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Dois quadros de Remedios Varo: Dor Reumática I (1948) e A Dor (1960). A dor é, para o sujeito humano, uma prisão que o isola da companhia dos outros, e, ao mesmo tempo, uma ponte que liga o que dispersa, dilacera e isola. A dor dilacera, dispersa e isola a alma, diferenciando-a e cortando-a em pedaços. No entanto, ao rasgar a unidade anímica do ser humano e ao diferenciá-la em relação ao outro, a dor reúne e articula o que foi cruelmente separado pelo rasgo e pelo corte: o re-nascimento da subjectividade rebelde, capaz de caminhar erguida para a frente, antecede a Grande Ruptura - a construção de um mundo melhor. O quadro Mimetismo (1960) rejeita categoricamente a teoria da mimesis subjacente ao realismo: o surrealismo de Remedios Varo confronta a realidade estabelecida com as suas possibilidades dialecticamente objectivas. As suas pinturas não imitam - ou reflectem - a realidade tal como é; pelo contrário, transfiguram-na de modo a revelar e a realizar a essência que o mundo dos fenómenos encobre: o surrealismo quebra o feitiço da pseudo-objectividade da realidade estabelecida.
J Francisco Saraiva de Sousa
1 comentário:
Há outras ideias questionadas nestes dois quadros: traição e tortura. Porém, a ideia básica subjacente é a de que a dor impede a marcha erguida do homem.
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