«A verdadeira crise da cidade manifesta-se não apenas numa diminuição do seu nível cultural, mas também na perda do seu carácter original de organismo cultural. Essa queda de valor é determinada pelo facto de que a cidade não é mais um bem e um instrumento da comunidade, cujo esforço tendente a uma finalidade comum facilita, mas um objecto de exploração por parte de uma minoria privilegiada». (Giulio Carlo Argan)
«A imaginação é a faculdade que nos permite pensar em nós mesmos de forma diferente do que somos e, portanto, propor uma finalidade além da situação presente. Sem imaginação pode haver cálculo, mas não projecto. O projecto não é mais do que a predisposição dos meios operacionais para pôr em prática os programas imaginados. A imaginação ética e politicamente intencionada é a ideologia, e não pode haver projecto sem ideologia». (Giulio Carlo Argan) Hoje à noite (15 de Junho de 2009) no "Prós e Contras" (RTP1) debateu-se o tema da degradação das cidades e da urgência da reabilitação urbana em Portugal. A apresentação prévia do debate é deveras impressionante: "Prédios a cair! Quarteirões em decadência! Centros históricos sem futuro! Cidades em risco!" Porém, sem uma filosofia da cidade, articulada com a arquitectura nessa disciplina que é a urbanística, estes temas podem ser incompreendidos, como sucede geralmente nos debates portugueses, com o mundo da programação a substituir de modo imperial e sufocante o mundo do projecto. A crise da cidade é crise da arte, a crise da arte é crise do objecto, e a crise do objecto é crise da historicidade. Ora, dado a cidade ser "uma entidade histórica absolutamente unitária" (Argan), a tarefa cultural da arquitectura é a recuperação da cidade como instituição histórico-cultural, "sem comprometer a sua actualidade de sistema de informação" e de comunicação. Quando escrevi este texto ainda não sabia quais eram os convidados, mas, em vez de arquitectos, os convidados são de outras áreas profissionais, com excepção do arquitecto Vasco Massapina: João Ferrão, Fernando Santos, Nogueira Leite, Elísio Summavielle e, em directo do Porto, Arlindo Cunha, no palco, e o Presidente da CM de Évora, Ricardo Gomes, Menezes Leite e Vasco Massapina, na plateia. Embora tenha falhado na explicitação de uma estética da cidade, o debate foi muito importante e rico em novas ideias que não devem ser esquecidas.
A ideia que presidiu a este debate e que foi discutida previamente entre Fátima Campos Ferreira e Fernando Santos, para justificar o seu título - as cidades onde não moramos, capta uma faceta negativa da história recente das cidades: o crescimento extensivo que expulsou as populações para fora das cidades, em especial para fora dos seus centros históricos. As grandes cidades estão desertas, porque foram trocadas pelas periferias. Este é um facto histórico incontornável, cujas causas são extremamente complexas, embora sejam sobredeterminadas pelos crimes da especulação inerentes ao funcionamento de uma economia de mercado desregulada e pela respectiva visão capitalista das cidades que sustenta as contradições das tradições culturais urbanas, tais como o caótico congestionamento do tráfego, o problema dos transportes, o escândalo das casas sem gente e da gente sem casas, a insuficiência dos serviços sociais e dos espaços verdes, a escassa mobilidade da cidadania ou mesmo a mediocridade cultural. O governo socialista elaborou um "Projecto de Reabilitação Urbana" que foi apresentado neste debate por João Ferrão (Secretário de Estado). O seu objectivo primordial é fornecer um "enquadramento das soluções" e um "conjunto de instrumentos" que possam ser utilizados por entidades gestoras, em especial da responsabilidade dos municípios, para reabilitar e revitalizar as cidades. A reabilitação deve estar ligada às actividades económicas, de modo a "refuncionalizar (produtivamente) o património". O projecto introduz uma nova figura jurídica: o "Plano de pormenor de reabilitação urbana". As autarquias desempenham um papel fundamental nessa tarefa de combater a degradação das cidades: compete-lhes delimitar as áreas de reabilitação das cidades, não apenas as áreas dos centros históricos, mas