades individuais! Conheço os estudos e faço estudos do género, com metodologias equivalentes. Também conheço outros estudos que não obtêm os mesmos resultados. É assim a ciência! Falível e apaixonante. Mas ela não deve ser tida como "autoridade". Defendo pesquisa fundamental mais do que encomendada. Esta última tende a afastar-se do espírito crítico da ciência e a fornecer dados compatíveis com as ideias daqueles que encomendam esses estudos.
O tabaco faz mal... Que se façam campanhas de prevenção, sem intimidar as pessoas. as outras drogas têm efeitos sociais e económicos: as famílias sabem disso, os acidentes provam isso, os custos dos tratamentos também, os crimes tb, etc. Não há nenhum estudo que associe o tabaco e a criminalidade, sobretudo violenta! O mesmo já não pode ser dito das outras drogas referidas, associadas também ao roubo e à prostituição e riscos acrescidos de doenças sexualmente transmissíveis! Grave problema de saúde pública!
A medida proposta por Fátima Bonifácio é racional.
Há sempre o problema de saber o que as pessoas vão fazer depois de deixar de fumar! Muitas alienam-se noutras coisas nada interessantes. Umas começam a comer muito, engordam e viciam-se noutros comportamentos, favorecendo as mortes cardiovasculares.
Estou de acordo com muitas coisas que disse. Não estou a defender o tabaco: somente a democracia e a liberdade, a responsabilidade política... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Mas sinceramento não vejo o tabaco como um problema muito importante e prioritário na política nacional, europeia e ocidental! Estou mais preocupado com a qualidade da democracia e a economia! :(

Fernando Dias disse...

É claro que temos muitos problemas pela frente. Como não é fácil tratar deles todos ao mesmo tempo, cada um deles acaba por ter o seu momento. O tabagismo poderá servir de pretexto para falarmos de assuntos mais abrangentes e o da liberdade concordo que é muito importante.

Nesse aspecto se Francisco me garantir que é tolerante em relação à minha liberdade, eu digo-lhe – dê cá um abraço. Eu também tenho incorporado que tenho de respeitar a sua liberdade mesmo que em certos aspectos não se sobreponha à minha. Este é o meu exercício da tolerância. Mesmo que diga que a ciência que para mim vale, mas para si não vale, eu tolero. Aceito que tem o direito de afirmar o que afirma.

Mas se em termos epistémicos ninguém poder realmente estar errado nem dizer coisas falsas nem inaceitáveis, não podemos realmente ser tolerantes: limitamo-nos a aceitar todas as perspectivas que reconhecemos à partida serem tão aceitáveis como as nossas. Nesse caso a sua filosofia cai por terra e não adianta trabalhar mais nesse sentido, porque não tem nada a que se agarrar.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Devo confessar que detesto espaços fechados congestionados de fumo! Evito-os, fazendo uso da minha liberdade e sem condenar os fumadores! Mas o que se passa em certos aeroportos é confinar os fumadores num espaço fechado e poluído, como em Frankfurt! Miséria higienista! Isso é talibanismo europeu! Mas também detesto espaços gordurosos e muitos restaurantes obedecem a esse critério! Também os evito, fazendo uso da minha liberdade! etc...

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Fernando Dias

Não sou contra a ciência; longe disso. Defendo uma ciência liberta da dominação... Mas a política não pode subordinar-se à ciência, fundamental ou encomendada (=ideologia). Um mundo cientificamente conduzido é não-livre. É o que diz Hannah Arendt! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Frenando Dias, Manuel Rocha e Santiago

Tolerância foi defendida por John Locke, um dos autores do Contrato Social, reparem utilizado por Constantino para impedir o acesso dos fumadores à esfera pública, como se fossem "criminosos"! O mesmo Locke que defendeu a liberdade e a "propriedade privada". Contrasenso do constantino! F. Dias: Isso é ciência?
O George recorre às "actas" para se defender das acusações que lhe foram feitas! Isso é espírito democrático? Um homem que diz que quer "eliminar os fumadores"? O programa de Fátima Campos está gravado e acessível. Basta ver!
Sou contra o positivismo, de resto uma mera filosofia. Sou a favor da multiplicidade de saberes! E, este é o meu argumento fundamental, a política, especialmente a decisão política, não deve ser prisioneira de "estudos técnicos", embora possa recorrer a eles. Os nossos antepassados legaram-nos um "mundo" que actualmente está a ser destruído, desde a revolução industrial. Há aqui algo que não soa bem: estarão a ciência e a tecnologia a ser usadas para destruir e lucrar! Já não podemos ser positivistas: a ciência não traz liberdade e di-ferença! Devemos meditar nisto! :)))

Fernando Dias disse...

