terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Prós e Contras: A Justiça

O programa "Prós e Contra" de hoje (11 de Fevereiro de 2008) foi dedicado supostamente à "justiça". Não pretendo criticar sistematicamente o programa, dado ser um dos poucos programas de informação que ainda vale a pena ver, mas hoje estava muito mal planeado.
Fátima Campos trouxe os dois casos mediáticos à baila (o caso Alípio Ribeiro e o caso Ricardo Bexiga) e queimou duas partes a tentar "fazer justiça em directo", mas a Procuradora-Adjunta Maria José Morgado, acompanhada pelos outros intervenientes, em especial António Hespanha (sinal da unidade corporativista dos "magistrados da lei"?), «boicotaram» racionalmente essa intenção. Isto significa que só o final da segunda parte e a terceira parte merecem alguma atenção: todos reconheceram que existe corrupção em Portugal, envolvendo sobretudo as "altas esferas nacionais do poder", mais precisamente do luso-poder do "roubo legítimo". Afinal, Marinho Pinho limitou-se a denunciar aquilo que todos conhecemos. Hespanha acrescenta: "São todos barbeiros que fazem a barba uns aos outros".
A corrupção ao nível do urbanismo e do ordenamento do território foi bem exposta por Paulo Morais. Afinal, a degradação dos partidos políticos é uma das razões fundamentais: os partidos "servem" os seus "financiadores" e não os seus "eleitores". Corrupção partidária: os seus "funcionários", sejam deputados ou membros dos governos, entregam ao desbarato os bens públicos aos privados, envolvendo quantias astronómicas de dinheiro, comparáveis às do negócio da droga. O resultado é que os "ricos" ficam mais ricos e os "pobres" mais pobres e os lideres dos partidos têm emprego garantido, com ordenados chorudos, nas empresas que favoreceram indevidamente quando ocupavam funções públicas (políticas).
Um magistrado (Vidal?) atribuiu a responsabilidade de tal situação de impunidade dos corruptos à Assembleia da República, a quem compete legislar "leis de combate à corrupção", e ao Governo, a quem compete fornecer os meios. Mas o fenómeno da corrupção nacional é bem antigo e, conforme lembrou Hespanha, Gil Vicente dedicou-lhe alguma atenção, condenando o "magistrado" ao Inferno. Hespanha avançou com uma hipótese "causal" da corrupção, associando-a às práticas do "neo-liberalismo selvagem" e aos seus valores antipúblicos (contra a res publica e suas virtudes), com a ajuda preciosa dos mass media e dos grandes centros de advocacia, mas Fátima Campos interrompe-lhe o raciocínio com o "argumento da bufaria". Um dia mau para Fátima Campos, que até impediu, com a sua graça, a Procuradora de ler a tal revista portuguesa de "estudos criminais", alegando que aqueles relatos de tipos de corrupção eram uma tremenda "depressão".
Um programa muito fraco e pouco esclarecedor quanto ao funcionamento da "justiça". Já que se citaram diversos ditados populares vou referir outro: "De boas intenções está o Inferno cheio". Os "consensos nacionais" são, eles próprios, uma manifestação da passividade dos portugueses, mesmo daqueles que parecem falar e agir de boa-fé, perante a corrupção. Aceitar uma opinião sem lhe dar luta é um gesto multisecular de corrupção de espírito, mas de um espírito sempre-já endurecido e socializado nesse imenso "sistema de favores".
A "justiça" não é um conceito "jurídico", mas um conceito político e moral, portanto, filosófico. Sem filosofia e educação não há reforma da "justiça"! Hespanha tentou expor uma ideia interessante em torno da ilegibilidade da "justiça", ou melhor, da linguagem dos seus códigos e procedimentos, que levaria à crise da Universidade Portuguesa, ela própria corrompida, e da educação, mas sem sucesso... Fátima Campos voltava sempre aos "casos mediáticos" e o resultado foi uma noite perdida, a menos que resolvesse retocar a ideia dos "ciclos de corrupção" e suas "tipificações" avançada por Maria José Morgado, a partir daqueles "estudos sociológicos...". Hummm... Medito! E se Fátima Campos tem razão quando diz que o "tema" era uma depressão? Não me apetece ficar com uma depressão! Aguardemos pelo próximo programa que vai contar com a presença "depressiva" (ui... afinal fiquei contagiado!) do Ministro da Justiça. Para já aconselho a leitura de dois posts, um dos quais relata um caso de "abuso de poder": Filosofia do Direito Um e Filosofia do Direito Dois.
J Francisco Saraiva de Sousa

16 comentários:

Manuel Rocha disse...

Boa risada matinal...Ahahah!

Vejo-o mais próximo de uma aboadagem da corrupção a partir das suas fundações. Os casos mediáticos dão imenso nas vistas mas não se apoiam em si mesmos. O funcionário dos serviços urbanisticos que é também mediador de seguros e os vai vendendo a quem entra com novos projectos para licenciamento, o funcionários dos serviços florestais cuja esposa ( orofessora primária ) é dona duma empresa de máquinas florestais que asseguaram os contratos dos projectos aprovados, o médico que analisa a doente na clinica privada e a manda comparecer de manhã no hospital, onde estará de banco,para um exame especializado e onde ela passa à frente de toda uma fila de espera ...
É esta via de expedientes esquemáticos que depois bloqueia...além de que a corrupção beneficia sempre duas partes...quando um gajo mete uma nota de 100 € dentro dos documentos que estende ao policia para este fazer de conta que não viu nada, quem é o corrupto ? E o doente que furou a espera do hospital o que é ?