também as áreas degradadas de toda a cidade, as quais serão geridas pelos municípios ou por outras entidades gestoras, dotadas de estratégia, gestão e visão de futuro. João Ferrão apresentou este plano como uma mudança de paradigmas: a visão da cidade subjacente não é uma "visão museológica", de acordo com a qual "tudo fica igual mas mais bonito", mas um novo paradigma da cidade - uma nova "aposta civilizacional" - como estilo de vida sustentável. No fundo, o governo socialista advoga uma política das cidades que requer a sua reabilitação e fornece com este projecto vários instrumentos de reabilitação, dando-lhe prioridade máxima e garantindo a sua continuidade mediante avaliações constantes. A ideia que me atrai neste projecto é a de dar uma nova ordem à cidade. Assim, por exemplo, no Porto, a especulação foi durante muito tempo a dona da cidade, com o auxílio de administrações políticas conservadoras e corruptas. Em volta do seu centro histórico que é património mundial da UNESCO, solidificou-se um imundo magma de construções caóticas que rouba espaço para os serviços sociais e culturais e para as zonas verdes. Ora, este projecto socialista - aliás já materializado nas iniciativas do Porto Vivo - possibilita reanimar o centro histórico sem descurar as suas periferias, incluindo a sua área metropolitana: a construção dos Estádios do Dragão e do Bessa, bem como da Casa da Música ou mesmo da Fundação Serralves (Museu de Arte Moderna), ajudaram muito a evitar que o centro histórico morresse esmagado sob o peso das periferias. O centro histórico não pode ser condenado a uma existência puramente de museu: a sua reanimação e a restauração dos seus monumentos exigem uma revisão e uma reforma de todo o complexo urbano do Porto: a identidade cultural e histórica da Cidade Invicta depende dessa visão de conjunto aberta à modernidade, ao Rio Douro e ao Mar. O seu centro histórico não deve tornar-se uma espécie de reserva como as reservas dos índios nas Montanhas Rochosas.
Com excepção de dois convidados da plateia - Menezes Leite (proprietário de Lisboa) e Ricardo Gomes, os restantes participantes foram receptivos a esta proposta do governo socialista, ajudando a clarificar o somatório de causas responsável pela degradação das cidades portuguesas. António Nogueira Leite (economista) defendeu a reabilitação urbana como a "prioridade do investimento público" nesta hora de crise financeira e económica e, retomando a concepção exposta por João Ferrão, opôs a "cidade viva" à "cidade museu", mostrando a necessidade de elaborar uma visão integrada da cidade, de "centrar as políticas das cidades nas próprias cidades" e de reforçar estruturalmente os dois grandes centros urbanos ou metrópoles - Lisboa e Porto, que sofreram de modo mais drástico o êxodo das populações citadinas para as periferias. Porto e Lisboa precisam ser dotados de uma "nova centralidade" e de um novo enquadramento para que as coisas funcionem por si mesmas de um modo durável (Vasco Massapina) ou sustentável. Fernando Santos (Bastonário da Ordem dos Engenheiros) responsabilizou a "ciência oculta" que domina o sistema estabelecido pela desertificação das cidades e pela existência de casas fechadas ou devolutas. A ciência oculta não deixa "ninguém mexer em nada sem pareceres" de técnicos da área da arqueologia que, nas zonas classificadas, bloqueiam o serviço público, em nome de uma velha noção de cidade museu, de resto ultrapassada e desmentida pela actual crise da cidade. João Ferrão e Nogueira Leite apontaram outra razão responsável pelo crescimento extensivo que expulsou as pessoas para fora das cidades, mais precisamente para as suas periferias ou cidades satélites e cidades dormitórios, agravando o problema dos transportes e contribuindo para a poluição, a crise ecológica e a crise da natureza: a política da compra de casa própria fomentada pelos bancos portugueses. O crédito à aquisição de casa, feito em detrimento do crédito às médias e pequenas empresas, além de ter criado a "descentralização dos grandes meios urbanos", não preparou devidamente Portugal para fazer face à crise económica que vivemos com angústia no momento presente.
