terça-feira, 22 de abril de 2008

Prós e Contras: PSD: Quem sucede a Menezes?

«Os leitores de Kant puderam aprender (que o nosso planeta é uma esfera e que, como permanecemos na superfície dessa esfera e nela nos movemos, não temos outro lugar para ir e, portanto, estamos destinados a viver para sempre na vizinhança e companhia de outros.) O mundo, contudo, mal prestou atenção. Parece que, em vez de escutar atentamente os seus filósofos, já sem falar em seguir as suas advertências, prefere homenageá-los com placas. Os filósofos podem ter sido os principais heróis do drama lírico do Iluminismo, mas a tragédia épica pós-iluminista quase apagou as suas falas». (Zygmunt Bauman)
Hoje (21 de Abril de 2008) Fátima Campos dedicou o seu programa "Prós e Contras" à crise que se vive no PSD, supostamente deflagrada pela demissão de L. F. Menezes, mas que acompanha o PSD desde a sua fundação. No palco estavam, de um lado, Ângelo Correia e Zita Seabra, que não representavam nenhuma candidatura, e, do outro, Pedro Passos Coelho e Patinha Antão, dois candidatos. Na plateia participaram dois politólogos, independentemente do que isto significa: Joaquim Aguiar e André Freire. Os outros dois candidatos, Aguiar Branco e Manuela Ferreira Leite, declinaram o convite para participar.
Destes convidados tenho uma clara simpatia por Ângelo Correia que, logo no início, disse aquilo que penso da situação nacional, embora depois tenha sido desviado do seu raciocínio: Em Portugal, "existimos para ter lugares, mas não para dizer o que se pretende fazer nesses lugares". A crise profunda portuguesa reside na ausência de pensamento e, portanto, de ideias e de projectos. Isto significa que a democracia portuguesa está profundamente degradada e corrompida, colocando em questão a própria liberdade assumida como responsabilidade. Em lugar dessa liberdade, está o medo que, nesta hora obscura, é o medo de perder o "lugar", isto é, a "sobrevivência" para a maioria dos portugueses e a "riqueza fácil" para a minoria. Mas Ângelo Correia foi mais longe quando, a propósito de uma reportagem sobre a vida privada de Menezes, que, segundo Zita Seabra, estaria na origem da sua demissão, responsabiliza os profissionais da comunicação social pela degradação da qualidade da política e da democracia, ao mesmo tempo que retomou a sua velha tese de que Cavaco Silva foi o "eucalipto" que secou o PSD e desacreditou a política.
Concordo, em termos gerais, com esta visão exposta por Ângelo Correia, mas acrescento a sua consequência política: Não podemos mudar de rumo com os mesmos homens que afundaram Portugal. A mudança desejada implica necessariamente uma ruptura: ruptura com as pessoas e elites estabelecidas, responsáveis pela mentira política, e ruptura com as políticas seguidas durante estes últimos 30 anos. Este Estado omnipotente foi criado por estes homens que lideraram e lideram Portugal para garantir os seus interesses de grupo ou mesmo privados. Isto significa que o Estado português é um monstro corrupto ou, pelo menos, manipulado por políticos e por outros agentes corruptos. A crise do PSD está ligada a esta corrosão do Estado: o PSD ajudou-o a criar. Por isso, o PSD não faz parte da solução do problema, porque ele próprio é um dos problemas: a sua ideologia sempre foi o "oportunismo", cujo objectivo é conquistar o poder para satisfazer a gula dos seus "barões".
Por isso, recuso-me a entrar no diálogo entre os dois candidatos presentes. Mais "liberalismo" (Pedro Passos Coelho) ou mais "social-democracia" (Patinha Antão) constitui um falso dilema, até porque o PSD não é nem liberal nem social-democrata. As falsas promessas populistas não são o caminho correcto de uma nova política de mudança social qualitativa. A social-democracia é pensamento de Esquerda e, em Portugal, ela tem sido legitimamente protagonizada pelo PS, o qual não se deixa aprisionar pela imagem que dele fazem os lideres do PSD: um mero tampão que visa bloquear a ascensão do PCP à sua esquerda, para que o PSD execute aquilo que o PS supostamente executa mal, devido às suas bases eleitorais! Quem tenha o mínimo de inteligência e de cultura filosófica, sabe que isso não corresponde à realidade e, se fosse honesto, reformava-se. Entrar no discurso das privatizações (da gestão dos hospitais, da TV pública, da Caixa Geral de Depósitos, etc.) é pura irresponsabilidade que, segundo sabe o nosso bom senso, conduz à corrupção e ao seu agravamento: ao enriquecimento dos "mesmos" e à miséria do país, portanto, à manutenção do Estado que pretendem reformar.
Ao contrário do que disse Joaquim Aguiar, dizer a verdade não mata e a "morte feliz" que disse ser preferível constitui a maior barbaridade que um homem pode dizer, porque significa promover a mentira sistemática, condenando os outros à sua menoridade, precisamente a mentira que nos tem governado, sobretudo na sua "versão laranja". Porém, merece algum crédito quando defendeu a necessidade de "refundar os partidos e a democracia". Pelo menos, encaro esta necessidade de refundação da democracia portuguesa como o tema que deveria ocupar a agenda das muito próximas comemorações do 25 de Abril de 1974. Como frisou Ângelo Correia, esta refundação exige muito trabalho de pensamento crítico e criativo, aquele que tem estado ausente da cena ou esfera pública, dado esta estar refeudalizada pelas novas classes dirigentes e os seus lacaios da comunicação social, e, sobretudo, mudança radical de pessoas e de lideres políticos. Faltou apenas questionar que tipo de capitalismo desejamos, embora André Freire tenha mostrado que o neoliberalismo não produziu aumento significativo da produtividade, mas maiores desigualdades entre os muito ricos e os muito pobres, lembrando que algumas reformas tidas como necessárias estavam a ser executadas pelo actual governo socialista. (Sobre a candidatura da "Dama de Ferro à portuguesa" leia aqui este post.)
J Francisco Saraiva de Sousa