Claro que não subscrevo o que eles disseram = o que eles disseram. Eu só estou com eles em relação à bondade dos seus propósitos.
Locke, na carta sobre a tolerância, a dada altura diz que a tolerância aplica-se a todos os credos, mas não se aplica aos ateus. Estes eram perigosos porque por definição não acreditavam em credo nenhum. Era como se não tivessem cromos para a troca. O pensamento evolui… convenhamos.
Não digo que seja contra o positivismo, não ponho as coisas nesses termos, mas não sigo o positivismo porque está ultrapassado e carregado de falsidades e imperfeições.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E Locke acrescentou também os católicos! (Então, não existem grandes divergências entre nós!)

JC(que não é o Cristo e embirra com cristalizados) disse...

Independentemente dos estudos científicos e da maior ou menor correlação que apontam entre o fumo do tabaco e certas doenças, parece-me incontestável que fumar tabaco (voluntária ou involuntariamente, é indiferente para o caso) faz mal à saúde; e que fumar tabaco com aditivos que potenciam os efeitos dos agentes maléficos faz ainda mais mal à saúde; de resto, viver também faz mal à saúde e conduz à morte.

É evidente que a lei do fumo do tabaco não tem qualquer objectivo higienista ou sanitarista, por muito imbuídos desse objectivo caritativo que os seus promotores se apresentem. Se assim fosse, os higienistas deveriam legislar sobre as substâncias maléficas do tabaco, com vista à sua redução, e sobre os aditivos que as potenciam, impondo a sua proibição. Em último caso, deveriam multiplicar as campanhas dissuasoras do fumo e os meios para levar os fumadores a abandonar o vício.

Parece-me também ser claro que a lei do fumo do tabaco não atinge a liberdade dos fumadores. Os fumadores não têm o direito de fumar em qualquer lugar que lhes apeteça, nomeadamente se o seu fumar incomodar outros, porque a sua liberdade não pode colidir com a liberdade alheia. Parecem-me descabidos os protestos dos fumadores acerca de um presumido atentado à sua liberdade, que de facto (ainda) não ocorre, para além da censura social subliminar com que o fumar passará a ser alvo.

A lei do fumo do tabaco infringe e viola, sim, a liberdade de outros: a dos proprietários dos estabelecimentos, que deveriam poder optar em ter estabelecimentos abertos a fumadores ou a não fumadores (cuja percentagem acabaria por não se afastar da percentagem da população fumadora), e a dos não fumadores que se estão nas tintas para o incómodo do fumo, ou dos que não se sentem incomodados ou dos que sentindo-se incomodados optam por não prescindir da companhia e do convívio com os seus amigos fumadores. É a liberdade destes que a lei viola.

A principal característica da lei, portanto, não é a defesa da saúde pública, mas a violação da liberdade individual, mesmo que violando apenas a liberdade individual de um grupo restrito de cidadãos. E este grupo minoritário de cidadãos é tão estimável quanto o grupo maioritário. Todo o resto da discussão é trampa. A parte relacionada com os custos com as despesas com cuidados de saúde, então, não tem ponta por onde se lhe pegue. Os fumadores morrem precocemente e de doenças que não possibilitam grande tempo de vida após o diagnóstico, etc., etc., daí que os custos que acarretam para o erário público sejam muito inferiores aos dos cidadãos não fumadores que padecem de outras maleitas, os quais acabam por viver até mais tarde à custa da conta da farmácia ou do hospital.

A leviandade com que em nome duma concepção higienista e sanitarista da vida se viola a liberdade individual é preocupante. Porque esta leviandade pode ser apenas o prenúncio de uma escalada anti-democrática de intolerável intromissão do Estado nas opções individuais, seja em relação ao modo de vida, seja em relação a valores éticos ou a concepções políticas ou religiosas. A vídeo vigilância do espaço público e a memorização dos dados informáticos relativos à vida pessoal são apenas outros sintomas. Quem achar que isto é coisa pouca é porque preza pouco a liberdade. A lei do fumo do tabaco é apenas fumaça que esconde a concepção totalitária da vida social que anima todos os burocratas.

JC (o tal que não é o Cristo, nem tem crista e embirra com cristalizados, mas que por restrição do número de caracteres teve de assinar abreviado).

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

JC

Obrigado pelo seu profundo comentário.
Estamos de acordo e tenho apontado para esse assunto fundamental: o ataque à democracia. A argumentação deles é, com diz, "treta". Aliás, o seu comentário esclareceu esses aspectos que englobei nos "poderes panópticos do Estado". :)

Manuel Rocha disse...

Claro que me preocupa a facilidade com que se usa a ciência como cavalo de tróia de uma série interminável de argumentos. Reflecti sobre isso numa série de posts sob o genérico de "ciência em contra ponto".

Incorporo um gene qualquer que não se dá bem com "verdades incontestáveis" nem com "certezas absolutas", mesmo quando ( ou sobretudo quando, pela arrogância que isso revela ) se apresentam como o produto da "melhor ciência".

:)