É certo que tanto Nogueira Leite como Fernando Santos chamaram a atenção para a necessidade de implementar a reforma das leis do arrendamento, sem a qual os proprietários não possuem capacidade para restaurar os prédios e ajudar a recuperar o património, com o apoio do Estado, mas não o fizeram nos termos usados por Ricardo Gomes e Menezes Leite. O congelamento das rendas ainda é uma lei oriunda do tempo de Salazar: Cavaco Silva limitou-se a actualizar os arrendamentos das novas habitações sem invalidar essa lei anterior. Mas a ideia de que a política da habitação deve obedecer às leis de mercado, sem levar em conta a questão social, facilitando o despejo dos inquilinos e restringindo o papel do Estado aos subsídios dados aos menos favorecidos e não à oferta, acabou por criar uma "crispação" condenada por Nogueira Leite. João Ferrão foi peremptório quando afirmou que a questão das rendas não é a questão central das políticas da cidade: a reabilitação deve ser vista como um meio para levar as pessoas para as cidades e como um fim - a revitalização. Elísio Summavielle chamou a atenção para a definição do "modelo de vida que desejamos para o futuro". Na sua perspectiva, a reabilitação dos centros históricos deve ser encarada como um problema de reordenamento do território que Vasco Massapina definiu nestes termos: as aldeias despovoam-se, enquanto as cidades se sobre-ocupam. É preciso operar uma ruptura com esta prática urbanística e devolver as cidades às pessoas (Fernando Santos), até porque os filhos das classes médias manifestam desejo em ir viver para os centros das cidades (Arlindo Cunha, Presidente de Reabilitação Urbana Porto Vivo), sendo necessário trabalhar os quarteirões que estão a ser reabilitados, de modo a restituir-lhes vitalidade cultural, turística e económica, e atrair o estabelecimento de serviços públicos nesses centros, nomeadamente os serviços universitários. Vasco Massapina defendeu a tese da durabilidade do sistema, e Arlindo Cunha, a sua continuidade, ou, nas palavras de Nogueira Leite, a sua sustentabilidade. A serenidade acabou por predominar sobre a crispação incentivada pelos dois proprietários já referidos, que, na perseguição do lucro fácil, sacrificam os interesses dispersos, subordinando-os aos interesses organizados (Nogueira Leite). A serenidade deu origem a um consenso alargado e, como finalizou João Ferrão, "a questão já não é «o quê», mas «o como»": o governo apresentou um conjunto de instrumento que permitem solucionar a crise da cidade, sem rejeitar a possibilidade de criar um mercado justo e equilibrado do arrendamento, mas os seus efeitos práticos devem ser posteriormente avaliados, de modo a que as políticas da cidade possam ser constantemente rectificadas e melhoradas.
Nota: A minha amiga Denise dedicou-me este post sobre o regresso de D. Sebastião, o Cristo do V Império. Obrigado pela dedicatória e pela escolha do texto de Fernando Pessoa.
J Francisco Saraiva de Sousa
Com excepção de dois convidados da plateia - Menezes Leite (proprietário de Lisboa) e Ricardo Gomes, os restantes participantes foram receptivos a esta proposta do governo socialista, ajudando a clarificar o somatório de causas responsável pela degradação das cidades portuguesas. António Nogueira Leite (economista) defendeu a reabilitação urbana como a "prioridade do investimento público" nesta hora de crise financeira e económica e, retomando a concepção exposta por João Ferrão, opôs a "cidade viva" à "cidade museu", mostrando a necessidade de elaborar uma visão integrada da cidade, de "centrar as políticas das cidades nas próprias cidades" e de reforçar estruturalmente os dois grandes centros urbanos ou metrópoles - Lisboa e Porto, que sofreram de modo mais drástico o êxodo das populações citadinas para as periferias. Porto e Lisboa precisam ser dotados de uma "nova centralidade" e de um novo enquadramento para que as coisas funcionem por si mesmas de um modo durável (Vasco Massapina) ou sustentável. Fernando Santos (Bastonário da Ordem dos Engenheiros) responsabilizou a "ciência oculta" que domina o sistema estabelecido pela desertificação das cidades e pela existência de casas fechadas ou devolutas. A ciência oculta não deixa "ninguém mexer em nada sem pareceres" de técnicos da área da arqueologia que, nas zonas classificadas, bloqueiam o serviço público, em nome de uma velha noção de cidade museu, de resto ultrapassada e desmentida pela actual crise da cidade. João Ferrão e Nogueira Leite apontaram outra razão responsável pelo crescimento extensivo que expulsou as pessoas para fora das cidades, mais precisamente para as suas periferias ou cidades satélites e cidades dormitórios, agravando o problema dos transportes e contribuindo para a poluição, a crise ecológica e a crise da natureza: a política da compra de casa própria fomentada pelos bancos portugueses. O crédito à aquisição de casa, feito em detrimento do crédito às médias e pequenas empresas, além de ter criado a "descentralização dos grandes meios urbanos", não preparou devidamente Portugal para fazer face à crise económica que vivemos com angústia no momento presente.