21 comentários:

Manuel Rocha disse...

Por vezes o Francisco deixa transparecer que acredita que a mudança de liderança possa conduzir directamente a uma melhoria generalizada na qualidade da vida pública . É possível que tenha razão, e que uma governança esclarecida pudesse realmente fazer a diferença. O interessante é depois partir dessa premissa para escalpelizar como o faria. É que se levarmos em conta que somos uma democracia reivindicativa, que quer sempre receber mais dando menos, a solução seria ludibriar essas reinvidicações e simular ir numa direcção mas enviando noutra inconfessada a estratégia principal ?
Bem, sei que é isso que acaba sempre por acontecer. Pessoalmente, não me agrada a pastorícia esclarecida. Prefiro os rebanhos autónomos. Mas não sei escolher entre a subordinação à dinâmica de reinvidicação idiota e um governo dissimulado.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel

Precisamos de nova liderança política, esclarecida e não-comprometida com o actual sistema. Sempre os mesmos candidatos já não é solução, porque quem governou mal não vai governar bem.
Mas precisamos também de novas ideias e novos projectos que saibam dizer a verdade.

Manuel Rocha disse...

Pois é essa a questão: quem é que está interessado na verdade ? Os governados ? Bem...permite-me que duvide ? Os governados estão interessados num caminho rápido para o paraiso na terra, e hão-de berrar que nem cabras desmamadas sempre que lhes surja o minimo escolho...Perante isso, como se governa ?
Repare, o esclarecimento de questões centrais para o nosso futuro colectivo, continua claramente difuso mesmo entre as elites. Ainda há pouco li um economista dissertar sobre a produção de diesel a partir de cereais. Se não sabemos do que falamos nestas questões mais simples, como é que se assume uma participação social esclarecida ?!

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Sim, os governados querem é pastar com telemóvel na mão. Eu sei isso. Por isso, penso que precisamos livrar o Estado desses governantes pouco esclarecidos que pensam também no seu próprio pasto ou bolso.
Sim, as elites são ignorantes. Uma política de verdade deve alterar radicalmente isso, nem que fosse necessário "suspender" a falsa democracia. Porém, reformas bem pensadas e bem feitas podem modificar os governados, recorrendo apenas ao sistema bem doseado de punição.
A corrupção deve ser combatida. Há figuras que circulam pela esfera pública que são muito atrasadas mentais (mesmo), mas ninguém as denuncia como tal.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

E os mass media devem ser controlados. Constituem um perigo total, sobretudo quando os seus empregados são absolutamente néscios.

Manuel Rocha disse...

