A tese que pretendo defender é impopular e difícil de expor: o jornalismo que se faz em Portugal é inimigo da democracia, da república e da liberdade.
O que está aqui em questão não são os jornalistas como pessoas, mas a prática do jornalismo e as suas pretensões corporativistas. Esta prática é absolutamente contrária ao espírito democrático e à noção de que todos os cidadãos responsáveis têm o direito e o dever de participar na esfera pública, sem mediadores. Ora, em Portugal, a esfera pública é claramente monopolizada pelo poder político instituído e pelos jornalistas que encaram a sua actividade como um «quarto poder», com amplos poderes de vigilância sobre a actividade política e os seus protagonistas. Esta ideologia jornalística espontânea visa veladamente ou mesmo descaradamente assegurar interesses corporativistas e garantir o monopólio das «notícias» e da «comunicação».
O poder político não fez nada para travar esta pretensão do jornalismo corporativista; pelo contrário, facilitou-lhe a vida, permitindo a aprovação de legislação favorável ou mesmo a abertura de cursos de jornalismo e de comunicação. Actualmente, o jornalismo não é uma actividade livre de cidadãos responsáveis, mas uma «carreira» que começa na universidade e que termina Deus sabe lá onde: o mais provável no desemprego! Sim, porque os jornalistas instalados aprenderam com os governantes ou com as pseudo-elites a bloquear a vida daqueles que os ameaçam: o jornalismo instalado é medíocre e, por isso, açambarca tudo o que pode, incluindo licenciaturas da treta e carreiras universitárias e políticas, para impedir uma reprodução renovadora e vivificadora do sistema. Seguindo o triste exemplo de outras ordens profissionais ou sindicais, os jornalistas instalados anseiam por uma corporação fechada, capaz de garantir os seus interesses, em detrimento dos interesses políticos, os da democracia e do bem público.
Distanciei-me ligeiramente do meu objectivo, mas com resultados positivos. Curiosamente, reli a obra de Oscar Lewis sobre a «antropologia da pobreza: cinco famílias mexicanas» e constatei que uma das suas conclusões ajuda a explicar a miséria nacional. Lewis diz que, apesar da mobilidade social e de algumas famílias terem ascendido na escala social, a sua cultura permanece sempre a mesma, a do estrato social inferior de que provêm. Em Portugal, após o 25 de Abril, assistimos a diversas ascensões sociais: as classes populares tiveram a sua oportunidade e, sobretudo nos meios rurais, arranjaram empregos de responsabilidade ou tomaram conta deles sem qualquer preparação, e muitos vieram depois para as cidades, sendo hoje figuras públicas. O nível de vida e o estatuto social subiram aparentemente, mas a formação cultural permanece a mesma do grupo inferior de que são provenientes. É certo que publicamente dizem detestar a «cultura popular» ou «cultura pimba» e fazem tudo para apagar esses vestígios da origem social, negando o passado ou inventado genealogias sociais, mas, lá no fundo, continuam a ser «parolos» e muito «rascas». A sua auto-estima é muito baixa, bem como a sua auto-confiança: daí o ódio que nutrem por tudo o que é realmente «superior» e egrégio. O sistema de ensino nada pode fazer para travar esta mediocridade, porque, ele próprio, a produz, através dos seus professores cuja licenciatura é a da «cultura popular», do «zé-parolo». O que é verdade para estas categorias sociais, também é verdade para os jornalistas: a ralé grassa por todos os lados e age de modo a bloquear o futuro de Portugal.
Penso que, de momento, não preciso acrescentar nada mais à tese que coloco em discussão: vejam os jornalistas em acção, estudem o seu comportamento e o modo como «fabricam notícias», e tirem as vossas conclusões. J Francisco Saraiva de Sousa
3 comentários:
República escreve-se com maíuscula.
Obrigado pelo comentário!
Além disso, a língua é feita pelos seus utentes activos e as convenções podem ser quebradas. Nada de dogmatismo linguístico! E, naquele contexto, não justificava destacar um termo em detrimento dos outros.
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