É certo que tanto Nogueira Leite como Fernando Santos chamaram a atenção para a necessidade de implementar a reforma das leis do arrendamento, sem a qual os proprietários não possuem capacidade para restaurar os prédios e ajudar a recuperar o património, com o apoio do Estado, mas não o fizeram nos termos usados por Ricardo Gomes e Menezes Leite. O congelamento das rendas ainda é uma lei oriunda do tempo de Salazar: Cavaco Silva limitou-se a actualizar os arrendamentos das novas habitações sem invalidar essa lei anterior. Mas a ideia de que a política da habitação deve obedecer às leis de mercado, sem levar em conta a questão social, facilitando o despejo dos inquilinos e restringindo o papel do Estado aos subsídios dados aos menos favorecidos e não à oferta, acabou por criar uma "crispação" condenada por Nogueira Leite. João Ferrão foi peremptório quando afirmou que a questão das rendas não é a questão central das políticas da cidade: a reabilitação deve ser vista como um meio para levar as pessoas para as cidades e como um fim - a revitalização. Elísio Summavielle chamou a atenção para a definição do "modelo de vida que desejamos para o futuro". Na sua perspectiva, a reabilitação dos centros históricos deve ser encarada como um problema de reordenamento do território que Vasco Massapina definiu nestes termos: as aldeias despovoam-se, enquanto as cidades se sobre-ocupam. É preciso operar uma ruptura com esta prática urbanística e devolver as cidades às pessoas (Fernando Santos), até porque os filhos das classes médias manifestam desejo em ir viver para os centros das cidades (Arlindo Cunha, Presidente de Reabilitação Urbana Porto Vivo), sendo necessário trabalhar os quarteirões que estão a ser reabilitados, de modo a restituir-lhes vitalidade cultural, turística e económica, e atrair o estabelecimento de serviços públicos nesses centros, nomeadamente os serviços universitários. Vasco Massapina defendeu a tese da durabilidade do sistema, e Arlindo Cunha, a sua continuidade, ou, nas palavras de Nogueira Leite, a sua sustentabilidade. A serenidade acabou por predominar sobre a crispação incentivada pelos dois proprietários já referidos, que, na perseguição do lucro fácil, sacrificam os interesses dispersos, subordinando-os aos interesses organizados (Nogueira Leite). A serenidade deu origem a um consenso alargado e, como finalizou João Ferrão, "a questão já não é «o quê», mas «o como»": o governo apresentou um conjunto de instrumento que permitem solucionar a crise da cidade, sem rejeitar a possibilidade de criar um mercado justo e equilibrado do arrendamento, mas os seus efeitos práticos devem ser posteriormente avaliados, de modo a que as políticas da cidade possam ser constantemente rectificadas e melhoradas.
Nota: A minha amiga Denise dedicou-me este post sobre o regresso de D. Sebastião, o Cristo do V Império. Obrigado pela dedicatória e pela escolha do texto de Fernando Pessoa.
J Francisco Saraiva de Sousa
70 comentários:
Não vou alterar a data deste post: o debate vai ocorrer hoje à noite (15 de Junho de 2009) e o post será concluído logo a seguir, na madrugada de 16 de Junho.
Estou curioso com os convidados e espero que haja alguém do Porto, porque é a cidade que mais precisa de investimento para contribuir para o progresso do país! O Porto é a cidade mais imponente de Portugal: uma marca de qualidade que é para Lisboa o que Barcelona é para Madrid, o que New York é para Washington ou Rio de Janeiro e São Paulo para Brasília! O progresso de Portugal sempre passou pelo Porto: esquecer isso é contribuir para a miséria nacional.
Ah, o FCPorto venceu a taça e o campeonato de Hóquei: mais duas taças! Por isso, a foto é a do Estádio do Dragão! :)
O Sea Life Center Porto vai ser inaugurado - espero que o nosso oceanário possa ser aumentado no futuro - e o Parque Oriental está a nascer em Campanhâ. A Cidade precisa destes - e de mais investimentos: O Porto já atrai actores de cinema e está entre as seis cidades preferidas pela malta da arte! :)
Aliás, o Sea life inaugura hoje, já inaugurou. Veja aqui
http://www.sealife.nl/local/index.php?loc=porto
Oi F.,
Pois, o Sea Life é fixe, mas o oceanário é muito melhor ;)
Já viu as dedicatórias da Denise?