Resumindo: volta Salazar que estás perdoado !!

::)))))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Pelo menos, morreu pobre! Pena é que tenha sido pouco esclarecido em relação ao futuro. (Aliás, os portugueses votaram nele como grande português!) Mas não defendo regimes autoritários de Direita! Sou de Esquerda e pela democracia real! :)

Manuel Rocha disse...

Isso não está em questão...

:)

Mas olhe que há coisas curiosas. Ainda hoje não há economista que não tenha que fazer manobras inenarráveis quando se trata de reconhecer que foi no perido 50-70 que Portugal teve os melhores resultados económicos do século.

Fazem-me lembrar uma professora de geografia do meu quinto ano que um dia não aceitou a resposta de um colega que dava o Volga como o maior rio da Europa. Para ela seria o Danúbio porque não tinhamos "relações" com a Rússia...:))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel

Repare que vivemos mergulhados numa terrível mentira! O capitalismo está em crise profunda, globaliza-se e, aos poucos, mergulha tudo consigo no abismo. Os lideres políticos regrediram cohnitivamento, o povo está satisfeito desde que tenha pasto, e não estamos preparados para fazer face a competição mundial. A economia portuguesa não existe! É uma invenção do Estado degradado!
O furacão nos USA mostrou que as pessoas são meros animais que se adaptam a outros estilos de vida, sem produzir muito lixo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ya, Salazar teve esse mérito de pôr a nossa economia a crescer e o 25 de Abril destruiu tudo... :(

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Eu não gosto de mencionar nomes, mas já viu que os candidatos do PSD são eternamente os MESMOS! Sim, aqueles que nos afundam sempre... :(((

Manuel Rocha disse...

Sim...

É provável que até se esqueçam de que a Dra Ferreira Leite trocou património por déficit...

Mas isto é o que dá sermos todos filhos da mesma "escola", além de que no contexto UE a margem de manobra de quem governa aqui o "bote" é reduzida. Assim, sem imaginação, as politicas mantêm o essencial e de resto é a gestão do fait-divers para consumo mediático...

BEJA TRINDADE disse...

Pelos vistos os candidatos do PS não, são uns anjinhos, só lhes faltam as asas.
Então no tempo do Salazar é que era bom, já faltou mais para lá chegar.
Este auto-proclamados "socialistas", nunca nos enganaram.

BEJA TRINDADE disse...

"O 25 DE ABRIL, destruiu tudo".

Ora aí está a frase que faltava, para identificar politicamente o J. Francisco Saraiva de Sousa, para quem tinha dúvidas, eis aqui, o seu conceito de "socialismo".

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Beja Trindade

Descontextualizou a frase: o crescimento económico e o nosso avanço em relação a Espanha regrediram depois do 25 de Abril devido à má gestão da "coisa". Era isso que o Manuel e eu comentávamos.
Então, se não acredita no PS, vote PSD!

BEJA TRINDADE disse...

Como muito bem sabe eu não, não voto nem nunca votei no PS nem PSD, porque se houve má gestão da "coisa", deve-se a quem tem estado no poder nos últimos 30 anos. Estou a ficar cansado de lhe lembrar esta questão do poder, pelo que vejo, continua a fazer orelhas moucas.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Beja Trindade

Vota CDU! Gostava de saber qualquer é o programa económico do seu partido! Que economia opõe à economia de mercado? :)

Manuel Rocha disse...

Sempre que por acaso do destino sou colocado em frente dessa "sua" TV, só apanho desgostos...Há pouco a RTP by Judite de Sousa ( sua prima ? ) com um fisico nuclear convertido ao aquecimento global, produziram um exercicio de demagogia psedo-cientifica arripinate...:((

Até fico a cardiovascular mal...:))


Beja Trindade,

Como diria o Herman, " do not precipitate"....:))

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Manuel

Vi essa entrevista. De facto, foi uma desilusão! No dia da Terra, ficámos sem perceber nada. :(

BEJA TRINDADE disse...

Caro J. Francisco

Se estivesse atento, sabia qual o tipo de economia que o meu partido defende, naturalmente que não será a mesma do seu partido.
Sabe muito bem que seria uma economia de rotura com as actuais privatizações, que nada tem de socialismo.

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Beja Trindade

Sim, "socialismo/social-democracia" e "comunismo" são absolutamente diferentes.