Imagine o prédio mais alto aí da sua cidade com um enorme ananás em corres fluorescentes em cima...toda a gente irá falar do ananás, certo ? O edificio que o suporta é a corrupção cinzenta duma economia que se prefere informal, sem facturas, sem IVA, em que as coisas se resolvem melhor entre quem se conhece mesmo quando não há troca de dinheiros... Quando a esta predesposição cultural se soma a vontade de dar nas vistas num programa de TV ou de ser rico...

E. A. disse...

Bom dia!

Pois o programa confundiu-me, só vi a 2ª parte, e só gostei da intervenção de Paulo Morais que foi sintética e esclarecedora. Acho que as pessoas de Direito tendiam sempre a minimizar, ou relativizar problemas com falsas analogias que confundiam o espectador, por isso fui ficando desinteressada. Mas obrigada pelo apanhado, sr. F.! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

De facto, o programa foi "cinzento", sem interesse... Como se tudo fosse ficar na mesma! E a experiência diz que "sim"... :(
Foi um professor que fez um sorteio para me atribuir a nota! Já faleceu... Uma situação ridícula, aparentemente motivada por razões políticas mas com outros contornos. Também não preciso da nota! Que se lixe o ensino universitário português! A maior parte dos professores universitários são uma merda corrompida! :)))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel

À sua lista acrescento o sistema de recrutamento dos professores universitários e a consequente crise do ensino superior: corrupção total! Basta pensar no ensino superior privado! Até surgem alunos que nunca foram matriculados com notas atribuídas nos "termos". Basta uma distracção e o professor assina! Mas, como diz, quem não conhece uma lista enorme de casos de corrupção! :)

António Miguel Miranda disse...

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www.camaradachoco.blogspot.com

“Camarada Choco”

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Tema: Haverá uma fronteira entre os Aparafusados e os Desaparafusados?"

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Manuel Rocha disse...

Francisco,

Que passa ?!

:)))

Manuel Rocha disse...

Ainda sobre a corrupção.

Julgo que possa ser um erro pensá-la como "entidade" com "cabeça, tronco e membros". A corrupção é só "corpo" ( cultura ) e membros ( nós ). Não há "cabeça " para cortar ! Ou poderá haver mas não é cabeça de serpente, pelo que a "entidade" permanecerá viva !

:((

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Nada de especial. Referia-se ao comentário anterior? Não conheço... :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, existem várias cabeças para "decepar"! :))))
A luta contra a corrupção deverá ser contínua e sobretudo preventiva. E deve começar na escola com educação para a cidadania.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel

Como escrevi no seu blogue:
"Penso que H. Arendt tem razão quando diz que, no Ocidente, o poder tornou-se impotente e, portanto, a violência está na ordem do dia. Basta alguém ter uma ideia e eis a revolução! Neste caso, (será necessário) "decepar", faz parte da dinâmica das mudanças históricas significativas..." Ou seja: Depois já não podemos controlar o curso da acção... Em França, o incêndio dos carros mexeu com o poder, porque não há poder... Os corruptos ou os burocratas não são poder genuíno...

E. A. disse...

Claro que n é preciso decepar literalmente...! Já experimentou arranjar um hobby tipo caçar ou tiro ao arco, ou paintball? Podia "agenciar" (à Deleuze) essa sua carência de investida tipicamente máscula e das bestas em geral. (Com todo o respeito, claro está). :)

Lembra-se do que disse ontem o Paulo Morais e que eu disse no outro dia: é muito difícil condenar um corrupto! E se é difícil fazê-lo aos corruptores "menores", aos outros, os tais que identifica como a "cabeça da serpente que é preciso decepar" ainda será muito mais, pois a corrupção nos sectores de decisão superiores, autonomizou-se, entrosando-se de maneira natural e imperceptível com o sistema. E, neste crescendo capitalista e individualista, a situação só tende a agudizar-se. Portanto, a minha hipótese (neste momento) sobre esta matéria, é a necessidade de perfectivar e supervisionar a justiça e a educação, pois só estas nos podem salvar.

Manuel Rocha disse...

Francisco,

Para "capar" um ou dois, conte comigo ! Para "decepar", tenha paciência ...procure ajuda noutro lado...:))))

Pode-se saber qual o tema do próximo post ?

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Exacto... "Decepar" é uma substituição de cabeça: Educação para a cidadania! Ou pensavam que era literalmente?! (rs) Sou um homem de bem! :)))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel

Vou tentar escrever agora sobre o poder e a violência em Arendt. Vou ver se sou capaz de terminar e editar daqui a algumas horas. :)

E. A. disse...

"Capar"? E "capar" tb não! :)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Afinal, o bastonário da ordem dos advogados chama-se Marinho PINTO e não "Pinho". Façam o correcção mental, onde escrevo "Pinho" deve ser lido PINTO. :(((