Oi Else
Sim, vejo sempre a Denise e sei que nos dedicou dois posts. ;)
Claro q sim... ;)
Caro Francisco, parece que só comento no seu blog para "cascar" no que escreve, mas não pense que é má vontade, pois gosto dos seus textos.
Sabendo que me estou a dirigir a uma pessoa bem-pensante e inteligente, sei que posso alertá-lo para os casos em que está a utilizar argumentos um pouco "desonestos".
Está a comparar a situação de Madrid (uma cidade que só começou a "sê-la" verdadeiramente no século XVI), Washington (uma cidade de finais do Século XVIII), e Brasília (uma cidade, cujo arquitecto que a concebeu ainda é vivo),com Lisboa?
Não falo apenas na população (Lisboa, que eu saiba, é bem maior do que o Porto, ao contrário do que sucede com Brasília, em relação às cidades citadas, ou Washington em relação a Nova Iorque).
Falo em importância histórica (Lisboa já existe há 3.000 e tal anos) e cultural.
E sim, também gosto muito da cidade do Porto, e acho que deve ser valorizada autonomamente, sem as pacóvias comparações com outras cidades, que só a minimizam.
De resto, os grandes culpados com a dita crise actual da cidade são....os portuenses! As tais pessoas que elegeram Rui Rio em dois mandatos consecutivos.
A menos que ache que o poder central lisboeta hipnotizou os habitantes do Porto para colocarem lá um espião mouro.
Cumprimentos cordiais
Bem, Lugones, temos concepções diferentes de cidade, a começar desde logo pela história: todas as cidades têm a sua história, independentemente do tempo da sua existência. Mas, quando estabeleci esse paralelo que criticou, estava a pensar na relação da capital de um país com outro grande centro urbano. "Ser capital" é um estatuto político: Washington é capital, mas New York é o grande centro económico, financeiro e cultural dos USA. O mesmo sucede com o caso do Brasil. Ou noutra linguagem: a capital não deve ser Madrid mais Barcelona, tudo concentrado no mesmo espaço. Ora, é esta noção de capital(ista) que critico na política portuguesa: Lisboa quer ser Portugal; o preço é elevado: a pobreza do país e as suas assimetrias.
De certo, as suas críticas são sempre bem-vindas: não sou dogmático. Quanto a Rui Rio, é o povo que decide... Cabe aos outros conquistarem o povo com melhores alternativas e uma visão de futuro para a Invicta!
Sim, nós seguimos o modelo francês, centralista, já herdeiro do absolutismo. Apesar de achar que Lisboa está em muito melhor condições de concorrer com uma Barcelona, (o Porto é muito pequeno), também sou adepta de um modelo muito mais equilibrado, talvez como nos Países Baixos, ou nos países escandinavos; assim seria o ideal. Mas é difícil quebrar hábitos. É preciso que haja mesmo vontade política para investir noutras cidades e determinar um projecto para elas.
Quanto à questão do património, ela é complexa... qq reabilitação requer muito dinheiro, até seria mais barato, destruir e contruir de novo. Além de que há muitos interesses por parte dos senhorios e uma lei de arrendamento que obsta ao arrendamento.
Enfim. É muito urgente pensar a(s) cidade(s), porque são o habitat do homem moderno e o lugar de formação do cidadão, mas as cidades, neste sentido mais originário, estão a morrer...
A crise da cidade não é a crise da arte, como escreveu, mas a crise da cidadania.
Ainda não percebi essa noção de o Porto ser pequeno, quando na verdade a área metropolitana do Porto é a região mais povoada do país.
Além disso, o país dispensa bem essa visão de megacentros urbanos, até porque são ecologicamente indesejáveis.
Mas não leu o que eu disse ou não percebeu? E a área metropolitana do Porto n é a maior do país não.
Só o concelho da Amadora (um dos subúrbios de Lisboa) é o 3º concelho mais populoso... N pode comparar a área metropolitana de Lx com a do Porto.
A área metropolitana de Lx acolhe 3.000.000 de habitantes e a do Porto 1.000.000... só 3 vezes mais.
Sim, a Amadora é um concelho populoso. Quanto às áreas metropolitanas é uma questão de definição prévia. Como suspeito da veracidade do conceito normalizado e oficial, mantenho a minha noção.
Aliás, o que entende por área metropolitana do Porto? O Norte é mais povoado do que o Sul, como sabe.
N falo de cor. Gosto de dialogar na verdade e não de forma patética e apaixonada ou fanática.
área metropolitana do Porto, de Lisboa ou de qq cidade são as cidades que orbitam a cidade maior, no caso do Porto: Espinho, Matosinhos, etc., q n me lembro de mais, é claro q n conta Braga e etc.
Mas o bairrista não sou eu que defendo a existência de duas metrópoles: Porto e Lisboa. Aliás, essa foi a perspectiva defendida neste debate de ontem. O arquitecto falou de Ponte de Lima como exemplo de reabilitação urbana de sucesso e os seus habitantes não querem ser cidade: apenas Vila. Outro exemplo foi dado por Nogueira Leite: Aveiro. Os problemas urbanos nacionais são Lisboa e Porto, como sabe.
Espinho, Gaia, Matosinhos, Maia, Ermesinde, Penafiel, Gondomar, Rio Tinto, Vila do Conde, Paços Ferreira, Santa Maria da Feira, etc...
Aliás, eu nem sequer estava a falar dos tamanhos...
Francisco, se nós lisboetas ou habitantes de Lx, já sentimos q Lx é uma aldeia, o Porto então é uma simpática aldeola. :D
Eu acho q os subúrbios de Lx devem invadir o centro da cidade, que se tornou luxo de poucos ou asilo de velhos.
A ideologia sanitária (à Virilio) varre os cidadãos de 2ª para a periferia, mas uma revolta deveria ser a tomada da cidade! da capital!
É a guerra civil do futuro!
Oh, ser "aldeias" com qualidade de vida não é nada mau: não precisamos importar modelos exteriores esgotados e condenados ao fracasso.
Eu li o seu comentário e compreendi: estamos de acordo quanto à estupidez de um modelo centralista.
Sim, essa guerra civil já acontece um pouco, porque Lx e Porto estão a ser invadidos por pessoas em busca de oportunidade de vida. Um efeito da crise económica! Penso que devemos pensar tb no interior e reabilitar esse património!
A Baixa do Porto começa a ter algum movimento nocturno, talvez devido à fixação dos estudantes universitários no centro. Os espanhóis estranham esse facto, porque nas suas cidades interiores têm muita movimentação nocturna nos centros históricos. Aliás, as periferias dos grandes centros comerciais explicam tb o apagamento das baixas de lx e Porto.
Ser uma metrópole não é propriamente um modelo condenado ao fracasso... n vejo decadência em NY ou Tókio ou...
NY está a ser tomada por "estranhos" e muitas empresas fugiram de lá..., fixando-se em San Francisco ou Los Angeles.
O q são "estranhos"? NY sempre foi tomada por estranhos...
"Estranhos" no sentido de já não se falar inglês nas ruas, mas espanhol. Outro aspecto é a fuga dos artistas de Manhattan, embora tenham sido desenvolvidas políticas para o evitar. Mas NY já não é o que foi: um centro de inovação cultural.
Tókio é um formigueiro visto via satélite: não me atrai.
Já corrigi o nome do arquitecto: é Vasco Massapina e não "Massipina", como tinha escrito. Sorry: estava a jantar quando assisti ao debate!
Bah... como se houvesse algum purismo cultural nova-iorquino... enfim! O q há de mágico nas grandes cosmopolis é essa diversidade. E NY continua a ser um grande centro cultural.
bahhhhhhhh... a Papillon ainda vai ser contratada pelo mayor para resolver os problemas de NY, com muitas mestiçagem-propaganda?! Uma das fontes do Problema... :)
Eu sou a favor da mestiçagem, caro F. :)
Os centros culturais entraram em declínio com o neoliberalismo selvagem: já fazem parte do passado. A cidade-objecto foi substituída pela cidade-imagem, onde o self regride... :(
Eu prefiro diversidade e a diferença sem uniformização mestiça, Papillon. :)
Sim a cidade, definitivamente, entrou em declínio - concordamos. Mas, penso q isso tenha a ver com a emergência do virtual - o espaço público despareceu, as pessoas não se encontram nas ruas e praças! Preferem o contacto virtual, como fazemos nós. E isso faz perder a noção de território comungado.
Não defendo a mestiçagem como uni-raça, porque isso seria a regressão total, o Grande Crime, cara Papillon. :)
E, logo, de responsabilidade cívica, de empenho político, etc. A polis funde a política. Sem cidade, n há cidadãos e cidadania - há zombies.
Acha q a uni-raça seria regressão? por acaso acho q seria o ideal (positivo).
Sim, isso é verdade: a cidade virtual deu cabo do espaço público. É um problema complexo, mas não concordo com a perspectiva de Castells ou mesmo de Bauman a esse respeito.
Sim, hoje em dia não existem humanos mas zombies: é um facto que devemos encarar de frente se quisermos mudar alguma coisa.
Historicamente, as mestiçagens estão associadas a declínios das culturas: pense nisso, Papillon.
exactamente! é isso mesmo, devemos admiti-lo para partir para soluções... e sobretudo admitir q o problema vem já de trás, de facto, Bauman, Castells, Virilio e outros pensadores pós-modernos supõem uma mudança radical sofrida pela sociedade pós-industrial, mas é falseado, pq a apatia do ser-urbano é uma doença q vem desde a cidade moderna do princípio do século XX... temos de contar a história de novo, para chegarmos à solução.
Oh Francisco, talvez tenha razão, n sei - quanto à mestiçagem. Mas amo a humanidade, e n consigo pensar de outra maneira.
Tb concordo com essa tarefa de reescrever a nossa história: ela tem sido mal contada. :)
Coexistência pacífica e produtiva: diálogo e tolerância, respeito pelas diferenças: eis como encarar essa diversidade étnica.
Mais outro nome corrigido: é Elísio Summavielle e não Sammvielle! Obrigado pela chamada de atenção anónima! :)
Olá
Conhecem algo sobre o Urbanismo Unitário? o dos situacionistas? :)
Sempre me deixou meio perplexo o porquê de o constituirem como uma noção central da sua critica, mas agora, antes me surpreende o visionarismo q todas as suas análises foram acabando por confirmar ao longo do tempo.
Cumps
"O Porto já atrai actores de cinema e está entre as seis cidades preferidas pela malta da arte! :)"
Caríssimo, a sua esperança foi rebatida no Público pelo director do museu de arte contemporânea de Serralves:
Em declarações à Lusa, João Fernandes admite que "tem havido, nos últimos anos, alterações positivas com o crescimento na cidade de instituições de referência e, ao mesmo tempo, impasses e paradoxos. "Um deles", assinalou, é o facto de a região ter, neste momento, instituições de referência a nível nacional e internacional, como Serralves, a Casa da Música e o Teatro Nacional de S. João, e, ao mesmo tempo, o Porto ser tão pouco acolhedor para os artistas desenvolverem trabalho".
Isso é verdade. O Porto para ser grande tem de ser aberto de espírito e cultivar-se.
Ah, o que o homem diz não é verdade, porque as notícias circularam na imprensa francesa e inglesa, com entrevistas de actores que estiveram no Porto a fazer rodagens de filmes. Além disso, por um lado, estão a abrir hotéis quase todos os dias, e, por outro lado, o FCPorto é sempre notícia nos meios de comunicação estrangeiros.
Novos investimentos serão feitos para melhorar as condições: não vale a pena tentar ofuscar a verdade, porque o S. João já começou e os estrangeiros já estão aqui na cidade a comer farturas e a gozar a cidade.
E mais: até pessoas de Lisboa da área das arte querem viver no Porto, recuperando edifícios abandonados. :)
E não negligencie as nossas Faculdades de Arquitectura e de Belas-Artes, os Teatros S. João e Carlos Alberto. O Mercado Ferreira Borges já está em obras. E o Pavilhão Rosa Mota também vai entrar em obras. Os estilistas já têm a sua rua arranjada, os edifícios estão a ser recuperados e vendidos na Baixa.
Portanto, as coisas começam a mudar, aliás já começaram a mudar há muito tempo: deve ter sido isto que o homem queria dizer. É preciso mudar, melhorar e combater a cunha!
Enfim, e o São João é algum tipo d evento artístico? O facto de se rodar um filme no Porto, faz dessa cidade acolhedora aos artistas? N dá para dialogar com o Francisco, pq desconhece e n reconhece os defeitos e limites da cidade do Porto... assim n fomenta a evolução.
O discurso do director do museu de Serralves é muito mais precioso pq é uma pessoa do meio, q trabalha numa das maiores organizações culturais do nosso país. O Francisco fala, pelo menos no que respeita à cultura, sem saber, louvando o Porto de maneira cega. Lx e o Porto têm muitos defeitos e devem ser reconhecidos, por forma a serem superados.
Senao houver um meio artístico forte, o Porto n passa das 3 salas q tem: Serralves, Casa da Música, e S. João, que são visitadas por artistas de Lx ou estrangeiros. É isto q o director quer dizer. E se o Franciso for atento e cultor de arte, experimente consultar as agendas da sua cidade e os artistas q as compõem.
Sabe qual é o problema do Porto e de Lx? São os portugueses e o seu falso estilo cultural: os convencidos e usurpadores afastam tudo, incluindo os estrangeiros! As pessoas não vêm ao Porto por causa de Serralves ou S João, mas sim por causa da cidade e do seu carácter único. Cultura-exposição têm muito nos países donde são provenientes...
O problema das instituições culturais portuguesas reside na vacuidade cultural e grotesca das pessoas que as dominam: o oportunismo que as rodeia mata-as. O resto são tretas...
A cultura que os estrangeiros procuram no Porto é a CIDADE e é nisso que se deve investir.
Ah, se diz que não existem verdadeiros artistas em Portugal, essa é uma verdade demasiado evidente... Claro que ninguém conhecedor da cultura admira o pseudo-estilo nacional de pseudo-cultura.
"O problema das instituições culturais portuguesas reside na vacuidade cultural e grotesca das pessoas que as dominam: o oportunismo que as rodeia mata-as. O resto são tretas..."
Claramente o amigo F. n sabe do q fala, pelo q deve ser mais humilde e procurar conhecer melhor a sua realidade.
Em segundo lugar, a "cidade" de que fala q os estrangeiros procuram, qual noção abstracta e vaga, n é nada. Se quer uma cidade do Porto realmente cultivada e cultural, n se pode cingir ao "postal da ponte d. maria" ou ao vinho do Porto, isso é pensamento estreito. O projecto de Serralves é muito bom e se o desconhece, comece a a fazê-lo, porque talvez seja das coisas mais interessantes, senao a mais da sua amada cidade.
"Ah, se diz que não existem verdadeiros artistas em Portugal, essa é uma verdade demasiado evidente... Claro que ninguém conhecedor da cultura admira o pseudo-estilo nacional de pseudo-cultura"
Que estilo é esse? E que pseudo-cultura é essa q fala? É muito fácil escrever o prefixo "pseudo" e n justificar. Isso n é nada.
Assim, volto a dizer, n dá para dialogar. O Francisco limita-se a ofender e a criticar sem justificar. Assim é pobre e vácuo... e, n enaltece o Porto nem Lisboa, nem nada.
No entanto, esta sua verborreia, fez-me lembrar uma frase q li ontem do João César Monteiro, um belíssimo artista, que deixa saudades, que dizia assim: "Portugal é um poço onde se cai, um cu onde não se sai." :D
Então, se Portugal é um cu donde não se sai, como diz, como quer que os outros se atirem ao cu-poço?! :)
Eu n disse q subscrevia a frase, limitei-me a transcrevê-la, pondo-a ao lado da sua retórica. Ao menos, o César Monteiro tinha graça, o F. nem isso. Desisto de falar consigo sobre o Porto, é inútil.
O Porto está bem: caminha... livremente o seu caminho. :)
"caminha... livremente o seu caminho"
que banalidade! Bom, tb vou caminhar ;)
Caro Sr
O conceito de arquitectura unitária tem abrangido alguns estudos interessantes, embora o termo "unitário" possa ser tomado num sentido negativo: abordagem integrada pode ser uma alternativa, mas nunca pensei muito nisso. O diferencial nunca pode ou deve ser apagado: arquitectura diferencial é outra abordagem interessante.
Cumps
Olá
nao, nao é a isso q me referia.
Qd tiver tempo, e se tiver curiosidade,leia esta entrevista do h.lefevre http://www.rizoma.net/interna.php?id=138&secao=potlatch
e talvez até ache tb interessante reflectir no urbanismo como ideologia ;)
Deixo os participantes do blog com um bom momento musical do nosso GOVERNO
http://vimeo.com/5177895
:)
Bom fim de semana \0/
Sim, Henri Lefebvre dedicou obras importantes à cidade e à crítica do urbanismo: o fetichismo do espaço, a cidade cedendo à sociedade urbana. Um pensamento crítico muito frutífero, de resto contrário à programação!
Sou capaz de alinhavar qualquer coisa sobre Lefebvre!
Bom fim de semana!
Neste debate, houve um erro: cidades onde não moramos. Percebe-se o objectivo, mas pode induzir em erro em termos de pensar a cidade.
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